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Sistemas Politicos da Alta Birmania Leach

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FICHAMENTO 
 
Texto base: LEACH, Edmund Ronald. Sistemas Políticos da Alta Birmânia: 
um estudo da estrutura social Kachin. São Paulo, Edusp, 1996. 
(Introdução, Capítulos 2, 3, 6, 7 e Conclusão). 
 
Introdução 
 
O livro Sistemas Políticos da Alta Birmânia, de Edmund Leach, trata 
dos povos do nordeste da Birmânia, os kachins e chans. Na introdução o 
autor propõe-se, antes de tudo, a esclarecer ao leitor o objetivo do seu 
trabalho. Ele pretende fornecer, mais do que uma descrição etnográfica, 
uma contribuição à teoria antropológica. 
A região nordeste da Birmânia, ao qual o livro aborda, será 
denominada pelo autor como a Região das Colinas de Kachin. Ela 
apresenta grandes diferenças culturais de uma parte à outra e a 
população que nela reside possui variadas línguas e dialetos. Apesar disso, 
comumente costuma-se denominar a totalidade dessa população com os 
termos kachin e chan. 
Os chans são um povo relativamente sofisticado, cuja cultura se 
assemelha à dos birmaneses. Ocupam os vales ribeirinhos, onde cultivam 
arroz em campos irrigados. Já os Kachins, ocupam as colinas onde 
cultivam arroz utilizando técnicas de cultura itinerante, através de 
derrubadas e queimadas. Apesar de suas diferenças culturais, linguísticas 
e de aparência, os kachins e os chans são vizinhos próximos, em quase 
todas as partes, estando intimamente relacionados nas questões 
cotidianas. 
Além da distinção entre kachins e chans, outro problema que se 
coloca é o de distinguir os kachins entre si. Eles possuem subcategorias 
que variam segundo a língua e o território. No entanto, não é do interesse 
imediato de Leach discutir se as generalizações sobre a uniformidade da 
cultura kachin são justificáveis. Na realidade, seu interesse consiste em 
saber até que ponto se é possível afirmar que um único tipo de estrutura 
social prevalece ao longo da região kachin. Antes de abordar o assunto, 
para Leach é importante entender os conceitos de continuidade e 
mudança, os quais serão abordados posteriormente. Assim, no restante 
do capítulo em questão, seu objetivo será explicar o ponto de vista teórico 
no qual aborda essa questão. 
Este é o ponto de partida pelo qual Leach começa a tecer uma 
crítica à Antropologia Social Britânica. Em primeiro lugar, aponta que os 
antropólogos sociais, seguindo a linha de Radcliffe-Brown, ao utilizarem o 
conceito de estrutura social como uma categoria por meio da qual se pode 
comparar uma sociedade com outra, pressupõem necessariamente que as 
sociedades de que tratam existem durante todo o tempo em equilíbrio 
estável. O autor se indaga, se é também é possível descrever, por meio 
de categorias sociológicas comuns, sociedades que não estão em 
equilíbrio estável. Posto que modelos conceituais de sociedade sejam 
obrigatoriamente modelos de sistema de equilíbrio, Leach afirma que as 
sociedades reais não podem jamais estar em equilíbrio. A discrepância 
está no fato de que , quando as estruturas sociais se expressam sob 
forma cultural, a representação é imprecisa em comparação com a 
fornecida pelas categorias exatas que o antropólogo gostaria de 
empregar. Acredita que essas inconsistências na lógica da expressão ritual 
são sempre necessárias para o bom funcionamento de qualquer sistema 
social. O autor sustenta que a estrutura social em situações práticas (em 
contraste com o modelo abstrato do sociólogo) consiste num conjunto de 
idéias sobre a distribuição do poder entre pessoas e grupos de pessoas. E 
os indivíduos são capazes de nutrir, e nutrem, idéias contraditórias e 
incongruentes sobre esse sistema, por causa da forma em que elas são 
expressas. A forma é a forma cultural e a expressão é a expressão ritual. 
Estrutura Social: Leach ressalta que, em certo nível de abstração, 
podemos discutir a estrutura social simplesmente em termos dos 
princípios de organização que unem as partes componentes do sistema. 
