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INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE INSUFICIÊNCIA ADRENAL: PRIMÁRIA E INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE CURSO DE FARMÁCIA INSUFICIÊNCIA ADRENAL: PRIMÁRIA E SECUNDÁRIA José Eduardo Ramos SANTANA DE PARNAÍBA 2016 INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE INSUFICIÊNCIA ADRENAL: PRIMÁRIA E José Eduardo Ramos INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE INSUFICIÊNCIA ADRENAL: PRIMÁRIA E INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE CURSO DE FARMÁCIA INSUFICIÊNCIA ADRENAL: PRIMÁRIA E SECUNDÁRIA José Eduardo Ramos Trabalho de Conclusão apresentado à Universidade Paulista como requisito para obtenção do título bacharel em Farmácia Orientadoras: Prof Petri Soares de Oliveira Daniela da Cunha Souza SANTANA DE PARNAÍBA 2016 INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE INSUFICIÊNCIA ADRENAL: PRIMÁRIA E José Eduardo Ramos Conclusão de Curso Universidade Paulista-UNIP, requisito para obtenção do título de : Profª. Drª. Beatriz Petri Soares de Oliveira e Profª. Drª. da Cunha Souza Patto RESUMO A insuficiência adrenal primária (IAP), também chamada de Doença de Addison (DA), caracteriza-se pela destruição irreversível de 90% ou mais das camadas do córtex das glândulas suprarrenais. As causas da DA podem ser: adrenalites autoimunes, infecções (TB, fúngicas, AIDS), metástases, doenças congênitas e outras. Na DA, há deficiência na produção de ambos os hormônios corticosteróides (glicocorticóides e mineralocorticóides), assim como alta concentração de ACTH no soro, devido à falta do feedback negativo exercido pelo cortisol sobre a adeno-hipófise e o hipotálamo. As consequências para o paciente são a perda renal intensa de sódio (até 20 g por dia) e a hipovolemia, podendo levar ao óbito, caso não se inicie rapidamente o tratamento com reposição de glicocorticóides (hidrocortisona ou outros) e mineralocorticóides (fludrocortisona). A insuficiência adrenal secundária (IAS) inicia-se pela diminuição da secreção do hormônio adrenocorticotrópico (ACTH) pelas células corticotróficas da adeno- hipófise. Na insuficiência adrenal secundária (IAS), devido aos baixos níveis do ACTH produzido pela hipófise, a produção de glicocorticóides e androgênios pelas zonas internas do córtex adrenal também diminui. Como a camada glomerular permanece funcional, não há deficiência de mineralocorticóides. As causas podem ser quaisquer distúrbios que afetem a hipófise e/ou o hipotálamo sendo a mais comum a retirada abrupta da administração de doses supra-fisiológicas de glicocorticóides para doenças crônicas em tratamentos prolongados (acima de 3 semanas). Neste caso, o eixo hipotalâmico-hipofisário-adrenal (HHA) pode demorar de vários meses até mais de 1 ano para retornar ao padrão normal de secreção dos hormônios CRH, ACTH e cortisol. O tratamento consiste na reposição com glicocorticóides sintéticos. Essa reposição é essencial nos tratamentos, tanto da IAP, como da IAS, porém não consegue simular o ritmo fisiológico da secreção do cortisol endógeno. Quando há excesso de reposição, os pacientes podem desenvolver intolerância à glicose, obesidade, osteoporose ou outras patologias. Quando há baixa reposição, podem sobrevir astenia, indisposição, mal-estar geral e risco de morte por doenças intercorrentes. Palavras-chave: suprarrenal, insuficiência adrenal, ACTH, cortisol 3 INTRODUÇÃO A importância clínica das glândulas suprarrenais foi percebida pela primeira vez por Thomas Addison, em meados do século 19, que descreveu diversos casos fatais de pacientes após a destruição das mesmas. Logo após, Brown-Séquard demonstrou que a suprarrenalectomia bilateral levava à morte animais de laboratório, sendo, em seguida, nestes experimentos, constatado ser o