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Sumário: I Psicologia Humanista 1.1 Histórico 1.2 Principais Influências e Adesões 1.2.1 Teorias Neo-Psicanalíticas 1.2.2 Gestaltistas e Holistas 1.2.3 Psicologias Existenciais 1.2.3 Outras Influências 1.3 A questôes da contracultura II Características 2.1 Temática Privilegiada 2.2 Visão do Homem 2.3 Modelo de Ciência 2.4 Métodos e Técnicas III Aspectos Humanistas, Existenciais e Fenomenológicos Presentes na Abordagem Centrada na Pessoa 3.1 ACP e Psicologia Humanista-existencias Norte-Americana 3.2 Aspectos Fenomenológicos presentes na ACP IV Alteridade e Psicologia Humanista: Uma leitura ética da abordagem centrada na pessoa 4.1 Abordagem na pessoa como teoria 4.2 Alteridade Radical 4.3 Do lugar do outro na ACP 4.4 O Des-centramento da ACP V Psicologia Humanista: A história de um dilema epistemológico 5.1 Pressupostos Filosóficos da Ciência Moderna 5.2 A imagem humanista do objetivo da Psicologia 5.3 O dilema da Psicologia Humanista 5.4 Que concepção epistemológica então? 5.5 Que métodos então? 5.6 Psicologia Humanista Contemporânea: Rychlak e a forma atual do dilema VI Psicologia Humanista no Brasil 6.1 Humanismo Ideal 6.2 Humanismo Romântico 6.3 Humanismo Individual 6.4 Humanismo Social 6.5 Humanismo Crítico 6.6 Existencialismo 6.7 Fenomenologia 6.8 Fenomenologia Existência 6.9 Abordagem Centrada na Pessoa 6.10 Fenomenologia e Psicologia 6.11 Gestalt-terapia 6.12 Logoterapia A PSICOLOGIA HUMANISTA 1. HISTÓRICO O Nascimento da Psicologia Humanista A Psicologia Humanista, conforme historiado por DeCarvalho (1990), surgiu no final da década de 50 e início dos anos 60 como uma reação ao panorama da Psicologia norte-americana, dominado, na leitura dos psicólogos humanistas, por duas grandes forças: o Behaviorismo e a Psicanálise clássica. Foi sobretudo graças ao trabalho de dois homens, Abraham Maslow e Anthony Sutich, que o Movimento Humanista pode ser articulado, organizado e institucionalmente fundado como a Terceira Força da Psicologia. No início da década de 50, Maslow era um promissor psicólogo experimental e professor de Psicologia na Universidade de Brandeis, mas seus interesses pouco ortodoxos e pouco afinados à forte predominância do Behaviorismo no ambiente acadêmico de então, apenas confrontado pela influência da Psicanálise nos meios clínicos, tendiam a levá-lo ao isolamento profissional e intelectual. Era-lhe inclusive difícil arranjar veículo adequado para publicar seus artigos, que não encontravam ressonância na linha editorial e teórica adotada pela maior parte das revistas técnicas de Psicologia. Como forma de contornar o problema, em meados dos anos 50 organizou uma lista de nomes e endereços de psicólogos e grupos envolvidos em visões menos ortodoxas e mais afinados com suas próprias idéias, para com eles manter intercâmbio de artigos e discussões, na forma de uma rede de correspondência, a que chamou Rede Eupsiquiana, ressaltando no título o interesse pelo tema da saúde psicológica, negligenciado, segundo Maslow, pela Psicanálise e pelo Behaviorismo. Anthony Sutich, psicólogo que conhecera Maslow no final dos anos 40 e que nos anos 50 tornara-se ativo participante da rede e intenso colaborador na discussão das novas idéias, veio a ter fundamental papel na oficialização do novo movimento. De suas discussões com Maslow nasceu a percepção de que já era a hora, ao final dos anos 50, de fundarem uma revista própria, sendo que Sutich foi encarregado de encabeçar o empreendimento. Portador de paralisia decorrente de artrite progressiva, Sutich dedicou-se intensamente à tarefa de articulação e organização, passando horas ao telefone contatando interessados e colaboradores. Após considerável deliberação sobre o nome da nova revista - foram sugeridos Ser e Tornar-se, Crescimento Psicológico, Desenvolvimento da Personalidade, Terceira Força, Psicologia do Self, Existência, e Orto-Psicologia - foi adotado o título Revista de Psicologia Humanista, sugerido por S. Cohen, e que desde então passou a designar o movimento, oficialmente lançado com o primeiro número da revista, em 1961. O sucesso da revista acabou levando à organização da Associação Americana de Psicologia Humanista, fundada em 1963, consolidando-se o movimento de forma definitiva em 1964 quando, em uma conferência realizada na cidade de Old Saybrook, compareceram em aberta adesão grandes nomes inspiradores do movimento, inclusive Carl Rogers. Com sua rápida e sólida difusão a Psicologia Humanista se mostra hoje uma Força firmemente estabelecida e respeitada no panorama da Psicologia mundial, generalizadamente reconhecida nos campos teórico, acadêmico e de aplicação. Principais Influências e Adesões Ao contrário das Forças anteriores, a Psicologia Humanista não se identifica ou inicia com o pensamento de um determinado autor ou escola. Tratando-se primariamente de um movimento congregador de diversas tendências, unidas pela oposição ao Behaviorismo e Psicanálise, assim como pela convergência em torno de algumas propostas comuns, várias afluências, adesões e influências podem ser apontadas, destacando-se as que se seguem: TEORIAS NEO-PSICANALÍTICAS A crítica que a Psicologia Humanista faz à Psicanálise, centra-se sobretudo na visão pessimista, determinista e psicopatologizante, que atribui à teoria de Freud, assim como na impessoalidade da técnica transferencial. Já algumas teorias de discípulos dissidentes de Freud são vistas com bons olhos, citadas como coerentes e importantes influências em relação ao trabalho de destacados humanistas. São vistas com simpatia as teorias de Adler, Rank, Jung, Reich e Ferenczi, assim como são bem recebidas contribuições da Psicanálise americana, representada por Horney, Sullivan, Erikson, e toda a corrente de Psicanalistas do Ego e Culturalistas em geral. Psicanalistas não ortodoxos, como Fromm e Nuttin, chegam mesmo a tornar parte ativa no Movimento. GESTALTISTAS E HOLISTAS. A Psicologia Humanista retoma em grande parte as propostas da Psicologia da Forma alemã, em especial a visão holista e organísmica do ser humano e seu envolvimento ambiental. Trazida aos Estados Unidos pelos seus criadores Wertheimer, Koffka e Köhler, e outros psicólogos imigrantes, fugitivos das conturbações políticas européias, a influência da Psicologia da Gestalt está presente em praticamente todos os psicólogos humanistas. Para citar apenas os principais autores envolvidos no surgimento da Psicologia Humanista e para os quais a formação gestáltica foi decisiva lembremos Goldstein, Angyal e Lewin, sendo que este último, ao lado das propostas do Psicodrama de Moreno, foi também uma das principais influências no extraordinário desenvolvimento e aplicação de técnicas de trabalho grupal, que marcou caracteristicamente o movimento da Psicologia Humanista. E ainda neste tópico da influência gestáltica, não pode ser esquecido Perls, o polêmico Fritz, que, em suas originais leituras da Psicanálise, da Psicologia da Gestalt e do Existencialismo, foi, com a Gestalt-Terapia por ele criada, uma das presenças mais marcantes no extraordinário sucesso e desenvolvimento da Psicologia Humanista nas décadas de 60 e 70. PSICOLOGIAS EXISTENCIAIS. As articulações para o lançamento da Psicologia Humanista coincidiram, no final da década de 50, com a maior difusão nos Estados Unidos do trabalho que havia décadas vinha sendo realizado na Europa por diferentes correntes de Psicologia e Psicoterapia inspiradas em filósofos existencialistas e fenomenólogos * . Essa difusão ocorre não só pela tradução para o inglês de obras de psicólogos existenciais, como Boss, Binswanger e Van Den Berg, mas também pelo trabalho de divulgação realizado no meio psicológico pelos escritos de Tillich e Rollo May, sendo que este em 1959 organiza o primeiro simpósio americano sobre Psicologia Existencial, para o qual são convidados expoentes e futuroslíderes do Movimento Humanista, como Maslow e Rogers. Não tardaram a serem encontrados pontos em comum nas respectivas propostas e, sobretudo pela participação ativa de May e outros psicólogos existenciais que aderiram ao Movimento, como Bugental e Bühler, a Psicologia Humanista foi amplamente enriquecida com a perspectiva fenomenológica e existencial, ao ponto de por vezes ser denominada Psicologia Humanista-Existencial (Greening, 1975). Não cabe aqui uma discussão mais aprofundada do relacionamento nem sempre fácil e pacificamente aceito entre a perspectiva humanista americana - em muitos sentidos muito mais essencialista, ligada antes a Rousseau que a Heidegger e Sartre, menos filosoficamente sofisticada, mais otimista e vinculada a interpretações biológicas da natureza humana - e a perspectiva existencial européia. Entre os filósofos existencialistas cujas idéias foram mais abertamente abraçadas pelos humanistas americanos, destacam-se Kierkegaard e Buber, sem esquecer a influência de Nietzche, que sobretudo por via indireta (as idéias de Adler), é notada em algumas propostas da Terceira Força. De uma maneira geral, o Movimento Humanista acabou por absorver a maioria dos psicólogos existenciais americanos e, do outro lado, a proposta humanista recebeu a adesão de pelo menos um teórico europeu de destaque, Viktor Frankl, criador da Logoterapia, que posteriormente integraria também o Movimento Transpessoal. Ronald Laing, o anti-psiquiatra inglês que sofreu forte influência das idéias de Sartre, pode também ser apontado como interlocutor e simpatizante da Psicologia Humanista e, à semelhança de Frankl, assíduo freqüentador do meio transpessoal. ESCOLAS AMERICANAS DE PSICOLOGIA DA PERSONALIDADE Outra importante influência na constelação do Movimento Humanista, diz respeito à afluência de importantes escolas de Psicologia da Personalidade desenvolvidas nos Estados Unidos. Afora a sempre lembrada