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1 Tutorial 3.3 - Geriatria 1. Compreender o envelhecimento do sistema osteoarticular. Osso O tecido ósseo é um sistema orgânico em constante remodelação, fruto dos processos de formação (pelos osteoblastos) e reabsorção (pelos osteoclastos). Nas duas primeiras décadas de vida, predomina a formação e há um incremento progressivo da massa óssea; após a soldadura das epífises, persiste ainda um predomínio construtivo, se bem que em menor ritmo, e o ser humano alcança sua maior massa óssea na quarta década da vida: é o chamado “pico de massa óssea”. A partir daí, praticamente, estabiliza-se a taxa de formação, enquanto a de reabsorção aumenta. Por conseguinte, passa a ocorrer perda progressiva, absoluta, da massa óssea até então presente: é a “osteopenia fisiológica”. Muitos consideram que tal pico ocorre aproximadamente aos 25 anos, uma vez que daí até os 35 anos o incremento é muito pequeno. De toda forma, admite-se que 90% da massa óssea seja alcançada próximo aos 18 anos de idade. Embora muito saibamos sobre as BMU (unidades multicelulares ósseas) cada vez fica mais evidente que quaisquer considerações sobre o “osso” devam levar em conta o esqueleto apendicular e o esqueleto axial, o osso cortical e o osso trabecular (este último tem uma atividade metabólica cerca de 8 vezes maior que a do osso cortical), a “maturação” do esqueleto pela ação dos hormônios sexuais e o papel do estrógeno em ambos os sexos, dentre outras. A atrofia óssea com o envelhecimento não se faz de modo homogêneo, pois, antes dos 50 anos, perdese sobretudo osso trabecular (principalmente trabéculas de menor importância estrutural) e, após essa idade, osso cortical (também aqui lamelas de menor importância localizadas na superfície endosteal). A cada 7 a 10 anos “renovamos” todo nosso esqueleto. A perda de massa óssea por involução ocorre sobretudo na mulher pós-menopausada (a falta do freio estrogênico libera a voracidade dos osteoclastos) e no velho; trata-se de um fenômeno relacionado à idade que acomete ambos os sexos e tem como mecanismo predominante a menor formação óssea, em um contexto no qual sobressaem o paratormônio e a vitamina D. Os idosos são potencialmente vulneráveis a um balanço cálcico negativo e às osteopenia/osteoporose em decorrência da hipovitaminose D. Obtemos a vitamina D por meio de uma adequada alimentação e principalmente pela produção endógena da pele sob exposição solar. Dependendo do tempo de exposição solar e do grau de pigmentação da pele, mais da 80% dessa vitamina poderá ser sintetizada a partir do 7-desidrocolesterol da pele. Todavia, muitos fatores contribuem para não termos tal “rendimento” na velhice – dentre eles institucionalização, menor mobilidade, uso de vários agasalhos, menor exposição voluntária ao sol, maior tempo em interiores etc. Significativamente, acresça-se a isso o fato de a pele envelhecida, sob idêntica exposição solar, produzir menor 2 quantidade de vitamina D do que a pele do adulto jovem (segundo Holick et al., [1989] indivíduos com 70 anos ou mais produzem apenas 25 a 30% da quantidade produzida pelos jovens). Sabe-se, ainda, que o envelhecimento traz consigo menor produção da 1α-hidroxilase renal, enzima responsável pela introdução da segunda hidroxila no 25(OH)D, originando o calcitriol, sua forma mais ativa (1,25 (OH)2D). Por conseguinte, os idosos, tendo uma reduzida produção endógena do calcitriol, passam a depender mais das fontes alimentares. Entretanto, o que se observa é que, anos de uma monotonia alimentar quase sempre parca no consumo de alimentos ricos em vitamina D – e que são poucos – acabam por estabelecer, com frequência, os déficits encontrados na velhice. Destaque-se ainda que há associação direta entre déficits dessa vitamina, condições de fraqueza muscular e depressão na velhice, além de se discutirem cada vez mais suas ações não relacionadas ao metabolismo osteomineral, uma vez que seus receptores estão presentes em várias células/tecidos de diferentes órgãos (fígado, estômago, intestino, rins, músculos, tireoide, alvéolos pulmonares, mamas e neurônios cerebrais, entre outros). Sabe-se hoje que níveis inadequados de vitamina D têm alta prevalência na velhice, mesmo em países tropicais, como o Brasil. Aspectos do metabolismo ósseo, diferenças quanto a raça, sexo etc. estão no Capítulo 78. Cartilagem articular A cartilagem articular (CA), produto de secreção dos condrócitos, é formada por matriz de colágeno tipo II altamente hidratada, conjuntamente com agregados de proteoglicanos (macromoléculas organizadas em uma complexa estrutura aniônica que atua como uma verdadeira mola biológica). Os proteoglicanos têm rápido ritmo metabólico, ao contrário da quase fixidez do colágeno. O colágeno tipo II – há pelo menos 28 tipos de colágeno descritos – é a mais abundante proteína fibrilar presente na CA, perfazendo cerca de 85% do conteúdo de colágeno aí existente. Evidências mostram que a síntese e a degradação do colágeno tipo II associam-se com a matriz pericelular e mantêm-se em um estado de equilíbrio dinâmico ao longo dos anos, não apresentando as alterações moleculares comumente associadas à osteoartrite (Aurich et al., 2002). A composição e a organização estrutural entre colágeno e proteoglicanos são os responsáveis pelas características de resistência, elasticidade e compressibilidade da CA, tecido extraordinário que amortece e dissipa forças recebidas, além de reduzir a fricção. O principal tipo de proteoglicano presente na CA é o agrecano, constituído por um núcleo proteico ao qual se aderem muitas cadeias de sulfato de condroitina, com predomínio daquelas 4 ou 6- sulfatadas. O envelhecimento cartilaginoso traz consigo menor poder de agregação dos proteoglicanos, aliado a menor resistência mecânica da cartilagem; o colágeno adquire menor hidratação, maior resistência à colagenase e maior afinidade pelo cálcio. 3 A modificação não enzimática de proteínas tissulares por açúcares redutores é uma característica marcante do envelhecimento. No envelhecimento cartilaginoso a rede colágena torna-se cada vez mais rígida, paralelamente ao fato de apresentar níveis elevados de pentosidina (um dos produtos de glicação avançada, do inglês AGES, advanced glycated end-product) que compreende um conjunto de moléculas heterogêneo de formação não enzimática que são capazes de modificar, irreversivelmente, propriedades químicas e funcionais de diversas estruturas biológicas (Barbosa et al., 2008). Tanto na cartilagem velha quanto naquela experimentalmente enriquecida com AGES, a taxa da síntese dos proteoglicanos foi inversamente proporcional ao grau de glicação (De Groot, 1999). Assim, o aumento idade-relacionado dos AGES explica, em parte, o declínio na capacidade de síntese cartilaginosa. Os condrócitos sofrem a ação reguladora de mediadores pré-catabólicos (metaloproteases e citocinas que promovem a degradação cartilaginosa) e pró-anabólicos (fatores de crescimento que ativam mecanismos de regeneração). Os principais agentes da degradação cartilaginosa são as metaloproteases (MMP), enzimas zinco-dependentes distribuídas em 3 grupos: colagenases, gelatinases e estromelisinas; bloqueando suas ações temos os inibidores tissulares das MMP. Das citocinas, destaca-se a ação catabólica da interleucina-1 (a mais importante!), da interleucina- 6 e do TNF-α (fator de necrose tumoral alfa). Dos fatores anabólicos, destacam-se as ações do IGF-1 (insulin-like growth factor-1) e do TGF-β (transforming growth factor-β) na formação de cartilagem articular e na síntese de proteoglicanos. Com o envelhecimento da CA reconhecem-se muitas alterações na estrutura do agrecano e dos agregados multimoleculares que ele forma com o hialuronato, fruto de processos anabólicos e catabólicos geridos por eventos celulares e extracelulares, em umaextensão que varia segundo o tipo, a articulação, o local e a profundidade considerada. Assim, a síntese e o turnover de agregados sofrem influência da idade e do local de origem (p. ex., ela não é a mesma na CA e no menisco do mesmo joelho). A estabilidade da CA depende das atividades biossintéticas dos condrócitos que se contrapõem à degradação normal das macromoléculas da matriz. A estimulação mecânica de condrócitos articulares humanos in vitro aumenta a produção de agrecanos mRNA, enquanto diminui a de metaloproteinase-3 mRNA, em um processo que envolve integrinas, ativação de canais iônicos e interleucina-4. Essa resposta condroprotetora ao estímulo mecânico não ocorre em condrócitos provenientes de cartilagens osteoartríticas. Embora estresses mecânicos e químicos possam ter efeitos desastrosos sobre a integridade estrutural da cartilagem, eles parecem ser determinantes apenas para alguns indivíduos, não explicando o declínio irreversível, idade-dependente, das respostas aos fatores de crescimento dos condrócitos e à síntese da matriz intersticial. Essas alterações, também observadas em cultura de células, refletem mais um processo intrínseco 4 do envelhecimento do condrócito. Sabe-se que os condrócitos de idosos têm menor capacidade de proliferação e possibilidade reduzida de formar tecido novo. A hipótese de que o envelhecimento celular esteja regulado por um relógio biológico intrínseco associado às alterações nos telômeros motivou estudos semelhantes nos condrócitos (Martin e Buckwalter, 2001). Observou-se que, com o aumento da idade, ocorre um decréscimo tanto da atividade mitótica quanto do comprimento médio do telômero, ao lado de maior atividade da β-galactosidase (um marcador de senescência). Esses achados comprovam a ocorrência de senescência na capacidade replicativa dos condrócitos in vivo, o que explica, em parte, a associação entre idade e osteoartrite (OA). Envelhecimento e degeneração da CA na OA são processos distintos; todavia, há uma forte associação entre a idade e a incidência e prevalência da OA. Ao contrário da impressão inicial, a apoptose de condrócitos não é um fenômeno generalizado que ocorre com o envelhecimento da cartilagem humana (tampouco na osteoartrite) (Aigner, 2001). A CA tem uma capacidade reparadora limitada, que mais ainda se estreita com o envelhecimento e/ou quando da eclosão de condições degenerativas. A função reparadora dos condrócitos diminui progressivamente com a idade, o que é demonstrado por uma síntese decrescente de agrecanos e por menor capacidade para a formação de agregados moleculares de grande tamanho; demonstrou-se também que estresses oxidativos contribuem para a senescência dos condrócitos (Carlo e Loeser, 2003) (fato que explica, também em parte, o maior risco de osteoartrite com a idade). Assim, é a idade do indivíduo a principal responsável pela composição da cartilagem. Compreende-se o porquê de serem as doenças articulares as mais frequentes na velhice. Estudos em cartilagem humana femoral mostram que alterações em sua composição química são mais pronunciadas do nascimento até os 20 anos de idade, período em que diminui o conteúdo dos dissacarídios 4-sulfatos. Com o progredir da idade, diminui a espessura da cartilagem e a composição predominante passa a ser de 6-sulfatos (Bayliss, 1999). Com referência ao sexo, sabe-se que o volume da cartilagem dos joelhos é muito maior no homem do que na mulher, em uma diferença tão significativa que não se explica apenas pela diferença de tamanho do corpo e dos ossos envolvidos; com o envelhecimento ela se acentua mais ainda, sugerindo que isso decorra tanto do desenvolvimento da cartilagem quanto de sua perda na velhice (Ding et al., 2003). Nos discos intervertebrais a degeneração aumenta com o envelhecimento, estando aumentados a fibronectina e seus fragmentos, substâncias que estimulam as células para a produção de metaloproteases e citocinas que inibem a síntese de matriz intercelular. A degeneração discal compreende rupturas estruturais grosseiras e alterações na composição da matriz; demonstrou-se que sobrecargas mecânicas moderadas e repetidas, sobretudo nos discos de indivíduos dos 50 aos 70 anos, podem ser a causa inicial do processo (Adams, 2000). Por outro lado, há cada vez 5 mais evidências de que fatores genéticos desempenham importante papel na patogênese da degeneração discal na velhice. Assim, o genótipo COLIA1Sp1 (gene do colágeno tipo Iα1) constitui um fator de risco genético para a discopatia na velhice. Em seu polimorfismo, o COLIA1 associa-se à densidade óssea e às fraturas (Pluijm et al., 2004). Os condrócitos articulares humanos secretam várias proteínas envolvidas na biogênese da cartilagem, dentre elas a YKL-40 (também conhecida como glicoproteína-39 da cartilagem humana, chitinase-3-like 1, chondrex, entre outros), que é a principal proteína secretada em cultura de condrócitos e sinoviócitos humanos. Seus níveis plasmáticos são semelhantes em ambos os sexos e estão altamente correlacionados com a idade; sabe-se não ter relação com o índice de massa corpórea, tampouco com a proteína C reativa sérica. Demonstrou-se estabilidade dos níveis plasmáticos da YKL-40 em indivíduos saudáveis durante 10 anos de acompanhamento. Têm-se estudado as alterações da YKL-40 em pacientes com diferentes tipos de câncer e em portadores de doenças não malignas que cursam com inflamação, remodelação tissual e fibrose. Atualmente pode-se dizer que a YKL-40 é uma das proteínas da fase aguda do soro, portanto, um biomarcador do processo inflamatório, sendo produzida localmente por neutrófilos e macrófagos. Por diferir da proteína C reativa (que é produzida por hepatócitos em resposta ao aumento da IL-6), acresce importantes informações sobre o processo inflamatório em curso (Schultz e Johansen, 2010). Evidências mostram que a determinação da YKL-40 possa ter abrangente utilidade clínica em variadas patologias (neoplasias malignas, doenças cardiovasculares, diabetes melito, doenças reumáticas, doenças inflamatórias intestinais, fibrose hepática, entre outras). Mais, um elevado nível plasmático de YKL-40 é um biomarcador independente de mortalidade em pacientes com diferentes patologias hospitalizados em situações de urgência (Mygind et al., 2013). Enfim, as funções biológicas da YKL-40 ainda precisam ser compreendidas, uma vez que desconhecemos os mecanismos e os estímulos que levam a maior expressão e síntese dessa proteína. De todo modo reconhece-se nela importante papel na remodelação/degradação da cartilagem. Adicionalmente tem-se estudado a YKL-39, quitinase também abundantemente secretada por condrócitos in vivo e in vitro, que parece ser um marcador mais acurado da ativação dos condrócitos nos pacientes com osteoartrite inicial do que a YKL-40 (que se expressa em adultos normais, na osteoartrite, na artrite reumatoide e em muitas outras doenças como já visto). Embora seja tentador considerar-se a YKL-39 como um marcador sobretudo da remodelação da matriz cartilaginosa, ressalta-se que as funções fisiológicas de ambas chitinases ainda são pouco compreendidas (Knorr et al., 2003). Articulação diartrodial Sede dos onde se passa os principais processos reumáticos na velhice, a articulação diartrodial caracteriza-se por apresentar membrana sinovial 6 (um tecido conjuntivo vascular que reveste a superfície interna da cápsula articular e é responsável pela elaboração da sinóvia). A sinóvia (líquido sinovial) pode ser considerada um dialisado do plasma sanguíneo com a adição de um mucopolissacarídio ácido não sulfatado, o ácido hialurônico (que é seu principal constituinte). A sinóvia não apenas lubrifica a articulação como também desempenha importante papel na nutrição da cartilagem articular. Sabe-se que o ácido hialurônico intervém na regularizaçãode várias atividades celulares (tem, p. ex., efeito estimulador sobre o metabolismo dos condrócitos). A membrana sinovial compreende 3 camadas, no sentido do lúmen articular para a cápsula fibrosa, que são: a íntima (zona avascular formada por uma camada superficial de células, com espessura normal de 1 a 3 células, chamadas de células limitantes), a subíntima (rica em células e vasos) e a subsinovial (que separa a subíntima do tecido fibroso capsular e é constituída por um tecido conjuntivo frouxo). Não há uma estrutura, tipo membrana basal, que separe a íntima das camadas subjacentes; também não há substância intercelular entre as células limitantes, de forma que a sinóvia circula livremente ente elas e as demais camadas. As células limitantes são de 2 tipos: as de tipo A (que se assemelham a macrófagos e têm funções fagocitárias); e as de tipo B (parecidas com fibroblastos e que exercem funções secretoras). Ao lado delas vê-se uma legião de células intermediárias (verdadeiras formas de transição entre os tipos A e B, que alguns denominam de células C). Com referência à membrana sinovial, considerou-se que ela não se alteraria com a idade; demonstrou-se que, após os 20 anos de idade, há maior quantidade de menos estroma abaixo das do que células limitantes, o qual se apresenta mais espesso e denso. Pasquali-Ronchetti et al. (1992), em um adequado estudo morfológico (dos 15 aos 56 anos) da membrana sinovial de joelhos humanos normais à inspeção, evidenciaram um aumento do colágeno com o envelhecimento, e que células limitantes do tipo secretor, presentes em todas as idades, estão hipertrofiadas nos mais velhos e que as do tipo macrofágico aumentam com a idade; que nos mais velhos as vilosidades são mais numerosas, enquanto a rede vascular e a distribuição celular apresentam-se de modo menos regular; que ocorrem grandes áreas de superfície sinovial desprovidas de células, além de feixes de colágeno expostos na cavidade articular. Com referência ao líquido sinovial, observou-se que as concentrações dos sulfatos de condroitina (C6S e C4S), do ácido hialurônico (AH) e da razão C6S:C4S variam com a idade. Os maiores valores são encontrados dos 20 aos 30 anos e decrescem progressivamente com o envelhecimento. Há também nítida diferença sexual, pois as mulheres apresentam concentração dos CS significativamente menor daquela constatada nos homens (já a alteração do AH não é significativa). A ampliação desses conhecimentos tem maior importância quando da interpretação das alterações associadas às patologias articulares, sobretudo a artrite reumatoide e a osteoartrite, pois, com base em tais informações, é 7 possível distinguir os fenômenos patológicos dos eventos normais, relacionados idade e sexo. Músculo esquelético O músculo esquelético é a maior massa tecidual do corpo humano. Com o envelhecimento, há uma diminuição lenta e progressiva da massa muscular, sendo o tecido nobre paulatinamente substituído por colágeno e gordura: Ela diminui aproximadamente de 50% (dos 20 aos 90 anos) ou 40% (dos 30 aos 80 a ). Tal perda tem sido demonstrada: Pela excreção da creatinina urinária, que reflete o conteúdo de creatina nos músculos e a massa muscular total Pela tomografia computadorizada, pela qual se observa que, após os 30 anos de idade, diminui a secção transversal dos músculos, há maior densidade muscular e maior conteúdo gorduroso intramuscular (alterações que são mais pronunciadas na mulher do que no homem) Histologicamente detecta-se uma atrofia muscular à custa de uma perda gradativa e seletiva das fibras esqueléticas (o número de fibras musculares no velho é aproximadamente 20% menor do que no adulto, sendo o declínio mais acentuado em fibras musculares do tipo II que, de uma média de 60% em adultos sedentários, vai para menos de 30% após os 80 anos). Tal declínio está diretamente