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A-psicologia-Humanista

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Sumário:
I Psicologia Humanista
 1.1 Histórico
 1.2 Principais Influências e Adesões
 1.2.1 Teorias Neo-Psicanalíticas
 1.2.2 Gestaltistas e Holistas
 1.2.3 Psicologias Existenciais
 1.2.3 Outras Influências
 1.3 A questôes da contracultura
II Características
 2.1 Temática Privilegiada
 2.2 Visão do Homem
 2.3 Modelo de Ciência
 2.4 Métodos e Técnicas
III Aspectos Humanistas, Existenciais e Fenomenológicos Presentes na Abordagem 
Centrada na Pessoa
 3.1 ACP e Psicologia Humanista-existencias Norte-Americana
 3.2 Aspectos Fenomenológicos presentes na ACP
IV Alteridade e Psicologia Humanista: Uma leitura ética da abordagem centrada na pessoa
 4.1 Abordagem na pessoa como teoria
 4.2 Alteridade Radical
 4.3 Do lugar do outro na ACP
 4.4 O Des-centramento da ACP
V Psicologia Humanista: A história de um dilema epistemológico
 5.1 Pressupostos Filosóficos da Ciência Moderna
 5.2 A imagem humanista do objetivo da Psicologia
 5.3 O dilema da Psicologia Humanista
 5.4 Que concepção epistemológica então?
 5.5 Que métodos então?
 5.6 Psicologia Humanista Contemporânea: Rychlak e a forma atual do dilema
VI Psicologia Humanista no Brasil
 6.1 Humanismo Ideal
 6.2 Humanismo Romântico
 6.3 Humanismo Individual 
 6.4 Humanismo Social
 6.5 Humanismo Crítico
 6.6 Existencialismo
 6.7 Fenomenologia
 6.8 Fenomenologia Existência
 6.9 Abordagem Centrada na Pessoa
 6.10 Fenomenologia e Psicologia
 6.11 Gestalt-terapia
 6.12 Logoterapia
 A PSICOLOGIA HUMANISTA 
1. HISTÓRICO
O Nascimento da Psicologia Humanista 
A Psicologia Humanista, conforme historiado por DeCarvalho (1990), 
surgiu no final da década de 50 e início dos anos 60 como uma reação ao panorama da 
Psicologia norte-americana, dominado, na leitura dos psicólogos humanistas, por duas 
grandes forças: o Behaviorismo e a Psicanálise clássica. 
Foi sobretudo graças ao trabalho de dois homens, Abraham Maslow e 
Anthony Sutich, que o Movimento Humanista pode ser articulado, organizado e 
institucionalmente fundado como a Terceira Força da Psicologia. 
No início da década de 50, Maslow era um promissor psicólogo 
experimental e professor de Psicologia na Universidade de Brandeis, mas seus interesses 
pouco ortodoxos e pouco afinados à forte predominância do Behaviorismo no ambiente 
acadêmico de então, apenas confrontado pela influência da Psicanálise nos meios 
clínicos, tendiam a levá-lo ao isolamento profissional e intelectual. Era-lhe inclusive 
difícil arranjar veículo adequado para publicar seus artigos, que não encontravam 
ressonância na linha editorial e teórica adotada pela maior parte das revistas técnicas de 
Psicologia. 
Como forma de contornar o problema, em meados dos anos 50 organizou 
uma lista de nomes e endereços de psicólogos e grupos envolvidos em visões menos 
ortodoxas e mais afinados com suas próprias idéias, para com eles manter intercâmbio de 
artigos e discussões, na forma de uma rede de correspondência, a que chamou Rede 
Eupsiquiana, ressaltando no título o interesse pelo tema da saúde psicológica, 
negligenciado, segundo Maslow, pela Psicanálise e pelo Behaviorismo. Anthony Sutich, 
psicólogo que conhecera Maslow no final dos anos 40 e que nos anos 50 tornara-se ativo 
participante da rede e intenso colaborador na discussão das novas idéias, veio a ter 
fundamental papel na oficialização do novo movimento. De suas discussões com Maslow 
nasceu a percepção de que já era a hora, ao final dos anos 50, de fundarem uma revista 
própria, sendo que Sutich foi encarregado de encabeçar o empreendimento. Portador de 
paralisia decorrente de artrite progressiva, Sutich dedicou-se intensamente à tarefa de 
articulação e organização, passando horas ao telefone contatando interessados e 
colaboradores. Após considerável deliberação sobre o nome da nova revista - foram 
sugeridos Ser e Tornar-se, Crescimento Psicológico, Desenvolvimento da Personalidade, 
Terceira Força, Psicologia do Self, Existência, e Orto-Psicologia - foi adotado o título 
Revista de Psicologia Humanista, sugerido por S. Cohen, e que desde então passou a 
designar o movimento, oficialmente lançado com o primeiro número da revista, em 1961. 
 O sucesso da revista acabou levando à organização da Associação 
Americana de Psicologia Humanista, fundada em 1963, consolidando-se o movimento 
de forma definitiva em 1964 quando, em uma conferência realizada na cidade de Old 
Saybrook, compareceram em aberta adesão grandes nomes inspiradores do movimento, 
inclusive Carl Rogers. Com sua rápida e sólida difusão a Psicologia Humanista se mostra 
hoje uma Força firmemente estabelecida e respeitada no panorama da Psicologia 
mundial, generalizadamente reconhecida nos campos teórico, acadêmico e de aplicação. 
Principais Influências e Adesões 
Ao contrário das Forças anteriores, a Psicologia Humanista não se 
identifica ou inicia com o pensamento de um determinado autor ou escola. Tratando-se 
primariamente de um movimento congregador de diversas tendências, unidas pela 
oposição ao Behaviorismo e Psicanálise, assim como pela convergência em torno de 
algumas propostas comuns, várias afluências, adesões e influências podem ser apontadas, 
destacando-se as que se seguem: 
TEORIAS NEO-PSICANALÍTICAS 
A crítica que a Psicologia Humanista faz à Psicanálise, centra-se sobretudo 
na visão pessimista, determinista e psicopatologizante, que atribui à teoria de Freud, 
assim como na impessoalidade da técnica transferencial. Já algumas teorias de discípulos 
dissidentes de Freud são vistas com bons olhos, citadas como coerentes e importantes 
influências em relação ao trabalho de destacados humanistas. São vistas com simpatia as 
teorias de Adler, Rank, Jung, Reich e Ferenczi, assim como são bem recebidas 
contribuições da Psicanálise americana, representada por Horney, Sullivan, Erikson, e 
toda a corrente de Psicanalistas do Ego e Culturalistas em geral. Psicanalistas não 
ortodoxos, como Fromm e Nuttin, chegam mesmo a tornar parte ativa no Movimento. 
GESTALTISTAS E HOLISTAS. 
A Psicologia Humanista retoma em grande parte as propostas da Psicologia 
da Forma alemã, em especial a visão holista e organísmica do ser humano e seu 
envolvimento ambiental. Trazida aos Estados Unidos pelos seus criadores Wertheimer, 
Koffka e Köhler, e outros psicólogos imigrantes, fugitivos das conturbações políticas 
européias, a influência da Psicologia da Gestalt está presente em praticamente todos os 
psicólogos humanistas. Para citar apenas os principais autores envolvidos no surgimento 
da Psicologia Humanista e para os quais a formação gestáltica foi decisiva lembremos 
Goldstein, Angyal e Lewin, sendo que este último, ao lado das propostas do Psicodrama 
de Moreno, foi também uma das principais influências no extraordinário 
desenvolvimento e aplicação de técnicas de trabalho grupal, que marcou 
caracteristicamente o movimento da Psicologia Humanista. E ainda neste tópico da 
influência gestáltica, não pode ser esquecido Perls, o polêmico Fritz, que, em suas 
originais leituras da Psicanálise, da Psicologia da Gestalt e do Existencialismo, foi, com a 
Gestalt-Terapia por ele criada, uma das presenças mais marcantes no extraordinário 
sucesso e desenvolvimento da Psicologia Humanista nas décadas de 60 e 70. 
PSICOLOGIAS EXISTENCIAIS. 
As articulações para o lançamento da Psicologia Humanista coincidiram, 
no final da década de 50, com a maior difusão nos Estados Unidos do trabalho que havia 
décadas vinha sendo realizado na Europa por diferentes correntes de Psicologia e 
Psicoterapia inspiradas em filósofos existencialistas e fenomenólogos * . Essa difusão 
ocorre não só pela tradução para o inglês de obras de psicólogos existenciais, como Boss, 
Binswanger e Van Den Berg, mas também pelo trabalho de divulgação realizado no meio 
psicológico pelos escritos de Tillich e Rollo May, sendo que este em 1959 organiza o 
primeiro simpósio americano sobre Psicologia Existencial, para o qual são convidados 
expoentes e futuroslíderes do Movimento Humanista, como Maslow e Rogers. 
Não tardaram a serem encontrados pontos em comum nas respectivas 
propostas e, sobretudo pela participação ativa de May e outros psicólogos existenciais 
que aderiram ao Movimento, como Bugental e Bühler, a Psicologia Humanista foi 
amplamente enriquecida com a perspectiva fenomenológica e existencial, ao ponto de 
por vezes ser denominada Psicologia Humanista-Existencial (Greening, 1975). 
Não cabe aqui uma discussão mais aprofundada do relacionamento nem 
sempre fácil e pacificamente aceito entre a perspectiva humanista americana - em muitos 
sentidos muito mais essencialista, ligada antes a Rousseau que a Heidegger e Sartre, 
menos filosoficamente sofisticada, mais otimista e vinculada a interpretações biológicas 
da natureza humana - e a perspectiva existencial européia. Entre os filósofos 
existencialistas cujas idéias foram mais abertamente abraçadas pelos humanistas 
americanos, destacam-se Kierkegaard e Buber, sem esquecer a influência de Nietzche, 
que sobretudo por via indireta (as idéias de Adler), é notada em algumas propostas da 
Terceira Força. De uma maneira geral, o Movimento Humanista acabou por absorver a 
maioria dos psicólogos existenciais americanos e, do outro lado, a proposta humanista 
recebeu a adesão de pelo menos um teórico europeu de destaque, Viktor Frankl, criador 
da Logoterapia, que posteriormente integraria também o Movimento Transpessoal. 
