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Sono e vigília O sono – que é definido, quanto ao comportamento, pela suspensão normal da consciência e, de forma eletrofisiológica, por critérios envolvendo a apresentação de ondas cerebrais específicas – consome um terço de nossas existências. [De fato, no sono REM (de rapid eye movement, ou sono com “movimento ocular rápido”) o encéfalo está quase tão ativo quanto em pessoas despertas]. O sono é constituído por uma série de estados encefálicos precisamente controlados, a sequência desses estados é governada por um grupo de núcleos no tronco encefálico, os quais se projetam amplamente por todo o encéfalo e a medula espinhal. Por que os seres humanos (e muitos outros animais) dormem? Para se sentirem descansados e revigorados ao despertar, a maior parte dos adultos necessita de 7 a 8 horas de sono por dia, embora esse número varie entre os indivíduos. O sono (ou ao menos um período fisiológico de quietude, repouso) é um comportamento altamente preservado que ocorre em animais que vão desde moscas-das-frutas ate humanos. Além disso, uma vez que à noite a temperatura é geralmente mais baixa, mais energia seria gasta para nos manter aquecidos caso fôssemos ativos nesse período. A temperatura corporal humana apresenta um ciclo de 24 horas alcançando um mínimo à noite e, assim, reduzindo a perda de calor. Como seria de se esperar, o metabolismo, medido pelo consumo de oxigênio, diminui durante o sono. Em humanos, a falta de sono leva a prejuízos na memória e à redução das capacidades cognitivas e, se a privação persistir, a alterações de humor e até mesmo a alucinações. Como o nome indica, pacientes com a condição genética denominada insônia familiar fatal morrem dentro de poucos anos após o início dessa condição. Essa doença rara que aparece na meia-idade, é caracterizada por alucinações, convulsões, perda do controle motor e pela incapacidade de entrar em um estado de sono profundo Eva Tamires de Sousa – Med VI Os efeitos da privação de sono por curtos períodos em humanos aparecem principalmente no desempenho comportamental, como sabe qualquer pessoa que já tenha experimentado uma ou duas noites sem dormir. O mais longo período documentado de privação voluntária de sono em humanos foi de 453 horas e 40 minutos (aproximadamente 19 dias), um recorde alcançado sem qualquer estimulação farmacológica. O ciclo circadiano de sono e vigília Os humanos têm um “relógio” interno que continua a operar na ausência de qualquer informação externa sobre a hora do dia; sob essas condições, diz-se que o relógio está em “livre curso”. Presume-se que relógios circadianos evoluíram para manter períodos adequados de sono e vigília e para controlar outros ritmos diários, apesar da quantidade variável de luz e escuridão em diferentes estações e em diferentes lugares do planeta. Para sincronizar ou fotoarrastar processos fisiológicos com o ciclo dia-noite (denominado fotoagente arrastador, zeitgebe, ou fotoarrasto – photoentrainment), o relógio biológico deve detectar reduções nos níveis de luz à medida que a noite se aproxima. Os receptores que percebem essas mudanças na intensidade da luz estão, como não é de surpreender, na camada nuclear externa da retina, comprovado pelo fato de que remover ou cobrir o olho elimina o fotoarrasto. Os detectores na retina não são, no entanto, nem os cones, nem os bastonetes. Essas células que transmitem esse tipo de informação situam-se dentro da camada de células ganglionares das retinas de primatas e de murídeos. Essas células ganglionares especiais contêm um novo fotopigmento denominado melanopsina e são despolarizadas, e não hiperpolarizadas pela luz. A função desses fotorreceptores peculiares é, evidentemente, codificar a luminosidade ambiental e, assim, ajustar o relógio biológico. Os axônios desses neurônios transitam pelo tracto retino-hipotalâmico e projetam-se ao núcleo