relacionado à diminuição da força muscular, acarretada pelo envelhecimento. Observou-se que a força de quadríceps aumenta progressivamente até os 30 anos, começa a declinar após os 50 anos e diminui acentuadamente após os 70 anos. Dados longitudinais indicam que a força muscular diminui ± 15% por década até a 6 a ou a 7 a década e aproximadamente 30% após esse período. Há relação inversa entre a força muscular e a velocidade de deambulação em ambos os sexos. Já a capacidade oxidativa do sistema musculoesquelético, pelo menos até a 7 a década de vida, está preservada. É a esse declínio muscular idade-relacionado que chamamos de sarcopenia, termo que denota o complexo processo do envelhecimento muscular associado a diminuições da massa, da força e da velocidade de contração muscular. A etiologia da sarcopenia é multifatorial, envolvendo alterações no metabolismo do músculo, alterações endócrinas e fatores nutricionais, mitocondriais e genéticos (Fulle et al., 2005). Recentemente demonstrou-se em camundongos que a sarcopenia está associada a mitocôndrias morfologicamente alteradas e disfuncionais decorrentes de uma reduzida mitofagia. Tais resultados, além de acrescentar subsídios à teoria mitocondrial-lisossomal do envelhecimento dos tecidos pós-mitóticos de longa vida, corroboram as duas principais estratégias não farmacológicas (restrição calórica e treinamento muscular, ambas condições que sabidamente melhoram a função mitocondrial) para minorar a sarcopenia (Leduc-Gaudet et al., 2015). O grau de sarcopenia não é o mesmo para diferentes músculos e varia amplamente entre os indivíduos. O mais significativo é saber que o declínio muscular idaderelacionado é mais evidente nos membros inferiores do que nos superiores, haja vista a importância daqueles para 8 o equilíbrio, a ortostase e a marcha dos idosos. Estima-se que, após os 60 anos, a prevalência da sarcopenia seja da ordem de 30%, aumentando progressivamente com o envelhecimento. A partir dos 75 anos, o grau de sarcopenia é um dos indicadores da chance de sobrevivência do indivíduo. O envelhecimento está associado a uma diminuição da altura, do peso e do índice de massa corpórea (IMC). Vários estudos têm demonstrado que o NADIR (IMC associado à menor mortalidade relativa) é maior no idoso do que no adulto. Na velhice, a massa muscular relaciona-se à força e esta, por sua vez, à capacidade funcional do indivíduo. A sarcopenia, desenvolvendo-se por décadas, progressivamente diminui a capacitação física, acabando por comprometer as atividades da vida diária e de relacionamento, por aumentar o risco de quedas, levando, por fim, a um estado de dependência cada vez mais grave. A sarcopenia contribui para outras alterações idade-associadas como, por exemplo, menor densidade óssea, menor sensibilidade à insulina e menor capacidade aeróbica. Longevos e velhos fragilizados têm menor musculatura esquelética – fruto do desuso, de doenças, da subnutrição e dos efeitos acumulativos da idade. Daí a necessidade de se traçarem estratégias para a manutenção da massa muscular com o envelhecimento. Em indivíduos sedentários, a massa magra é a principal consumidora de energia e, portanto, sua diminuição pelo envelhecimento faz com que sejam menores as necessidades energéticas. Assim, é fato que a força muscular, a área de secção transversal do músculo e a relação entre ambas diminuem com o envelhecimento (Jubrias et al., 1997); todavia, essas alterações quantitativas só explicam parcialmente a perda de força idaderelacionada, uma vez que se tem demonstrado que algumas alterações fenotípicas presentes no músculo senescente estão relacionadas com transcrição gênica alterada. A musculatura esquelética do velho produz menos força e desenvolve suas funções mecânicas com mais “lentidão”, dado que a excitabilidade do músculo e da junção mioneural está diminuída; há contração duradoura, relaxamento lento e aumento da fatigabilidade. A diminuição da força muscularna cintura pélvica e nos extensores dos quadris resulta em maior dificuldade para a impulsão e o levantarse; ao mesmo tempo, a diminuição da força da mão e do tríceps torna mais difícil o eventual uso de bengalas. Todavia, nem a reduzida demanda muscular, tampouco a perda de função associada, são situações inevitáveis do envelhecimento, uma vez que podem ser minimizadas e até revertidas com o condicionamento físico. Assim, exercícios mantidos durante a vida podem evitar em grande parte as deficiências musculares idade-relacionadas: exercícios aeróbicos melhoram a capacidade funcional e reduzem o risco de se desenvolver o diabetes tipo 2 na velhice; exercícios de resistência aumentam a massa muscular no idoso de ambos os sexos, minimizando, e mesmo revertendo, a síndrome de fragilidade física presente nos mais longevos. Fechando o ciclo saúde-nutrição-atividade física, resta dizer que uma 9 ingestão proteica diária inadequada resulta em maior perda de massa muscular. Cada vez mais se reconhece a deterioração de funções mitocondriais (genéticas, bioquímicas e bioenergéticas) na gênese de alterações fenotípicas associadas ao envelhecimento normal (Cortopassi e Wong, 1999). Mutações deletérias no genoma mitocondrial acumulam- se exponencialmente com o envelhecimento de nervos e músculos, nos quais se detecta perda de fibras e atrofia; há aumento exponencial no número de fibras deficientes em citocromo-oxidase a partir da 4 a década de vida. O estresse oxidativo, reduzindo a permeabilidade da membrana mitocondrial, tem sido responsabilizado pela liberação do citocromo C e pela iniciação da apoptose. As mutações do DNA mitocondrial têm sido ligadas a transtornos como convulsões, acidente vascular encefálico, atrofia óptica, neuropatia, miopatia, cardiomiopatia, surdez neurossensorial e diabetes melito; também têm um papel importante no processo de envelhecimento e em doenças neurodegenerativas, como as doenças de Parkinson e Alzheimer. Urge reconhecermos as síndromes clínicas sugestivas de disfunções mitocondriais. A razão das fibras musculares dos tipos I e II altera-se com o envelhecimento; todavia, isso não se traduz em uma enfermidade muscular incapacitante. Por outro lado, a conhecida diminuição da resistência muscular com a idade, em situações estressantes (doença aguda, por exemplo), pode ser causa de rápido descondicionamento, o que vem a exigir maior atenção e uma intervenção mais pronta em idosos, sob o risco de maior imobilidade, menor estabilidade postural, quedas etc. No transcorrer da vida ocorrem alterações na cinemática e na cinética da marcha, mas é principalmente após os 70 anos que tais alterações passam a ter significado clínico. Há alterações posturais, como cifose, redução da lordose lombar e desenvolvimento de valgismo nos quadris, com alargamento da base de apoio. A marcha do idoso difere da do adulto entre outros fatores, pelo menor comprimento dos passos, pela menor extensão dos joelhos, por menor força na flexão plantar dos tornozelos e por menor velocidade dos passos. Em uma avaliação clínica – reconhecendo que o envelhecimento traz consigo um decréscimo na informação sensorial (propriocepção, visão etc.), um retardo nas respostas e outras limitações musculoesqueléticas (aqui discutidas) – podemos constatar que cerca da metade dos longevos (≥ 85 anos) relatam não ter dificuldade para a marcha; também é possível reconhecer em ± 20% deles o que poderíamos chamar de transtorno senil (idiopático) da marcha. Infelizmente muitos adultos e idosos aceitam os transtornos da marcha e a diminuição da mobilidade como mudanças “normais” do envelhecimento. Nesse contexto estamos muito mais no campo das patologias a serem identificadas e tratadas do que em uma zona de penumbra, como citamos. Em idosos, o estudo da relação entre força e performance física não é linear; daí decorre, em indivíduos “fortes”, a não correlação entre força dos membros inferiores e velocidade da marcha, ao contrário dos “fracos”, nos quais é nítida tal 10 associação. Assim, pequenas alterações na capacitação fisiológica podem ter efeitos marcantes no desempenho de indivíduos fragilizados (Buchner, 1996). Ressalte-se que a menor capacidade de trabalho muscular é um dos primeiros sinais da velhice, afetando em última instância a capacidade laboral, a atividade motora e a adaptabilidade ao ambiente; por outro lado, os exercícios, melhorando a função muscular, reduzem a frequência de quedas, contribuindo assim para a manutenção da independência e de melhor qualidade de vida para os idosos. Atualmente aceitamos que o envelhecimento muscular resulta de alterações no equilíbrio entre o potencial miogênico e a atividade fibrótica, uma vez que o músculo senescente apresenta reduzida capacidade de reparo/regeneração, vindo a tornar-se progressivamente fibrótico. Entre as bases do fenômeno observa-se grande redução na expressão da sintase do óxido nítrico (Samengo et al., 2012) e sabe-se que, no músculo jovem, altos níveis de óxido nítrico aumentam o número das células satélites (= população específica de células estaminais presentes no músculo totalmente diferenciado) que inibem a extravasão de leucócitos para o músculo. Viu-se que a diminuição na produção do óxido nítrico durante o envelhecimento muscular possibilita um aumento dos macrófragos anti-inflamatórios M2a (são macrófagos ativados por citocinas para o fenótipo M2 e, em sequência, M2a), o que vem promover ainda mais a fibrose. Demonstrou-se que a mudança dos macrófagos musculares para o fenótipo M2a é fortemente influenciada pela idade das células hematopoéticas das quais provêm. Tudo indica que a fibrose no músculo senescente seja consequência de um estado de inflamação crônica de baixo grau e que células, de diferentes linhagens, possam interagir