Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Realização do ativo e extinção das obrigações do falido APRESENTAÇÃO A insolvência do devedor poderá levá-lo à falência, quando todo o seu patrimônio servirá para o pagamento de seus credores. Será no instituto da falência que os credores concorrerão em igualdade de condições para a satisfação de seus créditos, o que é denominado pelo princípio da par conditio creditorum (igualdade de condições). Diferentemente do passado, em que o falido era estigmatizado pela sociedade, hoje se compreende que o insucesso não pode impedi-lo de voltar a empreender assim que cumpridas suas obrigações. Nesta Unidade de Aprendizagem, você irá aprender a forma de venda do patrimônio do devedor falido e a extinção de suas obrigações. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Descrever as espécies de realização do ativo.• Identificar o encerramento do processo falimentar e a extinção das obrigações do falido.• Reconhecer o que prevê a Lei nº 11.101/05 a respeito da extinção das obrigações do falido.• DESAFIO O exercício da atividade empresarial requer certas habilidades e uma boa dose de empreendedorismo, razão pela qual se estimulam os pequenos e microempresários a empreenderem. No entanto, mesmo no insucesso do negócio, é possível a retomada das atividades após o processo de falência. Analise o cenário a seguir. O que você sugere para a situação de Joaquim? INFOGRÁFICO A satisfação dos créditos dos credores da massa falida nem sempre será em dinheiro, pois a alienação de bens em leilão judicial dificilmente arrecada os valores da avaliação real dos bens. Em segundo leilão, os bens costumam ser vendidos por apenas 60% de seu preço, frustrando aqueles que têm esperança no recebimento de valores da massa falida. Neste Infográfico, veja uma interessante possibilidade para os credores que conhecem a atividade empresarial do falido, oportunizando que eles a continuem e recebam seu crédito. Perceba também a adjudicação de bens da falida e como ela se torna realidade. CONTEÚDO DO LIVRO No Direito Romano, era permitido que os credores escravizassem o devedor ou o matassem, caso não fosse resgatado por alguém que pagasse sua dívida. O Direito Moderno contempla a possibilidade de afastamento do devedor de sua empresa para a venda de seu patrimônio e o pagamento de seus credores, sem recair a cobrança sobre sua pessoa (com penas corporais). No capítulo Realização do ativo e extinção das obrigações do falido, da obra Direito Falimentar: recuperação judicial e extrajudicial, base teórica desta Unidade de Aprendizagem, aprenda as formas de realização do ativo do devedor falido. Além disso, entenda que a unidade produtiva deve manter atenção ao princípio da preservação da empresa, face sua função social. Boa leitura. DIREITO FALIMENTAR: RECUPERAÇÃO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL Eduardo Zaffari Realização do ativo e extinção das obrigações do falido Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Descrever as espécies de realização do ativo. � Identificar o encerramento do processo falimentar e a extinção das obrigações do falido. � Reconhecer o que prevê a Lei nº. 11.101/2005 a respeito da extinção das obrigações do falido. Introdução O processo de falência tem por objetivo a preservação da atividade empresarial com o afastamento do devedor e a utilização de seu ativo para a continuidade da atividade. Entretanto, os credores do devedor terão que receber seus créditos, competindo ao administrador judicial viabilizar a melhor forma de compatibilizar o pagamento dos débitos e a preservação da empresa. Neste capítulo, você estudará as diferentes espécies de realização dos ativos da sociedade falida e a forma de encerramento do processo de falência. Você verá, também, que o falido poderá ser reabilitado à atividade empresarial, se cumpridos certos pressupostos previstos em lei. 1 Espécies de realização do ativo A falência tem descrita a sua finalidade no art. 75 da Lei nº. 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, denominada Lei de Recuperação Judicial e Falências, que regula ainda a recuperação extrajudicial. Partindo da ideia de que o negócio em si não vai à falência, mas apenas o empresário que administra a sociedade empresária, refere o art. 75 que “a falência, ao promover o afastamento do devedor de suas atividades, visa a preservar e otimizar a utilização produtiva dos bens, ativos e recursos produtivos, inclusive os intangíveis, da empresa”. Objetiva-se, então, afastar o devedor que não soube administrar a sua empresa, tornando-se insolvente, para que se preserve ao máximo a atividade empre- sarial, sem deixar de satisfazer os credores que não receberam os valores que lhes são devidos