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Anemia Falciforme Em 1904, James Herrick, médico de Chicago, examinou e relatou a história clínica de um paciente negro de 22 anos, que se apresentava astênico, com cefaléia e vertigens. Sentia palpitações e dispnéia. Há três anos havia diminuído sua atividade física. Ao exame físico, apresentava desenvolvimento neuropsicomotor adequado, icterícia e anemia. O hemograma confirmou a anemia: PARÂMETRO ENCONTRADO VALOR DE REFERÊNCIA Glóbulos Vermelhos 2,6 x 106/ml 4,6 – 6,2 x 106/ml Hemoglobina 8g/100mL 14 – 18 g/ml Glóbulos Brancos 15.250/ml 4.000 – 10.000/ml As hemácias variavam muito de tamanho, algumas eram anormalmente pequenas. Havia muitas células vermelhas nucleadas. Entretanto o que chamava a atenção era o grande número de formas finas, alongadas e falciformes que não eram observadas em amostras de sangue de indivíduos normais, colhidas e preparadas da mesma maneira. O tratamento foi de manutenção, consistindo de repouso e boa alimentação. O paciente deixou o hospital quatro semanas após. Sentia-se melhor, porém continuava a apresentar hemácias falciformes, embora em menor número. Herrick sugeriu em seu relato “que alguma alteração desconhecida pudesse ser o fator desencadeante da doença”. Questões 1 – Explique as alterações encontradas no hemograma. R: A partir do exame realizado, foi possível constatar que os valores tanto de glóbulos vermelhos quanto de hemoglobina do paciente estavam bem abaixo dos valores considerados normais. Já o valor de glóbulos vermelhos estava superior ao valor de referência. 2 – Qual seria o exame padrão-ouro para o diagnóstico de anemia falciforme? Justifique. R: O exame considerado padrão-ouro para o diagnóstico da anemia falciforme é a eletroforese. A eletroforese alcalina em acetato de celulose diferencia as hemoglobinas A (hemoglobina de cadeia alfanormal) e hemoglobinas F (fetais), e as variantes HbS e HbC. Entretanto, como as HbS aparecem na mesma posição (banda) do gel eletroforético que as outras hemo-globinas, faz-se necessária a realização da eletro-forese ácida em ágar citrato ou agarose para confirmação do resultado. A eletroforese ácida em ágar citrato ou agarose confirma a presença das hemoglobinas HbA, HbF, HbC e HbS, servindo, portanto, como diagnóstico confirmatório para doença falciforme quando apresenta HbS positivo no exame. 3 – A anemia falciforme possui tratamento, porém não existe cura. Por que não existe cura? R: Não existe cura para a anemia falciforme devido ao fato de ser uma doença genética, ou seja, está presente no DNA do indivíduo, uma vez que a anemia falciforme é causada por mutação genética, responsável pela deformidade dos glóbulos vermelhos. Para ser portador da doença, é preciso que o gene alterado seja transmitido pelo pai e pela mãe. 4- Explique como acontece a alteração conformacional da hemoglobina? R: A alteração conformacional ocorre porque o grupo radical da valina não possui carga elétrica, enquanto o ácido glutâmico possui carga negativa quando num ambiente de pH fisiológico (nesse valor o grupo carboxila perde um hidrogênio) e encontra-se na face externa da molécula. Assim, a substituição do resíduo de ácido glutâmico por valina cria um ponto hidrofóbico de ligação na superfície externa da cadeia beta, alterando a conformação final da proteína. 5- Descreva as principais manifestações clínicas de um paciente com Anemia falciforme. R: Os sintomas da anemia falciforme podem ser manifestar de forma divergente de indivíduo para indivíduo. Entretanto, os mais comuns são episódios vasos- oclusivos e crises dolorosas – É o sintoma mais frequente, proveniente da obstrução de pequenos vasos sanguíneos; manifestações cutâneas, em destaque as úlceras; icterícia; e infecções recorrentes. 6- Como é feito o diagnóstico laboratorial da anemia falciforme? R: O primeiro passo do diagnóstico laboratorial da anemia falciforme é o hemograma, pois é possível visualizar as hemácias falciformes presentes através do esfregaço sanguíneo, o número de leucócitos elevado. A heterozigose de HbS-Beta- Talassemia apresenta VCM e CHCM baixos devido à diminuição nos níveis de hemoglobinas em razão da fagocitação eritrocitária das células falciformes. Além dele, há o teste de falcização, que consiste em observar a presença de drepanócitos (células em foice) durante a leitura. É um exame para pré-diagnóstico, pois há muitas variáveis que podem interferir no resultado (falsos positivos e falsos negativos); dentre elas, a execução correta da técnica, a experiência na interpretação dos resultados, conservação do reagente, etc. Também tem o teste de solubilidade, cujo objetivo é avaliar a solubilidade da hemoglobina. A HbS é insolúvel e neste teste é visualizada através da opacidade que confere ao filtro de papel. Este exame não é recomendado para neonatos, pois pode apresentar um falso negativo; a Cromatografia Líquida de Alta Performance (HPLC), que é feita pelo sistema automatizado Variant (Bio-Rad), onde ocorre a detecção de anomalias hemoglobínicas, além da quantificação e triagem de variantes. É um teste quantitativo, que permite o diagnóstico das hemoglobinopatias, como a doença falciforme, de forma rápida e precisa; e a focalização isoelétrica, que utiliza um sistema de alta voltagem automatizado que permite a separação