Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 Marcela Oliveira Silva – Medicina UNIFG 2021 O choque hemorrágico é um tipo de choque hipovolêmico. É uma condição clínica que resulta da eventual perda de mais de 20% do sangue do corpo. E esta perda de volume torna impossível para o coração bombear uma quantidade suficiente de sangue para o corpo e por isso, pode levar a falência de órgãos e até a morte. O choque hemorrágico vai ser a principal causa de morte de pessoas politraumatizadas. Esse choque hemorrágico deve-se a sangramentos agudos e graves decorrentes de acidentes, sangramento de órgãos internos e lesões traumáticas FISIOPATOLOGIA Os choques são classificados como hipodinâmicos (baixo débito e aumento da resistência vascular periférica - vasoconstricção) e em hiperdinâmicos (alto débito cardíaco e redução da resistência vascular periférica – vasodilatação). Quanto ao choque hemorrágico, ele se caracteriza por ser hipodinâmico com aumento dos níveis de catecolaminas aumentando a constrição vascular, frequência cardíaca e contratilidade A resposta inicial do organismo diante da perda sanguínea consiste na vasoconstricção periférica na tentativa de preservar a perfusão tecidual de órgãos nobres (rins, coração e cérebro). Ocorrem também aumento da frequência cardíaca, com o intuito de manter o debito cardíaco. Na maioria das vezes, a taquicardia é o sinal mais precoce do choque. A vasoconstricção e o aumento da FC decorrem da liberação de catecolaminas endógenas, que aumentam a resistência vascular sistêmica (RVS). Inicialmente, com a vasoconstricção e o aumento da FC, a PA permanece inalterada. Se a perda sanguínea persistir, sem haver reposição, o paciente apresentará hipotensão. A nível celular, as células mal perfundidas e mal oxigenadas começam a realizar o metabolismo anaeróbico, com formação de ácido láctico e acidose metabólica. Tal condição é visível aos exames laboratoriais, que irão revelar aumento no lactato. Se o choque for prolongado a membrana celular perde a capacidade de manter a sua integridade. São liberados mediadores pró-inflamatórios, com dano orgânico e disfunção de múltiplos órgãos e sistemas. MECANISMOS COMPENSATÓRIOS O cérebro por ser um órgão nobre é protegido da isquemia devido a autorregulação do seu fluxo sanguíneo. No entanto, paciente com choque pode apresentar disfunção cerebral devido a atuação de mediadores inflamatórios, causando a encefalopatia séptica. No coração, a resposta cardíaca frente a um choque deriva da ativação neuro-hormonal (sistema adrenérgico), com aumento da frequência cardíaca e aumento da contratilidade. Os pulmões reagem frente a um choque com taquipneia, devido a acidose metabólica originada pela hipóxia. Os rins, de forma regulatória vai reduzir sua função renal, com baixa de filtração glomerular, provocando oligúria e azotemia (aumento da concentração de ureia e creatinina). O TGI sofre de forma direta com a hipoperfusao e vasoconstricção pela ação direta das catecolaminas. O fígado também sofre de forma semelhante, podendo ser encontrado um aumento das transaminases, fosfatase alcalina e bilirrubinas. A função sintética do fígado também Choque hemorrágico 2 Marcela Oliveira Silva – Medicina UNIFG 2021 é prejudicada, podendo ser observado uma hipoalbuminemia e deficiência dos fatores de coagulação. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Os primeiros sinais clínicos do choque são taquicardia e vasoconstricção cutânea, que se manifestam como pele fria e diaforética (pegajosa). A FC normalmente está aumentada, sendo a taquicardia um sinal hemodinâmico de choque. Aliado a isso, temos uma diminuição da pressão de pulso, que é a diferença entre as pressões sistólica e diastólica, com valores <20 indicando pulsos diminuídos. A queda da pressão arterial ocorre em uma fase mais tardia, em razão dos mecanismos compensatórios que já expliquei. Observa-se ainda redução do fluxo urinário, levando a oligúria e anúria. O indivíduo apresenta taquipneia, com alteração do nível de consciência que varia de confusão a coma quando a perda volêmica superior a 40% da volemia. MANEJO A primeira etapa no tratamento das hemorragias é o controle do sangramento. A reposição volêmica, quando indicada, deve ser precoce. Preconiza-se a punção de 2 acessos venosos periféricos. E no ato da punção, deve ser colhida uma amostra de sangue para tipagem, dosagem de