Ronald Laing, o anti-psiquiatra inglês que sofreu forte influência das idéias de Sartre, 
pode também ser apontado como interlocutor e simpatizante da Psicologia Humanista e, 
à semelhança de Frankl, assíduo freqüentador do meio transpessoal. 
ESCOLAS AMERICANAS DE PSICOLOGIA DA PERSONALIDADE 
Outra importante influência na constelação do Movimento Humanista, diz 
respeito à afluência de importantes escolas de Psicologia da Personalidade desenvolvidas 
nos Estados Unidos. Afora a sempre lembrada homenagem póstuma aos pragmatistas 
John Dewey e William James, destacados teóricos independentes como G. Allport, G. 
Murphy, Murray, Kelly, Ellis, Maslow e Rogers, assim como toda a escola de Psicologia 
do Self, se associaram ao movimento, em diferentes graus de apoio e envolvimento. 
* É importante ressaltar que a Fenomenologia, numa versão simplificada (entendida como descrição ingênua da
experiência vivida) e um tanto desvinculada de suas raízes filosóficas mais elaboradas, fôra trazida anteriormente
aos Estados Unidos pelos psicólogos gestaltistas alemães e psiquiatras da escola jasperiana, e já era, havia muito,
conhecida e utilizada pelos psicólogos americanos, quer como método auxiliar de coleta de dados, quer como a
fundamentação principal de elaborações teóricas.
OUTRAS AFLUÊNCIAS 
Como movimento aberto e inclusivo de novas tendências, idéias e 
experimentações pouco ortodoxas, a Psicologia Humanista não tardou a integrar em suas 
fileiras de simpatizantes e proponentes toda sorte de marginais contestadores do sistema. 
A espetacular revolução que o movimento propiciou no campo das psicoterapias, 
entendidas a partir de então na perspectiva ampliada de técnicas de crescimento pessoal 
ou de desenvolvimento do potencial humano, estimulou o estudo, experimentação e 
aplicação - infelizmente de modo nem sempre tão sério e criterioso como seria de se 
desejar - de novas formas de ajuda psicológica. Entre as tendências que se aproximaram 
da Psicologia Humanista destacam-se as novas psicoterapias que vinham se 
desenvolvendo a partir do trabalho mais ou menos independente de seus criadores, como 
a Terapia Primal de Arthur Janov, a Análise Transacional de Eric Berne e a 
Psicossíntese de Roberto Assagioli (que posteriormente abraçaria o Movimento 
Transpessoal); as escolas e técnicas de trabalho não verbal e corporal, com suas 
propostas de relaxamento, sensibilização e desbloqueio psíquico e energético; as variadas 
formas de trabalho intensivo com grupos que se associaram ao Movimento dos Grupos de 
Encontro; e enfim toda sorte de touchy-feelly terapeutas envolvidos na experimentação 
alternativa de técnicas de desenvolvimento pessoal ou simplesmente navegando em uma 
superficial e consumista adesão à nova onda. 
Influências matizadas de aspectos que em breve dariam origem ao 
Movimento Transpessoal, especialmente relativas ao estudo e aplicação de técnicas de 
meditação e experimentação psíquica com drogas psicodélicas, também podem aqui ser 
incluídas, embora alguns humanistas mais ortodoxos as rejeitem como parte das 
superficiais e pouco sérias contribuições e adesões que o movimento acabou por atrair, 
em grande parte devido ao clima cultural mais amplo a que o surgimento da Psicologia 
Humanista esteve associado e que examinamos a seguir. 
A Questão da Contracultura 
A institucionalização e o rápido desenvolvimento e aceitação da Psicologia 
Humanista coincidiu, no contexto cultural da década de 60, com os anos de acentuado 
questionamento e mudanças nas sociedades ocidentais. Anos de revoltas políticas e de 
costumes, sobretudo entre a juventude, e em que mais do que nunca a contestação ao 
Sistema e aos valores estabelecidos esteve na ordem do dia. Anos marcados pelo que, na 
expressão cunhada por Theodore Roszak (s. d.), foi chamado de Contracultura: revoltas 
estudantis, movimento hippie, mobilização pacifista contra a guerra do Vietnã, ativismo 
político, organização de minorias raciais e feministas, desafio à autoridade, revolução 
underground nas artes, oposição ao materialismo consumista, valorização do corpo, do 
sentimento, do amor livre, da experimentação psíquica através das drogas psicodélicas, 
da ecologia, da auto-expressão espontânea, e das experiências meditativas e espirituais. 
Essas tendências todas convergiam na rejeição aos modelos tradicionais de família, de 
trabalho, de escola, de relações interpessoais, de igreja, de governo, de instituições em 
geral, e da própria cultura ocidental. 
Muito do extraordinário sucesso da Terceira Força da Psicologia se deve 
ao Zeitgeist desse momento histórico, ao qual de várias maneiras suas propostas eram 
ressonantes e coincidentes, ao ponto de, em diversos sentidos, ter sido o Movimento da 
Psicologia Humanista abarcado como uma das facetas da Contracultura. A própria 
posição geográfica de alguns dos principais centros de desenvolvimento e difusão da 
Psicologia Humanista, como o quase lendário Instituto Esalen, colocava-os no centro dos 
acontecimentos, na Califórnia, Meca e terra prometida da Contracultura americana. 
Apesar dos excessos, equívocos, ingenuidades e superficialidades 
cometidos no calor da revolução cultural, não compartilho a opinião daqueles (como 
Smith, 1990) que lamentam como infeliz distorção a associação da imagem da Psicologia 
Humanista aos movimentos contestatórios dos anos 60. Na verdade, mais do que 
qualquer outra corrente da moderna Psicologia, a Psicologia Humanista é marcada por 
um compromisso de engajamento em favor da mudança social e cultural, em direção a 
uma sociedade de valores mais humanos, menos controladora, mais atenta às 
necessidades intrínsecas de auto-realização, mais criativa e lúdica, envolvendo relações 
pessoais mais abertas, autênticas, auto-expressivas e prazeirosas, em que a exploração 
alternativa das dimensões humanas da intimidade corporal e emocional fosse sancionada 
ao invés de reprimida; enfim, onde a pessoa, em sua liberdade e autodeterminação no 
desenvolvimento de suas possibilidades, fosse o valor supremo, contra todos os dogmas, 
valores e autoridades externamente constituídas. Ora, em grande parte, isso me parece 
coincidir com as propostas e os valores abraçados pelos movimentos contraculturais de 
então. 
2. CARACTERÍSTICAS
Temática Privilegiada 
Além da oposição ao Behaviorismo e à Psicanálise, e da absorção de 
escolas não identificadas com essas correntes, o Movimento Humanista é caracterizado 
pela congregação de estudiosos emtorno de alguns tópicos e interesses que podem ser 
apontados como temáticas típicas e preferenciais da Psicologia Humanista. Sutich 
(1991), relembrando o início do Movimento e o lançamento da Revista de Psicologia 
Humanista, informa como uma definição de Terceira Força, formulada por Maslow em 
1957, foi utilizada na introdução da primeira edição, para assim descrever a proposta: 
A Revista de Psicologia Humanística foi fundada por um grupo de psicólogos e 
profissionais de outras áreas, de ambos os sexos, interessados naquelas capacidades e 
potencialidades humanas que não encontram uma consideração sistemática nem na teoria 
positivista ou behaviorista, nem na teoria psicanalítica clássica, tais como criatividade, 
amor, self, crescimento, organismo, necessidades básicas de satisfação, auto-realização, 
valores superiores, transcendência do ego, objetividade, autonomia, identidade, 
responsabilidade, saúde psicológica, etc. (p. 24). 
Nessa significativa listagem elaborada por Maslow como resumo dos 
interesses editoriais do veículo oficial do Movimento, pode-se perceber o delineamento 
das principais tendências e ênfases temáticas que, relacionadas entre si, caracterizam-se 
como típicas da Psicologia Humanista. 
Em primeiro lugar, a Psicologia Humanista destaca-se como a corrente que, 
afastando-se do tradicional enfoque clínico de privilegiar o estudo das psicopatologias, 
passa a enfatizar a saúde, o bem estar, e o potencial humano de crescimento e auto-
realização. Já em seu livro Introdução à Psicologia do Ser, de 1957, Maslow (s. d.) 
aponta para a necessidade do desenvolvimento de uma Psicologia da Saúde, criticando 
as teorias, como a Psicanálise, que generalizam suas conclusões sobre o ser humano a 
partir de dados obtidos quase que exclusivamente no estudo de indivíduos mentalmente 
perturbados, resultando conseqüentemente em um retrato pessimista e desabonador da 
natureza humana. Maslow, ao contrário, se propõe o estudo dos melhores exemplares da 
espécie, por ele chamados personalidades auto-atualizadoras, dando início à tradição 
humanista de abordar a Psicologia a partir do prisma da saúde e do crescimento 
psicológico. Tão forte é essa tendência que forneceu o termo Eupsicologia, cunhado nas 
primeiras tentativas de articulação e caracterização do movimento. Também, em sua 
proposta de enfatizar o desenvolvimento das melhores capacidades e potencialidades do 
ser humano, a Psicologia Humanista é muitas vezes identificada como o Movimento do 
Potencial Humano. Assim, ao invés de empenhar-se em exaustivas descrições e 
teorizações sobre os mecanismos das enfermidades psíquicas, reservando à saúde a 
definição negativa de ausência de doença, é mais típico da Psicologia Humanista buscar 
definir as características do pleno e saudável exercício da condição humana, em 
distanciamento do qual as patologias podem então ser entendidas. 
Em segundo lugar, outra importante orientação temática geral da Psicologia 
Humanista diz respeito ao privilegiar das capacidades e potencialidades características e 
exclusivas da espécie humana. Criticam os humanistas, sobretudo ao Behaviorismo, a 
tendência a generalizar conclusões obtidas a partir de experimentos realizados quase que 
exclusivamente em pesquisa animal; assim como a forte tendência da psicologia 
experimental a, mesmo quando dedicada a trabalhos com pessoas, centrar-se em aspectos 
fisiológicos, ou muito parcializados, perdendo de vista a própria dimensão psicológica 
característica do ser humano, que deveria em princípio ser o enfoque prioritário de uma 
ciência dedicada ao estudo da mente e da psiquê. Como diz Matson (1975), um dos 
presidentes da Associação de Psicologia Humanista: 
Não seria excessiva violação da verdade afirmar que grande parte do que ocorre em 
Psicologia, nada tem de "psicológico". E isso nos leva à razão que gerou a Terceira 
Revolução - o renascimento do humanismo em psicologia. (p. 69 ) 
Assim, a volta ao humano como objeto de estudo é uma das bandeiras do 
Movimento, importante a ponto de fornecer-lhe o título designativo. Qualidades e 
capacidades humanas por excelência, tais como valores, criatividade, sentimentos, 
identidade, vontade, coragem, liberdade, responsabilidade, auto realização, etc., 
fornecem temas de estudo típicos das abordagens humanistas. Essas e outras temáticas, 
igualmente características (organismo, self, significados, intencionalidade, necessidades 
básicas, experiência subjetiva, encontro, etc.), estão também associadas à visão de 
homem, à proposta de Ciência, e aos métodos e técnicas desenvolvidos e assumidos pela 
Psicologia Humanista, que serão examinados nos próximos itens, e representam as 
diversas influências recebidas pelo Movimento, que foram sucintamente referidas nos 
itens anteriores. 