homenagem póstuma aos pragmatistas John Dewey e William James, destacados teóricos independentes como G. Allport, G. Murphy, Murray, Kelly, Ellis, Maslow e Rogers, assim como toda a escola de Psicologia do Self, se associaram ao movimento, em diferentes graus de apoio e envolvimento. * É importante ressaltar que a Fenomenologia, numa versão simplificada (entendida como descrição ingênua da experiência vivida) e um tanto desvinculada de suas raízes filosóficas mais elaboradas, fôra trazida anteriormente aos Estados Unidos pelos psicólogos gestaltistas alemães e psiquiatras da escola jasperiana, e já era, havia muito, conhecida e utilizada pelos psicólogos americanos, quer como método auxiliar de coleta de dados, quer como a fundamentação principal de elaborações teóricas. OUTRAS AFLUÊNCIAS Como movimento aberto e inclusivo de novas tendências, idéias e experimentações pouco ortodoxas, a Psicologia Humanista não tardou a integrar em suas fileiras de simpatizantes e proponentes toda sorte de marginais contestadores do sistema. A espetacular revolução que o movimento propiciou no campo das psicoterapias, entendidas a partir de então na perspectiva ampliada de técnicas de crescimento pessoal ou de desenvolvimento do potencial humano, estimulou o estudo, experimentação e aplicação - infelizmente de modo nem sempre tão sério e criterioso como seria de se desejar - de novas formas de ajuda psicológica. Entre as tendências que se aproximaram da Psicologia Humanista destacam-se as novas psicoterapias que vinham se desenvolvendo a partir do trabalho mais ou menos independente de seus criadores, como a Terapia Primal de Arthur Janov, a Análise Transacional de Eric Berne e a Psicossíntese de Roberto Assagioli (que posteriormente abraçaria o Movimento Transpessoal); as escolas e técnicas de trabalho não verbal e corporal, com suas propostas de relaxamento, sensibilização e desbloqueio psíquico e energético; as variadas formas de trabalho intensivo com grupos que se associaram ao Movimento dos Grupos de Encontro; e enfim toda sorte de touchy-feelly terapeutas envolvidos na experimentação alternativa de técnicas de desenvolvimento pessoal ou simplesmente navegando em uma superficial e consumista adesão à nova onda. Influências matizadas de aspectos que em breve dariam origem ao Movimento Transpessoal, especialmente relativas ao estudo e aplicação de técnicas de meditação e experimentação psíquica com drogas psicodélicas, também podem aqui ser incluídas, embora alguns humanistas mais ortodoxos as rejeitem como parte das superficiais e pouco sérias contribuições e adesões que o movimento acabou por atrair, em grande parte devido ao clima cultural mais amplo a que o surgimento da Psicologia Humanista esteve associado e que examinamos a seguir. A Questão da Contracultura A institucionalização e o rápido desenvolvimento e aceitação da Psicologia Humanista coincidiu, no contexto cultural da década de 60, com os anos de acentuado questionamento e mudanças nas sociedades ocidentais. Anos de revoltas políticas e de costumes, sobretudo entre a juventude, e em que mais do que nunca a contestação ao Sistema e aos valores estabelecidos esteve na ordem do dia. Anos marcados pelo que, na expressão cunhada por Theodore Roszak (s. d.), foi chamado de Contracultura: revoltas estudantis, movimento hippie, mobilização pacifista contra a guerra do Vietnã, ativismo político, organização de minorias raciais e feministas, desafio à autoridade, revolução underground nas artes, oposição ao materialismo consumista, valorização do corpo, do sentimento, do amor livre, da experimentação psíquica através das drogas psicodélicas, da ecologia, da auto-expressão espontânea, e das experiências meditativas e espirituais. Essas tendências todas convergiam na rejeição aos modelos tradicionais de família, de trabalho, de escola, de relações interpessoais, de igreja, de governo, de instituições em geral, e da própria cultura ocidental. Muito do extraordinário sucesso da Terceira Força da Psicologia se deve ao Zeitgeist desse momento histórico, ao qual de várias maneiras suas propostas eram ressonantes e coincidentes, ao ponto de, em diversos sentidos, ter sido o Movimento da Psicologia Humanista abarcado como uma das facetas da Contracultura. A própria posição geográfica de alguns dos principais centros de desenvolvimento e difusão da Psicologia Humanista, como o quase lendário Instituto Esalen, colocava-os no centro dos acontecimentos, na Califórnia, Meca e terra prometida da Contracultura americana. Apesar dos excessos, equívocos, ingenuidades e superficialidades cometidos no calor da revolução cultural, não compartilho a opinião daqueles (como Smith, 1990) que lamentam como infeliz distorção a associação da imagem da Psicologia Humanista aos movimentos contestatórios dos anos 60. Na verdade, mais do que qualquer outra corrente da moderna Psicologia, a Psicologia Humanista é marcada por um compromisso de engajamento em favor da mudança social e cultural, em direção a uma sociedade de valores mais humanos, menos controladora, mais atenta às necessidades intrínsecas de auto-realização, mais criativa e lúdica, envolvendo relações pessoais mais abertas, autênticas, auto-expressivas e prazeirosas, em que a exploração alternativa das dimensões humanas da intimidade corporal e emocional fosse sancionada ao invés de reprimida; enfim, onde a pessoa, em sua liberdade e autodeterminação no desenvolvimento de suas possibilidades, fosse o valor supremo, contra todos os dogmas, valores e autoridades externamente constituídas. Ora, em grande parte, isso me parece coincidir com as propostas e os valores abraçados pelos movimentos contraculturais de então. 2. CARACTERÍSTICAS Temática Privilegiada Além da oposição ao Behaviorismo e à Psicanálise, e da absorção de escolas não identificadas com essas correntes, o Movimento Humanista é caracterizado pela congregação de estudiosos emtorno de alguns tópicos e interesses que podem ser apontados como temáticas típicas e preferenciais da Psicologia Humanista. Sutich (1991), relembrando o início do Movimento e o lançamento da Revista de Psicologia Humanista, informa como uma definição de Terceira Força, formulada por Maslow em 1957, foi utilizada na introdução da primeira edição, para assim descrever a proposta: A Revista de Psicologia Humanística foi fundada por um grupo de psicólogos e profissionais de outras áreas, de ambos os sexos, interessados naquelas capacidades e potencialidades humanas que não encontram uma consideração sistemática nem na teoria positivista ou behaviorista, nem na teoria psicanalítica clássica, tais como criatividade, amor, self, crescimento, organismo, necessidades básicas de satisfação, auto-realização, valores superiores, transcendência do ego, objetividade, autonomia, identidade, responsabilidade, saúde psicológica, etc. (p. 24). Nessa significativa listagem elaborada por Maslow como resumo dos interesses editoriais do veículo oficial do Movimento, pode-se perceber o delineamento das principais tendências e ênfases temáticas que, relacionadas entre si, caracterizam-se como típicas da Psicologia Humanista. Em primeiro lugar, a Psicologia Humanista destaca-se como a corrente que, afastando-se do tradicional enfoque clínico de privilegiar o estudo das psicopatologias, passa a enfatizar a saúde, o bem estar, e o potencial humano de crescimento e auto- realização. Já em seu livro Introdução à Psicologia do Ser, de 1957, Maslow (s. d.) aponta para a necessidade do desenvolvimento de uma Psicologia da Saúde, criticando as teorias, como a Psicanálise, que generalizam suas conclusões sobre o ser humano a partir de dados obtidos quase que exclusivamente no estudo de indivíduos mentalmente perturbados, resultando conseqüentemente em um retrato pessimista e desabonador da natureza humana. Maslow, ao contrário, se propõe o estudo dos melhores exemplares da espécie, por ele chamados personalidades auto-atualizadoras, dando início à tradição humanista de abordar a Psicologia a partir do prisma da saúde e do crescimento psicológico. Tão forte é essa tendência que forneceu o termo Eupsicologia, cunhado nas primeiras tentativas de articulação e caracterização do movimento. Também, em sua proposta de enfatizar o desenvolvimento das melhores capacidades e potencialidades do ser humano, a Psicologia Humanista é muitas vezes identificada como o Movimento do Potencial Humano. Assim, ao invés de empenhar-se em exaustivas descrições e teorizações sobre os mecanismos das enfermidades psíquicas, reservando à saúde a definição negativa de ausência de doença, é mais típico da Psicologia Humanista buscar definir as características do pleno e saudável exercício da condição humana, em distanciamento do qual as patologias podem então ser entendidas. Em segundo lugar, outra importante orientação temática geral da Psicologia Humanista diz respeito ao privilegiar das capacidades e potencialidades características e exclusivas da espécie humana. Criticam os humanistas, sobretudo ao Behaviorismo, a tendência a generalizar conclusões obtidas a partir de experimentos realizados quase que exclusivamente em pesquisa animal; assim como a forte tendência da psicologia experimental a, mesmo quando dedicada a trabalhos com pessoas, centrar-se em aspectos fisiológicos, ou muito parcializados, perdendo de vista a própria dimensão psicológica característica do ser humano, que deveria em princípio ser o enfoque prioritário de uma ciência dedicada ao estudo da mente e da psiquê. Como diz Matson (1975), um dos presidentes da Associação de Psicologia Humanista: Não seria excessiva violação da verdade afirmar que grande parte do que ocorre em Psicologia, nada tem de "psicológico". E isso nos leva à razão que gerou a Terceira Revolução - o renascimento do humanismo em psicologia. (p. 