córtex suprarrenal, mais que a medula, essencial à sobrevivência e responsável por regular o metabolismo de carboidratos e o equilíbrio hidroeletrolítico. O isolamento de corticosteróides que regulam o metabolismo dos carboidratos, chamados de glicocorticóides, e da aldosterona, chamada de mineralocorticóide, por regular o equilíbrio hidroeletrolítico, levou ao conceito de que o córtex adrenal é constituído por duas unidades: uma zona externa, que produz mineralocorticóides, e uma interna, que sintetiza glicocorticóides e androgênios de baixa potência (SCHIMMER, B. P. e PARKER, K. L. , 2005). Após a purificação e determinação da estrutura química do hormônio adrenocorticotrópico (ACTH), também chamado corticotropina, demonstrou-se que esse hormônio é essencial à integridade estrutural e à capacidade esteroidogênica das zonas corticais internas ( SCHIMMER, B. P. e PARKER, K. L. , 2005). A insuficiência adrenal (IA) pode resultar de condições que afetam o córtex adrenal, sendo, nesse caso, chamada de insuficiência adrenal primária (IAP) ou Doença de Addison (DA), ou de condições que diminuem a secreção do hormônio adrenocorticotrópico (ACTH) pela adeno-hipófise, sendo chamada de insuficiência adrenal secundária (IAS), ou de condições que alterem a secreção do hormônio liberador de corticotropina (CRH) pelo hipotálamo, sendo, nesse último caso, chamada de insuficiência adrenal terciária (IAT) (NOVOA, P. M. et al, 2014). A IAP ou DA resulta de doenças que determinam a destruição de 90% ou mais do córtex adrenal com prevalência da ordem de 40 a 140 casos por milhão de habitantes, sendo, hoje, três vezes maior que na década de 1970, com predominância no sexo feminino na proporção de 2,6: 1 ( KATER, C. E. et al, 2013). A principal causa da destruição do córtex adrenal até os anos 1920 era a infecção tuberculosa. A partir de 1950, a maior parte dos casos, cerca de 80%, são 4 devidos às adrenalites autoimunes isoladamente ou às síndromes poliglandulares autoimunes (NOVOA, P. M. et al, 2014). A IAS tem como causas adquiridas mais comuns o uso crônico de glicocorticóides em doses suprafisiológicas, o que causa inibição direta da secreção de ACTH e de CRH. Os sintomas surgem após interrupção abrupta da tomada de glicocorticóides. Pode também resultar de traumatismo craniano, necrose hipofisária pós-parto (síndrome de Sheehan), apoplexia hipofisária, cirurgia, radioterapia, anorexia nervosa, tumores no terceiro ventrículo ou outra patologia tumoral, infecciosa ou infiltrativa, que envolva a hipófise ou o hipotálamo, havendo, nesses casos, deficiência de outros hormônios hipofisários associados à deficiência da secreção de ACTH ( KATER, C. E. et al, 2013). A prevalência da IAS é estimada em 150 a 280 casos por milhão de pessoas ( NOVOA, P. M. et al, 2014). O objetivo deste trabalho é o estudo da insuficiência adrenal primária e secundária, tratamentos e medicamentos utilizados. FISIOLOGIA DA HIPÓFISE E HIPOTÁLAMO A hipófise é uma glândula situada na base do cérebro, onde repousa em uma depressão em forma de sela do osso esfenóide, chamada sela turca ou sela túrcica, com peso entre 0,5 a 1,0 g e diâmetro em torno de 1 cm (tamanho aproximado de uma ervilha). Está ligada ao hipotálamo pelo pedúnculo hipofisário ( uma pequena "haste" em forma de funil) sendo constituída de dois tipos de tecidos, tecido neural e tecido epitelial, que formam, praticamente, duas glândulas diferentes em uma mesma estrutura. A adeno-hipófise contém 5 tipos de células : (1) tireotrofos, que produzem a tireotropina (TSH), (2) corticotrofos, que secretam a corticotrofina (ACTH), (3) gonadotrofos que produzem as gonadotrofinas (LH e FSH), (4) somatotrofos que produzem o hormônio do crescimento (GH) e (5) lactotrofos que secretam a prolactina. (PORTH, C. M. e MATFIN, G., 2010; GUYTON, A.C. e