pelo empresário. Nas palavras de Pedro Lenza “[...] tratando-se de uma execução coletiva, primeiro identificará os credores e bens do falido, depois promoverá a venda dos bens e o pagamento dos credores, encerrando-se em seguida” (LENZA, 2019, p. 1128). O renomado Rubens Requião afirmava que a falência objetivava a satisfação dos credores do falido em igualdade de condições (denominada sob o princípio da par condicio creditorum) e o saneamento do meio empresarial, ao retirar do comércio aqueles que não têm a condição de nele atuar (RE- QUIÃO, 1995). Para Gladston Mamede, a “[...] falência é o procedimento pelo qual se declara a insolvência empresarial e se dá solução à mesma, liquidando o patrimônio ativo e saldando, nos limites da força deste, o patrimônio passivo do falido” (MAMEDE, 2019, p. 247). A necessária distinção entre o empresário devedor e a sociedade empresária que lhe serve de instrumento para a realização da atividade empresarial é importante para que se compreenda por que poderão ser adotadas mais de uma forma de realização do ativo para a satisfação dos credores do falido. Dividindo em dois períodos a falência (um primeiro em que são colhidas informações, um segundo em que são vendidos os bens), Rubens Requião afirmava que (REQUIÃO, 1995, p. 310): “O segundo período visa a venda dos bens integrantes da massa falida objetiva e o pagamento dos credores que formam a massa subjetiva, e que têm nos bens do devedor a garantia do pagamento de seus créditos. Esse último é o período da liquidação”. Realização do ativo e extinção das obrigações do falido2 A liquidação, igualmente denominada realização, são os atos realizados pelo administrador judicial para a satisfação dos créditos daqueles que nego- ciaram com o devedor falido. O primeiro período referido por Requião reflete a necessidade de levantamento da situação patrimonial da falida, o montante dos créditos concorrentes aos valores arrecadados e quaisquer outros encargos e dívidas da massa. Essas informações estarão representadas no quadro geral de credores, que será submetido aos interessados, sejam esses os próprios credores ou o falido. Tanto a atividade de colheita de informações, quanto a liquidação do ativo, competem ao administrador judicial, que é o profissional designado pelo juízo e de sua confiança para a realização dos atos na falência. O art. 22 da Lei nº. 11.101/2005, que estabelece as atividades desse profissional, prescreve, em seu inciso terceiro, que lhe competirá, no juízo universal da falência, as seguintes atividades: � arrecadar os bens e documentos do devedor e elaborar o auto de arrecadação; � avaliar os bens arrecadados; � contratar avaliadores, de preferência oficiais, mediante autorização judicial, para a avaliação dos bens caso entenda não ter condições técnicas para a tarefa; � praticar os atos necessários à realização do ativo e ao pagamento dos credores; � requerer ao Juiz a venda antecipada de bens perecíveis, deterioráveis ou sujeitos a considerável desvalorização ou de conservação arriscada ou dispendiosa. Perceba que a arrecadação, a avaliação e a venda dos bens do falido serão de integralresponsabilidade do administrador judicial. A arrecadação de bens é um ato judicial, de natureza administrativa, realizado pelo administrador judicial. Ela tem por finalidade colocar à disposição do juízo falimentar todos os bens que compõem o patrimônio do devedor. 3Realização do ativo e extinção das obrigações do falido A realização do ativo será iniciada após a arrecadação dos bens pelo ad- ministrador judicial, comprovando-se pela juntada do auto de arrecadação ao processo, conforme determina o art. 139 da Lei nº. 11.101/2005. A lei ainda prescreve que se iniciará a liquidação antes mesmo da formação definitiva do quadro geral de credores, além da possibilidade da venda antecipada dos bens perecíveis, deterioráveis ou sujeitos a considerável desvalorização ou de conservação arriscada ou dispendiosa, conforme o art. 113 da Lei de Falências. Isso porque a formação do quadro de credores poderá demorar em razão de discussão sobre os créditos habilitados (como habilitações, impugnações ou ação revocatórias ajuizadas). Basicamente, são quatro as formas de realizações do ativo, quais sejam: 1. Alienação da empresa, com a venda de seus estabelecimentos em bloco. 2. Alienação da empresa, com a venda de suas filiais ou unidades pro- dutivas isoladamente. 3. Alienação em bloco dos bens que integram cada um dos estabeleci- mentos do devedor. 