69 ) Assim, a volta ao humano como objeto de estudo é uma das bandeiras do Movimento, importante a ponto de fornecer-lhe o título designativo. Qualidades e capacidades humanas por excelência, tais como valores, criatividade, sentimentos, identidade, vontade, coragem, liberdade, responsabilidade, auto realização, etc., fornecem temas de estudo típicos das abordagens humanistas. Essas e outras temáticas, igualmente características (organismo, self, significados, intencionalidade, necessidades básicas, experiência subjetiva, encontro, etc.), estão também associadas à visão de homem, à proposta de Ciência, e aos métodos e técnicas desenvolvidos e assumidos pela Psicologia Humanista, que serão examinados nos próximos itens, e representam as diversas influências recebidas pelo Movimento, que foram sucintamente referidas nos itens anteriores. Ao leitor mais atento não terá por certo escapado a inclusão, na listagem de Sutich, do tema transcendência do ego. Tal assunto, embora em algumas abordagens possa ser entendido como a mera superação da identificação com uma defensiva e socialmente imposta imagem de si, em seu sentido mais amplo, caracteriza antes uma temática transpessoal, cuja inclusão aqui serve para ilustrar a vinculação dessa tendência ao Movimento Humanista, no qual era inicialmente vista como uma facção de interesses, assunto que será melhor esclarecido quando tratarmos do surgimento da Psicologia Transpessoal. Visão de Homem De forma bem mais declarada que as Forças anteriores, a Psicologia Humanista, enquanto movimento organizado, reconhece, assume e propõe a inevitabilidade da adoção de um Modelo de Homem, ou seja, uma concepção filosófica da natureza humana, como ponto de partida e princípio norteador de qualquer projeto de construção da Psicologia. Neste tópico, talvez mais que em qualquer outro, destila a Psicologia Humanista suas maiores críticas e discordâncias às escolas a que se opõe, contestando veementemente os modelos de homem que identifica nas formulações psicanalíticas e behavioristas. Opõem-se os humanistas à concepção psicanalítica do homem como um animal lúbrico e feroz, movido por necessidades instintivas de prazer e agressão, ao qual só a custa de muitas restrições e sublimações da natureza animalesca básica se pode, na melhor das hipóteses, trazer algum verniz de racional sociabilidade, mas não sem um inevitável ônus de frustração, infelicidade e Mal-Estar da Civilização. Recusam-se também a conceber o ser humano como uma espécie de máquina, robô ou marionete, cuja natureza passiva e amorfa é absolutamente moldada, manipulada e controlada pelas contingências de estimulação e condicionamento ambiental, a quem na melhor das hipóteses se poderá oferecer a escolha (ela própria condicionada) entre um condicionamento fortuito e um planejado, quer este planejamento se dê por iniciativa (?) do próprio sujeito condicionado, quer se dê por interferência da ideologia ou poder político dominante que as circunstâncias ambientais mais amplas tenham levado as sociedades humanas a adotar. Negando-se a aceitar que o homem seja assim reduzido por tão pessimistas e desalentadoras visões, a Psicologia Humanista se afirma em um compromisso com uma visão otimista e engrandecedora, na qual que as melhores qualidades e potenciais positivos manifestados pelos homens sejam valorizados como a própria essência da natureza humana. Grosso modo, a visão psicanalítica costuma ser comparada, pelos humanistas americanos, à pessimista opinião de Hobbes (o homem é o lobo do homem), e a visão behaviorista à concepção de Locke, que vê o ser humano como uma tábula rasa; ao passo que seu próprio modelo é considerado como uma reedição da generosa visão de Rousseau: O homem é naturalmente bom, a sociedade é que o corrompe. Vejamos, em algumas tendências e consensos das abordagens humanistas, um sucinto esboço da visão de homem que elas propõem: Enxergando o homem como um todo complexoe organicamente integrado, cujas qualidades únicas vêm de sua configuração total, rejeitam os humanistas as concepções elementaristas e fragmentadoras da psiquê. Retomando para o Movimento a proposta holista que Adler foi buscar em Smuts, e que de outra parte caracterizou a Psicologia da Gestalt, vêem no homem uma natureza tal que a totalidade da pessoa humana é sempre maior que a soma de suas partes tomadas isoladamente. Em especial nas teorias desenvolvidas nos Estados Unidos - o ramo americano e mais caracteristicamente humanista do Movimento, e para o qual as idéias do neurologista e teórico gestaltista Goldstein foram especialmente influentes - a compreensão organísmica do ser incluí suas raízes biológicas. Assim, concebem o homem como marcado pela necessidade, que vêem como intrínseca a todo organismo vivo, de atualizar seu potencial e se tornar a totalidade mais complexa, organizada e autônoma que for capaz. Esta hipótese da necessidade de auto-realização fornece, em diversas versões, a teoria básica de motivação da maioria das psicologias humanistas. Mesmo que as escolas existenciais, dada sua ênfase na liberdade e sua compreensão do ser humano como criatura cuja natureza consiste em criar sua própria natureza (Sartre), rejeitem a consideração de tendências biológicas determinantes, há quem remonte à vontade de potência de Nietzsche a origem da formulação humanista da existência de uma tendência intrínseca de busca da auto-realização. Igualmente associada à concepção holista, está a compreensão que os humanistas em geral tem do homem como implicado e configurado - mas não determinado - em seu ambiente, seja este físico, fenomenológico-experiencial, relacional, ou sócio-histórico-cultural. O ser humano, na visão humanista-existencial, é proposto como um ser essencialmente livre e intencional, recebendo esta noção especial destaque nas psicologias existenciais, as quais por vezes rejeitam a concepção mais essencialista e rousseauniana dos americanos, que crêem ser a natureza humana positivamente orientada, devendo as relações psicossociais deletérias ser responsabilizadas por qualquer desvio dessa bondade original. Para os existencialistas, sendo o homem livre e auto- orientado pelos propósitos e sentidos que dá à própria existência, não pode eximir-se de se responsabilizar plenamente pelo que é, apesar da inevitável angústia que esse assumir- se evoca, pois qualquer outra atitude seria auto-engano, má fé, inautenticidade no existir. De qualquer forma, de uma maneira geral, as teorias humanistas propõem que o comportamento do ser humano não pode ser adequadamente entendido a partir de referências exclusivas a influências determinantes externas à sua consciência e aos significados atuais que imprime ao mundo, sejam essas influências provenientes do ambiente, do passado, ou do inconsciente. Associadas portanto à aceitação da liberdade, da responsabilidade, e da intencionalidade como características intrínsecas à condição humana, resultam a ênfase nas interpretações teleológicas (que enfocam a finalidade ao invés da causa passada) do comportamento; o privilegiar da dimensão consciente e do vivenciar da experiência presente; assim como o enfoque fenomenológico (que se atem à experiência subjetiva e consciente) e compreensivo (que contrapõe a compreensão por empatia à explicação por referenciais exteriores) que, com maior ou menor destaque, são defendidos pelos humanistas. Enfim, vendo o homem como um ser em busca e construção de si mesmo, cuja natureza continuamente se desvela e exprime no realizar de suas possibilidades e na atualização de seu potencial, compreendem os humanistas que só se é pessoa, só se é realmente humano, no autêntico, livre e integrado ato de se desenvolver. Daí o generalizado consenso, que alguns entendem como a característica mais marcante da visão de homem que a Psicologia Humanista apresenta, em rejeitar concepções estáticas da natureza humana, considerada antes como algo fluido: uma tendência para crescer, um movimento de sair de si, um projetar-se, um devir, um incessante tornar-se, um contínuo processo de vir a ser. Modelo de Ciência O desenvolvimento da Psicologia Humanista é caracteristicamente marcado por uma reflexão e tomada de posições, em questões filosóficas e epistemológicas, sobre a natureza da Psicologia enquanto Ciência. É, sob alguns novos aspectos e nuances, retomada a discussão que envolveu o nascimento e as primeiras décadas da Psicologia Científica contemporânea, em torno da questão do modelo, dos métodos e do objeto dessa nova ciência. A controvérsia principal referia-se à adequação do Modelo de Ciência, até então bem sucedido nas modernas ciências naturais, estender-se às nascentes ciências humanas, as quais, justificadas pela singularidades de seu objeto de estudo, congregavam arrebatados defensores do desenvolvimento de um modelo próprio e diferenciado. Embora na Europa o debate tenha prosseguido e frutificado, principalmente no desenvolvimento de escolas de psicopatologia e psicoterapia inspiradas na Fenomenologia e no Existencialismo, no panorama americano a discussão parecia ter estagnado, com a aparente vitória do dos modelos naturalistas, fosse o modelo positivista de determinismo ambiental adotado pelo Behaviorismo, com sua ênfase na experimentação animal e na observação objetiva; fosse o modelo médico, mecanicista em sua ênfase no determinismo psíquico, de inspiração darwiniana, e igualmente naturalista, da Psicanálise. Os humanistas, reeditando em novas versões propostas da Psicologia Compreensiva de Dilthey, da perspectiva holista da Psicologia da Gestalt, da primeira Fenomenologia de Husserl, e dos questionamentos existencialistas sobre a singularidade e irracionalidade da existência concreta, tendem a acordar que a Psicologia deve se afirmar em um modelo de ciência do homem, respeitando e se