Ao leitor mais atento não terá por certo escapado a inclusão, na listagem de 
Sutich, do tema transcendência do ego. Tal assunto, embora em algumas abordagens 
possa ser entendido como a mera superação da identificação com uma defensiva e 
socialmente imposta imagem de si, em seu sentido mais amplo, caracteriza antes uma 
temática transpessoal, cuja inclusão aqui serve para ilustrar a vinculação dessa tendência 
ao Movimento Humanista, no qual era inicialmente vista como uma facção de interesses, 
assunto que será melhor esclarecido quando tratarmos do surgimento da Psicologia 
Transpessoal. 
Visão de Homem 
De forma bem mais declarada que as Forças anteriores, a Psicologia 
Humanista, enquanto movimento organizado, reconhece, assume e propõe a 
inevitabilidade da adoção de um Modelo de Homem, ou seja, uma concepção filosófica 
da natureza humana, como ponto de partida e princípio norteador de qualquer projeto de 
construção da Psicologia. Neste tópico, talvez mais que em qualquer outro, destila a 
Psicologia Humanista suas maiores críticas e discordâncias às escolas a que se opõe, 
contestando veementemente os modelos de homem que identifica nas formulações 
psicanalíticas e behavioristas. 
 Opõem-se os humanistas à concepção psicanalítica do homem como um 
animal lúbrico e feroz, movido por necessidades instintivas de prazer e agressão, ao qual 
só a custa de muitas restrições e sublimações da natureza animalesca básica se pode, na 
melhor das hipóteses, trazer algum verniz de racional sociabilidade, mas não sem um 
inevitável ônus de frustração, infelicidade e Mal-Estar da Civilização. Recusam-se 
também a conceber o ser humano como uma espécie de máquina, robô ou marionete, 
cuja natureza passiva e amorfa é absolutamente moldada, manipulada e controlada pelas 
contingências de estimulação e condicionamento ambiental, a quem na melhor das 
hipóteses se poderá oferecer a escolha (ela própria condicionada) entre um 
condicionamento fortuito e um planejado, quer este planejamento se dê por iniciativa (?) 
do próprio sujeito condicionado, quer se dê por interferência da ideologia ou poder 
político dominante que as circunstâncias ambientais mais amplas tenham levado as 
sociedades humanas a adotar. Negando-se a aceitar que o homem seja assim reduzido por 
tão pessimistas e desalentadoras visões, a Psicologia Humanista se afirma em um 
compromisso com uma visão otimista e engrandecedora, na qual que as melhores 
qualidades e potenciais positivos manifestados pelos homens sejam valorizados como a 
própria essência da natureza humana. 
 Grosso modo, a visão psicanalítica costuma ser comparada, pelos 
humanistas americanos, à pessimista opinião de Hobbes (o homem é o lobo do homem), e 
a visão behaviorista à concepção de Locke, que vê o ser humano como uma tábula rasa; 
ao passo que seu próprio modelo é considerado como uma reedição da generosa visão de 
Rousseau: O homem é naturalmente bom, a sociedade é que o corrompe. 
 Vejamos, em algumas tendências e consensos das abordagens humanistas, 
um sucinto esboço da visão de homem que elas propõem: 
Enxergando o homem como um todo complexoe organicamente integrado, 
cujas qualidades únicas vêm de sua configuração total, rejeitam os humanistas as 
concepções elementaristas e fragmentadoras da psiquê. Retomando para o Movimento a 
proposta holista que Adler foi buscar em Smuts, e que de outra parte caracterizou a 
Psicologia da Gestalt, vêem no homem uma natureza tal que a totalidade da pessoa 
humana é sempre maior que a soma de suas partes tomadas isoladamente. Em especial 
nas teorias desenvolvidas nos Estados Unidos - o ramo americano e mais 
caracteristicamente humanista do Movimento, e para o qual as idéias do neurologista e 
teórico gestaltista Goldstein foram especialmente influentes - a compreensão 
organísmica do ser incluí suas raízes biológicas. Assim, concebem o homem como 
marcado pela necessidade, que vêem como intrínseca a todo organismo vivo, de atualizar 
seu potencial e se tornar a totalidade mais complexa, organizada e autônoma que for 
capaz. Esta hipótese da necessidade de auto-realização fornece, em diversas versões, a 
teoria básica de motivação da maioria das psicologias humanistas. Mesmo que as escolas 
existenciais, dada sua ênfase na liberdade e sua compreensão do ser humano como 
criatura cuja natureza consiste em criar sua própria natureza (Sartre), rejeitem a 
consideração de tendências biológicas determinantes, há quem remonte à vontade de 
potência de Nietzsche a origem da formulação humanista da existência de uma tendência 
intrínseca de busca da auto-realização. Igualmente associada à concepção holista, está a 
compreensão que os humanistas em geral tem do homem como implicado e configurado - 
mas não determinado - em seu ambiente, seja este físico, fenomenológico-experiencial, 
relacional, ou sócio-histórico-cultural. 
O ser humano, na visão humanista-existencial, é proposto como um ser 
essencialmente livre e intencional, recebendo esta noção especial destaque nas 
psicologias existenciais, as quais por vezes rejeitam a concepção mais essencialista e 
rousseauniana dos americanos, que crêem ser a natureza humana positivamente 
orientada, devendo as relações psicossociais deletérias ser responsabilizadas por qualquer 
desvio dessa bondade original. Para os existencialistas, sendo o homem livre e auto-
orientado pelos propósitos e sentidos que dá à própria existência, não pode eximir-se de 
se responsabilizar plenamente pelo que é, apesar da inevitável angústia que esse assumir-
se evoca, pois qualquer outra atitude seria auto-engano, má fé, inautenticidade no existir. 
De qualquer forma, de uma maneira geral, as teorias humanistas propõem que o 
comportamento do ser humano não pode ser adequadamente entendido a partir de 
referências exclusivas a influências determinantes externas à sua consciência e aos 
significados atuais que imprime ao mundo, sejam essas influências provenientes do 
ambiente, do passado, ou do inconsciente. Associadas portanto à aceitação da liberdade, 
da responsabilidade, e da intencionalidade como características intrínsecas à condição 
humana, resultam a ênfase nas interpretações teleológicas (que enfocam a finalidade ao 
invés da causa passada) do comportamento; o privilegiar da dimensão consciente e do 
vivenciar da experiência presente; assim como o enfoque fenomenológico (que se atem à 
experiência subjetiva e consciente) e compreensivo (que contrapõe a compreensão por 
empatia à explicação por referenciais exteriores) que, com maior ou menor destaque, são 
defendidos pelos humanistas. 
Enfim, vendo o homem como um ser em busca e construção de si mesmo, 
cuja natureza continuamente se desvela e exprime no realizar de suas possibilidades e na 
atualização de seu potencial, compreendem os humanistas que só se é pessoa, só se é 
realmente humano, no autêntico, livre e integrado ato de se desenvolver. Daí o 
generalizado consenso, que alguns entendem como a característica mais marcante da 
visão de homem que a Psicologia Humanista apresenta, em rejeitar concepções estáticas 
da natureza humana, considerada antes como algo fluido: uma tendência para crescer, um 
movimento de sair de si, um projetar-se, um devir, um incessante tornar-se, um contínuo 
processo de vir a ser. 
Modelo de Ciência 
O desenvolvimento da Psicologia Humanista é caracteristicamente marcado 
por uma reflexão e tomada de posições, em questões filosóficas e epistemológicas, sobre 
a natureza da Psicologia enquanto Ciência. É, sob alguns novos aspectos e nuances, 
retomada a discussão que envolveu o nascimento e as primeiras décadas da Psicologia 
Científica contemporânea, em torno da questão do modelo, dos métodos e do objeto 
dessa nova ciência. A controvérsia principal referia-se à adequação do Modelo de 
Ciência, até então bem sucedido nas modernas ciências naturais, estender-se às 
nascentes ciências humanas, as quais, justificadas pela singularidades de seu objeto de 
estudo, congregavam arrebatados defensores do desenvolvimento de um modelo próprio 
e diferenciado. Embora na Europa o debate tenha prosseguido e frutificado, 
principalmente no desenvolvimento de escolas de psicopatologia e psicoterapia 
inspiradas na Fenomenologia e no Existencialismo, no panorama americano a discussão 
parecia ter estagnado, com a aparente vitória do dos modelos naturalistas, fosse o modelo 
positivista de determinismo ambiental adotado pelo Behaviorismo, com sua ênfase na 
experimentação animal e na observação objetiva; fosse o modelo médico, mecanicista em 
sua ênfase no determinismo psíquico, de inspiração darwiniana, e igualmente naturalista, 
da Psicanálise. Os humanistas, reeditando em novas versões propostas da Psicologia 
Compreensiva de Dilthey, da perspectiva holista da Psicologia da Gestalt, da primeira 
Fenomenologia de Husserl, e dos questionamentos existencialistas sobre a singularidade 
e irracionalidade da existência concreta, tendem a acordar que a Psicologia deve se 
afirmar em um modelo de ciência do homem, respeitando e se adaptando às 
especificidades de seu objeto de estudo. Embora a este respeito não se possa encontrar 
unanimidades indiscutíveis entre as diversas propostas que se articulam no movimento 
humanista, algumas tendências parecem se destacar, sobretudo em decorrência do 
Modelo de Homem que, como vimos, esse movimento defende. 