HALL, J.E, 1997). O quadro 1 mostra os hormônios ou fatores de liberação hipotalâmicos, os hormônios hipofisários correspondentes e as glândulas ou tecidos alvos.5 Quadro 1: Hormônios hipotalâmicos e hipofisários Hormônios hipotalâmicos Hormônios hipofisários Glândulas ou tecidos TRH - hormônio de liberação do hormônio tireo-estimulante ) TSH ( tireotropina ou hormônio tireo-estimulante) Tireóide (T3 e T4) CRH - O hormônio de liberação da corticotropina ACTH (corticotropina ou hormônio adrenocorticotrópico) Suprarrenais (Cortisol) GHRH - O hormônio de liberação do hormônio do crescimento GHIH - O hormônio de inibição do hormônio do crescimento, idêntico ao hormônio somatostatina GH (hormônio do crescimento) Ossos e cartilagens Órgãos corporais Músculos (Ação das IGFs) GnRH - O hormônio de liberação das gonadotropinas que causa a liberação dos dois hormônios gonadotrópicos LH (hormônio luteinizante) e FSH ( hormônio folículo- estimulante) Ovários (estrogênio e progesterona ) Testículos (testosterona) PIF - o fator de inibição da prolactina PRL (prolactina ) Glândulas mamárias Fonte: Elaborado a partir de: Tratado de Fisiologia Médica 9ª ed (GUYTON, A.C. e HALL, J.E, 1997) Figura 1: esquema representativo da hipófise e hipotálamo Fonte : PORTH, C. M. e MATFIN, G.: FISIOPATOLOGIA, 8ª ed. 6 FISIOLOGIA DAS GLÂNDULAS SUPRA-RENAIS As glândulas suprarrenais são estruturas bilaterais, localizadas na região retroperitoneal , nos pólos superiores de ambos os rins, pesando, cada uma, cerca de 5 gramas (PORTH, C. M. e MATFIN, G., 2010). A glândula suprarrenal é constituída por duas camadas principais, a externa, chamada de córtex ("casca") e a interna, chamada de medula. A medula suprarrenal, que corresponde de 10 a 20% da glândula, secreta os hormônios epinefrina e norepinefrina, quando estimulada pelo sistema nervoso simpático. O córtex suprarrenal, que constitui a maior parte da glândula, secreta os hormônios corticosteróides (mineralocorticóides e glicocorticóides) e os hormônios androgênicos. A camada cortical delgada mais externa, a zona glomerular, secreta os mineralocorticóides, e as duas camadas corticais internas, a zona fasciculada e a zona reticular, secretam glicocorticóides e androgênios. Os hormônios corticosteróides mineralocorticóides agem sobre os eletrólitos dos líquidos extracelulares, principalmente o sódio e o potássio. Os hormônios corticosteróides glicocorticóides atuam sobre o metabolismo dos carboidratos, elevando a glicemia, e também sobre o metabolismo de proteínas e lipídios . (PORTH, C. M. e MATFIN, G., 2010; GUYTON, A.C. e HALL, J.E, 1997). Figura 2: Esquema mostrando as camadas da glândula suprarrenal Fonte: http://droualb.faculty.mjc.edu/ 7 Figura 3: Esquema das etapas da síntese dos três esteróides supra-renais fundamentais. ZONA GLOMERULAR COLESTEROL PREGNENOLONA PROGESTERONA 11 - DESOXICORTICOSTERONA CORTICOSTERONA + Angiotensina II ALDOSTERONA ZONA FASCICULADA COLESTEROL PREGNENOLONA PROGESTERONA 17- HIDROXIPROGESTERONA 11- DESOXICORTISOL CORTISOL ZONA RETICULAR COLESTEROL PREGNENOLONA 17-HIDROXIPREGNENOLONA DEHIDROEPIANDROSTERONA (DHEA) ANDROESTEDIONA (ANDROSTENEDIONA) Fonte: Adaptado de: FISIOLOGIA: BERNE & LEVY 6ª ed. e FISIOLOGIA: CONSTANZO, L. S. , 6ª ed.. Praticamente todas as etapas mostradas na figura 3 ocorrem nas mitocôndrias e no retículo endoplasmático das células corticais. No quadro 1 estão relacionadas, resumidamente, as patologias mais comuns que afetam as glândulas suprarrenais. Colesterol desmolase 3β-hidroxiesteroide desidrogenase 21β-hidroxilase 11β-hidroxilase Aldosterona sintase Colesterol desmolase 3β-hidroxiesteroide desidrogenase 17α-hidroxilase 21β-hidroxilase 11β-hidroxilase Colesterol desmolase 17α-hidroxilase 17,20 - liase 3β-hidroxiesteroide desidrogenase 17,20 - liase 8 Quadro 2: Fisiopatologia