supraquiasmático (NSQ) do hipotálamo anterior, o sítio do controle circadiano das funções homeostáticas. A ativação do NSQ por essa via evoca respostas no núcleo paraventricular do hipotálamo e, a seguir, ativa neurônios pré- ganglionares simpáticos na zona intermediolateral dos cornos laterais da medula espinhal torácica. Como descrito, esses neurônios pré-ganglionares modulam neurônios nos gânglios cervicais superiores, cujos axônios pós- ganglionares projetam para a glândula pineal (pineal significa com formato de “cone de pinheiro”), na linha média, próxima ao tálamo dorsal. A glândula pineal sintetiza o neuro-hormônio promotor do sono, a melatonina (N-acetil-5-metoxitriptamina), a partir do triptofano. A pineal então secreta na corrente sanguínea a melatonina, a qual modula circuitos no tronco encefálico que influenciam o ciclo sono- vigília. A síntese de melatonina aumenta à medida que a luz ambiental diminui, alcançando o ponto máximo entre 2 e 4 horas da manhã. Nos idosos, a glândula pineal produz menos melatonina, o que talvez explique por que pessoas mais velhas dormem menos à noite e são mais suscetíveis à insônia. A melatonina tem sido utilizada para promover o sono em idosos com insônia e para reduzir os distúrbios do relógio biológico que ocorrem em viagens transmeridianas (jet lag), mas ainda não está claro se essas terapias são de fato efetivas. A maior parte dos pesquisadores do sono considera o núcleo supraquiasmático o “relógio- mestre”. A evidência para essa conclusão é que a remoção do NSQ elimina os ritmos circadianos de sono e vigília em animais experimentais. Além disso, quando células do NSQ são colocadas em uma cultura, apresentam ritmos circadianos característicos. O NSQ também governa outras funções que estão sincronizadas com o ciclo sono-vigília, incluindo temperatura corporal, secreção hormonal (p. ex., o cortisol), pressão sanguínea e produção de urina. Em adultos, a produção de urina é reduzida durante a noite em função de uma redução circadiana na produção do hormônio antidiurético (ADH, também denominado vasopressina). Estágios do sono O ciclo normal de sono e vigília em humanos indica que, em horários específicos, vários sistemas neurais estão sendo ativados enquanto outros estão sendo desativados. No sono, os humanos passam por estágios sucessivos durante mais ou menos a primeira hora de sono. O estado desperto (vigília) com os olhos abertos é caracterizado por atividade de alta frequência (15 a 60 Hz) e baixa amplitude (~30 μV). Esse padrão é denominado atividade beta. A descida para o estágio I do sono não REM caracteriza-se por uma diminuição na frequência (4 a 8 Hz) e aumento na amplitude (50 a 100 μV) do EEG, observando-se as chamadas ondas teta. A descida para o estágio II do sono não REM é caracterizada por oscilações de 10 a 12 Hz (50 a 150 μV), chamadas de fusos, que ocorrem periodicamente e duram poucos segundos. O estágio III do sono não REM é caracterizado por ondas mais lentas, de 2 a 4 Hz (100 a 150 μV). O estágio IV do sono é definido por ondas lentas (também denominadas ondas delta) de 0,5 a 2 Hz (100 a 200 μV). Após alcançar esse nível de sono profundo, a sequência se reverte, e segue-se um período de sono com movimentos rápidos dos olhos, ou sono REM. O sono REM é caracterizado por atividade de baixa voltagem e alta frequência, semelhante à atividade observada no EEG de indivíduos despertos. Inicialmente, durante a “letargia”, o espectro de frequências do eletroencefalograma (EEG) desvia-se para valores mais baixos, e a amplitude das ondas corticais aumenta ligeiramente. Esse período letárgico, denominado estágio I do sono, cede lugar ao estágio II do sono, que se caracteriza por um decréscimo adicional na frequência das ondas do EEG e um aumento de amplitude, juntamente a grupos intermitentes de oscilações de alta frequência, denominados fusos do sono. Os fusos do sono são descargas periódicas