De uma maneira geral, a Psicologia Humanista não se opõe aos parâmetros 
de racionalidade e objetividade empírica, quando utilizados na busca de explicação, 
controle e previsão dos fenômenos do mundo das coisas. Entretanto, quando se trata do 
homem, que os humanistas entendem como tão distinto do restante da criação, em maior 
ou menor grau, se opõe a diversos princípios e procedimentos consagrados em modelos 
de ciência natural e nas propostas de Psicologia das Forças a que se opõe. Há 
considerável consenso na crítica da aplicação, ao estudo do homem, de abordagens 
reducionistas, deterministas, elementaristas e objetivantes, ao passo que o racionalismo 
empírico-indutivo e hipotético-dedutivo é, com adaptações, menos rechaçado. Vejamos 
brevemente estas questões. 
Opondo-se ao reducionismo, que vêem como associado aos modelos de 
homem do Behaviorismo e da Psicanálise, recusam-se os humanistas a entender o ser 
humano como um mero jogo de forças instintivas e culturais, ou intermináveis cadeias de 
estímulo-resposta, sujeito aos mesmos processos comportamentais que os animais de 
laboratório. Reconhecem os humanistas na pessoa humana uma complexidade tal que 
implica numa mudança qualitativa, e não apenas quantitativa, em relação às espécies 
inferiores, de tal ordem que o princípio metodológico de se compreender pelo mais 
simples o mais complexo deva, no caso do homem, ser invertido, pois até os processos 
psíquicos mais simples e primitivos adquirem novos sentidos na configuração total da 
personalidade humana. Ao determinismo e mecanicismo será desnecessário nos 
estendermos, pois para abordagens que enfatizam a liberdade e a intencionalidade comocondição humana, é evidente que o determinismo não vai ser de muito auxílio ou 
relevância. 
A questão da objetividade científica, em nome da qual o Behaviorismo 
mais radical tentou esterilizar de toda vida psíquica a ciência da Psicologia, é talvez a 
posição que recebe maiores ataques, pois é justamente a dimensão subjetiva dos 
sentimentos, das emoções, dos valores, das inter-relações, dos significados, da vontade, 
dos anseios, da criatividade, da experiência e vida consciente, o objeto de estudos que 
prioritariamente a Psicologia Humanista quer abordar. Como se pode então, em nome da 
Ciência, fechar os olhos ao que de mais significativo e característico há para se investigar 
no objeto que se tem para estudo? 
No que tange a levar a maiores extremos ainda o questionamento da 
natureza da investigação científica da psiquê humana, mesmo dentro do próprio 
Movimento Humanista as posições tendem a divergir. A maioria das escolas humanistas 
americanas se inclina a professar fé na Ciência, e seus investigadores, muitos com sólida 
formação empírica e experimental, são bastante criativos em renovar e adaptar formas de 
pesquisa, inclusive experimentos laboratoriais, às dimensões do ser que desejam estudar; 
enquanto a tradição fenomenológica européia tem possibilitado a enorme ampliação de 
vias no desenvolvimento de procedimentos para Psicologia, e fornecido talvez os 
principais subsídios para a discussão da natureza desta, enquanto ciência do homem. É 
entretanto em algumas propostas existencialistas que talvez se encontrem as posições 
mais radicais do questionamento. Tomadas até as últimas conseqüências, certas 
concepções básicas da visão existencial de homem e de universo, como as que propõe o 
caráter singular e único de cada existência, a imprevisibilidade das possibilidades e dos 
projetos decorrentes da liberdade e escolha autênticas, assim como a irracionalidade de 
um universo que, afora os mutantes sentidos que cada homem a cada momento lhe 
imprime, é de uma absurda e absoluta gratuidade, parecem tornar irrelevante qualquer 
noção de previsibilidade, constância, replicabilidade, generalização, racionalidade e 
mesmo comunicação de resultados, no estudo do humano. Sem se aceitar uma 
possibilidade mínima dessas condições, é de fato difícil acreditar que seja possível 
chegar a algum tipo de verdade científica, o que leva alguns psicólogos existenciais ao 
questionamento céptico da utilidade de investigações empíricas, formulações teóricas, ou 
mesmo da Psicologia enquanto Ciência. Deste ponto de vista mais extremado, algumas 
abordagens mantém-se muito mais próximas da Antropologia Filosófica que da 
Psicologia Científica, à qual parecem se manter ligadas apenas pelas preocupações de 
natureza clínica de suas propostas de psicoterapia. 
Enfim, não pode deixar de ser dito, os questionamentos e respostas que a 
Psicologia Humanista levanta e esboça sobre a natureza da Psicologia enquanto Ciência e 
sua possibilidade de contribuir para a felicidade, saúde e auto-realização humana, 
encontram-se no cerne de todo um processo mais amplo que marca a crise da moderna 
Civilização Ocidental. Se a Ciência colaborou para esvaziar e isolar o homem, 
reduzindo-o à sua mera dimensão material e aos frios mecanismos lógico-racionais a 
serviço de considerações mesquinhas e doentias, a justa revolta cultural contra esse 
estado de coisas que nos tem retirado o sentido, a maravilha e a profundidade da 
experiência de ser humano entre humanos, mobilizou também os psicólogos. Assim, a 
Psicologia Humanista se compromete, em seu projeto de Ciência, a estar sempre voltada 
a favorecer o movimento da aprisionada alma humana, em sua busca de um mundo que 
se possa chamar humano, e em que, entre os da nossa espécie, seja realmente um prazer 
viver. 
Métodos e Técnicas 
Mantendo-se fiel às suas opções temáticas, e tendo sempre em vista as 
dimensões do ser que seu enfoque privilegia, a Psicologia Humanista desenvolve, adapta 
e renova variadas técnicas e metodologias de abordagem da pessoa, com finalidades de 
estudo ou intervenção. Os questionamentos e posições assumidas sobre a natureza da 
Ciência Psicológica e seu objeto próprio de estudo fazem do projeto humanista de 
construção da Psicologia uma fonte de inspiração e parâmetros no desenvolvimento de 
abordagens adequadas, sendo sobretudo o compromisso com sua visão de homem que 
orienta a criação e desenvolvimento de novas formas de estabelecer a saúde psíquica e 
promover o desenvolvimento dos melhores potenciais humanos. 
No campo da pesquisa, a Psicologia Humanista é marcada não só pela 
eleição de temas e faixas da experiência humana até então negligenciadas como objeto de 
investigação, mas também pelo desenvolvimento e utilização de inovações 
metodológicas. O instrumental de pesquisa e investigação desenvolvido e utilizado sob a 
égide da Terceira Força é bastante rico e diversificado. Para um breve apanhado das 
contribuições mais significativas e características, podem ser brevemente lembradas as 
variações dos métodos inspirados na Fenomenologia, aí incluídas as chamadas pesquisas 
qualitativas; a crescente consideração da influência da pessoa do investigador nos 
experimentos, que em muitos estudos é complementada com a inscrição dos sujeitos da 
pesquisa como co-investigadores; a larga realização de estudos idiográficos (interessados 
nas singularidades, ao invés das características generalizáveis do sujeito da investigação); 
e o eclético e criativo uso com que investigadores humanistas renovam abordagens mais 
tradicionais de pesquisa, desde os experimentos laboratoriais até o consagrado recurso do 
estudo de caso. 
É entretanto no campo das psicoterapias e técnicas de crescimento pessoal, 
mais do que em qualquer outro, que a contribuição da Psicologia Humanista é 
especialmente exuberante e espetacular, resultando em uma verdadeira revolução nos 
conceitos e formas de ajuda psicológica. O espaço aqui seria pequeno, caso eu desejasse 
fazer a mínima justiça da citação nominal das novas escolas e propostas que foram 
desenvolvidas na vanguarda ou na esteira do Movimento Humanista. Optei então por me 
restringir apenas à discriminação comentada de algumas das principais tendências que se 
associam ao Movimento. 
Embora a diversidade das teorias e técnicas psicoterápicas abrangidas pela 
Psicologia Humanista seja quase inumerável, o reconhecimento do potencial positivo e 
saudável da natureza humana tende a congregá-las em um objetivo de trabalho comum, 
distinto do apresentado pelas Forças anteriores. Para a concepção psicanalítica de ser 
humano, a psicoterapia visa obter um equilíbrio entre a voracidade irracional das forças 
do Id, as restrições culturais internalizadas no Superego, e as condições objetivas da 
realidade, mediante as articulações parcialmente conscientes do Ego e seus mecanismos 
de defesa, resultando, na melhor das hipóteses, na transformação de uma infelicidade 
neurótica em uma infelicidade normal. Para o Behaviorismo, o conceito determinista e 
valorativamente neutro que faz da natureza humana, implica que a terapia é bem 
sucedida ao propiciar o descondicionamento dos comportamentos indesejados e a 
aprendizagem do repertório que propicie melhor adaptação e atenda ao desejado, sendo 
que as questões desejado por quem? ou adaptado a que? não encontram no 
Behaviorismo resposta, que deve ser buscada na ideologia da moda ou no senhor de 
escravos que estiver de plantão. Já para a Psicologia Humanista, o objetivo de qualquer 
tratamento pode ser formulado numa frase quase redundante: levar a pessoa a ser ela 
mesma. Propiciar ao cliente, ou estudante, a conquista de uma existência autêntica, auto-
consciente, transparente, espontânea, verdadeira, congruente e natural, sem máscaras, 
jogos, couraças ou divisões (splits) internas: eis o que pretendem os humanistas. 
A ênfase na saúde ao invés de na doença, assimcomo a proposta de 
desenvolvimento do potencial humano, tem levado as terapias humanistas a entender suas 
técnicas de ajuda muito mais como formas de estimular o desenvolvimento e a 
aprendizagem do que como tratamento de enfermidades, disfunções ou anomalias 
psíquicas. A troca do modelo médico pelo de auto-realização tem levado muitas 
abordagens a se apresentarem - não obstante o tradicional designativo psicoterapia 
mantenha sua força - como sendo métodos e técnicas de desenvolvimento ou crescimento 
pessoal. De qualquer forma é bastante generalizada a concepção de que toda psicoterapia 
bem sucedida é um processo de aprendizagem profunda e ampla, assim como toda 
aprendizagem verdadeiramente significativa é profundamente liberadora e curativa, 
sendo diversos dos métodos humanistas utilizados quase que indiferenciadamente no 
consultório e na sala de aula. 