4. Alienação dos bens individualmente considerados. Interessante observar que o caput do art. 140 da lei prescreve que “[...] a alienação dos bens será realizada de uma das seguintes formas, observada a seguinte ordem de preferência” (BRASIL, 2005, documento on-line, grifo nosso). Assim, ao liquidar o ativo, deve-se seguir a ordem prevista em lei, pois a ideia é sempre preservar o negócio como atividade econômica. A primeira hipótese na ordem de preferência é a venda dos estabelecimen- tos da empresa em blocos, ou seja, a transferência do patrimônio da empresa a terceiros arrematantes, que assumirão o negócio, e a atividade empresarial continuará comprando dos fornecedores e fornecendo aos seus clientes. A massa falida, por sua vez, receberá o valor pago pelo arrematante, com o pagamento dos credores da massa falida. Muitos fornecedores e clientes sequer perceberão que houve a transferência do estabelecimento empresarial por meio da falência. Essa hipótese busca preservar o estabelecimento como unidade produtiva, e o parágrafo terceiro do art. 140 determina que “[...] a alienação da empresa terá por objeto o conjunto de determinados bens necessários à operação rentável da unidade de produção, que poderá compreender a transferência de contratos específicos” (BRASIL, 2005, documento on-line). Realização do ativo e extinção das obrigações do falido4 Uma segunda possibilidade de alienação é a alienação da empresa por filiais ou unidades produtivas. Nessa hipótese, não se alienará o estabeleci- mento como um todo, mas o juízo dividirá a empresa em unidades economica- mente viáveis (por lojas, por lojas e fábricas, por conjunto de unidades, etc.), e as alienará para um ou mais interessados. O Judiciário irá atribuir a uma das unidades vendidas o título da antiga falida (marca, signos, etc.), excluindo as demais de seu uso. Se não for atribuído a nenhuma delas, todas as unidades deverão deixar de usá-las (MAMEDE, 2019). A terceira possibilidade de liquidação do ativo da falida é a venda em blocos de bens que integram cada um dos estabelecimentos do devedor. Imagine uma metalúrgica em processo falimentar. Não sendo possível a venda do estabelecimento como um todo, ou unidades produtivas, essa hipótese permitirá que sejam vendidos todos os bens (conjuntamente) da caldeiraria, do setor de pintura, do setor de corte e dobra, do setor de galvanização. Nessa possibilidade, consegue-se um valor superior do que a venda de cada máquina isoladamente, vendem-se os bens com um custo de leilão menor, assim como se atingirá diferentes interessados que, eventualmente, queiram apenas certo setor produtivo. Uma última hipótese, que costuma ser mais dispendiosa e arrecadar menores valores, é a venda individual de cada um dos bens que compõem o ativo da falida. Nessa situação, cada um dos bens deverá ser vendido separadamente, mesmo que em um único ou vários leilões, e deverão receber propostas de compras individuais. Os bens vendidos nesta forma usualmente recebem valores menores do que se fossem vendidos conjuntamente com outros bens, ou seja, em bloco. Ademais, muitos dos bens não serão adquiridos porque não aparecerão compradores, ao contrário de se estivessem inseridos em um bloco de bens e fossem comprados conjuntamente. As opções dispostas em lei buscam preservar a atividade empresarial como entidade produtiva, em que se afastará o devedor, e os credores que nele confiaram serão satisfeitos. A adoção de uma hipótese ou outra dependerá da característica da falida e deverá ter a finalidade de alcançar o melhor resultado para a massa de credores. 5Realização do ativo e extinção das obrigações do falido 2 Encerramento do processo falimentar e extinção das obrigações do falido A realização do ativo tem a finalidade de satisfazer os credores pelo pagamento por meio do produto decorrente da venda dos bens da falida. Arrecadados valores pela massa falida, esses serão destinados ao pagamento dos encargos da massa falida (honorários periciais, remuneração do administrador judicial, custas, etc.) e aos credores, conforme constante no quadro geral de credores, que observará a natureza de cada crédito. Os créditos se dividirão nas seguintes classes, conforme art. 83 da Lei de Falências: Art. 83 A classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem: I – os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e cinqüenta) salários-mínimos por credor, e os decorrentes de acidentes de trabalho; II – créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado; III – créditos tributários, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, excetuadas as multas tributárias; IV – créditos com privilégio especial, a saber: a) os previstos no art. 964 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002; b) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei; c) aqueles a cujos titulares a lei confira o direito de retenção sobre a coisa dada em garantia; d) aqueles em favor dos microempreendedores individuais e das