adaptando às especificidades de seu objeto de estudo. Embora a este respeito não se possa encontrar unanimidades indiscutíveis entre as diversas propostas que se articulam no movimento humanista, algumas tendências parecem se destacar, sobretudo em decorrência do Modelo de Homem que, como vimos, esse movimento defende. De uma maneira geral, a Psicologia Humanista não se opõe aos parâmetros de racionalidade e objetividade empírica, quando utilizados na busca de explicação, controle e previsão dos fenômenos do mundo das coisas. Entretanto, quando se trata do homem, que os humanistas entendem como tão distinto do restante da criação, em maior ou menor grau, se opõe a diversos princípios e procedimentos consagrados em modelos de ciência natural e nas propostas de Psicologia das Forças a que se opõe. Há considerável consenso na crítica da aplicação, ao estudo do homem, de abordagens reducionistas, deterministas, elementaristas e objetivantes, ao passo que o racionalismo empírico-indutivo e hipotético-dedutivo é, com adaptações, menos rechaçado. Vejamos brevemente estas questões. Opondo-se ao reducionismo, que vêem como associado aos modelos de homem do Behaviorismo e da Psicanálise, recusam-se os humanistas a entender o ser humano como um mero jogo de forças instintivas e culturais, ou intermináveis cadeias de estímulo-resposta, sujeito aos mesmos processos comportamentais que os animais de laboratório. Reconhecem os humanistas na pessoa humana uma complexidade tal que implica numa mudança qualitativa, e não apenas quantitativa, em relação às espécies inferiores, de tal ordem que o princípio metodológico de se compreender pelo mais simples o mais complexo deva, no caso do homem, ser invertido, pois até os processos psíquicos mais simples e primitivos adquirem novos sentidos na configuração total da personalidade humana. Ao determinismo e mecanicismo será desnecessário nos estendermos, pois para abordagens que enfatizam a liberdade e a intencionalidade comocondição humana, é evidente que o determinismo não vai ser de muito auxílio ou relevância. A questão da objetividade científica, em nome da qual o Behaviorismo mais radical tentou esterilizar de toda vida psíquica a ciência da Psicologia, é talvez a posição que recebe maiores ataques, pois é justamente a dimensão subjetiva dos sentimentos, das emoções, dos valores, das inter-relações, dos significados, da vontade, dos anseios, da criatividade, da experiência e vida consciente, o objeto de estudos que prioritariamente a Psicologia Humanista quer abordar. Como se pode então, em nome da Ciência, fechar os olhos ao que de mais significativo e característico há para se investigar no objeto que se tem para estudo? No que tange a levar a maiores extremos ainda o questionamento da natureza da investigação científica da psiquê humana, mesmo dentro do próprio Movimento Humanista as posições tendem a divergir. A maioria das escolas humanistas americanas se inclina a professar fé na Ciência, e seus investigadores, muitos com sólida formação empírica e experimental, são bastante criativos em renovar e adaptar formas de pesquisa, inclusive experimentos laboratoriais, às dimensões do ser que desejam estudar; enquanto a tradição fenomenológica européia tem possibilitado a enorme ampliação de vias no desenvolvimento de procedimentos para Psicologia, e fornecido talvez os principais subsídios para a discussão da natureza desta, enquanto ciência do homem. É entretanto em algumas propostas existencialistas que talvez se encontrem as posições mais radicais do questionamento. Tomadas até as últimas conseqüências, certas concepções básicas da visão existencial de homem e de universo, como as que propõe o caráter singular e único de cada existência, a imprevisibilidade das possibilidades e dos projetos decorrentes da liberdade e escolha autênticas, assim como a irracionalidade de um universo que, afora os mutantes sentidos que cada homem a cada momento lhe imprime, é de uma absurda e absoluta gratuidade, parecem tornar irrelevante qualquer noção de previsibilidade, constância, replicabilidade, generalização, racionalidade e mesmo comunicação de resultados, no estudo do humano. Sem se aceitar uma possibilidade mínima dessas condições, é de fato difícil acreditar que seja possível chegar a algum tipo de verdade científica, o que leva alguns psicólogos existenciais ao questionamento céptico da utilidade de investigações empíricas, formulações teóricas, ou mesmo da Psicologia enquanto Ciência. Deste ponto de vista mais extremado, algumas abordagens mantém-se muito mais próximas da Antropologia Filosófica que da Psicologia Científica, à qual parecem se manter ligadas apenas pelas preocupações de natureza clínica de suas propostas de psicoterapia. Enfim, não pode deixar de ser dito, os questionamentos e respostas que a Psicologia Humanista levanta e esboça sobre a natureza da Psicologia enquanto Ciência e sua possibilidade de contribuir para a felicidade, saúde e auto-realização humana, encontram-se no cerne de todo um processo mais amplo que marca a crise da moderna Civilização Ocidental. Se a Ciência colaborou para esvaziar e isolar o homem, reduzindo-o à sua mera dimensão material e aos frios mecanismos lógico-racionais a serviço de considerações mesquinhas e doentias, a justa revolta cultural contra esse estado de coisas que nos tem retirado o sentido, a maravilha e a profundidade da experiência de ser humano entre humanos, mobilizou também os psicólogos. Assim, a Psicologia Humanista se compromete, em seu projeto de Ciência, a estar sempre voltada a favorecer o movimento da aprisionada alma humana, em sua busca de um mundo que se possa chamar humano, e em que, entre os da nossa espécie, seja realmente um prazer viver. Métodos e Técnicas Mantendo-se fiel às suas opções temáticas, e tendo sempre em vista as dimensões do ser que seu enfoque privilegia, a Psicologia Humanista desenvolve, adapta e renova variadas técnicas e metodologias de abordagem da pessoa, com finalidades de estudo ou intervenção. Os questionamentos e posições assumidas sobre a natureza da Ciência Psicológica e seu objeto próprio de estudo fazem do projeto humanista de construção da Psicologia uma fonte de inspiração e parâmetros no desenvolvimento de abordagens adequadas, sendo sobretudo o compromisso com sua visão de homem que orienta a criação e desenvolvimento de novas formas de estabelecer a saúde psíquica e promover o desenvolvimento dos melhores potenciais humanos. No campo da pesquisa, a Psicologia Humanista é marcada não só pela eleição de temas e faixas da experiência humana até então negligenciadas como objeto de investigação, mas também pelo desenvolvimento e utilização de inovações metodológicas. O instrumental de pesquisa e investigação desenvolvido e utilizado sob a égide da Terceira Força é bastante rico e diversificado. Para um breve apanhado das contribuições mais significativas e características, podem ser brevemente lembradas as variações dos métodos inspirados na Fenomenologia, aí incluídas as chamadas pesquisas qualitativas; a crescente consideração da influência da pessoa do investigador nos experimentos, que em muitos estudos é complementada com a inscrição dos sujeitos da pesquisa como co-investigadores; a larga realização de estudos idiográficos (interessados nas singularidades, ao invés das características generalizáveis do sujeito da investigação); e o eclético e criativo uso com que investigadores humanistas renovam abordagens mais tradicionais de pesquisa, desde os experimentos laboratoriais até o consagrado recurso do estudo de caso. É entretanto no campo das psicoterapias e técnicas de crescimento pessoal, mais do que em qualquer outro, que a contribuição da Psicologia Humanista é especialmente exuberante e espetacular, resultando em uma verdadeira revolução nos conceitos e formas de ajuda psicológica. O espaço aqui seria pequeno, caso eu desejasse fazer a mínima justiça da citação nominal das novas escolas e propostas que foram desenvolvidas na vanguarda ou na esteira do Movimento Humanista. Optei então por me restringir apenas à discriminação comentada de algumas das principais tendências que se associam ao Movimento. Embora a diversidade das teorias e técnicas psicoterápicas abrangidas pela Psicologia Humanista seja quase inumerável, o reconhecimento do potencial positivo e saudável da natureza humana tende a congregá-las em um objetivo de trabalho comum, distinto do apresentado pelas Forças anteriores. Para a concepção psicanalítica de ser humano, a psicoterapia visa obter um equilíbrio entre a voracidade irracional das forças do Id, as restrições culturais internalizadas no Superego, e as condições objetivas da realidade, mediante as articulações parcialmente conscientes do Ego e seus mecanismos de defesa, resultando, na melhor das hipóteses, na transformação de uma infelicidade neurótica em uma infelicidade normal. Para o Behaviorismo, o conceito determinista e valorativamente neutro que faz da natureza humana, implica que a terapia é bem sucedida ao propiciar o descondicionamento dos comportamentos indesejados e a aprendizagem do repertório que propicie melhor adaptação e atenda ao desejado, sendo que as questões desejado por quem? ou adaptado a que? não encontram no Behaviorismo resposta, que deve ser buscada na ideologia da moda ou no senhor de escravos que estiver de plantão. Já para a Psicologia Humanista, o objetivo de qualquer tratamento pode ser formulado numa frase quase redundante: levar a pessoa a ser ela mesma. Propiciar ao cliente, ou estudante, a conquista de uma existência autêntica, auto- consciente, transparente, espontânea, verdadeira, congruente e natural, sem máscaras, jogos, couraças ou divisões (splits) internas: eis o que pretendem os humanistas. A ênfase na saúde ao invés de