Uma das conseqüências da visão holista e da concepção do homem como 
um todo bio-psíquico-social, é o destacado desenvolvimento das chamadas técnicas e 
abordagens corporais, em que massagem, toque, sensações, dança e movimento, 
catarses expressivas de cólera, choro, riso, vômito, grito e orgasmo, instrumentalizam o 
crescimento psíquico e a maior vivência de si. Ainda neste tópico do enfoque 
pluridimensional, podem ser incluídas as técnicas não verbais, o uso do poder da 
expressão artística, e até mesmo práticas meditativas e espirituais, cujo potencial 
curativo viria a ser posteriormente assumido como um dos principais recursos da terapias 
transpessoais. 
Noções existencialistas do homem como um ser de natureza dialogal, que 
só se mostra - e verdadeiramente é - no encontro pessoal, tem favorecido as terapias 
relacionais, em que o terapeuta abdica das posturas e defesas profissionais, para entrar 
em relação como pessoa real, pois é no encontro de pessoa para pessoa, na relação Eu-
Tu, que, acreditam os humanistas, a mudança se dá. 
A aceitação da tendência inata e intrínseca para o crescimento e auto-
realização favorece a compreensão do terapeuta como sendo antes um facilitador, do que 
alguém que atua sobre o outro. A ênfase no fluir constante, na liberdade e na 
singularidade de cada ser, tende a abolir os planejamentos, os objetivos e estratégias, e a 
desenvolver uma atitude de abertura ingênua e incondicional ao que vem do outro em seu 
processo de desenvolvimento e auto-criação. 
O extraordinário desenvolvimento de terapias e técnicas de trabalho com 
grupos, especialmente na forma de vivência intensiva, é uma das tendências que marca a 
Psicologia Humanista. Além das ricas e inovadoras contribuições teóricas e técnicas a 
essa modalidade de atuação, até então negligenciada, o chamado Movimento dos Grupos 
de Encontro representou, ao menos nos anos 60 e 70, a faceta de maior impacto da 
Terceira Força, traduzindo em ações efetivas o compromisso transformação sócio-
cultural que a Psicologia Humanista se impõe. 
Enfim, é no teste empírico de suas idéias, muitas vezes taxadas de ingênuas 
ou utópicas, e no sucesso e aceitação de suas práticas, que a Psicologia Humanista tem se 
consolidado como uma psicologia afinada ao Zeitgeist de nossa época, em que apesar de 
toda crise, amargura, cinismo, solidão e desesperança, o anseio mudo e oculto por uma 
vida mais autentica e humanizada torna-se eloqüente e fulgura ao encontrar quem nele 
acredite e se disponha a ajudar. 
ASPECTOS 
HUMANISTAS, 
EXISTENCIAIS E 
FENOMENOLÓGICOS 
PRESENTES NA 
ABORDAGEM 
CENTRADA NA PESSOA 
IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução 
A Abordagem Centrada na Pessoa (ACP) 
é fruto do trabalho desenvolvido por Carl 
Rogers ao longo de toda a sua vida produtiva 
em Psicologia. No percurso do 
desenvolvimento de seu pensamento, ele 
sempre demonstrou preocupação com as 
bases filosóficas da Psicologia, no entanto, a 
ACP surge a partir de sua experiência clínica e 
de pesquisas científicas dela decorrente. 
Poucos são os pensadores mencionados por 
ele que o influenciaram diretamente neste 
sentido. 
A perspectiva filosófica constitui-se em 
um modo de pensar a realidade, de 
questioná-la e de nortear a práxis do ser 
humano (Holanda, 1998). Este processo de 
inquirição e elaboração conceitual dá-se 
sobre construtos derivados da história da 
filosofia. Na prática psicológica não deve 
ocorrer a mera transposição de categorias 
filosóficas ao plano empírico do trabalho 
cotidiano do profissional da psicologia. Há o 
duplo risco de, por um lado, 
descontextualizar-se, e, por conseguinte, 
distorcer-se determinado conceito filosófico 
de sua acepção original, e por outro lado, 
desconsiderar-se a produção conceitual 
ASPECTOS HUMANISTAS, EXISTENCIAIS E FENOMENOLÓGICOS PRESENTES 
NA ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA 
RRRReeeessssuuuummmmoooo 
A Abordagem Centrada na Pessoa (ACP) é considerada uma das correntes 
identificadas com a Terceira Força em Psicologia ou Psicologia Humanista. 
Há aspectos significativos que correlacionam o pensamento do seu 
fundador, Carl Rogers, com alguns pressupostos da psicologia humanista e 
da filosofia existencialista. Mesmo que seu trabalho não tenha sido 
orientado pela fenomenologia, percebe-se em sua obra, desdobrada em 
várias fases, a prática de uma atitude desta natureza. Considerar, portanto, 
a ACP como uma abordagem humanista, existencial e fenomenológica 
remete-nos a uma série de questões relacionadas: 1) o que se entende por 
humanista? 2) Por consequência, o que é ser humano nesta perspectiva? 3) 
Como pensar o humanismo na psicologia? 4) Quais aspectos derivados da 
fenomenologia e do existencialismo encontram ressonância com a teoria e 
o método da ACP? Este artigo tem como objetivo contribuir na reflexão
sobre as possíveis correlações entre essas perspectivas filosóficas e a
Abordagem Centrada na Pessoa, tema ainda controverso no contexto
brasileiro mesmo diante da diversidade teórica e de perspectivas que esta
abordagem vem assumindo na atualidade.
existente na própria psicologia. É necessário, 
portanto, que ocorram as devidas 
apropriações, para que assim as abordagens 
psicológicas, em seu corpo teórico e técnico, 
possam ser enriquecidas na compreensão e 
reflexão da experiência humana por meio de 
conceitos filosóficos. 
Quanto às perspectivas filosóficas 
presentes na Abordagem Centrada na Pessoa, 
Messias (2001) aponta que a ligação existente 
entre a psicologia de Rogers e o movimento 
humanista e existencial é significativa. Não se 
pode, no entanto, afirmar que o seu trabalho 
foi direcionado pela fenomenologia, pois 
Rogers só descobriu tardiamente esta 
filosofia. Ele próprio afirma que nunca 
estudou filosofia existencial. Seu contato com 
a obra de Soeren Kierkegaard e de Martin 
Buber, por exemplo, deveu-se à insistência de 
alguns de seus estudantes de teologia em 
Chicago. Apesar disso, encontramos 
convergências entre seu pensamento e 
desses autores. 
É o que leva Puente (1978) a afirmar 
que Rogers, mesmo não sendo filósofo, “se 
encontra na orientação da fenomenologia ao 
reconhecer neste pensamento o seu estilo de 
trabalho, que se caracteriza pelo esforço de 
se aproximar até aquelas camadas do 
subjetivo que estão mais próximas do 
objetivo, as experiências pessoais” (p.55). 
Ao tomar a experiência prática, vivida, 
como ponto de partida para formular sua 
teoria e método psicoterapêutico, ao incluir a 
subjetividade do terapeuta e do cientista e ao 
se interessar pela compreensão dos 
significados atribuídos pela própria pessoa às 
suas vivências e pelos modos de 
experienciação dos mesmos, Rogers assume, 
em seu modo de trabalho, a prática de uma 
atitude humanista e fenomenológica. 
Mesmo com tais intenções, não há 
como negar que a construção da sua teoria 
ainda mantinha-se vinculada ao modelo 
positivista e à matriz cientificista que 
dominava o projeto de constituição da 
psicologia da época, em que a noção de 
verdade e o conhecimento representacional 
estavam muito presentes, daí, o seu extremo 
interessecom a comprovação científica dos 
dados observados na prática clínica (Barreto, 
1999). 
Por ter tido uma formação pragmática e 
determinista, Rogers considerava a ciência 
como algo externo, como um “corpo de 
conhecimento” sistemático e organizado em 
fatos observáveis; somente quando conheceu 
outros paradigmas e modelos de ciência 
tentou integrar esses dois aspectos, o 
cientista e o vivencial. 
A ciência apenas existe nas pessoas. 
Qualquer projeto científico tem o seu 
impulso criativo, o seu processo, a sua 
conclusão provisória, numa pessoa ou em 
várias pessoas. O conhecimento – mesmo 
o conhecimento científico - é aquele que
é subjetivamente aceitável. O
conhecimento científico só pode ser
comunicado àqueles que estão
subjetivamente preparados para receber
a sua comunicação. A utilização da ciência
apenas se dá através de pessoas que
procuram valores que significam alguma
coisa para elas (Rogers, 1991, p.195).
Portanto, reconheceu que a ciência, 
como a terapia e outros aspectos da vida, 
baseiam-se na experiência imediata das 
pessoas, que é comunicável apenas em parte 
e de forma limitada. Para ele, ao se 
estabelecer uma relação terapêutica, por 
exemplo, os sentimentos e o conhecimento 
se fundem numa experiência que é vivida ao 
invés de ser analisada, em que o terapeuta, 
no momento da relação, é mais um 
participante do que um observador. Atua 
como observador quando se interessa pela 
ordenação e pelo processo que ocorre nesta 
relação. Deve para tal utilizar-se dos recursos 
científicos, não de forma impessoal, mas 
vivendo subjetivamente outra fase de si 
mesmo. Tentou resolver seu impasse, 
colocando a pessoa, com seus próprios 
valores, como a base da relação terapêutica e 
da relação científica. 
Considerar, então, a ACP como uma 
abordagem que possui aspectos humanistas, 
existenciais e fenomenológicos remete-nos a 
uma série de questões relacionadas: 1) O que 
se entende por humanista? 2) Por 
consequência, o que é ser humano nesta 
perspectiva? 3) Como pensar o humanismo 
na psicologia? 4) Quais aspectos derivados da 
fenomenologia e do existencialismo 
encontram ressonância com a teoria e o 
método da Abordagem Centrada na Pessoa? 
Com base nestes questionamentos, 
mesmo que reconhecendo a abrangência dos 
mesmos, apresentaremos a seguir algumas 
reflexões sobre possíveis correlações entre 
essas perspectivas filosóficas e a Abordagem 
Centrada na Pessoa com o objetivo de trazer 
subsídios que possam fomentar discussão e 
contribuir para uma na melhor compreensão 
desta abordagem psicológica. 