Nesse nível, a forma da estrutura pode ser considerada 
independentemente do conteúdo cultural, bem como não é difícil distinguir 
um modelo formal de outro, pois as estruturas que o antropólogo 
descreve são modelos que existem apenas em sua própria mente na 
forma de construções lógicas. Difícil é relacionar essas abstrações com o 
trabalho empírico de campo, visto que as sociedades reais existem no 
tempo e no espaço, não se estruturam num ambiente fixo, mas num 
ambiente em constante mudança. Além disso, toda sociedade real é um 
processo no tempo. E as mudanças que resultam desse processo, podem 
ser de dois tipos: as que são coerentes com a continuidade formal da 
ordem existente; as mudanças que de fato refletem modificações na 
estrutura formal. 
Unidades Sociais: Devido às dificuldades em definir o conceito de 
“uma sociedade”, dado o complexo contexto da Região das Colinas de 
Kachin, Leach adota por ora as interpretações de Radcliffe-Brown e Nadel. 
Embora discorde do primeiro, aceita os argumentos do segundo e assim 
interpretará a sociedade como se significasse “alguma localidade 
conveniente” ou como prefere, alternativamente, qualquer unidade 
política autônoma. 
As unidades políticas na Região das Colinas de Kachin variam em 
larga escala de tamanho e parecem ser intrinsecamente instáveis. A 
essência da tese que o autor apresenta é que o processo pelo qual as 
pequenas unidades se desenvolvem em unidades maiores e as grandes 
unidades se fragmentam em menores não é uma simples parte do 
processo de continuidade estrutural. Trata-se de um processo que envolve 
mudança estrutural, cujo mecanismo é o que interessa à Leach. 
Neste ponto, ele faz uma crítica aos antropólogos sociais. De acordo 
com Leach, seus colegas que tenderam a extrair seus conceitos básicos de 
Durkheim, estão predispostos em favor de sociedades estáveis conforme o 
ponto de vista durkheimiano. Por outro lado, as sociedades que 
apresentam faccionarismo e conflito interno que conduzem a mudanças 
bruscas são suspeitas de anomia. Essa predisposição a favorecer as 
interpretações de “equilíbrio” decorre da natureza dos materiais do 
antropólogo e das condições sob as quais ele executa o seu trabalho. As 
sociedades são dissociadas do tempo e do espaço e a interpretação que é 
dada ao material é necessariamente uma análise de equilíbrio, como se 
elas sempre fossem o que são agora e assim serão para todo o sempre. E 
ressalta que a confusão entre equilíbrio e estabilidade está tão 
profundamente arraigada na literatura antropológica que o uso de 
qualquer destes termos está sujeito a ambigüidade. Contudo, o autor 
afirma que eles não são a mesma coisa. 
Sistemas de modelo: Conforme Leach, ao descrever um sistema 
social, o antropólogo descreve apenas um modelo da realidade social, que 
representa a hipótese do pesquisador sobre como o sistema social opera. 
As diferentes partes do sistema modelo formam, obrigatoriamente, um 
todo coerente, é um sistema em equilíbrio. Isso não implica que a 
situação real seja coerente, mas pelo contrário, é cheia de incongruências 
que podem propiciar uma compreensão dos processos de mudança social. 
No caso da Região das Colinas de Kachin, o autor considera que 
qualquer indivíduo particular detém uma condição social em diversos 
sistemas sociais ao mesmo tempo. Para o próprio indivíduo, tais sistemas 
apresentam-se como alternativas ou incongruências no esquema de 
valores pelo qual ele ordena sua vida. O processo de mudança estrutural 
realiza-se por meio da manipulação dessas alternativas como forma de 
progresso social. Todo indivíduo, cada qual em seu próprio interesse, se 
empenha em explorar a situação à medida que a percebe e, ao fazê-lo, a 
coletividade de indivíduos altera a estrutura da própria sociedade. 
Da mesma maneira, ao conjunto das comunidades Kachin se oferece 
uma escolha quanto ao sistema político que será o seu ideal. Em suma, a 
tese de Leach é que em termos de organização política as comunidadeskachins oscilam entre dois tipos polares – “democracia” gumlao, de um 