microem- presas e empresas de pequeno porte de que trata a Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006 (Incluído pela Lei Complementar nº 147, de 2014) V – créditos com privilégio geral, a saber: a) os previstos no art. 965 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002; b) os previstos no parágrafo único do art. 67 desta Lei; c) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei; VI – créditos quirografários, a saber: a) aqueles não previstos nos demais incisos deste artigo; b) os saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao seu pagamento; c) os saldos dos créditos derivados da legislação do trabalho que excederem o limite estabelecido no inciso I do caput deste artigo; VII – as multas contratuais e as penas pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, inclusive as multas tributárias; VIII – créditos subordinados, a saber: a) os assim previstos em lei ou em contrato; b) os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício (BRASIL, 2005, documento on-line). Realização do ativo e extinção das obrigações do falido6 A relação dos créditos a serem pagos constará no quadro geral de credores, conforme prescreve o parágrafo único do art. 18 da Lei nº. 11.101/2005, no qual consta que: O quadro-geral, assinado pelo juiz e pelo administrador judicial, men- cionará a importância e a classificação de cada crédito na data do re- querimento da recuperação judicial ou da decretação da falência, será juntado aos autos e publicadono órgão oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, contado da data da sentença que houver julgado as impugnações (BRASIL, 2005, documento on-line). Após pagos os credores, conforme os valores arrecadados, suas respectivas classes e dentro do que for possível efetuar o pagamento, inicia-se a fase de en- cerramento da falência, na qual o administrador judicial deverá prestar contas ao Juiz no prazo de 30 dias a partir da alienação de todo o ativo e distribuição deste produto entre os credores, conforme prescreve o art. 154 da Lei nº. 11.101/2005. As contas deverão ser prestadas na forma mercantil, com todos os documentos comprobatórios de seus atos e fatos ocorridos no seu desempenho. Essa prestação de contas será autuada em separado em relação ao processo de falência, e apenas será anexada ao mesmo após o encerramento. Mas, recebida a prestação contas do administrador, o Juiz determinará a publicação de aviso aos interessados, que poderão examiná-las e impugná-las no prazo de 10 dias. Com ou sem impugnação pelos interessados, o processo será disponibilizado ao Ministério Público (MP), que terá o prazo de cinco dias para exarar seu parecer contrário ou a favor da prestação de contas. O juízo abrirá prazo para o administrador judicial para que este se manifeste sobre as impugnações apresentadas (acaso haja) e parecer eventualmente contrário. O parágrafo terceiro do art. 154 da Lei nº. 11.101/2005 prescreve que: Decorrido o prazo do aviso e realizadas as diligências necessárias à apuração dos fatos, o juiz intimará o Ministério Público para manifestar-se no prazo de 5 (cinco) dias, findo o qual o administrador judicial será ouvido se houver impugnação ou parecer contrário do Ministério Público (BRASIL, 2005, documento on-line). A possibilidade de diligências para a apuração dos fatos e a oitiva do administrador significa que será possível a realização de instrução probató- ria na prestação de contas, como audiências, perícias ou inspeções. Mais, o 7Realização do ativo e extinção das obrigações do falido administrador judicial apresentará esclarecimentos acerca das impugnações, bem como poderá efetivamente contestar as discordâncias dos interessados ou MP. Isso porque a prestação de contas irá conclusa ao Juiz para a sentença, que poderá rejeitar ou aprovar as contas prestadas. Se rejeitadas as contas prestadas pelo administrador, o juízo fixará as responsabilidades, podendo determinar a indisponibilidade de bens do ad- ministrador judicial, sequestro de bens ou retenção do saldo de honorários devidos pelos seus serviços. A sentença que rejeitou a prestação de contas constituirá título executivo judicial em favor da massa falida. Na escolha do administrador judicial, o juízo da falência deverá levar em consideração não apenas a confiança no desempenho de sua atividade, mas a condição de possibilidade de arcar com eventuais prejuízos ocasionados à massa falida. A partir da sentença da prestação de contas, independentemente de sua aprovação ou apresentação de apelação, o administrador judicial apresentará relatório final da falência no prazo de 10 dias, demonstrando o valor do ativo, dos valores arrecadados com a sua venda, o valor das dívidas e o pagamento dos credores, especificando as