na regulação de tal fenômeno (Wang et al., 2015). No estudo da fisiopatologia da sarcopenia Basu et al. (2002) mostraram que alterações na síntese de proteínas musculares contráteis explicam algumas características clínicas da sarcopenia, notadamente a perda de força e o fatigamento precoce. Já Yarasheski et al. (2002) demostraram que a expressão do fator de crescimento e de diferenciação miostatina – que suprime o crescimento muscular – correlaciona-se negativamente à massa corpórea magra, enquanto o envelhecimento está diretamente associado a maior expressão da miostatina. Em outras palavras, a miostatina sérica é um marcador biológico da sarcopenia. Em sequência, Gannon et al. (2009) demonstraram que marcantes alterações idade- relacionadas ocorrem nas cadeias leves da miosina (MLC); identificaram, ainda, um extraordinário aumento da isoforma MLC2 do tipo lento, restrito às fibras musculares senescentes, além de confirmarem o processo de transformação de fibras rápidas para lentas durante o envelhecimento celular. Esses dados sugerem a isoforma MLC2 lenta como um possível marcador para o tipo de fibra muscular da sarcopenia. Por fim, embora se reconheça que a sarcopenia não seja intrinsecamente irreversível com o envelhecimento, não tem sido possível demonstrar que os exercícios físicos per se possam preveni-la, sobretudo nos 11 indivíduos com 70 anos ou mais. Por outro lado, há dados promissores sobre uma terapia gênica humana que evite seus efeitos (consegue-se assim um aumento da massa muscular sem exercícios!). Até que essas descobertas se concretizem, a intervenção sobre o estilo de vida de nossos idosos representa a chave-mestra da atuação geriátrico- gerontológica. Nervo Com o envelhecimento diminui a velocidade de condução nervosa. Há um aumento do balanço postural, diminuição dos reflexos ortostáticos e aumento do tempo de reação. Há uma perda do olhar fixo para cima e ocasional prejuízo dos movimentos dos tornozelos e da sensibilidade vibratória dos pés. O centrode gravidade das pessoas idosas muda para trás do quadril. Aumenta o número de fibras nervosas periféricas com que apresentam alterações morfológicas (degeneração axônica; desmielinização segmentar); já as alterações bioquímicas são menos pronunciadas. Característica importante é a preservação da capacidade de reparação de danos, independentemente da idade. Já a idade avançada está associada à COM O TEMPO, AQUELE NERVOS PERIFÉRICOS COMEÇAM A MOSTRAR OS PROBLEMAS DE SUA ALTERAÇÃO, HÁ disfunção dos nervos periféricos, o que vem distal e a além de determinar ataxia e hipotrofia muscular; por conseguinte, essa disfunção associa-se com causa anormalidades da marcha, comprometer a força e da a sensação espacial, vindo a contribuir para o declínio funcional do indivíduo. Biologia do envelhecimento articular | Considerações adicionais O envelhecimento determina alterações nas estruturas articulares em um continuum temporal que contribui para uma frequência crescente de transtornos clínicos ligados à função e à mobilidade. A passagem de certo grau de “degeneração cartilaginosa” idade-dependente para o estado patológico de uma cartilagem com fibrilação (osteoartrite) recai na já conhecida “zona de penumbra”. Dores e disfunções no sistema musculoesquelético constituem a mais frequente queixa na velhice e a segunda causa de incapacidade nesse grupo etário (a primeira são as doenças cardiovasculares). Tal informação é compreensível, já que muitas das doenças reumáticas têm maior incidência com o avançar da idade (como a osteoporose, a osteoartrite e a condrocalcinose articular difusa), ao lado de outras que são quase exclusivas dessa população (como a polimialgia reumática e a hiperostose esquelética difusa idiopática), e são, quase sempre, doenças crônicas não fatais com frequências acumulativas, umas predispondo a outras. Paralelamente, devemos reconhecer que muitos sintomas e sinais detectados no sistema locomotor e tidos, em um primeiro momento, como reumáticos são, na realidade, de outra natureza (correlacionados a hipotireoidismo, hiperparatireoidismo, mieloma múltiplo etc.). A avaliação dos transtornos musculoesqueléticos na velhice é complexa, pois, com 12 frequência, lidamos com um quadro monocórdio de dor muitas vezes de localização imprecisa e no qual não detectamos os demais sinais cardinais da inflamação (calor, rubor, tumefação e perda funcional). A propedêutica, cuja descrição escapa dessas considerações, deverá ser sempre minuciosa e nunca centrada, apenas, no atual histórico. A frequência das dores nas articulações dos membros inferiores (p. ex., decorrentes da osteoartrite) somente é superada pelas da coluna vertebral (segmentos cervical e lombar), área em que os achados de alterações radiográficas degenerativas são quase universais. Complicando a objetividade da avaliação é clássica a frequente discordância entre a sintomatologia e as anormalidades radiográficas. Além disso, os recursos da patologia clínica, importantes e esclarecedores em crianças e adultos, têm reduzido valor com o avançar da idade, uma vez que, na velhice, aumentam significativamente, entre outros, a positividade dos fatores reumatoides, os autoanticorpos de quaisquer naturezas, a velocidade de hemossedimentação e condições associadas que produzem hiperuricemias (como a hipertensão arterial, a insuficiência renal crônica e o uso de diuréticos). Dessa forma, parece- nos ser mais frequente um achado acidental do que um de significado diagnóstico. O achado de gamapatias monoclonais benignas exige cuidadoso acompanhamento. A sinovianálise e os estudos imuno- histoquímicos da membrana sinovial são procedimentos necessários para a compreensão dos processos artríticos, podendo vir a ser exames importantes tanto para a comprovação quanto para a exclusão de várias artropatias. Por vezes, utilizamse sinovianálises de repetição para avaliação do tratamento; podem servir ainda para embasar prognósticos. Em muitas doenças abordadas neste capítulo impõe-se estudo radiológico, e o geriatra deve familiarizar-se com as vias de exploração mais adequadas para a valorização de problemas específicos, evitando assim a repetição de exames mal-conduzidos. Por exemplo, devem-se solicitar raios X de ambos os joelhos, em ortostase e na posição anteroposterior, para avaliação inicial da gonartrose (com isso comparam-se os lados e avalia-se a espessura da cartilagem nos compartimentos medial e lateral da articulação femorotibial); as posições oblíquas no segmento cervical da coluna vertebral são solicitadas em casos de cervicobraquialgias (avaliam-se assim a presença, o grau e a localização de foramens de conjugação estreitados); a radiografia digital provou-se melhor para o estudo das mãos (são mais nítidas as alterações na estrutura óssea, a osteoporose regional, as erosões subcondrais) etc. É comum identificarmos calcificações de partes moles intra-articulares em radiografias de joelhos de idosos, presentes sobretudo na fibrocartilagem meniscal e na matriz da cartilagem articular hialina. Podemos estar diante de calcificações idade- relacionadas e assintomáticas, de uma osteoartrite de grau moderado ou mesmo de uma artropatia microcristalina (“pseudogota”). Demonstrou- se que tais calcificações têm correlação positiva com o envelhecimento e 13 com a gravidade da osteoartrite; daí surgiu um paradoxo: a osteoartrite conduz a uma calcificação patológica e a cartilagem calcificada leva ao agravamento da osteoartrite; o detalhamento desses estudos evidenciou que tais calcificações ocorrem antes das lesões cartilaginosas. Portanto tais calcificações decorrem primariamente do envelhecimento, podendo contribuir para a progressão de uma osteoartrite (Mitsuyama et al., 2007). Considerações sobre as artropatias microcristalinas são discutidas no Capítulo 83. Outras técnicas de imagem de uso crescente no estudo dos distúrbios musculoesqueléticos são a tomografia computadorizada, a ressonância nuclear magnética (RM) e a ultrassonografia (US). Esta última, graças ao desenvolvimento de novos transdutores, softwares e à utilização do fenômeno Doppler, tem-se consolidado como importante recurso na investigação de processos inflamatórios, na avaliação de outras estruturas (cartilagem, superfície óssea), como guia para realização de infiltrações e biopsias, além de fornecer informações sobre a vascularização dos tecidos; em outras palavras integrando-se cada vez mais na prática clínica (Miguel et al., 2014). Trata-se de método não invasivo, portátil, que não utiliza radiações ionizantes e que faculta uma avaliação dinâmica das estruturas durante o movimento articular, aliada a um custo relativamente baixo (Azevedo et al., 2005). Em nossa opinião, o maior óbice para seu pleno emprego reside no fato de ser método examinador- dependente; isto satisfeito, há de se verificar a adequação do equipamento frente à avaliação proposta. Por fim, eventuais exames histopatológicos devem levar em conta a atrofia muscular benigna (quando não por desuso) e a presença dos depósitos de amiloide, uma alteração “natural” nos mais longevos. Procurando integrar as doenças reumáticas pelo prisma da terceira idade, consideramos, sobretudo, aquelas discriminadas no Quadro 77.1. É o que será visto nos capítulos subsequentes. 