lado, e autocracia chan, de outro. A maioria das comunidades não são 
organizadas, nem de um tipo, nem de outro, mas segundo o sistema 
gumsa, uma espécie de compromisso entre o ideal gumlao e o chan. 
Apesar de descrita como um terceiro modelo estático entre o modelo 
gumlao e o chan, as comunidades gumsa não são estáticas. Algumas 
tendem mais para o modelo chan, enquanto outras se tornam gumlao. O 
sistema gumsa considerado em sim mesmo é realmente incompreensível, 
pois está cheio de contradições inerentes. Apenas enquanto esquema de 
modelo ele pode ser representado como um sistema de equilíbrio. Assim, 
no campo da realidade social, as estruturas políticas gumsa são 
essencialmente instáveis, e Leach sustenta que elas só se tornam 
plenamente inteligíveis em termos do contraste apresentado pelos tipos 
polares de organização. 
Ritual: O conceito de ritual, para o autor, serve para expressar o 
status do indivíduo enquanto pessoa social no sistema estrutural em que 
ele se encontra temporariamente. Ele critica os antropólogos sociais 
ingleses que, em sua maioria, seguem a dicotomia entre sagrado e 
profano, pautada na tradição durkheimiana. Nesse caso, o ritual seria uma 
ação social que ocorre em situações sagradas. Para Leach, está implícita à 
essa idéia uma teoria da ação de tipo funcional, como sugeriu Malinowski, 
uma ação que se classifica no tocante à seus fins, ou seja, as 
“necessidades básicas” que parecem satisfazer. Mas pouquíssimas ações, 
com efeito, têm essa forma elementar funcionalmente definida. Por isso, o 
autor desloca esta dicotomia absoluta de Durkheim, e sustenta que 
sagrado e profano, não denotam tipos de ação, mas aspectos de 
virtualmente qualquer tipo de ação. Os aspectos da ação que têm 
significado como símbolos de status social são os aspectos rituais, mesmo 
que eles não envolvam diretamente qualquer elemento sobrenatural ou 
metafísico. 
De acordo com Leach, o mito é a contrapartida do ritual. Mito 
implica ritual, ritual implica mito, ambos são uma só e a mesma coisa. 
Desse modo, critica a doutrina clássica na antropologia social inglesa, que 
considera os dois conceitualmente diferentes, perpetuando um ao outro 
mediante uma interdependência funcional – o rito é uma dramatização do 
mito, o mito é a sanção ou a justificativa do rito. Na ótica de Leach, o mito 
encarado como uma afirmação em palavras “diz” a mesma coisa que o 
ritual encarado como uma afirmação em ação. 
Interpretação: Em suma, a opinião do autor é que ação ritual e 
crença devem ser entendidas como formas de afirmação simbólica sobre a 
ordem social. A principal tarefa da antropologia é tentar interpretá-las. 
De acordo com Leach os desempenhos rituais são formas de tornar 
momentaneamente explícito aquilo que de outro modo é ficção, 
lembrando aos indivíduos a ordem básica que presumivelmente guia as 
suas atividades sociais. Nesse sentido, o ritual torna explícita a estrutura 
social. 
Estrutura social e cultura: A cultura proporciona a forma, a 
“roupagem” da situação social. Para Leach, a situação cultural é um fator 
dado, é um produto e um acidente da história. No entanto, a estrutura da 
situação é largamente independente da sua forma cultural. O mesmo tipo 
de relação estrutural pode existir em muitas culturas diferentes e ser 
simbolizado de maneiras correspondentemente diferentes, e aí Leach dá 
como exemplo a estrutura social do casamento. Desse modo, as fronteiras 
significativas das estruturas não precisam coincidir com as da cultura. 
Conforme o autor, cultura e sociedade são conceitos rigorosamente 
distintos. 
 Para os propósitos que o autor visa atingir, o que tem significado 
real é o modelo estrutural básico e não o modelo cultural manifesto. 
Assim, o seu interesse recai no modo como as estruturas particulares 
podem admitir várias interpretações culturais e no modo como estruturas 
diferentes podem ser representadas pelo mesmo conjunto de símbolos 
culturais. 
 