ACP e Psicologia HumanistaACP e Psicologia HumanistaACP e Psicologia HumanistaACP e Psicologia Humanista----Existencial Existencial Existencial Existencial 
NorteNorteNorteNorte----AmericanaAmericanaAmericanaAmericana 
Têm-se vários conceitos acerca do que 
venha a ser Humanismo (ver Amatuzzi, 2001; 
Nogare, 1994). Etimologicamente, significa 
tudo aquilo que se volta para o humano. O 
humanismo toma o Homem como foco de 
qualquer preocupação filosófica; é uma 
interrogação sobre o ser, que surge desde os 
filósofos gregos 
O humanismo, em sentido mais estreito, 
pode ser definido como um movimento 
de retorno à cultura greco-latina clássica, 
surgido no período do Renascimento, nos 
séculos XV e XVI (Gobbi, Missel & 
Holanda, 2002). O humano concebido 
como fim último de uma determinada 
teoria de conhecimento, abordagem ou 
postura ética é um denominador comum 
presente nas diversas acepções sobre o 
humanismo. Ele “... surge então como um 
questionamento, uma procura pelo 
sentido de ser deste homem. É um 
esforço contínuo pela compreensão de 
sua totalidade, pela sua consideração 
integral” (Holanda, 1998, p.21). 
Rogers sempre enfatizou a relação com 
a pessoa humana como fator primordial na 
estruturação de qualquer conhecimento 
sobre o fenômeno psicológico. Fez questão de 
colocar em xeque a validade de teorias ou 
técnicas psicoterápicas construídas a priori, 
descoladas da experiência, antes de se 
estabelecer o contato com a pessoa ou grupo 
em sua concretude. 
A Abordagem Centrada na Pessoa é 
considerada uma das correntes identificadas 
com a Terceira Força em Psicologia ou 
Psicologia Humanista. Tal identificação 
justifica-se por sua advocacia pela dignidade e 
valor da pessoa na sua busca pelo 
crescimento (Rogers, 1983). 
A psicologia humanista surgiu no final 
da década de 1950 e início da de 1960, nos 
Estados Unidos, num período de pós-guerra, 
marcado pela desesperança, crise moral e de 
valores. Amatuzzi (2001) esclarece que a 
designação ‘psicologia humanista’ não se 
refere, pois, “a uma teoria específica, ou 
mesmo a uma escola, mas sim ao lugar 
comum onde se encontram (ainda que com 
pensamentos diferentes) todos aqueles 
psicólogos, insatisfeitos com a visão de 
homem implícita nas psicologias oficiais 
disponíveis” (p.19). 
Surgiu, portanto, como uma reação, a 
partir da insatisfação sentida face às duas 
correntes predominantes, o behaviorismo e a 
psicanálise clássica. Mesmo considerando as 
descobertas e contribuições dessas duas 
correntes, o sentimento prevalecente entre 
os psicólogos humanistas era de que essas 
vertentes, permanecendo em suas 
perspectivas originais, com seus pressupostos 
reducionistas e deterministas, não traziam 
respostas aos anseios humanos, às questões 
de sentido, naquele momento histórico. 
A seguir analisaremos algumas 
perspectivas da psicologia humanista, de um 
modo geral, que se identificam com a 
proposta da Abordagem Centrada na Pessoa: 
1. Uma visão de sujeito capaz de
autorealizar-se e autoatualizar-se, com 
capacidade para “atuar seguindo convicções e 
princípios pessoais, que em si mesmo, são 
geradores de subjetivação, e não expressão 
de forças ocultas” (González Rey, 2003, p.59). 
Cabe refletir que esta concepção, 
apesar de incluir uma noção de sujeito ativo 
no mundo, portador de vontade própria e 
possibilidades de escolha, ainda relaciona-se a 
um sujeito soberano e epistêmico pleno que 
dominou o pensamento moderno. A este 
respeito, Moreira (2007) ressalta a 
importância de ampliarmos a visão de ser 
humano, a partir de uma concepção dialética 
da ACP. Isso implicaria em olhar o homem 
concreto, inserido na realidade; em conceber 
a pessoa, além da dimensão subjetiva 
individual, enfatizando a dialética entre o 
meio humano subjetivo e o meio objetivo, ou 
seja, a pessoa é, concomitantemente, um 
sujeito individual e transindividual. É 
necessário, então, considerar as expressões 
singulares e os sentidos subjetivos próprios, 
mas igualmente considerar as múltiplas 
influências recebidas do meio no processo 
contínuo de produção de subjetividade. O ser 
humano é concebido enquanto uma 
totalidade complexa, em processo, em devir, 
um ser implicado e configurado em seu 
ambiente, seja este físico, fenomenológico-
experiencial, relacional ou sócio-histórico-
cultural. 
2. Uma maior ênfase à consciência, à
subjetividade e à saúde psicológica. 
A consciência é concebida enquanto 
vivência ativa, intencional, criadora de 
sentidos, que gera novos processos de 
subjetivação no curso de sua expressão 
pessoal. De acordo com González Rey (2003), 
a consciência humana organiza-se, expressa-
se e desenvolve-se “na contínua 
processualidade do sujeito, que em suas 
complexas operações reflexivas (...) logra 
articular elementos de sentidos muito 
diversos nos diferentes momentos de sua 
expressão” (p.60). 
A subjetividade, portanto, desenvolve-
se num processo contínuo, não sendo, algo 
enclausurado no interior do individuo, uma 
vez que o ser individual se forma a partir das 
relações estabelecidas com os outros e com o 
mundo. 
3. Uma perspectiva positiva quanto às
potencialidades e possibilidades. 
Esta característica pode ser facilmente 
confundida como um olhar ingênuo ou 
deveras “otimista” sobre a condição humana. 
Mas é um princípio norteador de uma prática 
psicológica que ratifica a vida e as inúmeras 
possibilidades que o ser humano tem de 
operar mudanças em seuautoconceito, em 
seu comportamento e em suas atitudes 
diante das situações vividas, uma vez dadas as 
condições necessárias para tal. 
Amatuzzi (2010) possibilita-nos refletir 
sobre a atualidade e a amplitude desta 
prerrogativa quando enfatiza que o 
pressuposto humanista é um pressuposto de 
autonomia, em que o ser humano é 
concebido como detentor de algum poder 
sobre as determinações que o afetam. Com 
base nisso, engendram-se práticas 
psicológicas alicerçadas na autonomia 
crescente da pessoa e numa relação 
intersubjetiva e dialógica. O autor afirma que 
esta concepção é “uma visão ética e tem 
repercussões práticas na vida das relações 
pessoais, sociais e até políticas” (p.19). 
A ética aqui enfatizada refere-se a uma 
postura em que o ser humano é tratado não 
de um modo utilitário, mas como possuidor 
de um valor próprio e inalienável. Segundo 
Amatuzzi (2010), “a abordagem centrada na 
pessoa é muito mais uma ética do que uma 
técnica” (p.21). 
Evidenciam-se, dessa forma, diversos 
aspectos humanistas presentes na 
Abordagem Centrada na Pessoa, uma vez que 
ela busca resgatar o respeito e a ênfase no ser 
humano, destacando o papel dos sentimentos 
e da experiência como fator de crescimento. 
Busca centrar-se na relação interpessoal, 
construindo condições psicológicas 
adequadas ao desenvolvimento do potencial 
de mudança daquele que recorre a uma 
relação de ajuda. 
Quanto à noção de pessoa, há duas 
características norteadoras, aparentemente 
contraditórias: a primeira é que esta pessoa, 
única em sua concretude existencial (daí a 
aproximação da ACP com o Existencialismo), é 
um ser em processo, em movimento, 
dinâmico, em construção, nunca passível de 
ser esquematizado redutivamente; por outro 
lado, ela (pessoa) é concebida originalmente 
como possuidora de recursos próprios que 
lhe permitem superar as condições 
existenciais adversas. 
Ainda que esta concepção de ser 
humano seja questionada, principalmente 
devido à ausência nas obras de Rogers de 
uma leitura mais aprofundada sobre a 
influência sócio-histórica e política na 
constituição da subjetividade humana, é 
notória a sua preocupação em priorizar o 
humano em sua psicologia. Se 
compreendermos que a Psicologia, enquanto 
Ciência Aplicada, foi utilizada por muitas 
décadas no Brasil, por exemplo, para justificar 
e manter um alto grau de desigualdade social 
que relega grande parte da população à 
condições sub-humanas de existência, 
percebe-se a relevância efetiva de um 
humanismo engajado de Rogers na 
valorização da pessoa em sua inteireza – e aí 
pode-se ampliar esta inteireza a níveis sociais, 
políticos e transcendentes, por exemplo – 
ainda em nossos dias. Proporcionar o espírito 
crítico e libertário, como apregoado pela 
Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire, ou 
suscitar o debate e a participação política da 
pessoa em sociedade, no sentido pleno de 
cidadania democrática, é algo profundamente 
identificado com a ACP. 
A estruturação dos pilares principais 
desta abordagem deu-se no contexto de 
afloramento da Psicologia Humanista na 
sociedade norte-americana do pós-guerra. No 
entanto, não se pode dizer que Rogers 
derivou os princípios básicos da ACP desta 
rede de relações. Pelo contrário, os seus 
estudos, já provenientes da década de 1930 e 
bastante influenciados pela Terapia da 
Relação de Otto Rank, dentre outros, serviram 
de referência e inspiração para esta reação 
coletiva ao reducionismo das abordagens 
psicanalíticas e comportamentais de 
Psicologia, tão valorizado pela cientificidade 
do meio acadêmico norte-americano desta 
época. 
Percebe-se que, pelo próprio 
desenvolvimento e ampliação de perspectivas 
ocorridas no meio psicanalítico e 
comportamental, as críticas da chamada 
Psicologia Humanista ou Terceira Força não 
mais se sustentam na atualidade (Rosa & 
Kahhale, 2002). No entanto, deste movimento 
pontual ocorrido na História da Psicologia 
derivaram a valorização das relações 
pautadas no vivido (Amatuzzi, 2001) ou no 
experiencial (Rogers & Stevens, 1992), a 
legitimação da capacidade criativa e 
inovadora do ser humano e a consideração do 
humano como valor absoluto da existência. 
Vale ressaltar, que segundo Amatuzzi 
(2001), o rótulo específico de psicologia 
humanista é apenas um episódio 
momentâneo de algo que tem um sentido 
maior: a presença de uma atitude humanista 
no interior da psicologia. O humanismo na 
psicologia aponta para uma atitude 
fenomenológica, uma postura diferente que 
se revela o homem no que ele tem de 
próprio, onde o ser humano tem que ser 
captado em seu movimento e para isso é 
necessário nos colocarmos na postura do 
atual, do presente, do atuante, do em curso. 
