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Ensino Médio: sujeitos, políticas e 
práticas em discussão 
 
Conselho Editorial Técnico-Científico Mares Editores e Selos Editoriais: 
 
Renato Martins e Silva (Editor-chefe). 
http://lattes.cnpq.br/4416501555745392 
 
Lia Beatriz Teixeira Torraca (Editora Adjunta). 
http://lattes.cnpq.br/3485252759389457 
 
Ilma Maria Fernandes Soares (Editora Adjunta). 
 http://lattes.cnpq.br/2687423661980745 
 
Célia Souza da Costa 
http://lattes.cnpq.br/6191102948827404 
 
Chimica Francisco 
http://lattes.cnpq.br/7943686245103765 
 
Diego do Nascimento Rodrigues Flores 
http://lattes.cnpq.br/9624528552781231 
 
Dileane Fagundes de Oliveira 
http://lattes.cnpq.br/5507504136581028 
 
Erika Viviane Costa Vieira 
http://lattes.cnpq.br/3013583440099933 
 
Joana Ribeiro dos Santos 
http://lattes.cnpq.br/0861182646887979 
 
José Candido de Oliveira Martins 
http://www.degois.pt/visualizador/curriculum.jsp?key=5295361728152206 
 
Liliam Teresa Martins Freitas 
http://lattes.cnpq.br/3656299812120776 
 
Marcia Tereza Fonseca Almeida 
http://lattes.cnpq.br/4865156179328081 
 
Ricardo Luiz de Bittencourt 
http://lattes.cnpq.br/2014915666381882 
 
Vitor Cei 
http://lattes.cnpq.br/3944677310190316 
http://lattes.cnpq.br/4416501555745392
http://lattes.cnpq.br/3485252759389457
http://lattes.cnpq.br/2687423661980745
http://lattes.cnpq.br/6191102948827404
http://lattes.cnpq.br/7943686245103765
http://lattes.cnpq.br/9624528552781231
http://lattes.cnpq.br/5507504136581028
http://lattes.cnpq.br/3013583440099933
https://wwws.cnpq.br/cvlattesweb/PKG_MENU.menu?f_cod=F53926B302D68D4EEFD8275CA7A47362
http://www.degois.pt/visualizador/curriculum.jsp?key=5295361728152206
http://lattes.cnpq.br/3656299812120776
http://lattes.cnpq.br/4865156179328081
http://lattes.cnpq.br/2014915666381882
http://lattes.cnpq.br/3944677310190316
Ensino Médio 
sujeitos, políticas e práticas em discussão 
 
 
1ª Edição 
 
 
 
Lucas da Silva Martinez 
(Organizador) 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
Dictio Brasil 
2017 
 
 
Copyright © da editora, 2017. 
 
Capa Lucas da Silva Martinez 
Editoração Mares Editores 
 
Os textos são de inteira responsabilidade de seus autores e não representam 
necessariamente a opinião da editora. 
 
Dados Internacionais de Catalogação (CIP). 
 
Ensino médio: sujeitos, políticas e práticas em discussão 
/ Lucas da Silva Martinez (Organizador) – Rio de Janeiro: 
Dictio Brasil, 2017. 
365 p. 
ISBN 978-85-92921-24-8 
1. Educação 2. Educação Elementar. 3. Ensino Médio I. 
Título. 
 
CDD 372 
CDU 37 
 
2017 
Todos os direitos desta edição reservados à 
Mares Editores e seus selos editoriais 
Dictio Brasil é um selo editorial de Mares Editores 
CNPJ 24.101.728/0001-78 
Contato: mareseditores@gmail.com 
mailto:mareseditores@gmail.com
Sumário 
 