na doença, assimcomo a proposta de desenvolvimento do potencial humano, tem levado as terapias humanistas a entender suas técnicas de ajuda muito mais como formas de estimular o desenvolvimento e a aprendizagem do que como tratamento de enfermidades, disfunções ou anomalias psíquicas. A troca do modelo médico pelo de auto-realização tem levado muitas abordagens a se apresentarem - não obstante o tradicional designativo psicoterapia mantenha sua força - como sendo métodos e técnicas de desenvolvimento ou crescimento pessoal. De qualquer forma é bastante generalizada a concepção de que toda psicoterapia bem sucedida é um processo de aprendizagem profunda e ampla, assim como toda aprendizagem verdadeiramente significativa é profundamente liberadora e curativa, sendo diversos dos métodos humanistas utilizados quase que indiferenciadamente no consultório e na sala de aula. Uma das conseqüências da visão holista e da concepção do homem como um todo bio-psíquico-social, é o destacado desenvolvimento das chamadas técnicas e abordagens corporais, em que massagem, toque, sensações, dança e movimento, catarses expressivas de cólera, choro, riso, vômito, grito e orgasmo, instrumentalizam o crescimento psíquico e a maior vivência de si. Ainda neste tópico do enfoque pluridimensional, podem ser incluídas as técnicas não verbais, o uso do poder da expressão artística, e até mesmo práticas meditativas e espirituais, cujo potencial curativo viria a ser posteriormente assumido como um dos principais recursos da terapias transpessoais. Noções existencialistas do homem como um ser de natureza dialogal, que só se mostra - e verdadeiramente é - no encontro pessoal, tem favorecido as terapias relacionais, em que o terapeuta abdica das posturas e defesas profissionais, para entrar em relação como pessoa real, pois é no encontro de pessoa para pessoa, na relação Eu- Tu, que, acreditam os humanistas, a mudança se dá. A aceitação da tendência inata e intrínseca para o crescimento e auto- realização favorece a compreensão do terapeuta como sendo antes um facilitador, do que alguém que atua sobre o outro. A ênfase no fluir constante, na liberdade e na singularidade de cada ser, tende a abolir os planejamentos, os objetivos e estratégias, e a desenvolver uma atitude de abertura ingênua e incondicional ao que vem do outro em seu processo de desenvolvimento e auto-criação. O extraordinário desenvolvimento de terapias e técnicas de trabalho com grupos, especialmente na forma de vivência intensiva, é uma das tendências que marca a Psicologia Humanista. Além das ricas e inovadoras contribuições teóricas e técnicas a essa modalidade de atuação, até então negligenciada, o chamado Movimento dos Grupos de Encontro representou, ao menos nos anos 60 e 70, a faceta de maior impacto da Terceira Força, traduzindo em ações efetivas o compromisso transformação sócio- cultural que a Psicologia Humanista se impõe. Enfim, é no teste empírico de suas idéias, muitas vezes taxadas de ingênuas ou utópicas, e no sucesso e aceitação de suas práticas, que a Psicologia Humanista tem se consolidado como uma psicologia afinada ao Zeitgeist de nossa época, em que apesar de toda crise, amargura, cinismo, solidão e desesperança, o anseio mudo e oculto por uma vida mais autentica e humanizada torna-se eloqüente e fulgura ao encontrar quem nele acredite e se disponha a ajudar. ASPECTOS HUMANISTAS, EXISTENCIAIS E FENOMENOLÓGICOS PRESENTES NA ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução A Abordagem Centrada na Pessoa (ACP) é fruto do trabalho desenvolvido por Carl Rogers ao longo de toda a sua vida produtiva em Psicologia. No percurso do desenvolvimento de seu pensamento, ele sempre demonstrou preocupação com as bases filosóficas da Psicologia, no entanto, a ACP surge a partir de sua experiência clínica e de pesquisas científicas dela decorrente. Poucos são os pensadores mencionados por ele que o influenciaram diretamente neste sentido. A perspectiva filosófica constitui-se em um modo de pensar a realidade, de questioná-la e de nortear a práxis do ser humano (Holanda, 1998). Este processo de inquirição e elaboração conceitual dá-se sobre construtos derivados da história da filosofia. Na prática psicológica não deve ocorrer a mera transposição de categorias filosóficas ao plano empírico do trabalho cotidiano do profissional da psicologia. Há o duplo risco de, por um lado, descontextualizar-se, e, por conseguinte, distorcer-se determinado conceito filosófico de sua acepção original, e por outro lado, desconsiderar-se a produção conceitual ASPECTOS HUMANISTAS, EXISTENCIAIS E FENOMENOLÓGICOS PRESENTES NA ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA RRRReeeessssuuuummmmoooo A Abordagem Centrada na Pessoa (ACP) é considerada uma das correntes identificadas com a Terceira Força em Psicologia ou Psicologia Humanista. Há aspectos significativos que correlacionam o pensamento do seu fundador, Carl Rogers, com alguns pressupostos da psicologia humanista e da filosofia existencialista. Mesmo que seu trabalho não tenha sido orientado pela fenomenologia, percebe-se em sua obra, desdobrada em várias fases, a prática de uma atitude desta natureza. Considerar, portanto, a ACP como uma abordagem humanista, existencial e fenomenológica remete-nos a uma série de questões relacionadas: 1) o que se entende por humanista? 2) Por consequência, o que é ser humano nesta perspectiva? 3) Como pensar o humanismo na psicologia? 4) Quais aspectos derivados da fenomenologia e do existencialismo encontram ressonância com a teoria e o método da ACP? Este artigo tem como objetivo contribuir na reflexão sobre as possíveis correlações entre essas perspectivas filosóficas e a Abordagem Centrada na Pessoa, tema ainda controverso no contexto brasileiro mesmo diante da diversidade teórica e de perspectivas que esta abordagem vem assumindo na atualidade. existente na própria psicologia. É necessário, portanto, que ocorram as devidas apropriações, para que assim as abordagens psicológicas, em seu corpo teórico e técnico, possam ser enriquecidas na compreensão e reflexão da experiência humana por meio de conceitos filosóficos. Quanto às perspectivas filosóficas presentes na Abordagem Centrada na Pessoa, Messias (2001) aponta que a ligação existente entre a psicologia de Rogers e o movimento humanista e existencial é significativa. Não se pode, no entanto, afirmar que o seu trabalho foi direcionado pela fenomenologia, pois Rogers só descobriu tardiamente esta filosofia. Ele próprio afirma que nunca estudou filosofia existencial. Seu contato com a obra de Soeren Kierkegaard e de Martin Buber, por exemplo, deveu-se à insistência de alguns de seus estudantes de teologia em Chicago. Apesar disso, encontramos convergências entre seu pensamento e desses autores. É o que leva Puente (1978) a afirmar que Rogers, mesmo não sendo filósofo, “se encontra na orientação da fenomenologia ao reconhecer neste pensamento o seu estilo de trabalho, que se caracteriza pelo esforço de se aproximar até aquelas camadas do subjetivo que estão mais próximas do objetivo, as experiências pessoais” (p.55). Ao tomar a experiência prática, vivida, como ponto de partida para formular sua teoria e método psicoterapêutico, ao incluir a subjetividade do terapeuta e do cientista e ao se interessar pela compreensão dos significados atribuídos pela própria pessoa às suas vivências e pelos modos de experienciação dos mesmos, Rogers assume, em seu modo de trabalho, a prática de uma atitude humanista e fenomenológica. Mesmo com tais intenções, não há como negar que a construção da sua teoria ainda mantinha-se vinculada ao modelo positivista e à matriz cientificista que dominava o projeto de constituição da psicologia da época, em que a noção de verdade e o conhecimento representacional estavam muito presentes, daí, o seu extremo interessecom a comprovação científica dos dados observados na prática clínica (Barreto, 1999). Por ter tido uma formação pragmática e determinista, Rogers considerava a ciência como algo externo, como um “corpo de conhecimento” sistemático e organizado em fatos observáveis; somente quando conheceu outros paradigmas e modelos de ciência tentou integrar esses dois aspectos, o cientista e o vivencial. A ciência apenas existe nas pessoas. Qualquer projeto científico tem o seu impulso criativo, o seu processo, a sua conclusão provisória, numa pessoa ou em várias pessoas. O conhecimento – mesmo o conhecimento científico - é aquele que é subjetivamente aceitável. O conhecimento científico só pode ser comunicado àqueles que estão subjetivamente preparados para receber a sua comunicação. A utilização da ciência apenas se dá através de pessoas que procuram valores que significam alguma coisa para elas (Rogers, 1991, p.195). Portanto, reconheceu que a ciência, como a terapia e outros aspectos da vida, baseiam-se na experiência imediata das pessoas, que é comunicável apenas em parte e de forma limitada. Para ele, ao se estabelecer uma relação terapêutica, por exemplo, os sentimentos e o conhecimento se fundem numa experiência que é vivida ao invés de ser analisada, em que o terapeuta, no momento da relação, é mais um participante do que um observador. Atua como observador quando se interessa pela ordenação e pelo processo que ocorre nesta relação. Deve para tal utilizar-se dos recursos científicos, não de forma impessoal, mas vivendo subjetivamente outra fase de si mesmo. Tentou resolver seu impasse, colocando a pessoa, com seus próprios valores, como a base da relação terapêutica e da relação científica. Considerar, então, a ACP como uma abordagem que possui aspectos humanistas, existenciais e fenomenológicos remete-nos a uma série de questões relacionadas: 1) O que se entende por humanista? 2) Por consequência, o que é ser humano nesta perspectiva? 