do córtex suprarrenal Distúrbio Características Clínicas Níveis ACTH Tratamento Doença de Addison - Insuficiência adrenal primária Hipoglicemia Anorexia, Náuseas Vômitos,Perda de peso Hipotensão Hiperpotassemia Acidose metabólica Diminuição de pelos púbicos e axilares em mulheres Hiperpigmentação Aumentados (devido à falta de feedback negativo pelo cortisol) Reposição de glicocorticóide e mineralocorticóide Insuficiência adrenal secundária Mal-estar geral, fraqueza, fadiga, anorexia, perda de peso, náuseas, vômitos, dor abdominal e diarréia que se alterna com prisão de ventre Diminuídos ou normais Reposição de glicocorticóide Síndrome de Cushing Hiperglicemia Consumo muscular Obesidade central Face arredondada Gordura supraclavicular Osteoporose, Estrias Virilização e distúrbios menstruais em mulheres Hipertensão Diminuídos (efeito do feedback negativo pelo aumento do cortisol) Cetoconazol Metirapona Doença de Cushing (excesso de ACTH) Iguais às da Síndrome de Cushing Aumentados Remoção cirúrgica do tumor secretor de ACTH Síndrome de Conn (tumor secretor de aldosterona) Hipertensão Hipopotassemia Alcalose metabólica Diminuição da renina Espironolactona (antagonista da aldosterona) Remoção cirúrgica do tumor secretor de aldosterona Deficiência de 21β- hidroxilase (causa diminuição da secreção de glicocorticóides e mineralocorticóides e aumento dos androgênios suprarrenais) Virilização nas mulheres Aceleração no crescimento linear Aparecimento precoce de pelos pubianos e axilares Sintomas da deficiência dos glicocortcóides e mineralocorticóides Aumentados (diminuição do feedback negativo pelo cortisol) Reposição de glicocorticóide e mineralocorticóides Deficiência de 17α- hidroxilase (causa dminuição de androgênios e glicocorticóides; causa diminuição de mineralocorticóides) Ausência de pelos pubianos e axilares nas mulheres Sintomas da deficiência de glicocorticóides Sintomas de excesso de mineralocorticóides Aumentados (diminuição do feedback negativo pelo cortisol) Reposição de glicocorticóides Administrar antagonista da aldosterona Fonte : Adaptado de FISIOLOGIA, 6ª EDIÇÃO (CONSTANZO, L. S., 2015) 9 INSUFICIÊNCIA ADRENAL PRIMÁRIA Conhecida como "Doença de Addison," são muitas as causas para essa patologia. Quando Thomas Addison a descreveu pela primeira vez, em 1855, a causa mais comum era a destruição do córtex adrenaldevido à tuberculose. É uma patologia relativamente rara, com sintomas encontrados em diversas outras condições, como infecções virais, fadiga crônica, depressão e outras , cujo diagnóstico acontece, geralmente, entre a terceira e a quinta décadas de vida. Na DA todas as camadas do córtex suprarrenal são destruídas e, independentemente da causa, isso conduz a uma falha na produção de quantidades adequadas de cortisol e aldosterona. A morbidade e a mortalidade são extremamente altas, se não tratada. Também é perdida a secreção de andrógenos adrenais (por exemplo, DHEA). (RAFF, H. et al, 2014 e PORTH, C. M. e MATFIN, G., 2010; KATER, C. E. et al, 2013). Em adultos, a DA causada pela destruição autoimune das células do córtex adrenal pode se apresentar de forma isolada ou associada a outras endocrinopatias, caracterizando as síndromes poliglandulares autoimunes (SPAs). Na SPA-1, a DA é vista em 60 a 100% dos casos, geralmente após a candidíase crônica e o hipoparatireoidismo. A SPA do tipo 2 (SPA-2) está sempre associada à DA. A (SPA-4) é rara, caracteriza-se pela combinação de doenças autoimunes associadas ao hipogonadismo, gastrite atrófica, anemia perniciosa, vitiligo, hipofisite, doença celíaca, miatenia gravis, etc. A SPA-3 não causa insuficiência adrenal primária (SILVA, R. C. et al, 2004; KATER, C. E. et al, 2013). Cerca de 40% dos pacientes com DA autoimune apresentam outras doenças autoimunes associadas na seguinte ordem