O que está na raiz do humanismo não é, pois, 
apenas um postulado teórico, ou uma 
hipótese, mas uma atitude concreta em favor 
de homens e mulheres, sujeitos de ação no 
mundo. 
O caráter existencial presente em 
algumas psicologias humanistas é decorrente 
do encontro com vertentes da filosofia 
europeia no solo norte-americano entre 1940 
a 1970. Conforme aponta Fonseca (s.d.), as 
perspectivas fenomenológico-existenciais no 
âmbito da psicologia foram recebidas nos 
Estados Unidos com certa polêmica, de um 
lado, e com bastante entusiasmo, por outro, 
uma vez que elas configuravam uma 
alternativa válida para contrapor a dicotomia 
existente entre as abordagens psicanalítica e 
comportamental. 
A identificação com alguns referenciais 
existencialistas, por exemplo, deve-se ao seu 
compromisso pela primazia da atitude em 
detrimento da teorização abstrata da 
realidade, numa espécie de efetivação da 
máxima sartriana de que a existência precede 
a essência. Segundo Rollo May (1980), maior 
representante das idéias existencialistas entre 
os chamados psicólogos humanistas, tal 
identificação encontra sua origem em William 
James (1841-1910), considerado um dos 
principais precursores da psicologia norte-
americana. Conforme o autor verifica-se em 
James a ênfase dada ao imediatismo da 
experiência, à importância da vontade como 
elemento de decisão e ao compromisso com 
a construção da verdade, esta pensada não 
de forma teórica, mas eminentemente 
existencial e vivida. Concebia também a 
realidade como algo indeterminante em 
termos lógicos, porém dependente do mundo 
da experiência. 
De um modo geral, o Existencialismo 
pode ser definido como uma ampla corrente 
filosófica contemporânea, nascida na Europa 
pós-primeira guerra mundial. Este movimento 
prioriza a existência concreta do homem no 
mundo e teve suas raízes históricas no 
pensamento do filósofo dinamarquês Sören 
Kierkegaard (1813-1855). Seu pensamento 
reporta-se à existência em seu aspecto 
singular e concreto, contrapondo-se às 
tradicionais correntes filosóficas modernas na 
sua tendência universalista, em especial a 
hegeliana, bastante valorizada na primeira 
metade do século XIX. 
O movimento existencialista configurou-
se enquanto tal na Alemanha da década de 
1920, período de muito sofrimento, 
desespero e angústias. É na década de 1950, 
entretanto, que ocorre maior divulgação 
desse movimento, inclusive no contexto 
norte-americano (Penha, 1982). 
Dentre os diversos pensadores que 
difundiram o existencialismo, destacam-se: 
Jean-Paul Sartre, Martin Buber, Karl Jaspers, 
Gabriel Marcel, Emmanuel Levinas. Cada um, 
da sua forma, utilizou o método 
fenomenológico para elaborar a sua filosofia 
da existência, unindo assim os dois conceitos 
– fenomenologia e existencialismo (Gobbi e
outros, 2002).
A corrente existencialista concebe o ser 
humano comprometido com o mundo, cuja 
existência é instável e contraditória. É um 
conjunto de possibilidades em constante 
atualização. É capaz de criar condições para 
adquirir a sua liberdade, o que não lhe 
garante tranquilidade e bem estar, ao 
contrário, obriga-lhe a ser mais cuidadoso 
consigo, já que passa a ter diversas opções 
existenciais. Esta filosofia convoca-nos a 
atuarmos como protagonistas de nossa 
própria vida, assumindo nossasescolhas no 
mundo e, por conseguinte, sendo 
responsáveis por suas consequências. 
Rogers (1980) expressa a identificação 
com esse modo de fazer em seu artigo “Duas 
tendências divergentes”. Se, 
tradicionalmente, há uma tendência objetiva, 
própria de práticas fundamentadas em 
teorizações reducionistas, definições 
operacionais e procedimentos experimentais, 
por outro lado, a esta contrapõe a tendência 
existencial. Relata que, no decorrer de sua 
experiência profissional, partiu de uma 
perspectiva objetiva para, gradualmente, 
assumir um viés existencialista. Sob esta 
referência afirma, 
(...) A essência da terapia... é um encontro 
de duas pessoas, no qual o terapeuta é 
aberta e livremente ele próprio e 
evidencia isto talvez mais 
completamente, quando ele pode livre e 
com receptividade entrar no mundo da 
outra. (...) O cliente sente-se confirmado 
(para usar o termo de Buber) não 
somente no que ele é, mas em suas 
potencialidades. Pode afirmar-se, 
temerosamente de estar certo, como 
uma pessoa única, separada. Pode tornar-
se o arquiteto de seu próprio futuro 
através do funcionamento de sua 
consciência. O que isso quer dizer é que já 
que ele está mais aberto à sua 
experiência, pode permitir-se viver 
simbolicamente em função de todas as 
possibilidades. Pode consentidamente dar 
vida, em seus pensamentos e 
sentimentos, aos impulsos criativos 
dentro de si mesmo, às tendências 
destrutivas que ele descobre dentro de si, 
ao desafio do crescimento, ao desafio da 
morte. Pode fazer face, em seu 
consciente, ao que para ele significa ser, e 
o que lhe significa não ser. Torna-se uma
pessoa humana autônoma capaz de ser o
que é e de escolher seu caminho. Este é o
resultado da terapia, vista por esta
segunda tendência (Rogers, 1980, p. 100-
101).
As duas tendências apresentadas acima 
correspondem às duas atitudes que o ser 
humano assume em suas diferentes relações 
interpessoais e com a própria existência, 
segundo a filosofia dialógica de Martin Buber 
(1878-1965): a relação EU-ISSO, que 
fundamenta a tendência objetiva pela sua 
natureza objetal, exclusivamente cognoscitiva 
e utilitária; e a relação EU-TU, que expressa a 
tendência existencial, pelo seu modo baseado 
na relação pessoal, “... do encontro de 
mulheres e homens que se dirigem entre si 
enquanto realidades pessoais, dimensões 
existenciais, num duplo movimento recíproco 
de aceitação e confirmação, sendo através 
desse que ambos acolhem o mundo como 
celeiro da alteridade” (Valente, 2006, p.56). 
Rogers (1991) assinala diversos pontos 
de convergência das suas idéias com as de 
Buber. Para ele, nos momentos profundos do 
processo psicoterápico dá-se uma verdadeira 
relação Eu-Tu, um encontro dialógico 
permeado de reciprocidade, como uma 
espécie de vivência atemporal que envolve 
intensamente terapeuta e cliente. 
Aspectos fenomenológicos presentes na Aspectos fenomenológicos presentes na Aspectos fenomenológicos presentes na Aspectos fenomenológicos presentes na 
ACPACPACPACP 
Ao nos referirmos sobre os aspectos 
fenomenológicos presentes na ACP é 
importante refletir sobre a inserção desta 
perspectiva na psicologia brasileira e latino-
americana. Para Fonseca (s.d.), a ACP que 
recebemos no Brasil é fruto da vertente 
pragmática e empirista norte-americana e da 
fenomenológico-existencial européia, que, 
inicialmente, foi recebida de modo acrítico e 
impessoal e, gradualmente, desenvolveu-se 
enquanto uma abordagem singular e com 
perspectivas próprias a partir da década de 
1980. 
De acordo com Gomes, Holanda & 
Gauer (2004), no cenário internacional, os 
pressupostos fenomenológicos se expandiram 
rapidamente da filosofia para o campo da 
saúde: na psiquiatria, a primeira área de 
influência da fenomenologia, é representada 
pelos trabalhos de Ludwing Binswanger 
(1881-1966) e Karl Jaspers (1833-1969). No 
que se refere à psicologia, a década de 1970 é 
um marco quanto à produção de 
conhecimento. Impulsionada pelos estudos 
do grupo liderado por Amadeo Giorgi, na 
Universidade de Duquesne, Pensilvânia, EUA, 
a fenomenologia transformou-se em método 
de pesquisas empíricas. É importante 
ressaltar que o trabalho de Giorgi foi 
precedido pelo de dois psicólogos ligados a 
Carl Rogers: Adrian L. Van Kaam (1959), 
fundador de um programa de psicologia 
dedicado à fenomenologia em Duquesne e 
Eugene Gendlin (1962), que formulou um 
modelo de psicoterapia considerado de 
inspiração fenomenológica. 
Ainda que existam concepções distintas 
de fenomenologia, este conceito ainda 
permanece bastante associado a Edmund 
Husserl (1859-1938). O caráter formal de uma 
nova epistemologia surgiu ao final do século 
XIX, na Alemanha. 
Fenomenologia advém de duas palavras 
gregas: phainomenon e logos. Phainomenon 
(fenômeno) corresponde a tudo aquilo que 
aparece, que se manifesta e que pode ser 
percebido, captado pelos sentidos ou pela 
consciência. Logos é entendido como o 
discurso esclarecedor. Assim, 
etimologicamente, fenomenologia significa o 
discurso esclarecedor a respeito daquilo que 
se mostra por si mesmo. De um modo geral, é 
compreendida como o estudo ou a ciência do 
fenômeno. 
De acordo com Zilles (2002), a 
fenomenologia husserliana, “é, em primeiro 
lugar, uma atitude ou postura filosófica e, em 
segundo lugar, um movimento de idéias com 
método próprio, visando sempre o rigor 
radical do conhecimento” (p.13). Husserl, 
atento aos problemas do conhecimento, 
busca encontrar um método e um ponto de 
partida para a Filosofia enquanto ‘ciência do 
rigor’. 
O desenvolvimento das idéias de 
Husserl foi precedido por um acontecimento 
histórico que ocorreu ao final do século XIX: 
declínio dos grandes sistemas filosóficos 
tradicionais e ascensão das Ciências, em 
particular a Matemática e a Psicologia, que se 
converteram na chave das explicações da 
teoria do conhecimento e da lógica. Husserl 
questionou a pretensão da Psicologia da 
época submeter o modo de conhecer aos 
seus princípios, dedicando-se a encontrar um 
método de conhecimento rigoroso que 
servisse de fundamento às demais Ciências 
(Capalbo, 1987). 
Dentre os principais conceitos 
desenvolvidos por Husserl, destacam-se: 
essência, redução e intencionalidade. 