3) Como pensar o humanismo na psicologia? 4) Quais aspectos derivados da fenomenologia e do existencialismo encontram ressonância com a teoria e o método da Abordagem Centrada na Pessoa? Com base nestes questionamentos, mesmo que reconhecendo a abrangência dos mesmos, apresentaremos a seguir algumas reflexões sobre possíveis correlações entre essas perspectivas filosóficas e a Abordagem Centrada na Pessoa com o objetivo de trazer subsídios que possam fomentar discussão e contribuir para uma na melhor compreensão desta abordagem psicológica. ACP e Psicologia HumanistaACP e Psicologia HumanistaACP e Psicologia HumanistaACP e Psicologia Humanista----Existencial Existencial Existencial Existencial NorteNorteNorteNorte----AmericanaAmericanaAmericanaAmericana Têm-se vários conceitos acerca do que venha a ser Humanismo (ver Amatuzzi, 2001; Nogare, 1994). Etimologicamente, significa tudo aquilo que se volta para o humano. O humanismo toma o Homem como foco de qualquer preocupação filosófica; é uma interrogação sobre o ser, que surge desde os filósofos gregos O humanismo, em sentido mais estreito, pode ser definido como um movimento de retorno à cultura greco-latina clássica, surgido no período do Renascimento, nos séculos XV e XVI (Gobbi, Missel & Holanda, 2002). O humano concebido como fim último de uma determinada teoria de conhecimento, abordagem ou postura ética é um denominador comum presente nas diversas acepções sobre o humanismo. Ele “... surge então como um questionamento, uma procura pelo sentido de ser deste homem. É um esforço contínuo pela compreensão de sua totalidade, pela sua consideração integral” (Holanda, 1998, p.21). Rogers sempre enfatizou a relação com a pessoa humana como fator primordial na estruturação de qualquer conhecimento sobre o fenômeno psicológico. Fez questão de colocar em xeque a validade de teorias ou técnicas psicoterápicas construídas a priori, descoladas da experiência, antes de se estabelecer o contato com a pessoa ou grupo em sua concretude. A Abordagem Centrada na Pessoa é considerada uma das correntes identificadas com a Terceira Força em Psicologia ou Psicologia Humanista. Tal identificação justifica-se por sua advocacia pela dignidade e valor da pessoa na sua busca pelo crescimento (Rogers, 1983). A psicologia humanista surgiu no final da década de 1950 e início da de 1960, nos Estados Unidos, num período de pós-guerra, marcado pela desesperança, crise moral e de valores. Amatuzzi (2001) esclarece que a designação ‘psicologia humanista’ não se refere, pois, “a uma teoria específica, ou mesmo a uma escola, mas sim ao lugar comum onde se encontram (ainda que com pensamentos diferentes) todos aqueles psicólogos, insatisfeitos com a visão de homem implícita nas psicologias oficiais disponíveis” (p.19). Surgiu, portanto, como uma reação, a partir da insatisfação sentida face às duas correntes predominantes, o behaviorismo e a psicanálise clássica. Mesmo considerando as descobertas e contribuições dessas duas correntes, o sentimento prevalecente entre os psicólogos humanistas era de que essas vertentes, permanecendo em suas perspectivas originais, com seus pressupostos reducionistas e deterministas, não traziam respostas aos anseios humanos, às questões de sentido, naquele momento histórico. A seguir analisaremos algumas perspectivas da psicologia humanista, de um modo geral, que se identificam com a proposta da Abordagem Centrada na Pessoa: 1. Uma visão de sujeito capaz de autorealizar-se e autoatualizar-se, com capacidade para “atuar seguindo convicções e princípios pessoais, que em si mesmo, são geradores de subjetivação, e não expressão de forças ocultas” (González Rey, 2003, p.59). Cabe refletir que esta concepção, apesar de incluir uma noção de sujeito ativo no mundo, portador de vontade própria e possibilidades de escolha, ainda relaciona-se a um sujeito soberano e epistêmico pleno que dominou o pensamento moderno. A este respeito, Moreira (2007) ressalta a importância de ampliarmos a visão de ser humano, a partir de uma concepção dialética da ACP. Isso implicaria em olhar o homem concreto, inserido na realidade; em conceber a pessoa, além da dimensão subjetiva individual, enfatizando a dialética entre o meio humano subjetivo e o meio objetivo, ou seja, a pessoa é, concomitantemente, um sujeito individual e transindividual. É necessário, então, considerar as expressões singulares e os sentidos subjetivos próprios, mas igualmente considerar as múltiplas influências recebidas do meio no processo contínuo de produção de subjetividade. O ser humano é concebido enquanto uma totalidade complexa, em processo, em devir, um ser implicado e configurado em seu ambiente, seja este físico, fenomenológico- experiencial, relacional ou sócio-histórico- cultural. 2. Uma maior ênfase à consciência, à subjetividade e à saúde psicológica. A consciência é concebida enquanto vivência ativa, intencional, criadora de sentidos, que gera novos processos de subjetivação no curso de sua expressão pessoal. De acordo com González Rey (2003), a consciência humana organiza-se, expressa- se e desenvolve-se “na contínua processualidade do sujeito, que em suas complexas operações reflexivas (...) logra articular elementos de sentidos muito diversos nos diferentes momentos de sua expressão” (p.60). A subjetividade, portanto, desenvolve- se num processo contínuo, não sendo, algo enclausurado no interior do individuo, uma vez que o ser individual se forma a partir das relações estabelecidas com os outros e com o mundo. 3. Uma perspectiva positiva quanto às potencialidades e possibilidades. Esta característica pode ser facilmente confundida como um olhar ingênuo ou deveras “otimista” sobre a condição humana. Mas é um princípio norteador de uma prática psicológica que ratifica a vida e as inúmeras possibilidades que o ser humano tem de operar mudanças em seuautoconceito, em seu comportamento e em suas atitudes diante das situações vividas, uma vez dadas as condições necessárias para tal. Amatuzzi (2010) possibilita-nos refletir sobre a atualidade e a amplitude desta prerrogativa quando enfatiza que o pressuposto humanista é um pressuposto de autonomia, em que o ser humano é concebido como detentor de algum poder sobre as determinações que o afetam. Com base nisso, engendram-se práticas psicológicas alicerçadas na autonomia crescente da pessoa e numa relação intersubjetiva e dialógica. O autor afirma que esta concepção é “uma visão ética e tem repercussões práticas na vida das relações pessoais, sociais e até políticas” (p.19). A ética aqui enfatizada refere-se a uma postura em que o ser humano é tratado não de um modo utilitário, mas como possuidor de um valor próprio e inalienável. Segundo Amatuzzi (2010), “a abordagem centrada na pessoa é muito mais uma ética do que uma técnica” (p.21). Evidenciam-se, dessa forma, diversos aspectos humanistas presentes na Abordagem Centrada na Pessoa, uma vez que ela busca resgatar o respeito e a ênfase no ser humano, destacando o papel dos sentimentos e da experiência como fator de crescimento. Busca centrar-se na relação interpessoal, construindo condições psicológicas adequadas ao desenvolvimento do potencial de mudança daquele que recorre a uma relação de ajuda. Quanto à noção de pessoa, há duas características norteadoras, aparentemente contraditórias: a primeira é que esta pessoa, única em sua concretude existencial (daí a aproximação da ACP com o Existencialismo), é um ser em processo, em movimento, dinâmico, em construção, nunca passível de ser esquematizado redutivamente; por outro lado, ela (pessoa) é concebida originalmente como possuidora de recursos próprios que lhe permitem superar as condições existenciais adversas. Ainda que esta concepção de ser humano seja questionada, principalmente devido à ausência nas obras de Rogers de uma leitura mais aprofundada sobre a influência sócio-histórica e política na constituição da subjetividade humana, é notória a sua preocupação em priorizar o humano em sua psicologia. Se compreendermos que a Psicologia, enquanto Ciência Aplicada, foi utilizada por muitas décadas no Brasil, por exemplo, para justificar e manter um alto grau de desigualdade social que relega grande parte da população à condições sub-humanas de existência, percebe-se a relevância efetiva de um humanismo engajado de Rogers na valorização da pessoa em sua inteireza – e aí pode-se ampliar esta inteireza a níveis sociais, políticos e transcendentes, por exemplo – ainda em nossos dias. Proporcionar o espírito crítico e libertário, como apregoado pela Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire, ou suscitar o debate e a participação política da pessoa em sociedade, no sentido pleno de cidadania democrática, é algo profundamente identificado com a ACP. A estruturação dos pilares principais desta abordagem deu-se no contexto de afloramento da Psicologia Humanista na sociedade norte-americana do pós-guerra. No entanto, não se pode dizer que Rogers derivou os princípios básicos da ACP desta rede de relações. Pelo contrário, os seus estudos, já provenientes da década de 1930 e bastante influenciados pela Terapia da Relação de Otto Rank, dentre outros, serviram de referência e inspiração para esta reação coletiva ao reducionismo das abordagens psicanalíticas e comportamentais de Psicologia, tão valorizado pela cientificidade do meio acadêmico norte-americano desta época. Percebe-se que, pelo próprio desenvolvimento e ampliação de perspectivas ocorridas no meio psicanalítico e comportamental, as críticas da chamada Psicologia Humanista ou Terceira Força não mais se sustentam na atualidade (Rosa & Kahhale, 2002). No entanto, deste movimento pontual ocorrido na História da Psicologia derivaram a valorização das relações pautadas no vivido (Amatuzzi, 2001) ou