2. ESTUDAR A FISIOLOGIA DO METABOLISMO ÓSSEO (MINERALIZAÇÃO) Metabolismo mineral A manutenção das concentrações extra e intracelulares de cálcio, fósforo e magnésio, dentro da faixa de normalidade, depende do controle dos fluxos de cálcio, fósforo e magnésio no rim, no trato gastrintestinal e nos ossos. Esses fluxos são coordenados pela ação do hormônio da paratireóide (PTH), da 1,25 diidroxi-vitamina D (1,25(OH)2D ou calcitriol) e do FGF-23 (fibroblast growth factor 23). Homeostase do cálcio O conteúdo de cálcio total do organismode um adulto normal é de aproximadamente 1.000 g e encontra-se no esqueleto (menos de 1% desse total encontra-se solúvel nos fluidos extracelular e intracelular). O cálcio contido nos ossos está associado às fibrilas de colágeno e a outros 14 componentes da matriz óssea sob a forma de hidroxiapatita (Ca10 (PO4)6(OH)2). O cálcio na circulação encontra-se sob a forma de íons livres, íons ligados a proteínas plasmáticas e, em menor grau, a complexos difusíveis. Aproximadamente 70% do cálcio ligado a proteínas é transportado pela albumina sérica. Os métodos de dosagem do cálcio total medem a quantidade de cálcio livre e ligado à albumina, sofrendo interferência das alterações das concentrações sanguíneas dessa proteína. A proporção entre o cálcio ligado às proteínas e o cálcio iônico é influenciada pelo pH, pela temperatura, pela força iônica e pela concentração de outros íons, especialmente o magnésio. O cálcio iônico é o mais importante fisiologicamente e é regulado por controle hormonal. O cálcio total sérico varia de 8,6 a 10,2 mg/dL e o cálcio iônico de 4,6 a 5,3 mg/dL. O cálcio ionizado pode ser medido diretamente com o uso de eletrodos específicos para o cálcio. Na ausência de alteração dos níveis de albumina, aceita-se a determinação do cálcio total como índice do metabolismo mineral. Em casos de diminuição ou aumento significativo da albumina, deve-se optar pela determinação de cálcio iônico. Quando não for possível a determinação do cálcio iônico, realiza- se a determinação de albumina sérica e corrige-se o cálcio total por meio da seguinte fórmula: Ca total corrigido = Ca total mg/dL + 0,8 (4 – albumina g/dL) O cálcio extracelular participa de numerosas funções essenciais, tais como coagulação sangüínea, adesão celular, manutenção da integridade do esqueleto e regulação da excitabilidade extracelular. O íon cálcio, no interior da célula, está envolvido principalmente na proliferação, na diferenciação, na motilidade celular e no controle de diversas funções celulares como contração muscular, secreção hormonal e metabolismo do glicogênio, além de atuar como segundo mensageiro e co-fator enzimático. A concentração do cálcio intracelular é, aproximadamente, 10.000 vezes menor do que a concentração do cálcio ionizado extracelular. O cálcio intracelular pode sofrer rápidas elevações provenientes do cálcio extracelular ou quando ocorre ativação celular, devido à liberação de cálcio do estoque intracelular2 . Em contraste, o valor de cálcio iônico medido no sangue varia muito pouco, permanecendo dentro de um intervalo estreito. Nesse sentido, a regulação e manutenção da homeostase desse íon dependem do receptor do sensor de cálcio (CaR), que é ultra-sensível a pequenas variações do cálcio3 . A elevação da concentração do cálcio extracelular ativa o CaR e assim desencadeia uma série de efeitos objetivando a redução da calcemia. O principal ligante do CaR é o próprio íon cálcio extracelular, que atua à semelhança de um hormônio. O CaR é um receptor acoplado à proteína G (Gq e Gi) e está presente em diversos tecidos, e os principais efeitos da sua ativação são: ■ Nas paratireóides: redução da síntese e secreção do PTH e supressão da proliferação celular. ■ Nos rins: redução da reabsorção tubular dos íons cálcio e magnésio na porção espessa do ramo ascendente da alça de Henle e no túbulo distal, 15 antagonizando os efeitos do PTH nestes segmentos do néfron; aumento dos níveis celulares da calbindina (proteína transportadora de cálcio intracelular) no túbulo renal. Inibição da ação do hormônio antidiurético no ducto coletor, com incremento da diurese. ■ No tecido ósseo: estímulo dos precursores dos osteoblastos (responsáveis pela formação do tecido ósseo) e inibição da função dos osteoclastos (células responsáveis pela reabsorção óssea). ■ No intestino: aumento da produção de calbindina no duodeno. ■ Nas células C da tiróide: estímulo da secreção de calcitonina, cujo principal efeito consiste na inibição dos osteoclastos3 . No adulto normal, existe um intercâmbio lento, mas contínuo, de cálcio entre o seu principal reservatório, o esqueleto e o meio extracelular. Além disso, há um balanço constante entre a absorção intestinal de cálcio e sua excreção pelos rins. Essas relações estão representadas de forma esquemática na Figura 1. Homeostase do fosfato No organismo adulto, há cerca de 600 g de fósforo (1% do peso corporal), dos quais 85% são encontrados no esqueleto e 15% no fluido extracelular, sob a forma de fosfato inorgânico, e nos tecidos moles, na forma de ésteres de fosfato. O fosfato, junto com o cálcio, constitui a hidroxiapatita, principal componente mineral do osso. O fosfato é componente de um grande número de macromoléculas intracelulares, incluindo fosfolipídeos, ácidos nucléicos e fosfoproteínas. O fosfato sérico também existe sob três formas: ionizado (45%) (complexado a sódio) cálcio e magnésio (45%) e ligado a proteínas (10%). Ao contrário do cálcio, em que apenas 50% são filtrados, cerca de 90% do fosfato sérico inorgânico é filtrado pelos glomérulos. Em contraste com o cálcio sérico, a concentração de fosfato pode variar muito (ao redor de 30 a 50%) durante um dia, sendo influenciada por idade, sexo, dieta e pH. Aproximadamente 60% da concentração do fósforo ingerido, que pode variar de 800 a 1.500 mg/d em uma dieta normal, é absorvida pelo intestino, sendo menos regulada que a de cálcio. Portanto, só em raras situações (uso prolongado de antiácidos que quelam fósforo) o suprimento de fósforo é um fator limitante para sua homeostase. O rim exerce papel fundamental na regulação da homeostase do fosfato. A capacidade renal de reabsorver fósforo é saturável. Essa capacidade máxima do túbulo renal em reabsorver fósforo é conhecida como TmP, ou transporte máximo de fósforo. O limiar para reabsorção de fosfato no túbulo proximal representa o nível de fósforo sérico, abaixo do qual o fósforo sérico filtrado será reabsorvido e acima do qual será excretado. Assim, esse limiar representa essencialmente o set-point que define a concentração sérica de fósforo. Esse set-point é regulado pelo PTH e FGF-232 . A representação esquemática da cinética do fósforo em um adulto normal em situação de balanço encontra-se na Figura 2. O 16 produto das concentrações de cálcio e de fósforo séricos tende a ser constante, visto que o aumento de um desses íons leva à redução recíproca do outro. Este ajuste é feito por intermédio da regulação pelo PTH. O aumento agudo na concentração de fósforo sérico produz queda transitória na concentração de cálcio ionizado e aumento do PTH, que, por sua vez, reduz o limiar da reabsorção tubular renal de fósforo, reajustando as concentrações séricas de ambos os íons. A concentração sérica de fosfato é importante na manutenção de um produto iônico adequado para a mineralização óssea. Homeostase do magnésio O magnésio, segundo cátion intracelular mais abundante após o potássio, é um co-fator essencial na função de várias enzimas. Todas as enzimas que utilizam ATP requerem magnésio, portanto, fosforilação oxidativa, glicólise, transcrição de DNA e síntese de proteínas dependem dele. A ingestão média diária de magnésio deve ser em torno de 300 mg/d, dos quais cerca de 40% são absorvidos pelo intestino, mas o balanço neutro se mantém com ingestões tão baixas quanto 25 mg/d. As fontes dietéticas mais importantes de magnésio são as carnes e alguns cereais. Dietas ricas em fibra, fitato, oxalato e fosfato reduzem a absorção de magnésio pela ligação desses nutrientes com o cátion. Considerando um nível sérico de magnésio total de 1,7 a 2,3 mg/dL, 30% estão ligados à proteína e 70% são filtrados pelo rim. Normalmente, apenas 3% do que é filtrado aparece na urina e 97% são reabsorvidos pelo túbulo renal. Diferentemente do cálcio,apenas 25 a 30% do magnésio filtrado é reabsorvido no túbulo proximal, 60 a 65% na alça ascendente espessa de Henle e 5% no túbulo distal. O rim é o órgão que regula o metabolismo de magnésio, com discreta influência hormonal. Hormônio da paratireóide (PTH) O hormônio da paratireóide (PTH) é sintetizado pelas células principais da paratireóide e sua função principal é manter a concentração sérica de cálcio, evitando a hipocalcemia. As células principais das paratireóides são capazes de secretar de forma rápida o hormônio armazenado e, quando cronicamente estimuladas, podem se proliferar. Essas características das células paratireoidianas permitem adaptações em curto, médio e longo prazos, com a finalidade de manter a homeostase do cálcio4 . O PTH é um hormônio polipeptídeo de 84 aminoácidos produzido pelas células principais da paratireóide. O PTH é sintetizado como uma grande molécula precursora com 115 aminoácidos, denominada pré-paratormônio, sendo seqüencialmente reduzida durante o processamento intracelular. O hormônio intacto, biologicamente ativo, representa 5 a 30% da concentração plasmática total do PTH. A seqüência dos primeiros 34 aminoácidos, na extremidade aminoterminal, é responsável por sua atividade biológica. Além da molécula intacta do PTH, são secretados fragmentos aminoterminais, carboxiterminais e a sua porção média. O PTH tem uma meia-vida de aproximadamente 4 minutos, e sua metabolização ocorre, em maior 17 quantidade, no fígado (70%), nos rins (20%) e, em menor quantidade, em outros tecidos, como o tecido ósseo. O principal estímulo para a liberação do PTH é a hipocalcemia. As células da paratireóide são capazes de detectar pequenas variações na concentração sérica de cálcio por meio do receptor sensor de cálcio (CaR) expresso em suas membranas. A ligação do íon cálcio ao CaR leva à alteração na conformação do receptor e à conseqüente ativação