hemoglobina, hematócrito, amilase, beta Hcg e eventuais exames toxicológicos. Para a reposição volêmica devem ser utilizadas soluções de cristaloides isotônicas aquecidas a 39ºC. O ringer lactato é a solução preferencial pois tem uma composição semelhante ao do plasma sanguíneo. Preconiza-se uma reposição inicial de 1L e os volumes subsequentes devem basear-se na resposta do paciente. A resposta adequada de volume deve restabelecer, no adulto o debito urinário de aproximadamente 0,5mL/Kg/h. A infusão continua de grandes quantidades de volume na tentativa de normalizar a PA não substitui o controle definitivo da hemorragia. O ácido tranexâmico (antifibrinolítico) é indicado para pacientes traumatizados com sinais de hemorragia significativa, até 3 horas após a lesão. A dose inicial deve ser administrada em 10 minutos e de preferência no local do acidente e a segunda dose deve ser infundida em oito horas, em ambiente hospitalar. O sangue deve ser reposto na forma de concentrado de hemácias. O objetivo é aumentar a capacidade de transporte de oxigênio do volume intravascular. Está indicada transfusão a pacientes com perda estimada > 30% do volume sanguíneo total. Idealmente, devem ser feitas provas cruzadas, utilizando sangue com tipo específico ABO e Rh. Na indisponibilidade do tipo específico ou na falta de tempo, deve-se utilizar sangue tipo O e, em mulheres em idade fértil, Rh negativo. 3 Marcela Oliveira Silva – Medicina UNIFG 2021 DROGAS VASOPRESSORAS: As aminas vasopressoras mais utilizadas na prática do choque em nosso meio são a dopamina, a noradrenalina e, menos frequentemente, a adrenalina. Uma amina vasopressora está indicada em todos os casos de choque refratário à reposição volêmica ou outras medidas iniciais, quando a PA sistólica estiver abaixo de 80 mmHg ou a PAM invasiva abaixo de 65-70 mmHg. Estas drogas agem através da VASOCONSTRIÇÃO, aumentando a RVS e, portanto, a PAM. Com isso, melhoram a perfusão dos órgãos nobres, como o cérebro e o coração e, eventualmente os rins. Para isso, têm que promover vasoconstrição do leito arteriolar dos órgãos não nobres, como as vísceras, a musculatura esquelética, a pele e o subcutâneo. No choque séptico, as aminas vasopressoras têm indicação precisa, pois agem no principal distúrbio hemodinâmico deste choque – a vasodilatação inapropriada, corrigindo (pelo menos em parte) a queda da RVS CLASSIFICAÇÃO DO CHOQUE HEMORRÁGICO E MANEJO O estado de choque em uma vítima politraumatizada, até prova em contrário, é hipovolêmico devido a perdas hemorrágicas, principalmente perdas externas ou internas em cavidades como tórax, abdome ou pelve. O reconhecimento do estado de choque é clínico, em que a história do trauma, aliada a dados vitais como frequência cardíaca, frequência respiratória, estado de consciência, pressão de pulso (diferença entre PA sistólica e diastólica) e pressão arterial orientam a classificá-lo em graus de I a IV, que orientarão a reposição volêmica. Convém lembrar que a reposição volêmica não substitui o controle da hemorragia. Então, concomitante à reposição, deve-se fazer um esforço muito grande para reconhecimento do sítio do sangramento. Quanto à reposição, sempre deve ser iniciada com infusão de cristaloide, sendo o Ringer Lactato a escolha, na quantidade de 1.000 mL, por veia periférica. No grau I de choque, ou seja, aquele que há história de perda e não há alterações dos dados vitais, a conduta é observar e não deve ser feita a reposição rapidamentee, eventualmente, posterga-se a reposição No grau II, já há perda de 15 a 30% da volemia e habitualmente já temos taquicardia e diminuição da pressão de pulso (< 30 mmHg), e neste caso é imperativa a reposição do cristaloide. No grau III, a perda está entre 31 a 40% da volemia, e já há hipotensão, taquicardia, taquipneia, oligúria, sendo, neste caso, já indicado concentrado de hemácias tipo específico com prova cruzada sem deixar de infundir 1.000 mL de Ringer Lactato. No choque grau IV, existe hemorragia maciça e perda volêmica maior que 40% da volemia, com hipotensão severa, perda de consciência, oligúria severa, grande taquicardia e taquipneia, sendo indicado o chamado protocolo de reposição maciça, que consiste em infusão de concentrado de hemácias (para aumentar o transporte de 02 e volume intravascular) O, e em mulhers O negativo, além de plasma fresco e concentrado de plaquetas.
Compartilhar