no experiencial (Rogers & Stevens, 1992), a legitimação da capacidade criativa e inovadora do ser humano e a consideração do humano como valor absoluto da existência. Vale ressaltar, que segundo Amatuzzi (2001), o rótulo específico de psicologia humanista é apenas um episódio momentâneo de algo que tem um sentido maior: a presença de uma atitude humanista no interior da psicologia. O humanismo na psicologia aponta para uma atitude fenomenológica, uma postura diferente que se revela o homem no que ele tem de próprio, onde o ser humano tem que ser captado em seu movimento e para isso é necessário nos colocarmos na postura do atual, do presente, do atuante, do em curso. O que está na raiz do humanismo não é, pois, apenas um postulado teórico, ou uma hipótese, mas uma atitude concreta em favor de homens e mulheres, sujeitos de ação no mundo. O caráter existencial presente em algumas psicologias humanistas é decorrente do encontro com vertentes da filosofia europeia no solo norte-americano entre 1940 a 1970. Conforme aponta Fonseca (s.d.), as perspectivas fenomenológico-existenciais no âmbito da psicologia foram recebidas nos Estados Unidos com certa polêmica, de um lado, e com bastante entusiasmo, por outro, uma vez que elas configuravam uma alternativa válida para contrapor a dicotomia existente entre as abordagens psicanalítica e comportamental. A identificação com alguns referenciais existencialistas, por exemplo, deve-se ao seu compromisso pela primazia da atitude em detrimento da teorização abstrata da realidade, numa espécie de efetivação da máxima sartriana de que a existência precede a essência. Segundo Rollo May (1980), maior representante das idéias existencialistas entre os chamados psicólogos humanistas, tal identificação encontra sua origem em William James (1841-1910), considerado um dos principais precursores da psicologia norte- americana. Conforme o autor verifica-se em James a ênfase dada ao imediatismo da experiência, à importância da vontade como elemento de decisão e ao compromisso com a construção da verdade, esta pensada não de forma teórica, mas eminentemente existencial e vivida. Concebia também a realidade como algo indeterminante em termos lógicos, porém dependente do mundo da experiência. De um modo geral, o Existencialismo pode ser definido como uma ampla corrente filosófica contemporânea, nascida na Europa pós-primeira guerra mundial. Este movimento prioriza a existência concreta do homem no mundo e teve suas raízes históricas no pensamento do filósofo dinamarquês Sören Kierkegaard (1813-1855). Seu pensamento reporta-se à existência em seu aspecto singular e concreto, contrapondo-se às tradicionais correntes filosóficas modernas na sua tendência universalista, em especial a hegeliana, bastante valorizada na primeira metade do século XIX. O movimento existencialista configurou- se enquanto tal na Alemanha da década de 1920, período de muito sofrimento, desespero e angústias. É na década de 1950, entretanto, que ocorre maior divulgação desse movimento, inclusive no contexto norte-americano (Penha, 1982). Dentre os diversos pensadores que difundiram o existencialismo, destacam-se: Jean-Paul Sartre, Martin Buber, Karl Jaspers, Gabriel Marcel, Emmanuel Levinas. Cada um, da sua forma, utilizou o método fenomenológico para elaborar a sua filosofia da existência, unindo assim os dois conceitos – fenomenologia e existencialismo (Gobbi e outros, 2002). A corrente existencialista concebe o ser humano comprometido com o mundo, cuja existência é instável e contraditória. É um conjunto de possibilidades em constante atualização. É capaz de criar condições para adquirir a sua liberdade, o que não lhe garante tranquilidade e bem estar, ao contrário, obriga-lhe a ser mais cuidadoso consigo, já que passa a ter diversas opções existenciais. Esta filosofia convoca-nos a atuarmos como protagonistas de nossa própria vida, assumindo nossasescolhas no mundo e, por conseguinte, sendo responsáveis por suas consequências. Rogers (1980) expressa a identificação com esse modo de fazer em seu artigo “Duas tendências divergentes”. Se, tradicionalmente, há uma tendência objetiva, própria de práticas fundamentadas em teorizações reducionistas, definições operacionais e procedimentos experimentais, por outro lado, a esta contrapõe a tendência existencial. Relata que, no decorrer de sua experiência profissional, partiu de uma perspectiva objetiva para, gradualmente, assumir um viés existencialista. Sob esta referência afirma, (...) A essência da terapia... é um encontro de duas pessoas, no qual o terapeuta é aberta e livremente ele próprio e evidencia isto talvez mais completamente, quando ele pode livre e com receptividade entrar no mundo da outra. (...) O cliente sente-se confirmado (para usar o termo de Buber) não somente no que ele é, mas em suas potencialidades. Pode afirmar-se, temerosamente de estar certo, como uma pessoa única, separada. Pode tornar- se o arquiteto de seu próprio futuro através do funcionamento de sua consciência. O que isso quer dizer é que já que ele está mais aberto à sua experiência, pode permitir-se viver simbolicamente em função de todas as possibilidades. Pode consentidamente dar vida, em seus pensamentos e sentimentos, aos impulsos criativos dentro de si mesmo, às tendências destrutivas que ele descobre dentro de si, ao desafio do crescimento, ao desafio da morte. Pode fazer face, em seu consciente, ao que para ele significa ser, e o que lhe significa não ser. Torna-se uma pessoa humana autônoma capaz de ser o que é e de escolher seu caminho. Este é o resultado da terapia, vista por esta segunda tendência (Rogers, 1980, p. 100- 101). As duas tendências apresentadas acima correspondem às duas atitudes que o ser humano assume em suas diferentes relações interpessoais e com a própria existência, segundo a filosofia dialógica de Martin Buber (1878-1965): a relação EU-ISSO, que fundamenta a tendência objetiva pela sua natureza objetal, exclusivamente cognoscitiva e utilitária; e a relação EU-TU, que expressa a tendência existencial, pelo seu modo baseado na relação pessoal, “... do encontro de mulheres e homens que se dirigem entre si enquanto realidades pessoais, dimensões existenciais, num duplo movimento recíproco de aceitação e confirmação, sendo através desse que ambos acolhem o mundo como celeiro da alteridade” (Valente, 2006, p.56). Rogers (1991) assinala diversos pontos de convergência das suas idéias com as de Buber. Para ele, nos momentos profundos do processo psicoterápico dá-se uma verdadeira relação Eu-Tu, um encontro dialógico permeado de reciprocidade, como uma espécie de vivência atemporal que envolve intensamente terapeuta e cliente. Aspectos fenomenológicos presentes na Aspectos fenomenológicos presentes na Aspectos fenomenológicos presentes na Aspectos fenomenológicos presentes na ACPACPACPACP Ao nos referirmos sobre os aspectos fenomenológicos presentes na ACP é importante refletir sobre a inserção desta perspectiva na psicologia brasileira e latino- americana. Para Fonseca (s.d.), a ACP que recebemos no Brasil é fruto da vertente pragmática e empirista norte-americana e da fenomenológico-existencial européia, que, inicialmente, foi recebida de modo acrítico e impessoal e, gradualmente, desenvolveu-se enquanto uma abordagem singular e com perspectivas próprias a partir da década de 1980. De acordo com Gomes, Holanda & Gauer (2004), no cenário internacional, os pressupostos fenomenológicos se expandiram rapidamente da filosofia para o campo da saúde: na psiquiatria, a primeira área de influência da fenomenologia, é representada pelos trabalhos de Ludwing Binswanger (1881-1966) e Karl Jaspers (1833-1969). No que se refere à psicologia, a década de 1970 é um marco quanto à produção de conhecimento. Impulsionada pelos estudos do grupo liderado por Amadeo Giorgi, na Universidade de Duquesne, Pensilvânia, EUA, a fenomenologia transformou-se em método de pesquisas empíricas. É importante ressaltar que o trabalho de Giorgi foi precedido pelo de dois psicólogos ligados a Carl Rogers: Adrian L. Van Kaam (1959), fundador de um programa de psicologia dedicado à fenomenologia em Duquesne e Eugene Gendlin (1962), que formulou um modelo de psicoterapia considerado de inspiração fenomenológica. Ainda que existam concepções distintas de fenomenologia, este conceito ainda permanece bastante associado a Edmund Husserl (1859-1938). O caráter formal de uma nova epistemologia surgiu ao final do século XIX, na Alemanha. Fenomenologia advém de duas palavras gregas: phainomenon e logos. Phainomenon (fenômeno) corresponde a tudo aquilo que aparece, que se manifesta e que pode ser percebido, captado pelos sentidos ou pela consciência. Logos é entendido como o discurso esclarecedor. Assim, etimologicamente, fenomenologia significa o discurso esclarecedor a respeito daquilo que se mostra por si mesmo. De um modo geral, é compreendida como o estudo ou a ciência do fenômeno. De acordo com Zilles (2002), a fenomenologia husserliana, “é, em primeiro lugar, uma atitude ou postura filosófica e, em segundo lugar, um movimento de idéias com método próprio, visando sempre o rigor radical do conhecimento” (p.13). Husserl, atento aos problemas do conhecimento, busca encontrar um método e um ponto de partida para a Filosofia enquanto ‘ciência do rigor’. O desenvolvimento das idéias de Husserl foi precedido por um acontecimento histórico que ocorreu ao final do século XIX: declínio dos grandes sistemas filosóficos tradicionais e ascensão das Ciências, em particular a Matemática e a Psicologia, que se converteram na chave das explicações da teoria do conhecimento e da lógica. Husserl questionou a pretensão da Psicologia da época submeter o modo de conhecer aos seus princípios, dedicando-se a encontrar um método de conhecimento