nítida das bandas de hemoglobinas, identificando-as precisamente quantitativa e qualitativamente, permitindo um diagnóstico preciso e concreto das hemoglobinopatias 7- Qual o tratamento para as manifestações clínicas? R: O tratamento da anemia falciforme deve ser realizado por toda a vida porque estes pacientes podem apresentar infecções frequentes. A febre pode indicar infeção e por isso se a pessoa com anemia falciforme apresentar febre deve ir imediatamento ao médico porque pode desenvolver septicemia em apenas 24 horas, podendo ser fatal. Remédios para baixar a febre não devem ser usados sem conhecimento médico. Os medicamentos utilizados são principalmente Penicilina nas crianças desde os 2 meses até aos 5 anos de idade, para evitar o aparecimento de complicações como a pneumonia, por exemplo. Além disso, podem também ser utilizados remédios analgésicos e anti-inflamatórios para aliviar a dor durante uma crise e inclusive usar máscara de oxigênio para aumentar a quantidade de oxigênio no sangue e facilitar a respiração. Além disso, o transplante de medula óssea também é uma forma de tratamento, indicada para alguns casos graves e selecionados pelo médico, podendo vir a curar a doença, entretanto apresenta alguns riscos, como uso de medicamentos que reduzem a imunidade. Discussão do caso: ANEMIA FALCIFORME Doença de caráter genético, descrita pela primeira vez em 1904 por Herrick, frequente, mas não exclusiva, em indivíduos de origem africana, é originada por uma mutação no cromossomo 11 que resulta na substituição de um ácido glutâmico pela valina na posição seis da extremidade N-terminal na cadeia ß da globina, dando origem à hemoglobina S. O que difere a hemoglobina normal da hemoglobina S é a seqüência primária de cada uma, que é determinada pela seqüência de DNA. Enquanto na hemoglobina normal há o ácido glutâmico ocupando a sexta posição da sequência, na hemoglobina S é a valina que ocupa esta posição. Esta troca é conseqüência da substituição de um único nucleotídeo na sequência de DNA. Ao invés do nucleotídeo adenina na posição 20 da cadeia de DNA, na sequência anormal encontra-se o nucleotídeo timina. Esta simples mudança afeta a sequência de códon (GAG vira GTG), alterando a sequência de aminoácidos (ácido glutâmico vira valina alterando então a forma tridimensional da proteína). A alteração conformacional ocorre porque o grupo radical da valina não possui carga elétrica, enquanto que o ácido glutâmico possui carga negativa quando num ambiente de pH 7,4 (esse valor de pH é o fisiológico e nesse valor o grupo carboxila perde um hidrogênio) e encontra-se na faceexterna da molécula. Assim a substituição do resíduo de ácido glutâmico por valina cria um ponto hidrofóbico de ligação na superfície externa da cadeia beta, alterando a conformação final da proteína. Os eritrócitos cujo conteúdo predominante é a hemoglobina S assumem, em condições de hipóxia, forma semelhante à de uma foice daí o nome falciforme, decorrente da polimerização da hemoglobina S. O gene da hemoglobina S é um gene de alta freqüência em toda a América, e no Brasil é mais freqüente nas regiões sudeste e nordeste. Na África Equatorial, 40% da população são portadoras, e a doença falciforme atinge uma prevalência de 2 a 3% da população. As hemoglobinopatias constituem uma das principais e mais freqüentes doenças genéticas que acometem seres humanos; e, dentre elas, a anemia falciforme é a doença hereditária mais prevalente no Brasil chegando a acometer 0,1 a 0,3% da população negra, com tendência a atingir parcela cada vez mais significativa da população, devido ao alto grau de miscigenação em nosso país. O diagnóstico laboratorial da anemia falciforme é feito através do hemograma, esfregaço de sangue periférico, teste do afoiçamento, eletroforese de hemoglobina, focalização isoelétrica ou cromatografia líquida de alta performance (HPLC). A doença falciforme pode se manifestar de forma diferente em cada indivíduo. Geralmente é durante a segunda metade do primeiro ano de vida de uma criança que aparecem os primeiros sintomas da doença. Segue as principais manifestações: Episódios vasos-oclusivos e crises dolorosas – É o sintoma mais frequente, proveniente da obstrução de pequenos vasos sanguíneos. A dor pode ser extrema e ser transferida para o abdome, tórax e articulações. Nas crianças pode haver edema muito doloroso nas mãos e nos pés. Manifestações cutâneas- A mais comum é a úlcera crônica situada nas pernas, próxima aos tornozelos, a partir da adolescência. Icterícia- O paciente geralmente tem cor amarelada causada pelo aparecimento de bilirrubina indireta, devido à hemólise. Atraso de maturação física- Algumas crianças apresentam atraso no desenvolvimento físico e sexual. O problema torna-se aparente na primeira década de vida. Crise de sequestro de sangue- Em crianças com anemia falciforme, o baço pode aumentar rapidamente por sequestrar o sangue e, isso pode levar rapidamente à anemia aguda. Infecções- Os pacientes são muito suscetíveis às infecções bacterianas, como pneumonias e meningites, principalmente na infância. O tratamento envolve transfusão de concentrados de hemácias, hidratação vigorosa, ácido fólico, oxigenação e deve-se evitar desidratação como também exercícios físicos intensos.
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