responsabilidades do falido que permanecem, conforme art. 155 da Lei nº. 11.101/2005. Enquanto a prestação de contas do administrador se refere à sua administração, o relatório final se refere ao destino do ativo e passivo da massa. À vista do relatório, o juízo julgará a falência por sentença, encerrando-a e publicando a decisão por edital. Considerando que serão estabelecidas as responsabilidades do falido na decisão, o art. 156, parágrafo único, da Lei de Falências prescreve que caberá da mesma apelação, valendo transcrever o dispositivo legal, em que “a sentença de encerramento será publicada por edital e dela caberá apelação”. Importante destacar, também, que, se a socie- dade empresária não tiver bens ou direitos remanescentes, a sentença servirá como forma de dissolução da mesma, pois, conforme o art. 1.044 do Código Civil brasileiro, “[...] a sociedade se dissolve de pleno direito por qualquer das causas enumeradas no art. 1.033 e, se empresária, também pela declaração da falência” (BRASIL, 2002, documento on-line). Realização do ativo e extinção das obrigações do falido8 O Código Civil brasileiro incorporou as regras do Código Comercial de 1850, aglutinando o Direito Empresarial entre seus arts. 966 e 1122. A inscrição do empresário é tratada entre os art. 966 e 971 do Código Civil. O trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência dá início ao prazo prescricional das obrigações do falido. Isso porque, entre os efei- tos da sentença declaratória da falência, está a inabilitação do falido para o exercício da atividade empresarial, seja como empresário individual, seja como administrador, na forma do art. 102 da Lei nº. 11.101/2005. Tal artigo estabelece que “[...] o falido fica inabilitado para exercer qualquer atividade empresarial a partir da decretação da falência e até a sentença que extingue suas obrigações […]” (BRASIL, 2005, documento on-line). Essa inabilitação será comunicada ao respectivo registro público de empresas, apenas alterando a sua situação quando de sua reabilitação. A pessoa do falido não perde a sua capacidade civil, mas tem a disponibilidade e administração de seu patrimônio suspensa durante o processo de falência. Usa-se a expressão capitis diminutio para expressar a limitação imposta ao falido. O legislador reconhece que o insucesso empresarial é uma possibilidade e que depende de uma série de fatores que não dependem do empresário. Ou seja, nem sempre o falido obrou com culpa ou dolo para a situação de insolvência, o que significa dizer que o reingresso do falido na atividade empre- sarial deve ser estimulado para que ele possa novamente produzir. Para tanto, a lei prescreve não apenas o encerramento da falência, mas a possibilidade de extinção de suas obrigações e, eventualmente, a reabilitação do falido para a atividade empresarial. 3 Extinção das obrigações do falido segundo a Lei nº. 11.101/2005 A sentença da falência não impõe apenas a inabilitação ao exercício da atividade empresarial. A suspensão de sua capacidade para o exercício dessas atividades talvez seja a mais óbvia relacionada ao processo falimentar. Entretanto, como recorda Pedro Lenza, não se trata apenas de sua incapacidade para as atividades empresariais, defluindo outros reflexos da sentença falimentar (LENZA, 2019). Mesmo que o empresário não mais queira realizar as atividades empresariais, 9Realização do ativo e extinção das obrigações do falido os efeitos da falência vão muito além de suas atividades, o que aumenta o seu interesse na extinção de suas obrigações. O segundo efeito da Lei de Falências em relação ao empresário (além de sua inabilitação para a empresa) é a perda da capacidade de disposição patrimonial. A partir da sentença, há a impossibilidade, pelo falido, de administrar seu patrimônio que seja de interesses da massa falida. Qualquer ato de disposição de bem ou direito pelo falido será nulo, pois esse patrimônio eventualmente será necessário para a satisfação dos credores da massa falida. Será o administrador judicial que poderá administrar e dispor desses bens até o encerramento da falência e a extinção das obrigações do falido. Apenas os bens impenhoráveis poderão ser administrados pelo devedor, como seus proventos e bem de família, conforme prescreve o art. 833, IV, do Código de Processo Civil, e o art. 1º, da Lei nº. 8.009, de 29 de março de 1990. Outra restrição imposta ao devedor é a restrição de sua capacidade processual, pois, nas ações em que o falido era autor ou réu, passará o administrador judicial a representar o falido quando houver interesse da massa falida. Tanto que o art. 6º da Lei nº. 11.101/2005 prescreve a suspensão das ações para que o administradorjudicial possa habilitar-se e dar prosseguimento às