rigoroso que servisse de fundamento às demais Ciências (Capalbo, 1987). Dentre os principais conceitos desenvolvidos por Husserl, destacam-se: essência, redução e intencionalidade. Entende-se essências ou eidos como a estrutura invariante cuja presença permanente define o que é o objeto, ou seja, essências são as maneiras características do aparecer dos fenômenos; são conceitos, objetos ideais que nos permitem distinguir e classificar os fatos. Referem-se ao sentido do ser do fenômeno; independem da experiência sensível, muito embora se dando através dela (Zilles, 2002). Segundo Dartigues (1992), essência é o “ser da coisa ou da qualidade, isto é, um puro possível; em consequência, poderá haver tantas essências quantas significações nosso espírito é capaz de produzir” (p.16). Quanto à redução ou epoque, ela aparece sob diversas formas, acompanhando a evolução do pensamento de Husserl. Num primeiro momento, quando acreditava que a existência era separável do sentido das coisas, entendia a redução como a colocação entre parênteses, o colocar de lado a existência factual das coisas para se evidenciar a essência. Tal concepção estava compatível com um contexto, racionalista, que considerava a consciência enquanto interioridade, fechada em si mesmo, que representa um “exterior”. Um segundo aspecto da redução manifesta-se no lema “voltar às coisas mesmas”, tais como aparecem antes de qualquer apreensão, uma espécie de retorno ao elemento puro como fundamento do conhecimento. Com o tempo, esta visão de consciência enquanto representação se tornará superada a partir da noção de intencionalidade (Martins & Dichtchekenian, 1984). Para Husserl (s.d), “a propriedade fundamental dos modos de consciência [...] é a chamada intencionalidade, é sempre ter consciência de alguma coisa” (p.21). Zilles (2002) explica que a intencionalidade fenomenológica é “visada de consciência e produção de um sentido que permiteperceber os fenômenos em seu teor vivido” (p.31). É o que Husserl denomina de análise intencional. Como nosso intuito neste artigo não é explanar de forma detalhada sobre a fenomenologia enquanto filosofia e sim apontar alguns conceitos que convergem com a psicologia e a ACP, apresentaremos agora alguns aspectos considerados significativos da fenomenologia heideggeriana. Martin Heidegger, discípulo de Husserl, é tido como um dos poucos filósofos contemporâneos cuja produção apresenta singular crescimento póstumo, uma vez que ele morreu deixando uma grande quantidade de inéditos que começaram a ser editados a partir de 1978, o que gerou uma terceira fase de seu pensamento (Nunes, 2002). Heidegger reinterpretou o método oriundo da fenomenologia de Husserl, na busca do sentido das coisas, em íntima relação com a hermenêutica. Para ele, existir é interpretar-se. O recurso hermenêutico faz- se necessário para o aparecer e o desvelar do fenômeno (Nunes, 2002; Bruns & Trindade, 2001). Na elaboração de Ser e Tempo, para viabilizar o objetivo de questionamento do sentido do ser, o autor estrutura, de modo original, conceitos que posteriormente despertaram interesse em teóricos e profissionais de diferentes áreas das ciências humanas. Evidenciaremos àqueles que mais frequentemente têm sido referenciados por psicólogos: ser-no-mundo, angústia, abertura e cuidado. Heidegger buscou romper com a concepção do ser como conceito vazio e universal. Na sua investigação, distinguiu a estrutura do ser da do ente. Para este autor, “[...] Ente é tudo de que falamos, tudo que entendemos [...] ente é também o que e como nós mesmos somos.” (Heidegger, 2005. p.32) Na perspectiva heideggeriana esse ente que cada um de nós somos e que possui em seu ser a possibilidade de questionar, é designado como Dasein, expressão alemã que significa “ser-aí”. A edição brasileira traduz o dasein como pre-sença. O dasein sempre se relaciona de formas distintas com os entes, em virtude do seu caráter dinâmico, em constante movimento, que está sendo, numa espécie de acontecendo contínuo conforme a possibilidade existencial vivenciada. Esse caráter pré-ontológico, determinação original e constitutiva do próprio dasein, permite que venha a se expressar com relação aos entes de múltiplas maneiras, com várias possibilidades. Essa amplitude de modos de ação corresponde ao caráter de existência, característico do dasein. Belém (2004) esclarece que o dasein “se identifica com o homem, mas não é o homem. É dizer o mais originário do homem, que, ontologicamente é a sua existência” (p.95). O ser-aí diz de um “ser lançado em um mundo cujo estar presente implica na possibilidade da existência”. Para Heidegger (2005) “o estar- lançado, porém, é o modo de ser de um ente que sempre é suas próprias possibilidades e isso de tal maneira que ele se compreende nessas possibilidades e a partir delas (projeta-se para elas)” (p.244). Com isso, pode-se dizer que o dasein é possibilidade lançada ao mundo. A esta estrutura do dasein de ser lançado, Heidegger nomeou de facticidade da existência. “O dasein se entrega à responsabilidade de assumir o seu próprio ser e, sendo se relaciona com ele e se comporta com o seu ser como possibilidade mais própria” (Belém, 2004, p.97). Desta forma, pelo seu caráter existencial e promotor de sentido, o dasein é principalmente ser-no-mundo. O acesso do ente à existência tem como condição primária o mundo, estrutura fundamental pertencente exclusivamente ao dasein, onde se dá o ingresso dos entes diferentes de nós. A existência humana, então, não teria uma vida privada, precedente, que depois, se relacionaria com o mundo exterior; ela existe no mundo. É o que nos diz Nunes (2004), “o Dasein (enquanto Ser-no-mundo) não está para o mundo como uma coisa encaixada dentro de outra maior, mas sim que ao mundo se liga sob forma de um engajamento pré-reflexivo, integrante da constituição mesma desse ente que somos” (p.126). Em lugar da consciência pura do ‘eu transcendental’, Heidegger partiu da facticidade no mundo, da vida que é histórica e se compreende historicamente. A essência da existência humana é existir em pluralidade, e não em si mesma, uma vez que ela pertence a um mundo circundante, com sua estrutura referencial de utensílios e com a co-presença dos outros. O homem, enquanto, ser-no- mundo, é compreendido no seu próprio existir, pois o existente só pode se compreender em sua relação com o mundo (Lanteri-Laura, 1965). A expressão ser-no-mundo refere-se a um fenômeno de unidade que abrange os seguintes momentos estruturais: a) ser-em, que não indica uma coisa, um ser simplesmente dado, dentro do mundo, mas se refere a uma constituição existencial, a um habitar em, estar familiarizado com; b) ser- junto ao mundo, no sentido de empenhar-se no mundo e não dar-se em conjunto de coisas que ocorrem; c) ser-com, em que a co- presença dos outros constitui existencialmente o ser-no-mundo, pois, conforme afirma Heidegger (2005): “na base desse ser-no-mundo determinado pelo com, o mundo é sempre o mundo compartilhado com os outros” (p.170); d) ser-próprio cotidiano e o impessoal significa que o ser- no-mundo é sempre em função de si próprio, porém o próprio do cotidiano, habitual é o impróprio ou próprio impessoal caracterizado pela dispersão e impessoalidade, em que o si-mesmo é aprendido como próprio, uma vez que “ de início, “eu” não “sou” no sentido do propriamente si mesmo e sim os outros nos moldes do impessoal. É a partir deste e como este que, de início, eu “sou dado” a mim mesmo (Heidegger, 2005, p.182). Ao procedermos uma leitura psicológica deste conceito eminentemente filosófico, podemos abstrair que quando o dasein descobre o mundo, isto é, quando ocorre uma abertura para si mesmo, este “descobrimento de mundo” e esta abertura se cumpre e se realiza como uma “eliminação das obstruções, encobrimentos, obscurecimentos, como um romper das deturpações em que a pre-sença se tranca contra si mesma” (Heidegger, 2005, p.182). Outro aspecto importante refere-se ao que Heidegger denomina de decaída, , , , também traduzida por decadência, ou seja, o desvio de si, o de-cair no mundo das ocupações, a fuga da existência que está fundada na angústia. Heidegger, inspirado em Kierkegaard, não conceitua a angústia como uma experiência disfuncional, um estado ou uma propensão, mas a concebe enquanto uma disposição fundamental da existência; como aquilo que se teme, mas, que, ao mesmo tempo, se deseja. É na angústia que a existência abre-se a si mesmo. O dasein por apresentar diversas possibilidades de concretizar-se, oscila entre fechamento para si e abertura, entre o próprio impessoal e o próprio pessoal; possui um modo de ser em que já se põe diante de si mesmo e se abre para si em seu estar- lançado. A angústia, como disposição constitutiva, é que irá propiciar a abertura para si do dasein, uma saída da cotidianidade, uma independência dos outros, uma ruptura consigo, com o que se é cotidianamente, com a estabilidade. Esta disposição para a abertura não significa um voltar-se para si subjetivo, mas caracteriza-se pelo ser a si mesmo, com as coisas e com os outros. Como é uma disposição não se equivale à abertura; ela é um entre fechamento e abertura, porém, ainda que permeado de cotidianidade, está voltado para o não-cotidiano. Por sermos ser-no- mundo nos voltamos para as coisas, para algo que nos escapa. Essa ausência da coisa é o nada, que se revela em parte alguma, com que a angústia se angustia. Daí porque estamos sempre tendendo à cotidianidade, nos voltando aos entes, para compensar o mal-estar. A angústia não é somente angústia com... mas, enquanto disposição, é também angústia por... O por quê a angústia se angustia não é um modo determinado de ser e uma possibilidade da pre-sença [...] Na angústia o que se encontra à mão
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