de frequência: tireoidite de Hashimoto (em 3,7 a 32% dos casos), doença de Graves (em 2 a 22,7%), gastrite crônica atrófica (25%), diabetes mellitus tipo 1 (1,2 a 20,4%), hipoparatireoidismo (1,2 a 20%), hipogonadismo hipergonadotrófico (4,5 a 17,6%), vitiligo (0,8 a 16%), alopécia (0,8 a 12%), doença celíaca (1,2 a 8%), anemia perniciosa (0,8 a 6%), esclerose múltipla (3,7%), doenças inflamatórias intestinais (2,4%), síndrome de Sjögren (2,4%), hepatite crônica (1,6 a 3%) e hipofisite linfocítica (0,8%). Além disso, de 4% a 17% dos pacientes com DA autoimune isolada apresentam autoimunidade contra outros órgãos (SILVA, R. C. et al, 2004). 10 Quadro 3: Síndromes poliglandulares autoimunes (SPA). SPA COMPONENTES TIPO 1 Candidíase crônica / hipoparatireoidismo / DA / (pelo menos dois presentes) TIPO 2 DA + doença tireoideana auto-imune e/ou diabetes mellitus do tipo 1 (DA deve estar sempre presente) TIPO 3 Doença tireoideana auto-imune + outra doença auto-imune (excluindo DA, hipoparatireoidismo e candidíase) TIPO 4 Duas ou mais doenças auto-imunes órgão específicas, incluindo DA (mas que não se incluem nas síndromes dos tipos 1, 2 ou 3) Fonte: Insuficiência Adrenal Primária no Adulto: 150 anos depois de Addison (SILVA, R. C. et al, 2004) INSUFICIÊNCIA ADRENAL SECUNDÁRIA A insuficiência adrenal secundária é definida como a secreção diminuída de cortisol devida a uma perda de entrada normal de ACTH no córtex adrenal. Isso pode estar associado com uma diminuição na função de todas as células produtoras de hormônios da hipófise anterior (hipopituitarismo ou pan-hipopituitarismo) ou pode ser devido à deficiência de ACTH isolado. A deficiência de ACTH por longos períodos de tempo resulta em atrofia adrenocortical. No entanto, é importante salientar que é tipicamente apenas a perda da função adrenocortical ACTH- dependente (cortisol e androgênios). A zona glomerular - a fonte de aldosterona - geralmente não é afetada na insuficiência adrenal secundária porque o sistema renina-angiotensina permanece intacto. (RAFF, H. et al, 2014). Insuficiência adrenal iatrogênica A retirada abrupta de corticoterapia prolongada ou em altas doses leva à supressão do eixo HHA e, consequentemente, à insuficiência adrenal secundária. Isso ocorre devido à supressão da produção, parcial ou total, de cortisol, pelas suprarrenais, como resultado da atrofia da camada fasciculada. Existe grande variabilidade individual quanto à susceptibilidade para supressão do eixo HHA, após uso exógeno de corticóides. Portanto, os pacientes devem ser lentamente retirados 11 de terapias crônicas por glicocorticóides. Tanto o ACTH como o cortisol plasmático estão suprimidos quando o desmame é iniciado. Como a dose da terapia de glicocorticóides é decrescente, a unidade hipotálamo-hipófise começa a se recuperar , o ACTH no plasma começa a aumentar e inicia o processo de "acordar" o córtex adrenal atrofiado. Quando o ACTH no plasma ultrapassa o intervalo de referência, isto conduz a uma recuperação completa do eixo em cerca de um ano depois do início do processo de desmame. A duração deste processo é muito variável, mas provavelmente se correlaciona com a dose e o tempo durante o qual o paciente tenha recebido a terapia de glicocorticóides (ALVES, C. et al, 2008 ; RAFF, H. et al, 2014). A corticoterapia utilizada em uma grande superfície corpórea e também os corticóides intranasais em altas doses ou por tempo prolongado podem causar supressão do eixo HHA (ALVES, C. et al, 2008). Alguns estudos têm mostrado o desenvolvimento de insuficiência adrenal em crianças que utilizam medicamentos corticosteróides inalados. Em um recente revisão de casos de 163 crianças, com idade de 9 anos ou mais, admitidas com asma intratável no Hospital Nacional Judaico, em Denver, nos EUA, Covar e colegas encontraram