Apresentação ................................................................................ 9 
PRIMEIRA PARTE: Sujeitos e protagonismo ................................. 17 
Juventude, Ensino Médio e Relações com o saber: elementos 
teórico-metodológicos ............................................................... 18 
As ocupações nas escolas em 2015 e 2016 e o protagonismo da 
juventude .................................................................................... 48 
SEGUNDA PARTE: História, organização e políticas ..................... 76 
Problematizações acerca do Ensino Médio: em busca de uma 
educação integral ....................................................................... 77 
A organização do Ensino Médio no Brasil: Algumas questões em 
discussão ................................................................................... 106 
Ensino Médio nas escolas do campo: Autonomia e Resistência 
para o Campo ........................................................................... 136 
Formação Integral, Interdisciplinaridade e Contextualização nas 
Políticas Curriculares para o Ensino Médio .............................. 157 
Iniciação Científica e Pesquisa no Ensino Médio: concepções e 
práticas docentes ..................................................................... 188 
As mudanças na educação brasileira em escolas de Ensino Médio 
no Rio Grande do Sul ................................................................ 214 
Discutindo o (s) lugar (es) da avaliação no ensino de Sociologia e 
a Lei 11.684/2008 ..................................................................... 250 
TERCEIRA PARTE: Propostas e práticas ...................................... 272 
Ensino médio: ressignificação do ambiente escolar por meio de 
práticas restaurativas ............................................................... 273 
CIL Paranoá como possibilidade de acesso ao ensino de línguas 
para os jovens do Ensino Médio do DF .................................... 297 
Educação científica: importância e desafios do ensino de ciências 
em nível médio ......................................................................... 315 
Prática de Estágio no Ensino Médio: A Química e a aprendizagem 
sob o olhar da/na docência ...................................................... 337 
Sobre os autores ....................................................................... 356 
 
 
- 9 - 
Apresentação 
 
O mundo não é. O mundo está sendo. Como 
subjetividade curiosa inteligente, interferidora na 
objetividade com que dialeticamente me relaciono, 
meu papel no mundo não é só o de quem constata 
o que ocorre, mas também o de quem intervém 
como sujeito de ocorrências. Não sou apenas 
objeto da história, mas seu sujeito igualmente. No 
mundo da história, da cultura, da política, constato 
não para me adaptar, mas para mudar [...] mudar 
é difícil, mas é possível (Paulo Freire, em Pedagogia 
da Autonomia). 
 