de atividade com cerca de 10 a 12 Hz que geralmente duram 1 ou 2 segundose surgem como resultado de interações entre neurônios talâmicos e corticais. No estágio III do sono, que representa um sono de moderado a profundo, o número de fusos diminui, enquanto a amplitude das ondas do EEG aumenta ainda mais, e a frequência continua a diminuir. No nível mais profundo do sono, o estágio IV, também conhecido como sono de ondas lentas, a atividade predominante no EEG consiste em flutuações de muito baixa frequência (0,5 a 2 Hz) e alta amplitude, denominadas ondas delta, as características ondas lentas pelas quais essa fase do sono é designada. (Observe que elas também podem ser entendidas como se refletissem atividade elétrica sincronizada de neurônios corticais.) Toda a sequência de eventos, desde a letargia ao estágio mais profundo, o estágio IV, leva, normalmente, cerca de uma hora. Juntos, esses quatro estágios do sono são denominados sono não REM, isto é, um sono sem movimentos oculares rápidos, e sua característica mais marcante é o sono de ondas lentas (estágio IV). É bem difícil acordar pessoas nesse estágio do sono; assim, considera-se esse o estágio do sono mais profundo. Após um período de sono de ondas lentas, entretanto, registros de EEG mostram que os estágios do sono se alteram para atingir um estágio bem diferente, denominado sono REM ou sono com movimento ocular rápido. No sono REM, os registros de EEG são notavelmente semelhantes aos do estado desperto. Após cerca de 10 minutos de sono REM, o encéfalo normalmente estabelece um ciclo de volta por meio dos estágios de sono não REM. O sono de ondas lentas ocorre normalmente uma vez mais, no segundo período desse ciclo contínuo, mas em geral há apenas dois estágios de ondas lentas durante uma noite. Em média, ocorrem quatro períodos adicionais de sono REM, com durações cada vez maiores. Alterações fisiológicas nos estados do sono Períodos de sono não REM são caracterizados por movimentos lentos e circulares dos olhos e por decréscimos no tônus muscular, nos movimentos corporais, na frequência cardíaca e respiratória, na pressão sanguínea, na taxa metabólica e na temperatura. Todos esses parâmetros atingem seus níveis mais baixos durante o estágio IV do sono. Períodos de sono REM, por sua vez, são caracterizados por aumentos na pressão sanguínea, frequência cardíaca e metabolismo para níveis quase tão altos quanto aqueles observados durante o estado de vigília. Além disso, o sono REM, como o nome implica, caracteriza-se por rápidos movimentos dos olhos de um lado para outro, constrição pupilar, paralisia dos grandes grupos de músculos (embora não do diafragma nem de outros músculos utilizados para a respiração, obviamente) e movimentos espasmódicos de músculos menores nos dedos dos pés e das mãos e no ouvido médio. A ereção espontânea do pênis também ocorre durante o sono REM, um fato clinicamente importante quando se tenta determinar as bases fisiológicas ou psicológicas de um suposto caso de impotência. Apesar de registros de EEG obtidos durante o sono REM e durante a vigília serem semelhantes, as duas condições são claramente estados diferentes do encéfalo. Por um lado, quaisquer percepções que se tenha durante o sono REM são sonhos, um estado peculiar semelhante às alucinações, no sentido de que a experiência dos sonhos não está relacionada a qualquer estímulo sensorial correspondente originado do mundo real. Uma vez que a maioria dos músculos está inativa durante o sono REM, as respostas motoras aos sonhos são relativamente pequenas. (O sonambulismo, que é mais comum em crianças entre 4 e 12 anos, e o ato de falar durante o sono ocorrem, na verdade, durante o sono não REM e em geral não são acompanhados ou motivados por sonhos.) A paralisia física relativa durante o sono REM advém de um aumento na atividade de neurônios GABAérgicos na formação reticular pontina que projetam contatos