que, mesmo na metade das crianças, que já não estavam em uso de corticóides sistêmicos regulares, mas estavam usando altas doses de corticóides inalados (ICS), houve uma alta prevalência de efeitos corticosteróides secundários, incluindo hipertensão, padrões cushincóides, supressão adrenal, miopatias, osteopenia, supressão do crescimento, obesidade, hipercolesterolemia e catarata (PATEL, L. et al, 2001). CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS DA INSUFICIÊNCIA ADRENAL Os aspectos clínicos da insuficiência adrenal dependem da extensão da perda da função suprarrenal e se a produção de mineralocorticóides está preservada. O início geralmente é gradual e a condição pode permanecer sem diagnóstico até que uma doença ou estresse precipite uma crise adrenal. Na IAP ou DA, a deficiência mineralocorticóide leva às características distintivas de insuficiência adrenal primária relacionada à deficiência de aldosterona: hiponatremia, hipovolemia, tontura postural, hipotensão / hipotensão ortostática, 12 desidratação e hipercalemia, avidez por sal , às vezes com a ingestão maciça de sal ou alimentos salgados, como picles e carne seca. Hiperpigmentação, também é uma característica distintiva da insuficiência adrenal primária crônica e está presente em quase todos os pacientes como resultado do aumento da produção de pró- opiomelanocortina, um pró-hormônio que é clivado para ACTH, e do hormônio estimulante de melanócito (MSH). Na insuficiência adrenal primária e na síndrome de Cushing, a hiperpigmentação resultante é mais proeminente em áreas expostas à luz (face, pescoço e dorso das mãos), em áreas expostas ao atrito (cotovelos, joelhos, punhos e cintura), e vincos palmares. Pigmentação da mucosa bucal, do mamilo, vaginal e anal podem também acontecer (RAFF, H. et al, 2014). As características clínicas da insuficiência adrenal secundária ou terciária são semelhantes aos da insuficiência adrenal primária com algumas exceções. Hiperpigmentação não está presente, pois os níveis de ACTH não estão aumentados. Hipercalemia e desidratação não ocorrem e a hipotensão é menos proeminente porque o sistema renina-angiotensina-aldosterona está intacto. Os sintomas mais comuns estão relacionados com a insuficiência de glicocorticóides e incluem mal-estar geral, fraqueza, fadiga, anorexia, perda de peso, náuseas, vômitos, dor abdominal e diarréia que se alterna com prisão de ventre. A hiponatremia e retenção de água podem ocorrer relacionadas com uma secreção ou ação inadequadas da vasopressina devido à deficiência decortisol. As manifestações clínicas de uma lesão hipotalâmica ou hipofisária, tais como deficiência de outros hormônios hipofisários, dores de cabeça ou déficits visuais podem estar presentes (RAFF, H. et al, 2014). DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DA INSUFICIÊNCIA ADRENAL As conseqüências da falta do diagnóstico são tão grandes, nos casos de insuficiência adrenal, que é preciso apenas um pequeno índice de suspeita para levar a uma maior investigação destas desordens. O teste clínico tem de ser relativamente fácil de executar e ter uma taxa de falsos negativos muito baixa. A compreensão da fisiologia do córtex adrenal é de grande ajuda na compreensão dos resultados. Ao contrário do excesso de cortisol, que pode ser detectado através de uma dosagem noturna no soro ou numa amostra de saliva, a falta de secreção de 13 cortisol é muito difícil de avaliar em pacientes ambulatoriais. A variabilidade dos níveis de cortisol pela manhã em indivíduos saudáveis torna a medição do cortisol basal plasmático ou salivar sub-ótimos para a detecção de insuficiência adrenal. Assim, é rotina usar o ACTH sintético (cosintropina, Synacthen®) como teste de estimulação para avaliar pacientes para a deficiência de cortisol (RAFF, H. et al, 2014). Os