Com as palavras de Paulo Freire, inicio a apresentação de uma 
obra que, com a colaboração de vários autores, além de constar 
realidades, problematizar reformas, também indica caminhos de 
mudança. Difíceis, mas possíveis. 
Na realidade brasileira, o Ensino Médio surge e permanece 
como uma etapa a ser “esclarecida”. Vários autores com produção 
reconhecida destacam inúmeros desafios da referida etapa: 
investimento na formação de professores, devido à falta e a atuação 
em áreas não habilitadas; reconhecimento das culturas juvenis na 
escola; alteração na organização curricular; melhorias nos espaços 
físicos, construção de novos espaços como laboratórios, etc.; 
investimento em tecnologias digitais, entre outros. 
Diante desses desafios, nós pesquisadores mobilizamo-nos 
para ampliar conhecimentos na área, tentando entender o que é o 
- 10 - 
Ensino Médio, qual seu objetivo principal e como alcançar sucesso 
frente a esses desafios. Esse é um exercício rigoroso de diagnóstico, 
análise, investimento, formação. O contexto atual de reformas desta 
etapa também sugere um movimento de reflexão crítica sobre o 
presente e o futuro dos jovens estudantes. 
Em detrimento da prática de pesquisa e de uma concepção que 
valoriza a publicação científica como forma de socialização e 
mobilização de conhecimentos, o E-book “Ensino Médio: sujeitos 
políticas e práticas” buscou reunir textos que integrassem três eixos: 
sujeitos do processo educativo, políticas educacionais e práticas 
educativas. Dessa forma, os capítulos que compuseram este E-book 
podem ser considerados produção comprometida com os problemas 
atuais da prática educativa no Ensino Médio. Para a organização desse 
artigo, dividimos os artigos em três partes: Primeira parte – Sujeitos e 
protagonismo; Segunda parte – História, organização e políticas e; 
Terceira parte – Propostas e práticas. 
Desse modo, a primeira parte é composta de dois capítulos. De 
autoria do organizador da obra, o primeiro capítulo é intitulado 
“Juventude, Ensino Médio e Relações com o saber: elementos teórico-
metodológicos”, e tem por objetivo discutir a conceituação de relação 
com o saber como elemento teórico-metodológicopara a docência e 
a pesquisa sobre os jovens no Ensino Médio. Através de diferentes 
referenciais o autor aponta que o caminho indicado é o diálogo, de 
forma a entender as relações estabelecidas pelos jovens com a escola, 
- 11 - 
com os professores e com o conhecimento escolar e permitir reflexões 
válidas sobre o ensino e a pesquisa, buscando entender a 
aprendizagem dos jovens e as possibilidades de êxito/fracasso escolar. 
O capítulo a seguir intitulado “As ocupações nas escolas em 
2015 e 2016 e o protagonismo da juventude”, de autoria de João Paulo 
de Souza da Silva e Danielle Scheffelmeier Mei trata de refletir sobre 
os movimentos estudantes secundaristas, que aconteceram entre 
2015 e 2016, considerando que estes preocuparam com a garantia de 
uma escola de qualidade e a promoção de espaços de diálogo na 
escola e com o poder público. Assim, os autores entendem que as 
ocupações constituíram-se como uma força de construção coletiva, 
vislumbrando possibilidade de mudanças sociais, no âmbito nacional 
quanto na realidade das escolas. 
A segunda parte possui sete capítulos. Sueli Salva, Daiele 
Zuquetto Rosa e Ethiana Sarachin Ramos no capítulo 
“Problematizações acerca do Ensino Médio: em busca de uma 
educação integral” apresentam alguns aspectos históricos referentes 
ao ensino médio no Brasil. O objetivo do estudo é fazer a relação entre 
a história e alguns processos vinculados ao currículo de ensino médio 
em implementação atualmente nas escolas brasileiras, tais como, a 
proposta de Currículo Integrado à Educação Profissional Técnica de 
Nível Médio. 
O capítulo intitulado “A organização do Ensino Médio no Brasil: 
Algumas questões em discussão”, de Angela Maria Corso, discute a 
- 12 - 
organização do Ensino Médio, a partir das últimas legislações, dando 
destaque ao PROEJA (Programa Nacional de Integração da Educação 
Profissional com a Educação Básica, na Modalidade de Educação de 
Jovens e Adultos) e ao Ensino Médio Noturno. A partir de documentos 
e dados e oriundos do Estado do Paraná, a autora destaca a estratégia 
do estado, da organização curricular do Ensino Médio Noturno a partir 
de blocos, como uma possibilidade de enfrentamento à evasão e a 
reprovação, a partir do Programa Ensino Médio Inovador. 
Ivanio Folmer, Samella Taiane Minosso, Ana Margarida Ferreira 
Piani e Ane Carine Meurer, no capítulo intitulado “Ensino Médio nas 
escolas do campo: Autonomia e Resistência para o Campo” discutem 
a importância do Ensino Médio e Educação do Campo, como aliados 
no processo de reconhecimento de cultura dos educandos no espaço 
em que vivem, assim, como também discutir, ainda que previamente, 
a questão do próprio campo e a transformação do mesmo. Nessa 
esteira, discute-se também o Projeto Político-Pedagógico e a 
participação da comunidade no levantamento e/ou enfrentamento 
das problemáticas e objetivos a serem alcançados nessas escolas. 
No capítulo intitulado “Formação Integral, 
Interdisciplinaridade e Contextualização nas Políticas Curriculares para 
o Ensino Médio”, os autores Jéssica Erd Ribas, Guilherme dos Santos 
Pinto, Raquel Brum Sturza e Elisete Tomazetti buscam analisar 
algumas políticas curriculares produzidas a partir da Lei de Diretrizes e 
Bases da Educação Nacional, considerando três princípios básicos: 
- 13 - 