mesmas. Caso a falida seja uma sociedade empresária, e não um empresário indi- vidual, um quarto efeito é a possibilidade de sua dissolução. Conforme antes referido, o art. 1.044 do Código Civil brasileiro prescreve a possibilidade de dissolução da sociedade falida caso extintas as suas obrigações. Encerrada a falência por sentença, os sócios da sociedade falida poderão dissolver a sociedade ou continuar com a sua atividade empresarial caso reabilitada para a atividade. Um quinto efeito sobre a pessoa do falido é a necessidade de cumprimento de uma série de deveres, conforme prescreve o art. 104 da Lei de Falências, como depositar em cartório, no ato de assinatura do termo de comparecimento, os seus livros obrigatórios, a fim de serem entregues ao administrador judicial, depois de encerrados por termos assinados pelo Juiz; ou não se ausentar do lugar onde se processa a falência sem motivo justo e comunicação expressa ao Juiz, e sem deixar procurador bastante, sob as penas cominadas na lei. A não observância dos deveres impostos em lei, estes ou os demais previstos no dispositivo legal, importarão em crime de desobediência, o que dificultará a posterior reabilitação do falido. Realização do ativo e extinção das obrigações do falido10 A sentença que declara a falência é um ato complexo, que apresenta uma série de determinações, conforme consta no art. 99 da Lei nº. 11.101/2005. Entre elas, poderá determinar a prisão preventiva do falido inclusive. Explicando o sistema anterior ao revogado Decreto-Lei nº. 7.661, de 21 de junho de 1945 (Lei de Falências que antecedeu a Lei nº. 11.101/2005), Rubens Requião explicava que o falido poderia postular a sua reabilitação independentemente da extinção de suas obrigações, o que fazia com que os credores que não haviam sido pagos se voltassem contra os bens reinvestidos ao falido. Ou seja, o falido era reabilitado, mas os credores impagos continuavam sua investida em face do comerciante, praticamente impossibilitando a sua retornada (REQUIÃO, 1995). Entretanto, o Decreto-Lei nº. 7.661/1945 alterou a sistemática para que, antes da reabilitação do falido, houvesse a extinção de suas obrigações. Como afirmava Requião (REQUIÃO, 1995, p. 339): A declaração da extinção das obrigações do falido é uma sentença, precedida da sentença de encerramento da falência. Depois de atendidos os pressupostos necessários à declaração judicial, por sentença, é que o falido vê cessado seu estado de falência. Só, então, sem peias, sua atividade comercial renovada. A Lei nº. 11.101/2005 prescreve, nos arts. 158 e 159, os fundamentos e formas de extinção das obrigações do falido. A extinção de suas obrigações poderá se dar de forma ordinária ou extraordinária, pois ordinariamente se espera que as obrigações sejam adimplidas por meio do pagamento e, excepcionalmente, por meio de outras formas. Afirma-se que a primeira hipótese prevista no art. 158, I, da Lei de Falências é a extinção ordinária das obrigações do falido por meio do pagamento de todos os credores. Pagos todos os credores do falido, não mais persistirão obrigações, tornando possível o encerramento da falência. A segunda hipótese prevista em lei consta no art. 158, II, da Lei de Falências. Ela consiste no “[...] pagamento, depois de realizado todo o ativo, de mais de 50% (cinqüenta por cento) dos créditos quirografários, sendo facultado ao falido o depósito da quantia necessária para atingir essa porcentagem se para tanto não bastou a integral liquidação do ativo” (BRASIL, 2005, documento on-line). Nessa possibilidade, deverão estar pagos ao menos mais do que 50% 11Realização do ativo e extinção das obrigações do falido dos credores quirografários (credores não preferenciais), o que significa que as classes anteriores terão sido pagas — mesmo que, para atingir esse percentual, o falido deposite a diferença entre o valor arrecadado pela venda do ativo e o percentual de 50%. Poderá um terceiro realizar o depósito em nome do falido inclusive, desde que se alcance o valor previsto em lei. Verifica-se o valor a ser pago pelo quadro geral de credores, e não poderá, nesta hipótese, o falido privilegiar um credor em detrimento de outros, ou seja, todos os quirografários deverão receber igual valor. Gladston Mamede ressalta o interessante fato que há a necessidade de pagamento de valor superior a 50%, o que significa que será metade dos créditos mais R$ 0,01 (um centavo de real) para configurar essa possibilidade (MAMEDE, 2019). Outra hipótese de extinção extraordinária vem prescrita no art. 158, III e IV, da Lei de Falências, diferenciando-as quanto à possibilidade de crime falimentar pelo falido. Prescrevem os incisos que será considerada extinta a obrigação do falido após “[...] o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contado do encerramento da falência, se o falido não tiver sido condenado por prática de crime previsto nesta Lei” (inciso III do dispositivo legal citado) ou após “[...] o decurso do prazo de 10 (dez) anos, contado do encerramento da falên- cia, se o falido tiver sido condenado por prática de crime previsto nesta Lei” (inciso IIV do dispositivo legal citado) (BRASIL, 2005, documento on-line). Iniciado o processo de falência, ele suspende a prescrição das obrigações em face do falido, o que significa que, encerrada a falência, continuam a correr esses prazos e poderão os credores cobrar em face do devedor o saldo impago na falência. Rubens Requião bem explicava que (REQUIÃO, 1995, p. 340): Abrem-se, assim, duas possibilidades para que as obrigações do falido sejam extintas pela prescrição: empreiteiro lugar, se o falido, ou o sócio solidário, provar que todas as suas obrigações estão prescritas, hipótese em que se somam as frações de prazos anteriores e posteriores à falência; em segundo lugar, abandonando o falido essa prova de prescrição de cada crédito, pode após cinco anos do encerramento da falência, quando estarão prescritas por força da lei falimentar todas as suas obrigações. Nesse sentido, a prescrição do crédito se dará antes do decurso do prazo de cinco anos, se inferior a esse o prazo prescricional ou quando do prazo de cinco anos a partir do encerramento da falência. Caso o falido tenha cometido crime falimentar, apenas com o implemento do prazo de 10 anos poderá o devedor requerer a sentença de extinção de suas obrigações e reabilitação. Realização do ativo e extinção das obrigações do falido12 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Instituiu o Código Civil. Brasília: Presidência, 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada. htm. Acesso em: 13 ago. 2020. BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudi- cial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Brasília: Presidência, 2005. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101. htm. Acesso em: 22 ago. 2020. LENZA, P. (org.). Direito Empresarial esquematizado. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. MAMEDE, G. Falência e recuperação de empresas. São Paulo: Atlas, 2019. NEGRÃO, R. Manual de Direito Empresarial. 10. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2020. REQUIÃO, R. Curso de Direito Falimentar. São Paulo: Saraiva, 1995. 2 v. Leituras recomendadas MIRANDA, P. de. Direito das obrigações: falência. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. (Coleção Tratado de Direito Privado: parte especial, 28). TOMAZETTE, M. Curso de direito empresarial: falência e recuperação de empresas. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2017. v. 3. Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun- cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informaçõesreferidas em tais links. 13Realização do ativo e extinção das obrigações do falido DICA DO PROFESSOR O art. 140 da Lei nº 11.101/05 prescreve as formas de alienação do ativo que levarão à extinção das obrigações do falido. As diferentes maneiras que poderão ser usadas para a satisfação dos débitos do falido dependerão da viabilidade para cada caso concreto, o que necessita criteriosa opção. Nesta Dica do Professor, veja que a escolha de forma de realização do ativo não é aleatória e deverá objetivar a mais vantajosa para a atividade empresarial. Perceba também que adquirir bens da massa falida não trará riscos aos arrematantes, desde que estes não sejam determinadas pessoas previstas na Lei nº 11.101/05. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! EXERCÍCIOS 1) O administrador judicial tem relevância no procedimento de liquidação do ativo da sociedade, porque realizará os atos necessários para tanto. Em relação à alienação dos bens do ativo, marque a alternativa correta. A) A realização do ativo deverá ser realizada pelo administrador judicial durante o processo de falência e, em alguns casos, antes da falência. B) A venda dos bens do ativo da massa falida será realizada a partir da arrecadação dos bens pelo administrador judicial. C) A realização do ativo dependerá da arrecadação dos bens da massa falida e dependerá da concordância dos credores. D) A arrecadação dos bens permite a realização destes para a satisfação dos créditos devidos, mas os perecíveis deverão aguardar o fim da falência. E) Os bens perecíveis não poderão ser vendidos antecipadamente, sob pena de afronta aos interesses da massa falida. 