principais exames e testes para o diagnóstico das insuficiências adrenais crônicas estão no quadro 4. Quadro 4: Exames e testes para diagnóstico de IAS e IAP Exame ou teste Procedimentos Valores do cortisol indicativos de IAS e IAP Valores do cortisol que excluem IAS e IAP Valor do ACTH indicativo de IAP Dosagem do cortisol sérico basal Coleta entre 8 e 9 h da manhã = < 3 µg/dL >=20 µg/dL Dosagem do ACTH plasmático basal Coleta entre 8 e 9 h da manhã >= 100pg/mL Teste da estimulacão rápida com ACTH (teste da Cortrosina ® ou Synacthen®) Realizar após coleta para os exames anteriores. Aplicação E.V. de 250 µg de ACTH humano sintético (tetrasoctida ou cosintropina, Cortrosina® ou Synacthen®) 30 minutos após injeção = < 3 µg/dL 30 minutos após injeção >= 20 µg/dL Teste de tolerância à insulina (ITT) Aplicação de insulina regular E.V. (0,05 UI/Kg) Incremento no cortisol < 8 µg/ dL Pico > 18 a 20 µg/dL Fonte: Endocrinologia Clínica, Lúcio Vilar, 5ª ed. 14 Teste de estimulação do ACTH A lógica por trás do teste de estimulação do ACTH na insuficiência adrenal primária é intuitivamente óbvio. No entanto, por que a resposta adrenal ao ACTH deveria estar reduzida na insuficiência adrenal secundária ? Porque a privação do córtex suprarrenal de estimulação de ACTH endógeno conduz à atrofia adrenocortical, de forma que quando estimulado com uma dose farmacológica de ACTH, a resposta será subnormal. Portanto, o teste de estimulação de ACTH é útil para identificação, tanto para insuficiência suprarrenal primária quanto para insuficiência adrenal secundária estabelecida. O teste pode não ser anormal em insuficiência adrenal secundária de início recente porque é preciso tempo para a adrenal atrofiar e perder a sensibilidade a uma dose farmacológica de ACTH (RAFF, H. et al, 2014). Hipoglicemia induzida por insulina (teste de tolerância à insulina - ITT) O ITT consiste na dosagem do cortisol sérico (CS) basal e 30 e 60 minutos após a a administracão por via intravenosa de insulina regular (0,05UI/kg). Esse teste baseia-se na capacidade de a hipoglicemia induzir uma resposta de estresse do sistema nervoso central (SNC) e aumentar a liberação do CRH e, conseqüentemente, a secreção de ACTH e cortisol. A resposta normal do CS é um incremento maior que 8 µg/dL e um pico maior que 18 a 20 µg/dL. Esses valores descartam insuficiência adrenal e baixa reserva hipofisária; contudo, é necessário que a glicemia caia para menos de 40 mg/dL para que haja uma interpretação adequada do teste. O principal temor é o desencadeamento de uma hipoglicemia grave. Caso surjam sintomas ou sinais neurológicos graves, particularmente convulsões, duas a três ampolas de glicose a 50% devem ser administradas por via intravenosa de imediato. Pacientes idosos, doença cardiovascular ou cerebrovascular ou doenças que cursem com convulsões são contra-indicações ao ITT. Para esses pacientes, deve-se optar pelo teste de estimulo com metirapona (não disponível no Brasil), glucagon ou CRH ( KATER, C. E. et al, 2013). 15 O TRATAMENTO DA INSUFICIÊNCIA ADRENAL O objetivo do tratamento das IAs é restaurar o nível do cortisol sérico por meio da administração de glicocorticóides sintéticos. Como o cortisol é normalmente secretado num ritmo circadiano, é mais comum administrar o cortisol (hidrocortisona) por via oral procurando ajustar as doses a esse padrão. Por exemplo, os pacientes podem tomar 10 mg de hidrocortisona ao acordar e 5 mg à tarde . Uma cápsula de liberação programada de hidrocortisona tem sido desenvolvida que pode ser administrada ao deitar e começa a libertar hidrocortisona algumas horas antes de acordar . Esta preparação está atualmente disponível na Europa como Plenadren®, e outra como Chronocort®, está em ensaios clínicos nos Estados Unidos. O aumento do custo dessas preparações provavelmente