formação humana integral, interdisciplinaridade e contextualização. 
Dessa forma, os autores buscaram compreender o significado de tais 
princípios, assim como problematizar suas repercussões no âmbito do 
currículo escolar, em um contexto de desvalorização da profissão 
docente e de carências materiais da escola básica brasileira. 
De autoria de Sônia Maria Pereira de Lima e Isaura Beltrán 
Nuñez o capítulo “Iniciação Científica e Pesquisa no Ensino Médio: 
concepções e práticas docentes” busca discutir a iniciação científica no 
contexto das reformas curriculares propostas pelo Programa Ensino 
Médio Inovador, considerando professores de Química, Física, 
Biologia, Matemática (áreas de Ciências da Natureza e Matemática) e 
outros. Desse modo a partir da revisão de documentos que norteiam 
o referido programa e a pesquisa com os professores, os autores 
concluem que é preciso articular a formação docente à estudos 
relacionados à iniciação científica, de modo que os professores 
entendam como o conhecimento pode ser produzido em sala de aula. 
Em “As mudanças na educação brasileira em escolas de Ensino 
Médio no Rio Grande do Sul”, de autoria de Sônia Suzana Farias Weber 
e Kauana Martins Bonfada,. trata-se de um estudo referente às 
mudanças ocorridas em dois momentos do Processo de 
Reestruturação Curricular em Escolas Públicas de Ensino Médio do 
Estado do Rio Grande do Sul. O objetivo do trabalho é apresentar uma 
parte da organização das propostas de implementação e 
reestruturação curricular via orientações, bem como implicações no 
- 14 - 
processo de reorganização curricular e mudanças nas Escolas de 
Ensino Médio, do Rio Grande do Sul. 
A autora Letícia Ramos no capítulo intitulado “Discutindo o(s) 
lugar (es) da avaliação no ensino de Sociologia e a Lei 11.684/2008” 
aborda o ensino de Sociologia e a forma de avaliação da 
aprendizagem, que vem sendo disponibilizada para a produção do 
conhecimento em sala de aula no ensino médio, desde as reformas 
oriundas da organização curricular proposta para essa etapa de 
escolaridade a partir da Lei 11.684 de 02 de junho de 2008. O objetivo 
do estudo é compreender como o ensino de Sociologia vem situando 
a avaliação da aprendizagem. 
A terceira parte é composta por quatro capítulos. O capítulo 
“Ensino médio: ressignificação do ambiente escolar por meio de 
práticas restaurativas”, de autoria de Katury Rayane Rodrigues Ramos 
discute o contexto escolar, principalmente o papel da escola em 
tempos de conflitos e violências exacerbadas. Nesse contexto, um 
olhar diferenciado sobre as relações sociais estabelecidas entre os 
sujeitos escolares é importante, pois a busca de uma compreensão 
real dos conflitos, no que se refere às causas e seus 
desmembramentos contribui para a construção de um ambiente 
favorável e para a possibilidade de reverter quadros de violências. O 
objetivo é refletir sobre as relações de conflito e os hábitos escolares 
que estão presentes nas rotinas das escolas. 
- 15 - 
Alexandre Fernando da Silva e Carlos Alexandre Vieira no 
capítulo “Educação científica: importância e desafios do ensino de 
ciências em nível médio” discutem a educação científica no contexto 
da formação e preparação dos jovens para os desafios do mundo 
contemporâneo. Neste contexto, o ensino médio possui papel 
fundamental, como etapa final de escolarização básica e que deve 
consolidar e aprofundar os conhecimentos adquiridos em estágios 
anteriores. A partir do contexto atual do ensino de ciências em nível 
médio e da importância da ciência para o mundo moderno, o referido 
trabalho busca discutir a educação científica e sua importância na 
formação crítica e reflexiva dos jovens. 
No capítulo “Sim, nós podemos: CIL Paranoá como 
possibilidade de acesso ao ensino de línguas para os jovens do Ensino 
Médio do Distrito Federal”, os autores Eduardo Dias da Silva e Lucimar 
Pinheiro da Silva Sampaio problematizam o ensino de línguas, 
apresentando o engajamento político-organizacional e pedagógico do 
Centro Interescolar de Línguas 01 do Paranoá (CIL Paranoá), no Distrito 
Federal, como exemplo concreto na junção colaborativa entre os 
gestores públicos e a comunidade escolar (professores, alunos, equipe 
gestora e comunidade em geral) em desenvolver um ensino de línguas 
que possibilita à inserção dos alunos do ensino médio no mundo 
globalizado de forma crítica e autônoma. 
As autoras Fernanda Monteiro Rigue, Denise Santos da Cruz e 
Fabiana Bortoluzzi Angelo no capítulo “Prática de Estágio no Ensino 
- 16 - 
Médio: A Química e a aprendizagem sobo olhar da/na docência” 
apresentam reflexões acerca dos contextos e circunstâncias da escola 
pública de Educação Básica, através do viés do estudante em 
Formação Inicial. As impressões, sensações e desafios vivenciados no 
estágio são enfatizados por meio da análise de relatos construídos 
pelos estudantes da Educação Básica, de modo a destacar a prática 
realizada e também a relação entre os sujeitos envolvidos no ensinar 
e aprender no Ensino Médio. 
Desse modo, a obra aqui apresentada é um exercício crítico e 
curioso que, com a colaboração de vários autores, de vários estados 
do país, busca lançar luz sobre a etapa do Ensino Médio, considerando 
que o mesmo, como última etapa da Educação Básica é um campo 
complexo de concepções e disputas políticas. Espero que o E-book em 
questão possa ampliar conhecimentos na área e estimular outros 
novos pesquisadores a considerarem o Ensino Médio como campo de 
estudo. 
 