O Plano de Fundo Ecológico da Sociedade Kachin 
 
 Neste capítulo, o autor dá uma indicação geral do tipo de vida 
econômica que levam os kachins e os chans, como os diferentes modos de 
subsistência são influenciados pelos fatores ecológicos. O que não significa 
que tais fatores sejam determinantes, mas sim limitantes da ordem social, 
como Leach aponta. 
 Ele faz uma distinção climática; a fertilidade contínua da terra é 
mais alta nos cinturões de chuva do que nas zonas secas. Ao longo do 
vales fluviais, o cultivo de arroz irrigado é fácil e as vias carroçáveis são 
rapidamente construídas, ao passo que nas montanhas que separam os 
vales, a construção de estradas ou de terraços de arroz requer uma 
técnica mais elaborada. Assim, fica evidente que a organização técnica e 
econômica dos habitantes das colinas é bem diferente da dos moradores 
nos vales. E que também os povos das colinas em diferentes partes da 
Birmânia recorrem ao mesmo tipo de recursos para superar as 
dificuldades do meio ambiente. Ou seja, o contraste entre os kachins, 
habitantes das terras altas, e os chans, habitantes das terras baixas, é 
primeiramente ecológico. 
 Os habitantes do vale, os “birmaneses” e os “chans”, praticam o 
cultivo do arroz irrigado com moderada eficiência, embora adequada. Isso 
permite um sistema de cultivo contínuo e fixação contínua, mesmo em 
regiões onde a pluviosidade anual é relativamente baixa. Há em condições 
normais, a produção de um excedente, ou seja, uma quantidade de arroz 
maior do que o necessário para o consumo dos agricultores. Essa base 
econômica também permite o desenvolvimento do comércio e uma 
urbanização em pequena escala, com um grau moderado de complexidade 
cultural. Nesse sentido, vivem num nível de organização “superior” ao dos 
seus vizinhos das colinas. 
 Já os povos das colinas praticam técnicas habituais de cultivo 
itinerante que só poderiam produzir um excedente sob condições 
excepcionais de baixa densidade populacional e de terras especialmente 
favoráveis. Quando essa técnica se revela inadequada, os povos das 
colinas recorrem a diferentes soluções. Alguns grupos desenvolveram 
esquemas muito elaborados de rotação de culturas; outros optaram pela 
construção de terraços de arroz irrigado cortados nas encostas das 
colinas; outros ainda fizeram algum tipo de aliança política e econômica 
com seus vizinhos mais prósperos das planícies. 
 Ao analisar a história política, Leach aponta que a opção de alguns 
povos kachin pelos sistemas de terraços de colina parece ser mais militar 
e política do que econômica. Os mais notáveis sistemas de terraços na 
região são feitos transversalmente ou próximos às principais rotas 
comerciais. O controle militar dessas rotas de comércio foi a razão original 
das concentrações relativamente elevadas de população kachin 
encontradas nessas localidades, e os lucros advindos das cobranças de 
pedágio é que tornaram recomendável a construção dos sistemas de 
terraços, em primeiro lugar. 
 Assim, o autor conclui que, embora os fatores ecológicos exerçam 
influência considerável sobre os diferentes modos de subsistência kachin e 
chan, a história política também exerceu uma influência considerável. A 
situação ecológica é um fator limitante e não um determinante da ordem 
social. 
 