irá diminuir a sua utilização generalizada (GROSSMAN, A. et al, 2013; RAFF, H. et al, 2014). É necessária a substituição da aldosterona endógena em insuficiência adrenal primária. Pílulas de aldosterona não estão disponíveis. Em vez disso, o agonista de mineralocorticóide 9-αfluorocortisol (fludrocortisona) é utilizado. Pacientes com insuficiência adrenal secundária, normalmente, não necessitam de substituição de mineralocorticóide (de novo, porque o sistema renina-angiotensina- aldosterona está intacto) (RAFF, H. et al, 2014). O desafio dos tratamentos convencionais é o ajuste da reposição de glicocorticóides de acordo com a necessidade de cada paciente. A dose de manutenção diária é essencial, assim como as doses extras para prevenir crises adrenais durante o aparecimento de doenças ou nas atividades mais estressantes (como exercícios intensos por exemplo). O objetivo do tratamento da insuficiência adrenal é utilizar a menor dose glicocorticóide possível que alivia os sintomas, evitando o excesso. (GROSSMAN, A. et al, 2013). Glicocorticóides de ação prolongada, como a prednisona ou dexametasona, são mais susceptíveis de serem associadas com o aumento da perda óssea e não são os agentes preferidos para a substituição (RAFF, H. et al, 2014). A adequação da reposição mineralocorticóide pode ser avaliada pela monitorização da pressão arterial e eletrólitos. Tontura postural, a avidez por sal, hipotensão ortostática, hiponatremia e hipercalemia refletem sub-reposição. Cansaço e lassitude, sem clara hipotensão, também podem refletir sub-reposição, e 16 a adequação da dose de mineralocorticóides deve ser avaliada antes de aumentar a dose de glicocorticóides. Medição da atividade da renina no plasma também pode ser útil, especialmente em pacientes recentemente diagnosticados até que estejam com uma dose estável de fludrocortisona, com o objetivo de manter os níveis dentro da faixa normal superior. É importante notar que a substituição de mineralocorticóides pode precisar ser aumentada em estações mais quentes ou quando a temperatura ambiente estiver mais alta (no verão, por exemplo), devido ao aumento da perda de sal na transpiração. Isto deve ser acompanhado por ingestão de sal liberada, especialmente quando o paciente está se exercitando. Hipertensão arterial, edema, e hipocalemia podem ser sinais de sobre-reposição mineralocorticóide. Se a hipertensão se desenvolve, a dose de fludrocortisona pode ser reduzida gradualmente com monitorização cuidadosa dos eletrólitos, mas nunca pode ser completamente retirada (RAFF, H. et al, 2014). CONCLUSÃO O tratamentoda insuficiência adrenal primária pela administração de glicocorticóides e mineralocorticóides parece ser a única opção terapêutica para os pacientes com DA , pois quase todo o córtex suprarrenal já se encontra afetado de forma irreversível. No tratamento da insuficiência adrenal secundária, entretanto, existe a possibilidade da glândula suprarrenal voltar a secretar cortisol e androgênios , em níveis fisiológicos, mesmo que após 1 ano ou mais de estímulo pelo aumento do ACTH. O paciente com IAS também não pode prescindir da reposição hormonal pois ficaria exposto, tanto pela necessidade do aumento de cortisol em situações estressantes para o organismo como por reativação da doença crônica tratada. Nenhum tratamento convencional com glicocorticóides sintéticos consegue simular precisamente o ritmo fisiológico da secreção do cortisol endógeno. Excesso de reposição pode levar à intolerância à glicose, obesidade, osteoporose, baixa resistência a infecções, adelgaçamento da pele e outras. Quando há baixa reposição, podem sobrevir astenia, indisposição, mal-estar geral e risco de morte por doenças intercorrentes. 17 BIBLIOGRAFIA ALVES, C., ROBAZZI, T. C. 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