da proteína G (Gq e Gi). A sinalização intracelular é feita por meio da inibição da adenilciclase (com redução do AMP intracelular) e ativação das fosfolipases C e A. Concentrações séricas de cálcio inferiores a 9,0 mg/dL promovem um aumento na liberação do PTH. Calcemias superiores a 10,5 mg/dL reduzem acentuadamente a concentração sérica do PTH. As variações do magnésio e a ativação de receptores beta-adrenérgicos representam mecanismos secundários de controle da secreção de PTH. A principal função do PTH é a manutenção da concentração do cálcio no espaço extracelular (Figura 3). A sua ação fisiológica se faz nos tecidos ricos em receptores específicos para o PTH, nos túbulos renais e nas células do tecido ósseo. O receptor do PTH também é um receptor de membrana acoplado à proteína G (Gs e Gq). Após a ligação do PTH ao seu receptor, ocorre ativação da proteína Gs com consequente ativação da adenilciclase (determinando aumento da concentração intracelular de AMP cíclico) e da fosfolipase C (via proteína Gq culminando com o aumento intracelular de cálcio). As ações do PTH, no tecido ósseo, variam de acordo com suas concentrações plasmáticas5 . Em concentrações fisiológicas, a secreção intermitente do PTH tem efeito ósseo anabólico com a manutenção e/ou aumento da massa óssea trabecular em humanos, e sua secreção contínua e/ou aumentada apresenta efeito catabólico. A ação do PTH sobre o osteoclasto é indireta. O PTH se liga ao receptor do osteoblasto gerando um fator local capaz de estimular a atividade do osteoclasto que é responsável pela reabsorção óssea4 . Nos rins, o PTH aumenta a reabsorção de cálcio no túbulo distal e no túbulo proximal, e promove a inibição da reabsorção de fósforo e a hidroxilação renal da 25 hidroxi-vitamina D (25OHD), gerando 1,25 diidroxi-vitamina D (1,25(OH)2D ou calcitriol), pelo aumento da síntese da enzima 1alfa- hidroxilase. A ação intestinal do PTH é indireta, por meio da síntese de calcitriol, que aumenta a absorção de cálcio e fósforo. O efeito do PTH é a elevação da calcemia e a redução da fosfatemia. Vitamina D A vitamina D é um secosteróide sintetizado na pele por ação de raios ultravioleta ou pode ser ingerida na alimentação. Os alimentos que contêm vitamina D são poucos (peixes gordurosos, gema de ovo, óleo de fígado de bacalhau e produtos lácteos). A vitamina D proveniente da síntese em animais é denominada colecalciferol ou vitamina D3, e a de origem vegetal, ergocalciferol ou vitamina D2 6 . A síntese da vitamina D é realizada, principalmente, na pele. A partir da exposição aos raios ultravioleta (UV), o 7-dehidrocolesterol (7-DHC ou pró-vitamina D) 18 presente na derme e epiderme é transformado em vitamina D3 (colecalciferol). A produção da vitamina D3 é uma reação fotoquímica não-enzimática que depende da intensidade da irradiação e da quantidade de substrato. A intensidade de radiação solar, que influencia a produção cutânea da vitamina D3, depende da latitude, do horário do dia e da estação do ano. Em países localizados além de 40 graus de latitude, a síntese da vitamina D3 na pele diminui durante os meses de inverno, por causa da menor quantidade de raios ultravioletas que atingem a camada terrestre. Uma exposição ao sol de 2 horas por semana é suficiente para manter a concentração sérica de 25 hidroxi-vitamina D (25OHD) dentro da normalidade em crianças e adultos6 . Existe uma relação inversa entre a concentração de vitamina D3 e a idade. Os adultos jovens produzem duas ou três vezes mais vitamina D cutânea do que os idosos. A melanina é um protetor de sol natural e compete com o 7-DHC pelos fótons de raios UV. As pessoas com cor de pele mais escura necessitam de exposição mais prolongada à luz solar para produzir a mesma quantidade de vitamina D que os indivíduos com cor de pele mais clara produzem. O vidro e as roupas absorvem os raios ultravioleta e diminuem a síntese da vitamina D. O uso tópico de protetores solares com fator 8, ou maior, também reduz a produção cutânea de vitamina D7 . A vitamina D produzida na pele é transportada pela corrente sangüínea, ligada a proteínas (DPB), até o fígado, onde sofre uma hidroxilação no carbono 25, tornando-se 25OHD ou calcidiol. A maioria da 25OHD produzida é depositada no tecido gorduroso, seu principal reservatório. A produção da 25OHD no fígado, além de rápida, sofre pouca regulação. Desse modo, a concentração sérica de vitamina D plasmática reflete a reserva corporal de vitamina D. Para tornar-se ativa, a vitamina D necessita, ainda, de uma hidroxilação na posição 1, que ocorre nas mitocôndrias dos túbulos contornados proximais do rim sob ação da enzima 1alfa-hidroxilase, transformando-se em 1,25(OH)2D ou calcitriol. Essa passagem renal, ao contrário da hepática, é estreitamente regulada por vários fatores. A elevação plasmática do PTH e a diminuição do fosfato estimulam a atividade da 1alfa-hidroxilase. A 1,25(OH)2D retrorregula sua produção, inibindo a atividade da 1alfa-hidroxilase. Por outro lado, o FGF-23 tem efeito inibidor sobre a 1alfa-hidroxilase8 . Além das células dos túbulos renais proximais, outras células produzem 1alfa- hidroxilase, como os monócitos e as células da pele e da placenta. O calcitriol representa a forma ativa da vitamina D; sua metabolização é feita nos seus principais órgãos-alvo (intestino e osso), além do fígado e dos rins. O receptor para 1,25(OH)2D (VDR) pertence à superfamília dos receptores nucleares e ativa a transcrição de vários genes nos órgãos- alvo. O calcitriol normalmente forma homodímeros ou heterodímeros, principalmente com o ácido retinóico (RAR) e com o ácido 9- cis- retinóico (RXR). Também há receptores de membrana com propriedades de ligação hormonal diferentes, responsáveis pelo estímulo hormonal rápido para absorção intestinal de cálcio 19 denominada transcaltáquia6 . O calcitriol é um hormônio potente que circula em concentrações cerca demil vezes inferiores ao seu precursor, o calcidiol. Sua ação primordial é no trato digestivo, aumentando a absorção intestinal de cálcio e fósforo por meio de receptores nucleares encontrados no intestino delgado, aumentando a síntese da calbindina,responsável pelo transporte de cálcio através da mucosa intestinal. Atua fisiologicamente no osso de forma permissiva na mineralização da matriz protéica óssea. Ante níveis reduzidos de cálcio na dieta, sua ação no osso passa a ser indutora da reabsorção. Na paratireóide, a 1,25(OH)2D age inibindo a secreção do PTH. FGF-23 O FGF-23 é um peptídeo produzido pelas células osteogênicas que participa do metabolismo do fósforo e da vitamina D9 . O aumento da concentração de FGF-23 está associado à hipofosfatemia por perda renal de fósforoeà diminuição da síntese de calcitriol 10. A diminuição da síntese ou a presença de FGF-23 circulante inativo é acompanhado de aumento na concentração sérica do fósforo e do calcitriol. A ação do FGF- 23, no túbulo renal, necessita da presença de uma proteína produzida pelo gene Klotho11. Assim, as células osteogênicas, ao produzirem FGF- 23, participam da homeostase do fósforo por seu efeito na reabsorção renal de fósforo e na síntese do calcitriol. Metabolismo ósseo O osso é um tecido dinâmico e sua formação e reabsorção são processos contínuos durante toda a vida do organismo. Durante o crescimento, a reabsorção e a formação produzem mudanças no tamanho e na forma dos ossos (processo conhecido como modelagem) ocorrendo em diferentes locais e sem acoplamento12. Concomitantemente, ocorre o processo de remodelação óssea: a formação óssea somente acontece nos locais onde houve reabsorção, e o novo osso ocupa o mesmo local que o antigo. A remodelação óssea é um processo contínuo de atividade que tem por finalidade manter a microestrutura óssea, possibilitando sua constante adaptação às exigências mecânicas e funcionais do esqueleto, como também um suprimento de osso jovem adequado com densidade mineral baixa para participar na homeostase mineral. O ciclo da remodelação consiste nas seguintes fases: ativação, reabsorção, reversa e formação (Figura 4). Essa atividade é realizada em unidades funcionais, as unidades metabólicas ósseas (BMU – basic multicellular unit), distribuídas por todo o esqueleto. A fase de ativação é iniciada pela retração dos osteoblastos de superfície que expõem a matriz óssea e liberam os fatores locais que estimularão a formação dos osteoclastos, a osteoclastogênese. A fase de reabsorção, que dura em torno de duas a três semanas, é realizada pelos osteoclastos que removem o mineral e liberam os fragmentos de colágeno. Na fase reversa, células mononucleares da linhagem de monócitos e macrófagos preparam a 20 superfície para os novos osteoblastos iniciarem a formação. A fase de formação óssea se prolonga por cerca de quatro meses, até que o osso reabsorvido seja completamente substituído, e ocorre em duas fases: formação da matriz e a mineralização que são separadas no tempo e no espaço. As células responsáveis pela formação óssea são os osteoblastos. São células colunares ou cubóides com citoplasma basófilo adjacentes à camada de matriz nãomineralizada (o rebordo osteóide) com uma espessura média de 8 a 10 mm. A matriz óssea (orgânica) é o osteoide, O rebordo osteóide formado determina o volume do osso novo, mas não sua densidade. A mineralização aumenta a densidade do osso novo, mas não altera seu volume; e envolve a deposição inicial de fosfato tricálcico amorfo, que é lentamente convertido em cristais de hidroxiapatita. A formação da matriz tem lugar na ocorre entre interface entre o osteoblasto e o rebordo osteóide, enquanto a mineralização ocorre entre o osteóide e o osso mineralizado, região de transição com 3 mm de espessura conhecida como frente de mineralização. Esses dois