As categorias chan e kachin e suas subdivisões 
 
 Neste capítulo, Leach se propõe em definir as categorias kachin e 
chan, e suas várias subdivisões, bem como as subcategorias contrastantes 
kachin gumsa e kachin gumlao. 
 Os birmaneses aplicam o termo chan a todos os habitantes da 
Birmânia política e da região fronteiriça entre Birmânia e Yun-nan que se 
autodenominam Tais. No oeste e sudeste, isso envolve certa ambigüidade, 
porque os birmaneses distinguem os chans dos siameses, embora ambos 
se autodenominem tais. Mas para o noroeste, a definição é clara.Encontram-se territorialmente dispersos, mas têm uma cultura 
razoavelmente uniforme. Há diferenças dialetais consideráveis, mas salvo 
exceções, de um modo geral todos os chans falam uma mesma língua, o 
tai. Os chans são budistas e habitam o vale, onde eles cultivam arroz 
irrigado, a essência de sua cultura. Sua “sociedade” é de classes 
estratificadas em aristocratas, plebeus e uma casta inferior. A organização 
política chan é a seguinte. Eles são organizados em Estados (möng), 
tendo cada Estado seu próprio príncipe hereditário (saohpa). Esses möng 
vivem às vezes em isolamento; às vezes são federados como unidades de 
um möng maior. 
 A categoria kachin é mais complicada. Não há um consenso, nem 
por parte da administração britânica, nem pelos estudiosos, pois os kachin 
apresentam diversas variedades. Assim, podem ser divididos em 
subcategorias de três espécies: (a) linguística, (b) territorial e (c) política. 
O foco de Leach no restante do livro será nas distinções políticas, 
especialmente aquelas que os próprios kachins denotam pelos termos 
gumsa e gumlao. Embora não entre em detalhes nas diferenças 
linguísticas, não signifique que elas não sejam importantes. 
 De modo geral, o autor emprega o termo kachin para denotar uma 
categoria geral para todos os povos da Região das Colinas de Kachin que 
não são budistas, englobando falantes de vários dialetos diferentes. A 
sociedade kachin inclui numerosas formas de organização política, que 
variam entre dois tipos polarizados. O sistema kachin gumlao é uma 
espécie de organização “democrática” em que a entidade política é uma 
aldeia única e não existe diferença de classes entre aristocratas e plebeus. 
O sistema kachin gumsa é uma espécie de organização “aristocrática”. A 
entidade política é um território chamado mung que tem a governá-lo um 
príncipe de sangue aristocrático denominado duwa, que assume o título de 
Zan. Todos os kachins reconhecem a existência de um sistema complexo 
de clãs extremamente segmentados. As linhagens desse sistema de clãs 
se ramificam por toda a Região das Colinas de Kachin e ultrapassam todas 
as fronteiras de língua e de costumes locais. Não apresentam uma cultura 
uniforme como os chans. 
 O problema que se coloca é o seguinte. De modo geral, na Região 
das Colinas de Kachin é encontrado um número significativo de grupos 
cultural ou parcialmente distintos. Em alguns lugares, esses grupos 
encontram-se segregados em áreas bem delimitadas, em outros eles se 
confundem (estão “misturados”). Então, Leach sustenta que um estudo da 
organização social kachin não pode, por conseguinte, adotar o 
procedimento clássico da etnografia que tratava os grupos de cultura 
como grupos sociais isolados. 
 O método de exposição que o autor propõe, presume que dentro da 
Região das Colinas de Kachin (definida de modo arbitrário) existe um 
sistema social. Os vales entre as colinas estão aí inclusos, de modo que os 
chans e os kachins são, nesse nível, parte de um sistema social único. 
Dentro desse sistema social maior existe num dado momento, um número 
de subsistemas significativamente distintos e interdependentes. Três 
desses subsistemas poderiam ser classificados como chan, kachin gumlao 
e kachin gumsa. Tomados meramente como modelos de organização, 
podem ser pensados como variações sobre um tema. A organização 
kachin gumsa modificada numa direção seria indistinguível da dos chans; 
noutra, seria indistinguível da kachin gumlao. Consideradas 
historicamente, tais modificações de fato ocorrem, e é lícito falar de 
kachins que se tornaram chans ou de chans que se tornaram kachins. 
Portanto, qualquer equilíbrio que pareça existir numa dada localidade 
kachin ou chan, pode ser na realidade, um equilíbrio muito transitório e 
instável. 
 