2) A realização do ativo deverá atender aos interesses da massa de credores, o que nem sempre é convergente ao interesse do falido. Analise as alternativas a seguir e marque quem tem a opção de escolha quanto à forma de realização de ativo. A) A escolha pela forma de venda do ativo dependerá da opção pelo administrador judicial, com a concordância da Assembleia de Credores. B) A Assembleia de Credores é responsável por apreciar e autorizar o falido a alienar os bens da massa para a satisfação destes. C) O administrador judicial e o Comitê de Credores deverão deliberar sobre a melhor forma de liquidar o ativo da falida. D) A lei não dispõe de uma ordem de preferência na realização do ativo, ficando a critério do juízo estabelecê-la. E) O juízo da falência deverá deliberar sobre a melhor forma de realização do ativo, sempre fundamentando sua opção em razão da repercussão da decisão. 3) A preservação da empresa como atividade é fundamental para a economia, preferindo-se afastar o devedor falido de seu negócio. Em relação à ordem de preferência na alienação do ativo, marque a alternativa correta. A) A lei prescreve uma ordem de preferência na realização do ativo, mas esta não deve ser observada pelo juízo. B) A ordem de preferência na realização do ativo está superada, e o juiz adotará a forma de realização do ativo sem ouvir os interessados. C) O juízo da falência observará a ordem de preferência prevista em lei para a realização do ativo, fundamentando sua escolha diferente. D) A lei não dispõe de uma ordem de preferência na realização do ativo, pois cada falência será diferente das demais. E) A realização do ativo não tem relação com a continuidade das atividades empresariais e não há a necessidade de uma ordem de alienação dos bens. 4) O empresário falido pode ter chegado ao estado de insolvência por fatores de mercado, podendo ter sucesso em outras atividades. Marque a alternativa correta quanto à reabilitação do falido no processo de falência. A) O falido poderá ser reabilitado após a extinção de suas obrigações. B) O falido poderá ser reabilitado durante o andamento da falência. C) Após o encerramento da falência, o falido estará automaticamente reabilitado. D) O falido não poderá ser reabilitado após a falência. E) A reabilitação é possível antes da formação do quadro geral de credores. 5) Entre os efeitos da sentença de falência, alguns recaem sobre os bens do falido e outros sobre sua pessoa. Em relação à extinção das obrigações do falido, é possível afirmar que: A) a lei determina que o falido deverá ter pago todos os seus credores para serem extintas suas obrigações. B) o falido poderá ter extinta suas obrigações, mesmo que não tenha pago a integralidade de suas obrigações. C) a prescrição dos créditos do falido não poderá ser causa da extinção das obrigações deste. D) o juiz decidirá sobre a extinção das obrigações do falido antes do encerramento da falência. E) as hipóteses de extinção das obrigações do falido não estão previstas em lei, e o juiz decidirá conforme seu livre-arbítrio. NA PRÁTICA O Direito Falimentar evoluiu, ao longo do tempo, em razão da mudança de seu paradigma: de um direito punitivo para um direito de preservação da atividade empresarial, como forma de fomento às atividades empreendedoras. A continuidade do negócio é a tônica do processo falimentar. Na Prática a seguir, veja que o juízo falimentar deve decidir sobre a forma mais interessante para a satifação dos credores, pois o ativo pode representar um passivo para a massa falida. Acompanhe a forma escolhida pelo juiz da falência de uma indústria de laticínios para a satisfação dos créditos trabalhistas e a continuidade dos negócios. SAIBA MAIS Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Pedidos de recuperação judicial e falência crescem no país A insolvência do empresário que o leva ao estado falimentar decorre de uma série de fatores, entre eles o despreparo para momentos adversos. Assista, neste vídeo, a causa de os microempresários serem os que mais sofrem em momentos de crise. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Da inaplicabilidade do princípio da par conditio creditorum na recuperação judicial de empresas Veja, neste texto, quando não é aplicado o princípio de igualdade entre credores (par conditio creditorum). Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Saiba o que estará no leilão da massa falida da Voges. Bens passam dos R$ 90 milhões Uma das mais tradicionais metalúrgicas de Caxias do Sul, na Serra Gaúcha, foi à falência em agosto de 2019. Veja os bens e valores milionários que poderão ser arrecadados nos leilões da massa falida. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Regras gerais Você já pensou em participar de um leilão em um processo de falência? Diversos leiloeiros oficiais oferecem a oportunidade de fazê-lo na forma telepresencial. Acompanhe. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
Compartilhar