Entende-se essências ou eidos como a 
estrutura invariante cuja presença 
permanente define o que é o objeto, ou seja, 
essências são as maneiras características do 
aparecer dos fenômenos; são conceitos, 
objetos ideais que nos permitem distinguir e 
classificar os fatos. Referem-se ao sentido do 
ser do fenômeno; independem da experiência 
sensível, muito embora se dando através dela 
(Zilles, 2002). Segundo Dartigues (1992), 
essência é o “ser da coisa ou da qualidade, 
isto é, um puro possível; em consequência, 
poderá haver tantas essências quantas 
significações nosso espírito é capaz de 
produzir” (p.16). 
Quanto à redução ou epoque, ela 
aparece sob diversas formas, acompanhando 
a evolução do pensamento de Husserl. Num 
primeiro momento, quando acreditava que a 
existência era separável do sentido das coisas, 
entendia a redução como a colocação entre 
parênteses, o colocar de lado a existência 
factual das coisas para se evidenciar a 
essência. Tal concepção estava compatível 
com um contexto, racionalista, que 
considerava a consciência enquanto 
interioridade, fechada em si mesmo, que 
representa um “exterior”. Um segundo 
aspecto da redução manifesta-se no lema 
“voltar às coisas mesmas”, tais como 
aparecem antes de qualquer apreensão, uma 
espécie de retorno ao elemento puro como 
fundamento do conhecimento. Com o tempo, 
esta visão de consciência enquanto 
representação se tornará superada a partir da 
noção de intencionalidade (Martins & 
Dichtchekenian, 1984). 
Para Husserl (s.d), “a propriedade 
fundamental dos modos de consciência [...] é 
a chamada intencionalidade, é sempre ter 
consciência de alguma coisa” (p.21). Zilles 
(2002) explica que a intencionalidade 
fenomenológica é “visada de consciência e 
produção de um sentido que permiteperceber os fenômenos em seu teor vivido” 
(p.31). É o que Husserl denomina de análise 
intencional. 
Como nosso intuito neste artigo não é 
explanar de forma detalhada sobre a 
fenomenologia enquanto filosofia e sim 
apontar alguns conceitos que convergem com 
a psicologia e a ACP, apresentaremos agora 
alguns aspectos considerados significativos da 
fenomenologia heideggeriana. 
Martin Heidegger, discípulo de Husserl, 
é tido como um dos poucos filósofos 
contemporâneos cuja produção apresenta 
singular crescimento póstumo, uma vez que 
ele morreu deixando uma grande quantidade 
de inéditos que começaram a ser editados a 
partir de 1978, o que gerou uma terceira fase 
de seu pensamento (Nunes, 2002). 
Heidegger reinterpretou o método 
oriundo da fenomenologia de Husserl, na 
busca do sentido das coisas, em íntima 
relação com a hermenêutica. Para ele, existir 
é interpretar-se. O recurso hermenêutico faz-
se necessário para o aparecer e o desvelar do 
fenômeno (Nunes, 2002; Bruns & Trindade, 
2001). 
Na elaboração de Ser e Tempo, para 
viabilizar o objetivo de questionamento do 
sentido do ser, o autor estrutura, de modo 
original, conceitos que posteriormente 
despertaram interesse em teóricos e 
profissionais de diferentes áreas das ciências 
humanas. Evidenciaremos àqueles que mais 
frequentemente têm sido referenciados por 
psicólogos: ser-no-mundo, angústia, abertura 
e cuidado. 
Heidegger buscou romper com a 
concepção do ser como conceito vazio e 
universal. Na sua investigação, distinguiu a 
estrutura do ser da do ente. Para este autor, 
“[...] Ente é tudo de que falamos, tudo que 
entendemos [...] ente é também o que e 
como nós mesmos somos.” (Heidegger, 2005. 
p.32)
Na perspectiva heideggeriana esse ente 
que cada um de nós somos e que possui em 
seu ser a possibilidade de questionar, é 
designado como Dasein, expressão alemã que 
significa “ser-aí”. A edição brasileira traduz o 
dasein como pre-sença. 
O dasein sempre se relaciona de 
formas distintas com os entes, em virtude do 
seu caráter dinâmico, em constante 
movimento, que está sendo, numa espécie 
de acontecendo contínuo conforme a 
possibilidade existencial vivenciada. Esse 
caráter pré-ontológico, determinação original 
e constitutiva do próprio dasein, permite que 
venha a se expressar com relação aos entes 
de múltiplas maneiras, com várias 
possibilidades. Essa amplitude de modos de 
ação corresponde ao caráter de existência, 
característico do dasein. 
Belém (2004) esclarece que o dasein 
“se identifica com o homem, mas não é o 
homem. É dizer o mais originário do homem, 
que, ontologicamente é a sua existência” 
(p.95). O ser-aí diz de um “ser lançado em 
um mundo cujo estar presente implica na 
possibilidade da existência”. 
Para Heidegger (2005) “o estar-
lançado, porém, é o modo de ser de um ente 
que sempre é suas próprias possibilidades e 
isso de tal maneira que ele se compreende 
nessas possibilidades e a partir delas 
(projeta-se para elas)” (p.244). 
Com isso, pode-se dizer que o dasein é 
possibilidade lançada ao mundo. A esta 
estrutura do dasein de ser lançado, 
Heidegger nomeou de facticidade da 
existência. “O dasein se entrega à 
responsabilidade de assumir o seu próprio 
ser e, sendo se relaciona com ele e se 
comporta com o seu ser como possibilidade 
mais própria” (Belém, 2004, p.97). 
Desta forma, pelo seu caráter 
existencial e promotor de sentido, o dasein é 
principalmente ser-no-mundo. O acesso do 
ente à existência tem como condição 
primária o mundo, estrutura fundamental 
pertencente exclusivamente ao dasein, onde 
se dá o ingresso dos entes diferentes de nós. 
A existência humana, então, não teria 
uma vida privada, precedente, que depois, se 
relacionaria com o mundo exterior; ela existe 
no mundo. É o que nos diz Nunes (2004), “o 
Dasein (enquanto Ser-no-mundo) não está 
para o mundo como uma coisa encaixada 
dentro de outra maior, mas sim que ao 
mundo se liga sob forma de um engajamento 
pré-reflexivo, integrante da constituição 
mesma desse ente que somos” (p.126). 
Em lugar da consciência pura do ‘eu 
transcendental’, Heidegger partiu da 
facticidade no mundo, da vida que é histórica 
e se compreende historicamente. A essência 
da existência humana é existir em pluralidade, 
e não em si mesma, uma vez que ela pertence 
a um mundo circundante, com sua estrutura 
referencial de utensílios e com a co-presença 
dos outros. O homem, enquanto, ser-no-
mundo, é compreendido no seu próprio 
existir, pois o existente só pode se 
compreender em sua relação com o mundo 
(Lanteri-Laura, 1965). 
A expressão ser-no-mundo refere-se a 
um fenômeno de unidade que abrange os 
seguintes momentos estruturais: a) ser-em, 
que não indica uma coisa, um ser 
simplesmente dado, dentro do mundo, mas 
se refere a uma constituição existencial, a um 
habitar em, estar familiarizado com; b) ser-
junto ao mundo, no sentido de empenhar-se 
no mundo e não dar-se em conjunto de 
coisas que ocorrem; c) ser-com, em que a co-
presença dos outros constitui 
existencialmente o ser-no-mundo, pois, 
conforme afirma Heidegger (2005): “na base 
desse ser-no-mundo determinado pelo com, 
o mundo é sempre o mundo compartilhado
com os outros” (p.170); d) ser-próprio
cotidiano e o impessoal significa que o ser-
no-mundo é sempre em função de si próprio,
porém o próprio do cotidiano, habitual é o
impróprio ou próprio impessoal caracterizado
pela dispersão e impessoalidade, em que o
si-mesmo é aprendido como próprio, uma
vez que “ de início, “eu” não “sou” no sentido
do propriamente si mesmo e sim os outros 
nos moldes do impessoal. É a partir deste e 
como este que, de início, eu “sou dado” a 
mim mesmo (Heidegger, 2005, p.182). 
Ao procedermos uma leitura 
psicológica deste conceito eminentemente 
filosófico, podemos abstrair que quando o 
dasein descobre o mundo, isto é, quando 
ocorre uma abertura para si mesmo, este 
“descobrimento de mundo” e esta abertura 
se cumpre e se realiza como uma “eliminação 
das obstruções, encobrimentos, 
obscurecimentos, como um romper das 
deturpações em que a pre-sença se tranca 
contra si mesma” (Heidegger, 2005, p.182). 
Outro aspecto importante refere-se ao 
que Heidegger denomina de decaída, , , , 
também traduzida por decadência, ou seja, o 
desvio de si, o de-cair no mundo das 
ocupações, a fuga da existência que está 
fundada na angústia. Heidegger, inspirado 
em Kierkegaard, não conceitua a angústia 
como uma experiência disfuncional, um 
estado ou uma propensão, mas a concebe 
enquanto uma disposição fundamental da 
existência; como aquilo que se teme, mas, 
que, ao mesmo tempo, se deseja. É na 
angústia que a existência abre-se a si mesmo. 
O dasein por apresentar diversas 
possibilidades de concretizar-se, oscila entre 
fechamento para si e abertura, entre o 
próprio impessoal e o próprio pessoal; possui 
um modo de ser em que já se põe diante de 
si mesmo e se abre para si em seu estar-
lançado. A angústia, como disposição 
constitutiva, é que irá propiciar a abertura 
para si do dasein, uma saída da 
cotidianidade, uma independência dos 
outros, uma ruptura consigo, com o que se é 
cotidianamente, com a estabilidade. Esta 
disposição para a abertura não significa um 
voltar-se para si subjetivo, mas caracteriza-se 
pelo ser a si mesmo, com as coisas e com os 
outros. Como é uma disposição não se 
equivale à abertura; ela é um entre 
fechamento e abertura, porém, ainda que 
permeado de cotidianidade, está voltado 
para o não-cotidiano. Por sermos ser-no-
mundo nos voltamos para as coisas, para algo 
que nos escapa. Essa ausência da coisa é o 
nada, que se revela em parte alguma, com 
que a angústia se angustia. Daí porque 
estamos sempre tendendo à cotidianidade, 
nos voltando aos entes, para compensar o 
mal-estar. 
A angústia não é somente angústia com... 
mas, enquanto disposição, é também 
angústia por... O por quê a angústia se 
angustia não é um modo determinado de 
ser e uma possibilidade da pre-sença [...] 
Na angústia o que se encontra à mão

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