Gumlao e Gumsa 
 
O objetivo de Leach neste capítulo é explicar o que os contrastes de 
teorias de governo na Alta Birmânia implicam de fato. Em síntese, os 
gumsa dizem-se governados por chefes que são membros de uma 
aristocracia hereditária; os gumlao repudiam quaisquer noções de 
diferença hereditária de classes. Os gumsa vêem nos gumlao servos 
plebeus que se revoltaram contra seus legítimos senhores; os gumlao 
vêem nos gumsa tiranos e esnobes. Embora os dois termos representem 
no pensamento kachin dois modos de organização fundamentalmente 
opostos, ambos são compatíveis com o mesmo conjunto geral de aparatos 
culturais que identificamos como kachin. 
Leach descreve alguns mitos que enfatizam o que vem a ser uma 
incoerência básica na ideologia gumsa. A ordem gumsa ideal consiste 
numa rede de linhagens aparentadas, mas é também uma rede de 
linhagens hierarquizadas. À medida que se desenvolve o processo de cisão 
de linhagem, chega-se a um ponto em que se impõe uma escolha entre o 
primado do princípio da hierarquia ou o princípio do parentesco. A 
hierarquia implica uma relação assimétrica. O suserano extorque serviços 
de seus subordinados sem obrigações de reciprocidade. O parentesco 
implica uma relação simétrica; uma relação mayu-dama (de parentesco 
afim) ou hpu-nau (irmão de linhagem) entre um chefe e seu partidário 
pode implicar obrigações unilaterais do subordinado para com o seu chefe. 
A fraqueza do sistema gumsa está em que o chefe bem-sucedido é 
tentado a repudiar os vínculos de parentesco com seus partidários e tratá-
los como se fossem escravos (mayam). É essa situação que, de um ponto 
de vista gumlao, é invocada para justificar a revolta. 
O sistema gumlao é igualmente cheio de incoerências. Na teoria 
gumlao não existem chefes. Todas as linhagens são da mesma categoria, 
nenhum irmão é ritualmente superior a qualquer outro. Assim, 
teoricamente, as categorias mayu e dama gumlao se equivalem, e não 
pode haver nenhum interdito sobre o casamento patrilateral entre primos. 
Os gumlao de língua jinghpaw se vêem assim confrontados com o 
paradoxo de que sua língua separa as categorias de parentes mayu e 
dama, embora nada haja em seu sistema político que imponha essa 
separação. 
A proposição geral de Leach é que muito embora seja analiticamente 
correto considerar os sistemas gumsa e gumlao como modelos distintos 
de estrutura social, os dois tipos, em suas aplicações práticas, estão 
sempre inter-relacionados. Ambos os sistemas são estruturalmente 
deficientes. Um Estado político gumsa tende a desenvolver aspectos que 
levam à rebelião, redundando, de tempos em tempos, numa ordem 
gumlao. Mas uma comunidade gumlao, a menos que esteja centrada em 
torno de um núcleo territorial fixo, geralmente carece de meios para 
manter suas linhagens constituintes num status de igualdade. Irá então 
ou desintegrar-se totalmente por cisão, ou novas diferenças de status 
entre grupos de linhagem reconduzirão o sistema ao modelo gumsa. 
Nesse sentido, a ordem gumlao e a ordem gumsa são ambas instáveis. 
 
Gumsa e Chan 
 
 Neste capítulo, Leach se propõe a explicar o que implica a imitação 
dos príncipes chans pelos chefes kachin e por que, no conjunto, ela é 
malsucedida. 
 Os aristocratas kachins podem “tornar-se chans” no sentido de se 
tornarem mais sofisticados e contraírem uma relação mayu-dama de 
casamento com uma linhagem chan aristocrática, mas nem por isso 
renunciam a seu status de chefes kachins. Ao contrário, o seu status de 
chefe kachin é robustecido: o ápice dos ideais gumsa é que o duwa kachin 
seja tratado como saohpa por sua contraparte chan. Os plebeus kachins, 
por outro lado, só se tornam chans se deixarem de ser kachins. Em nível 
plebeu, o sistema kachin e chan, embora vinculados economicamente, são 
totalmente separados por barreiras de parentesco e religião. 
 Mas por que as tentativas dos chefes kachins gumsa de se tornarem 
chan quase sempre terminam em desastre? Embora um chefe kachin 
possa alçar-se a uma posição na qual seja tratado por seus iguais como 
um saohpa, não lhe é dado comportar-se como um saohpa deverdade 
perante seus vassalos, pois, se assim fizer, será privado do apoio dos 
outros chefes kachins. 
 A estabilidade de um autêntico Estado chan depende do fato de que 
a aliança política representada pelas numerosas esposas do saohpa é mais 
forte do que qualquer facção dissidente que possa surgir entre os próprios 
parentes imediatos do saohpa. O chefe kachin que aspira à posição de 
saohpa chan não pode consolidar a sua posição dessa forma. Não pode 
aceitar mulheres de seus vassalos chans sem prejudicar sua posição de 
kachin, nem pode continuar dando mulheres a seus vassalos kachins 
(seus dama) sem prejuízo de seu status de príncipe chan. Em outras 
palavras, o chefe kachin pode “tornar-se um chan” sem perda de status, 
mas seus seguidores kachins plebeus não o podem. Por isso, ao tornar-se 
chan, o chefe kachin tende a isolar-se das raízes de seu poder, ofende os 
princípios da reciprocidade mayu-dama e encoraja o desenvolvimento das 
tendências revolucionárias gumlao. Assim, à primeira mudança nos rumos 
econômicos e políticos, seu poder é abalado. Em sua ascensão ao poder, o 
chefe kachin depende do apoio de seus parentes; mas, se logra êxito, só 
consegue manter a posição com a ajuda de autoridade externa. 
 