inibitórios com a circuitaria de neurônios motores da medula espinhal. Da mesma forma, a atividade de projeções descendentes inibitórias que vão da ponte a núcleos da coluna dorsal determina uma diminuição nas respostas a estímulos sensoriais somáticos. Em conjunto, essas observações levaram ao aforismo “o sono não REM é caracterizado por um encéfalo inativo em um corpo ativo, enquanto o sono REM é caracterizado por um encéfalo ativo em um corpo inativo”. CA RA CT ER IS TIC AS Mecanismos Neurais do Sono Sabemos agora que o sono é um processo ativo, que requer a participação de uma variedade de regiões encefálicas. Amplas áreas do córtex são, na verdade, controladas por coleções muito pequenas de neurônios, situadas nas profundezas do encéfalo. Essas células atuam como comutadores ou sintonizadores do prosencéfalo, alterando a excitabilidade cortical e controlando a passagem do fluxo de informação sensorial para ele. Os detalhes desses sistemas de controle são complexos e não totalmente compreendidos. Podemos, porém, resumir alguns princípios básicos. 1. Os neurônios mais críticos para o controle do sono e da vigília fazem parte dos sistemas modulatórios difusos de neurotransmissores. 2. Os neurônios modulatórios do tronco encefálico que usam noradrenalina e serotonina disparam durante a vigília e acentuam o estado acordado; alguns neurônios que usam acetilcolina acentuam eventos críticos do sono REM, e outros neurônios colinérgicos estão ativos no estado de vigília. 3. Os sistemas modulatórios difusos controlam os comportamentos rítmicos do tálamo, os quais, por sua vez, controlam muitos ritmos do EEG do córtex cerebral; os ritmos lentos do tálamo, relacionados ao sono, aparentemente bloqueiam o fluxo da informação sensorial até o córtex. 4. O sono também envolve atividade em ramos descendentes dos sistemas modulatórios difusos, como a inibição dos neurônios motores durante os sonhos. As possíveis funções do sono REM e dos sonhos Uma possível pista para a compreensão das funções do sono REM é a prevalência de sonhos durante esses períodos do ciclo do sono. O momento da ocorrência de sonhos durante o sono foi determinado despertando-se voluntários durante o sono REM e durante o sono não REM e perguntando-lhes se estavam sonhando. Sujeitos despertos durante o sono REM geralmente recordam sonhos elaborados, vívidos e, muitas vezes, emocionais, enquanto sujeitos despertos durante o sono não REM relatam menor quantidade de sonhos, os quais, quando ocorrem, são mais conceituais, menos vívidos e com menor carga de emoções. Os sonhos também podem ocorrer durante o sono não REM leve, próximos ao início do adormecer ou do despertar, e não são, portanto, inteiramente limitados ao período de sono REM. A hipótese mais geral de que o sono seja importante para a consolidação de memórias tem sido apoiada por estudos de memória espacial em roedores e por experimentos em humanos que mostram uma melhora no aprendizado dependente do sono. Outra racionalização bem psicológica acerca dos sonhos é que esse processo “libera” comportamentos pouco usados no estado acordado e raramente expressos. Francis Crick, por exemplo, sugeriu que os sonhos atuam como um mecanismo de remoção de modos “parasíticos” de pensamento que do contrário se tornariam intrusivos, como ocorre nos transtornos envolvendo pensamentos compulsivos. Por fim, alguns especialistas, como Allan Hobson, têm uma visão mais cética de que o conteúdo dos sonhos possa ser “tanto refugo quanto ouro; tanto lixo quanto tesouro cognitivo; tanto ruído informacional quanto sinal de algo”. Essas descobertas parecem dar a entender que podemos seguir sem sono REM, mas dependemos do sono não REM para nossa sobrevivência. Em suma, as questões sobre o porquê de termos sono REM e sonharmos permanecem sem resposta. Ainda assim, a maioria das pessoas, incluindo a maior parte dos pesquisadores do sono, dão algum crédito ao