processos estão separados no espaço e no tempo. A separação no espaço é representada pela espessura do rebordo osteóide, e a separação no tempo resulta da demora de 20 dias, em média, entre a deposição da matriz e a sua subseqüente mineralização (MLT – mineralization lag time). Uma vez completada a formação óssea, há um prolongado período de repouso com pouca atividade celular naquela unidade óssea, até que um novo ciclo de remodelação se inicie. A cada 10 segundos surge uma BMU, e a cada ano 3a4milhões da BMU são iniciadas. Um organismo contém cerca de um milhão de BMU atuando continuamente. Pode-se especular que o esqueleto é renovado de 10 em 10 anos13. A BMU cortical é o sistema de Havers ou ósteons. No osso esponjoso, a BMU é aplainada como se o ósteon tivesse sido aberto e desenrolado, sendo paralelo ao plano esponjoso. O osso cortical é denso e compacto, e constitui a parte exterior das estruturas de todo esqueleto. O osso cortical compreende 80% do esqueleto. Sua função principal é prover força mecânica e proteção, mas pode participar também das respostas metabólicas, particularmente quando há déficit mineral prolongado ou intenso. O osso esponjoso ou trabecular é encontrado no interior dos ossos longos, particularmente nas extremidades, nos corpos vertebrais, nas porções internas da pélvis e em outros ossos grandes planos. O osso esponjoso pode exercer uma função mecânica nas vértebras, mas é mais ativo metabolicamente que o osso cortical, e também provê os materiais iniciais em estados de deficiência mineral aguda. Como o osso esponjoso é mais ativo em qualquer doença óssea metabólica, a perda óssea ocorre primeiramente nele. A atividade metabólica do osso esponjoso é realizada pelos osteócitos14. O número de unidades remodeladoras, a eficácia e a duração de cada fase podem variar nas várias doenças, e essas alterações representam a base das doenças ósseas metabólica. 21 Histomorfometria óssea A histomorfometria é a técnica que permite quantificar a remodelação e as estruturas ósseas, possibilitando caracterizar as doenças osteometabólicas em bases morfológicas. A biópsia óssea é realizada na crista íliaca com trefinas especiais e sob anestesia local. A biópsia é realizada em nível ambulatoria e sem complicações. A inclusão do fragmento em material metilmetacrilato permite o estudo do tecido ósseo preservando o tecido calcificado. Com o recurso do micrótomo de alto impacto, é possível a obtenção de cortes histológicos finos que, por meio das colorações histológicas (azul de toluldina, Goldner, Solocromo e Von Kossa) que possibilitam diferenciar o tecido mineralizado do não mineralizado. As medidas histomorfométricas podem avaliar a quantidade de tecido ósseo e as taxas de formação e reabsorção, além de fornecer dados da espessura da cortical e caracterizar a desorganização da microestrutura trabecular16. O estudo dinâmico da mineralização óssea é realizado com a utilização da tetraciclina permitindo o diagnóstico da osteomalacia17,18. Considerações finais O PTH é um hormônio hipercalcemiante pela ação reabsortiva óssea, por aumentar a reabsorção tubular renal de cálcio e por agir indiretamente aumentando a absorção intestinal de cálcio. O PTH regula a homeostase do cálcio e fósforo, mantendo seus valores séricos constantes. A produção endógena de vitamina D3 (colecalciferol) depende da conversão da pró-vitamina D sob a ação dos raios UV; o calciferol também pode ser assimilado exogenamente pelo consumo de alimentos de origem animal (colecalciferol ou vitamina D3) ou vegetal (ergocalciferol ou vitamina D2) ricos em vitamina D. O osso é um tecido dinâmico, e sua formação e reabsorção são processos contínuos durante toda vida por meio da modelagem e remodelação óssea. A histomorfometria óssea quantifica o processo de formação e reabsorção ósseo, possibilitando caracterizar as doenças osteometabólicas em bases morfológicas, sendo importante no diagnósticoda osteomalacia. 3. COMPREENDER A FISIOPATOLOGIA DA OSTEOPOROSE. RANKL Fisiopatologia As fraturas são decorrentes da diminuição da resistência óssea e das quedas. A resistência óssea depende da quantidade e da qualidade do osso. Enquanto a quantidade óssea é avaliada pela densidade mineral óssea (DMO), sua qualidade depende de outros fatores, como forma e tamanho, remodelação, microarquitetura, mineralização óssea e 22 qualidade da matriz. Atualmente, considera-se que a massa óssea seja responsável por cerca de 50 a 70% da resistência do osso à fratura. Quantidade óssea A massa óssea depende do seu pico de formação e de sua subsequente perda. O pico de massa óssea representa a quantidade de osso adquirida no período de crescimento do esqueleto e sofre influências genéticas, como demonstram as diferenças raciais e a maior concordância da massa óssea entre gêmeos monozigóticos do que nos dizigóticos. É provável que parte desse efeito seja mediada pelo tamanho do esqueleto10. Outros fatores que influenciam a massa óssea máxima são dieta (especialmente a ingestão dietética de cálcio), exercício físico e época da puberdade. Um pico de massa óssea insuficiente na infância e na adolescência é importante para o desenvolvimento da osteoporose. Depois que o pico de massa óssea é alcançado, a DMO permanece estável por anos e, então, começa a declinar devido ao predomínio da reabsorção sobre a formação, resultando em diminuição da massa óssea. Na mulher, a perda óssea tem início na perimenopausa, embora o tempo preciso de início seja desconhecido. Uma vez que a menopausa se instala, ocorre uma aceleração da taxa de perda óssea. Durante os primeiros 5 a 10 anos após a menopausa, o osso esponjoso é perdido mais rapidamente que o osso cortical, com taxas de 2 a 4% e 1 a 2% por ano, respectivamente. Assim, uma mulher pode perder de 10 a 15% do seu osso cortical e de 25 a 30% do seu osso esponjoso. Essas taxas variam consideravelmente entre as mulheres, não sendo claro por que algumas são “perdedoras rápidas de osso”11. O mecanismo pelo qual a deficiência de estrógeno leva à perda óssea é complexo. A deficiência estrogênica aumenta a produção das citocinas que estimulam a reabsorção óssea, como as interleucinas 1 e 6 (IL-1 e IL6) e o fator de necrose tumoral (TNF). A deficiência de estrógeno também pode diminuir a produção de osteoprotegerina, um membro solúvel da família TNF que reduz a osteoclastogênese. Por outro lado, o hipoestrogenismo pode reduzir a produção de fatores de crescimento que estimulam a formação de osso, como IGF-1 e TGF-beta12. A partir da sexta década de vida, homens e mulheres sofrem um declínio da massa óssea, devido principalmente ao balanço negativo na unidade de remodelação, pela menor atividade dos osteoblastos. A deficiência de vitamina D, que pode ocorrer nessa faixa etária, acarreta um hiperparatireoidismo secundário que pode acentuar essa perda. Qualidade óssea Além da quantidade, a resistência óssea também depende de sua qualidade, depende da, a qual sofre a influência de vários fatores, como sua forma e seu tamanho. Assim, por exemplo, fraturas de colo do fêmur têm sido correlacionadas com a extensão do eixo do fêmur; provavelmente por essa razão, as mulheres japonesas têm metade das fraturas de colo de fêmur que as ocidentais13. Outro fator que interfere na qualidade óssea é a atividade do periósteo. Esta atividade ocorre 23 durante toda a vida, conferindo resistência ao osso cortical; quando a formação óssea pelo periósteo é deficiente, essa resistência pode ficar comprometida14. Todos os materiais estruturais se desgastam e enfraquecem, e tal processo é denominado dano por fadiga. Como o osso é um tecido estrutural, está sujeito a este dano. Uma das finalidades da remodelação óssea é reparar as fraturas por dano de fadiga que ocorrem no osso normal. Se essas fraturas ocorrem mais rapidamente do que o processo de remodelação possa reparar, ocorre aumento das fraturas por dano de fadiga. Tanto a remodelação óssea aumentada como a diminuída aumentam o risco de fraturas. A remodelação aumentada é associada à maior taxa de perda óssea e pode ser um fator de risco para fratura independente da densidade mineral óssea, possivelmente por causa do número aumentado dos locais de osso a remodelar. Pode ocorrer a concentração de maior número de unidades de remodelação em locais submetidos à força de estresse produzindo pontos frágeis que possibilitam a microfratura óssea. O aumento das microfraturas ocasiona desorganização da microestrutura15. A intensidade da deformação óssea depende da magnitude da força aplicada, mas também da resistência dos materiais que compõem o osso. Esta resistência depende da proporcionalidade entre os cristais de hidroxiapatita e o colágeno tipo I: tanto o colágeno pouco mineralizado como o muito mineralizado representam diminuição da resistência óssea ao traumatismo. O risco de fratura depende também da qualidade da matriz óssea. O colágeno é a proteína de matriz mais abundante. Suas propriedades mecânicas, como resistência à tração e viscoelasticidade, são determinadas principalmente por seu padrão de formação da ligação cruzada (cross-link) entre as fibras de colágeno. O processo de maturação do colágeno possibilita a formação de maior número de cross-link, dando maior resistência ao osso. Nas condições de remodelação aumentada, há formação de menor número de cross- link16. A patogênese da fratura é complexa, sendo a diminuição da massa óssea o principal fator determinante de risco de fratura; no entanto, anormalidades na qualidade do osso também contribuem para o aumento da fragilidade óssea. - Densitometria óssea Ao pensar em saúde dos ossos, é comum que a primeira doença que venha em mente seja a osteoporose. Porém, outro quadro também pode indicar que os ossos estão