Conclusão 
 
A conclusão apontada na obra de Leach é que a população da 
Região das Colinas de Kachin não é uniforme culturalmente, embora seja 
é relativamente uniforme nos aspectos rituais. O ato ritual que cita, 
ilustra, segundo o autor, perfeitamente sua tese. No entanto, ele afirma 
que não devemos considerar os participantes dessa cerimônia como 
membros de uma “sociedade”, pelos critérios da etnografia normal. Talvez 
sim, se levarmos em conta os critérios deste livro. Mas questiona se um 
ritual desse tipo denotaria mesmo “integração”, “solidariedade” ou 
“equilíbrio” social. 
A tese sustentada por Leach é a de que por trás do ritual havia não 
a estrutura política de um verdadeiro Estado, mas a estrutura “como se” 
de um Estado ideal. Em termos mais amplos, isto faz o autor constatar a 
inadequação das categorias convencionais da época em contextos como o 
estudado. 
Seu objetivo foi dizer algo sobre os mecanismos de um tipo de 
processo social que ultrapassa distinções culturais, descrevendo a 
estrutura de um sistema que não está em equilíbrio. 
 Nas páginas finais, Leach apresenta algumas críticas. Para ele, os 
sistemas modelares de todos os antropólogos anteriores, sejam expressos 
em termos culturais ou estruturais, são vastos e vagos. O que eles têm 
em comum é o fato de serem concebidos como sistemas fixos estáveis, de 
serem tipos ideais. Os atuais antropólogos sociais, de acordo com o autor, 
operam numa escala mais modesta, com muito mais detalhes. No 
entanto, suas “sociedades” ainda são em grande medida sistemas de 
modelo, cuja estabilidade é uma hipótese e não um fato estabelecido. 
Mas, como sempre trataram a ficção “uma sociedade” como uma realidade 
isolada, ainda não dispõem de uma linguagem na qual possam descrever 
os sistemas sociais que são ao mesmo tempo contemporâneos e 
adjacentes, ou seja, que se acham numa verdadeira inter-relação. 
Critica também a teoria do equilíbrio na antropologia social. Para 
Leach, ela se justificava outrora, mas requer uma modificação drástica, 
pois já não é mais possível para o antropólogo se satisfazer com 
tentativas de estabelecer uma tipologia de sistemas fixos. Deve 
reconhecer que poucas das sociedades que um pesquisador de campo 
atual pode estudar revelam alguma tendência acentuada à estabilidade. 
Por outro lado, desenvolver para a análise de sistemas sociais em 
mudança, métodos que evitem generalizações metafísicas do 
“historicismo”. Esse reconhecimento não precisa compelir o antropólogo 
social a abandonar suas técnicas tradicionais de análise, pois ele será 
ainda mais justificado em continuar a usar suas ficções científicas. Nas 
situações práticas de trabalho de campo, o antropólogo deve sempre 
tratar o material de observação como se fosse parte de um equilíbrio 
global, senão a descrição torna-se quase impossível. Tudo o que Leach 
propõe é que a natureza fictícia desse equilíbrio seja reconhecida. 
Na opinião do autor, não é possível descrever o processo de 
mudança social a partir da observação direta de dados etnográficos de 
primeira mão. Deve-se, primeiro, analisar os dados etnográficos por 
referência a sistemas globais abstratos que são concebidos em equilíbrio 
instável e em seguida postular que a confusão da realidade decorre da 
interpretação desses sistemas ideais instáveis. 
A asserção de Leach é de que os kachins e os chan pensam 
realmente sua própria sociedade da maneira descrita por ele.

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