significado dos sonhos como um aspecto importante da fisiologia do sono.Circuitos neurais que regem o sono A partir das descrições sobre as várias alterações fisiológicas que ocorrem durante o sono, fica claro que alterações periódicas excitatórias e inibitórias ocorrem em muitos circuitos neurais. Em 1949 por Horace Magoun e Giuseppe Moruzzi descobriram que a estimulação elétrica de um grupo de neurônios colinérgicos situados próximos à junção entre a ponte e o mesencéfalo determina um estado de vigília e alerta. O nome sistema ativador reticular foi, então, dado a essa região do tronco encefálico. Esse trabalho dá a entender que para estar acordado são precisos circuitos ativadores especiais, ou seja, o estado de vigília não é apenas uma vivência sensória adequada. Mais ou menos na mesma época, o fisiologista suíço Walter Hess, descobriu que a estimulação do tálamo com pulsos de baixa frequência em um gato desperto produzia um sono de ondas lentas. Esses importantes experimentos mostraram que o sono envolve uma interação de padrões entre o tálamo e o córtex. Sabe-se hoje que os movimentos oculares rápidos, análogos aos movimentos sacádicos, que definem o sono REM, surgem porque, na ausência de estímulo visual externo, sinais gerados de forma endógena a partir da formação reticular pontina são transmitidos à região motora do colículo superior. Neurônios coliculares se projetam para a formação reticular paramedialpontina (FRPP) e para o núcleo intersticial rostral, que coordena a precisão temporal e a direção dos movimentos dos olhos. O sono REM é também caracterizado por ondas EEG que se originam na formação reticular pontina e se propagam através do núcleo geniculado lateral do tálamo ao córtex occipital. Essas ondas pontino-genículo-occipitais (PGO) nos fornecem, portanto, um marcador útil do início do sono REM; elas também indicam outra rede neural pela qual os núcleos do tronco encefálico podem ativar o córtex. Todas as atividades na amígdala, no para-hipocampo, no tegmento pontino e no córtex cingulado anterior aumentam no sono REM, enquanto as atividades nos córtices pré-frontal dorsolateral e cingulado posterior estão diminuídas. O aumento da atividade no sistema límbico, juntamente à notável diminuição na influência do córtex frontal durante o sono REM, talvez explique algumas características dos sonhos. acredita-se que um dos componentes- chave do sistema ativador reticular é um grupo de núcleos colinérgicos, próximos à junção ponte-mesencéfalo, que projetam para neurônios talamocorticais. Os neurônios relevantes nesses núcleos caracterizam-se por altas taxas de descargas durante a vigília e no sono REM e por estarem quiescentes durante o sono não REM. Essas características sugerem que a atividade dos neurônios colinérgicos no sistema ativador reticular seja a causa principal da vigília e do sono REM e que sua relativa inatividade seja importante para a produção do sono não REM. A atividade desses neurônios colinérgicos não é, no entanto, a única base celular para a vigília; estão envolvidos também neurônios noradrenérgicos do locus ceruleus, neurônios serotoninérgicos dos núcleos da rafe e neurônios contendo histamina, do núcleo tuberomamilar (NTM) do hipotálamo. A ativação simultânea dessas redes colinérgicas, monoaminérgicas e histaminérgicas é responsável pelo estado de vigília. O locus ceruleus e os núcleos da rafe são modulados pelos neurônios do NTM, localizado próximo à região tuberal, que sintetiza o peptídeo orexina (também denominado hipocretina). A orexina promove a vigília e pode ter aplicações úteis em trabalhos em que os operadores necessitam estar alertas. Por outro lado, anti-histamínicos inibem a rede do NTM contendo histamina, deixando o indivíduo sonolento. Os três circuitos responsáveis pelo estado desperto são inibidos periodicamente por neurônios do núcleo pré-óptico ventrolateral (POVL) do hipotálamo. Assim, a