passando por um processo de desgaste: a osteopenia. Diferente da osteoporose, a osteopenia não é uma doença, é uma condição pré-clínica que mostra que há uma perda precoce de densidade óssea e enfraquecimento dos ossos. Segundo critérios estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), considera-se que a osteopenia está instalada quando a densidade mineral do osso gira entre menos 1% e menos 2,4%, portanto, maior do que a perda fisiológica considerada normal para a faixa de idade. Se não for tratada de forma adequada, o 24 quadro pode evoluir para uma osteoporose. A osteopenia pode afetar mulheres e homens. No entanto, são mais vulneráveis as mulheres pós-menopausa, que apresentam uma queda na produção do estrogênio, hormônio que contribui para a absorção de cálcio. Além do envelhecimento, os fatores de risco também incluem herança genética, desnutrição, exposição insuficiente ao sol e sedentarismo. O recurso mais importante para o diagnóstico é a densitometria óssea, exame que permite detectar a redução da massa óssea de maneira precoce e precisa. Ele avalia a coluna lombar, a região proximal do fêmur e o terço distal do rádio, áreas que estão mais sujeitas ao risco de fraturas. Esse método utiliza aparelhos modernos, que apresentam duas vantagens importantes: são rápidos (durando cerca de 5 minutos) e produzem uma baixa exposição à radiação. Quanto mais precoce o diagnóstico, maior a chance de sucesso do tratamento. É muito difícil reverter um quadro de osteopenia, por isso, o principal objetivo é deter ou retardar a degradação do tecido ósseo que pode levar à osteoporose. O CEPEM oferece a densitometria óssea para o diagnóstico de osteopenia e osteoporose. Contamos com exames de alta tecnologia, além de uma equipe médica capacitada para garantir laudos precisos e seguros. A Densitometria Óssea é o exame que irá diagnosticar a Osteoporose desenvolvida pelo paciente. O método detecta a redução da massa ósseade forma precoce e precisa, sendo ainda a forma mais utilizada para avaliar a densidade mineral dos ossos. Ela é a responsável pela avaliação da coluna lombar, a região proximal do fêmur e o terço distal do rádio, que são as áreas mais propensas ao risco de fraturas. A Densitometria Óssea se utiliza de meios bastante sofisticados tecnologicamente para a captação dos resultados. Além disso, o exame é rápido (tem duração – comparado a média de 15 minutos) produz até 10 vezes menos radiação radiografia tradicional do tórax – e é indolor. O método também é utilizado por pediatras, em crianças e adolescentes até os 20 anos de idade, afim de acompanhar o crescimento, a massa óssea e a quantidade de massa magra e massa gordurosa. É ainda um importante aliado para avaliação de que o tratamento da Osteoporose esteja sendo realizado com sucesso e, assim, fazendo com que o paciente tenha uma qualidade de vida melhor e com riscos diminuídos. 25 4. COMPREENDER A FISIOPATOLOGIA, FATORES DE RISCO, QUADRO CLÍNICO E TRATAMENTO FARMACOLÓGICO E NÃO FARMACOLÓGICO DA OSTEOARTRITE. Introdução A osteoartrite (OA) tem sido considerada uma condição degenerativa da articulação, conseqüência quase inevitável do envelhecimento. O metabolismo e o fenótipo da cartilagem afetada, no entanto, apontam para uma situação oposta, na qual se destaca a presença de condrócitos ativados, que produzem aceleradamente todos os componentes da matriz extracelular. Paralelamente, toma curso um processo de degradação que, ao sobrepujar a capacidade anabólica do tecido, determina sua progressiva perda. Essas alterações podem iniciar-se já na idade adulta, mas geralmente ultrapassam o horizonte clínico após a quarta ou quinta década de vida, tornando-se mais prevalente com o avançar da idade. A osteoartrite afeta 3,5% da população geral e aproximadamente 10% dos indivíduos acima dos 60 anos. Com o aumento da expectativa de vida, o contingente atingido tende a alcançar cifras alarmantes. Em face desse cenário, a comunidade científica tem dedicado um crescente esforço na elucidação dos mecanismos fisiopatológicos e no desenvolvimento de fármacos e procedimentos capazes de mudar a história natural da doença. As duas últimas décadas têm assistido ao surgimento de medicamentos com ação específica sobre a cartilagem, denominados fármacos de ação lenta na osteoartrite, mas, embora promissores, a real magnitude da sua eficácia ainda permanece controversa. O transplante de cartilagem e o implante de condrócitos, ativados ou não com fatores de crescimento, já são uma realidade, porém têm indicação limitada aos casos de lesões focais, sendo pouco eficientes na perda difusa da cartilagem, como ocorre na osteoartrite. A mais nova perspectiva intervencionista é o emprego da engenharia tecidual a partir de células-tronco e condrócitos. Ao lado dessas novas opções, o alvo principal do tratamento continua sendo a educação e aplicação de medidas físicas, destinadas basicamente a mudar a distribuição anormal das cargas mecânicas que atuam sobre a articulação. Medidas simples como proteção articular, exercícios apropriados e órteses são altamente eficientes. Definição A osteoartrite decorre de uma multiplicidade de fatores causais, desencadeantes e agravantes, devendo, portanto, ser encarada como uma síndrome, na qual a perda qualitativa e quantitativa da cartilagem articular acarreta uma significativa remodelação óssea hipertrófica local e uma inflamação secundária, via de regra de pequena magnitude. Para a caracterização da osteoartrite é obrigatória a presença da dor, visto que alterações anatomopatológicas, bioquímicas e verificadas por meio de métodos de imagem podem ocorrer de modo assintomático, situação que não deve ser diagnosticada como osteoartrite. Do ponto de vista fisiopatológico, a osteoartrite é definida como uma insuficiência da 26 cartilagem articular, decorrente de um predomínio da degradação sobre a síntese, que evolui com inflamação local, proliferação sinovial e enfraquecimento global dos ligamentos e músculos. Surge como resultado da interação de fatores biológicos (genéticos, inflamatórios, metabólicos, hormonais e envelhecimento) e mecânicos (trauma, displasias, obesidade, maus alinhamentos, perda de propriocepção etc.). Epidemiologia Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2000, a população com faixa etária acima dos 60 anos representa 8,6% do total ou 15 milhões de indivíduos, e a expectativa de vida atingiu os 70,4 anos. O envelhecimento populacional é uma tendência mundial e as estimativas nacionais apontam na mesma direção: em 2050, cerca de 18% da nossa população será constituída por indivíduos com mais de 65 anos e com uma expectativa de vida de 81,3 anos. Logo, a osteoartrite, que já é um grave problema de saúde pública, afetará cada vez mais pessoas em nosso país, o que poderá comprometer de forma importante a qualidade de vida dos brasileiros, assim como o sistema previdenciário e de saúde. Aspectos socioeconômicos No mundo todo, a osteoartrite é identificada como uma das principais causas de afastamento do trabalho, além de onerar significativamente o sistema de saúde por meio de internações e cirurgias reparadoras. No Brasil, dados obtidos junto ao Instituto Nacional de Previdência Social mostram que as doenças osteoarticulares ocupam o terceiro lugar das causas de incapacidade laborativa (10,6%), ficando atrás apenas das doenças mentais e cardiovasculares, e que a osteoartrite responde por 7,8% desses casos1 . Prevalência A osteoartrite acomete aproximadamente 3,5% da população geral e sua prevalência aumenta com a idade, atingindo 10% dos indivíduos acima dos 60 anos2 . Esses dados se referem à doença manifesta e não a achados radiográficos ou histopatológicos isoladamente, pois sabe-se que, muito antes de o processo eclodir clinicamente, um lento e silencioso curso fisiopatológico compromete as estruturas atingidas. Achados histopatológicos, por exemplo, revelam que o processo nos joelhos e quadris inicia-se já na adolescência, e aos 40 anos 90% dos indivíduos apresentam alguma alteração tecidual compatível com a doença3 . Quanto aos achados radiográficos característicos, 52% da população adulta já apresenta OA de joelhos, e, destes, 20% com quadro moderado ou grave, mesmo sem sintomas. Além disso, 85% dos indivíduos na faixa dos 55 aos 64 anos apresentam algum grau de OA em uma ou mais articulações, e acima dos 85 anos essa cifra aproxima-se dos 100%. O estudo National Health and Nutrition Examination Survey II demonstra que, na faixa etária dos 75 aos 79 anos, as alterações radiográficas compatíveis com a OA estão presentes nas mãos em 84% 27 dos casos, nos pés em 51%, nos joelhos em 13,8% e nos quadris em 3,1% dos indivíduos4 . Incidência A incidência da osteoartrite dos joelhos situa-se entre 1645 e 2406 casos por 100.000 indivíduos-ano. Para a osteoartrite dos quadris, a incidência observada é de 47,36 a 88,05 por 100.000 indivíduos-ano. No estudo de coorte de Framingham, mulheres com 71 anos desenvolveram alterações radiográficas nos joelhos na taxa de 2% ao ano e sintomas no ritmo de 1% ao ano, os homens tiveram taxas de 1,4 % e 0,7%, respectivamente7 . A incidência de osteoartrite das mãos varia de 2 a 4% ao ano, dependendo da idade da população estudada. Distribuição entre os sexos A osteoartrite acomete igualmente ambos os sexos até os 40 anos5 . Na década seguinte, as mulheres apresentam uma elevação discretamente superior na incidência da OA das mãos, dos quadris e dos joelhos, e essa tendência se torna marcante após os 50 anos. A incidência tende a se estabilizar após os 70 anos nos homens e 80 anos nas mulheres5 . Na mulher, é mais freqüente a forma generalizada idiopática, com o envolvimento das mãos.
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