ativação dos neurônios POVL contribui para o início do sono, e lesões dos neurônios do POVL produzem insônia. Como se esse tópico já não estivesse suficientemente complicado, trabalhos recentes sugerem que a modulação adenossinérgica no prosencéfalo basal também esteja envolvida na regulação do sono. Os sistemas colinérgico e monoaminérgico estão, ambos, ativos durante o estado de vigília e inibidos durante o sono não REM. Assim, uma diminuição na atividade dos sistemas monoaminérgicos e colinérgicos leva ao início do sono não REM. No sono REM, os níveis dos neurotransmissores monoaminérgicos e da serotonina diminuem notavelmente, enquanto que os níveis colinérgicos aumentam para próximo dos níveis observados no estado de vigília. Com tantos sistemas e transmissores envolvidos nas diferentes fases do sono, não é surpresa que várias drogas possam influenciar seu ciclo. Núcleos importantes para a regulação do ciclo sono-vigília. (A) Uma variedade de núcleos do tronco encefálico que utilizam diferentes neurotransmissores determina o estado mental em uma série que vai do sono profundo aos mais altos níveis de alerta. Esses núcleos incluem (à esquerda) os núcleos colinérgicos da junção ponte-mesencéfalo e os núcleos da rafe, e (à direita) o locus ceruleus e o núcleo tuberomamilar. Todos eles possuem amplas conexões ascendentes e descendentes com outras regiões (setas), o que explica seus numerosos efeitos. Setas curvas ao longo do perímetro do córtex indicam a inervação de regiões corticais laterais não mostradas no plano da secção. (B) Localização de núcleos hipotalâmicos envolvidos no sono. (C) Ativação do POVL induz o sono. Neurônios que contêm orexina projetam a diferentes núcleos, e sua ativação leva ao estado de alerta. Interações talamocorticais Os efeitos da atividade neuronal (ou sua ausência) nesses núcleos do tronco encefálico são evidentemente alcançados por meio da modulação da ritmicidade das interações entre o tálamo e o córtex. Assim, a atividade de diversos sistemas ascendentes do tronco encefálico diminui tanto as descargas rítmicas de neurônios talamocorticais quanto a atividade sincronizada a elas relacionada dos neurônios corticais. Os neurônios talamocorticais recebem projeções ascendentes do locus ceruleus (noradrenérgicas), dos núcleos da rafe (serotoninérgicas), do sistema ativador reticular (colinérgicas), do NTM (histaminérgicas) e, como seu nome indica, projetam-se a células piramidais corticais. A característica principal dos neurônios talamocorticais é que eles apresentam dois possíveis estados eletrofisiológicos estáveis: um estado oscilatório intrínseco e um estado tonicamente ativo, que é gerado quando os neurônios são despolarizados, como ocorre quando o sistema ativador reticular gera a vigília. No estado de disparos tônicos, os neurônios talamocorticais transmitem ao córtex informações que estão relacionadas com os trens de potenciais em pico (spikes) codificando estímulos periféricos. Por outro lado, quando os neurônios talamocorticais estão disparando de forma oscilatória, os neurônios no tálamo sincronizam-se com aqueles do córtex, “desconectando”, em essência, o córtex do mundo exterior. Durante o sono de ondas lentas, quando registros de EEG exibem as menores frequências e as maiores amplitudes, essa desconexão é máxima. Em suma, o controle do sono e da vigília depende da modulação do tálamo e do córtex pelo tronco encefálico. É essa modulação da alça talamocortical que gera a assinatura eletroencefalográfica da função mental ao longo do contínuo que vai desde o sono profundo até o mais alto nível de alerta. Os principais componentes do sistema modulatório do tronco encefálico são os núcleos colinérgicos da junção ponte-mesencéfalo, as células noradrenérgicas do locus ceruleus na ponte, os núcleos serotoninérgicos da rafe e os neurônios GABAérgicos no POVL.
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