Lucas da Silva Martinez 
(Organizador) 
 
- 17 - 
 
 
 
 
 
PRIMEIRA PARTE: Sujeitos e protagonismo 
 
- 18 - 
Juventude, Ensino Médio e Relações com o saber: 
elementos teórico-metodológicos 
 
Lucas da Silva Martinez1 
 
Discussões introdutórias sobre a temática: o que os dados nos 
revelam sobre os desafios do Ensino Médio? 
O Ensino Médio desponta, atualmente, como um dos maiores 
desafios de atendimento da Educação Básica. Como nos adverte 
Krawczyk (2011, p. 754): 
 
Quando se trata de refletir sobre o sistema 
educacional brasileiro, é consensual a percepção 
de que o ensino médio é o nível de ensino que 
provoca os debates mais controversos, seja pelos 
persistentes problemas do acesso e da 
permanência, seja pela qualidade da educação 
oferecida, ou, ainda, pela discussão sobre a sua 
identidade. 
 
No entanto, as preocupações com essa etapa não se dão 
apenas no presente. A definição histórica das funções do Ensino Médio 
e do seu público (jovens estudantes da elite ou de classes populares) 
foi marcada pela luta constante de poderes e interesses. A elite foi 
privilegiada em oposição à educação para as classes populares no que 
 
1 Pedagogo. Mestrando em Educação pela Universidade Federal de Santa Maria, 
Santa Maria/RS. E-mail: lukasspedagogia@gmail.com 
mailto:lukasspedagogia@gmail.com
- 19 - 
se refere ao acesso ao conhecimento. Enquanto uns tiveram 
possibilidades formativas com acesso ao Ensino Superior, sendo 
formados para ser dirigentes, grande parte da população do país teve 
acesso apenas à formação necessária para serem trabalhadores. A 
divisão entre trabalho manual e intelectual fica explícita nas propostas 
desenvolvidas ao longo da história (KUENZER, 2005). 
É difícil definir com precisão quais são os problemas do Ensino 
Médio. Na verdade, é aí que reside o potencial da pesquisa educativa: 
tentar delinear quais elementos são fundamentais para se entender o 
estado do Ensino Médio e como ele assim se configurou, constituir 
uma discussão que qualifique a realidade da etapa. 
Um dos pontos passíveis de discussão é o da identidade dessa 
etapa. Entretanto, de acordo com Krawczyk (2014) falam-se de 
diferentes problemas, mas a falta de identidade do Ensino Médio não 
pode ser tratada da mesma forma, pois o Ensino Médio nunca teve 
uma identidade definida. Entre a formação para o trabalho, a 
formação para o acesso à universidade e, uma tentativa de estabelecer 
uma identidade em si mesmo, gira o Ensino Médio buscando se definir. 
Considerando a complexidade do tema, esse texto vem em 
outra perspectiva, tentando abordar um aspecto central da instituição 
escolar, que é o da aprendizagem dos estudantes, o motor que os faz 
continuar estudando ou não. 
- 20 - 
 De acordo com dados de 2013 do Instituto Nacional de Estudos 
e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira dispostos no site Qedu2 a 
distorção idade-série no Ensino Médio (taxa média) é de 30%. Sendo 
assim, a cada 9 jovens estudantes do Ensino Médio, 3 reprovaram duas 
vezes ou mais. 
Estes índices não se constituem como fenômenos isolados. A 
aprendizagem dos jovens estudantes pode estar ligada a uma 
variedade de problemas ou dificuldades encontradas na escola, 
principalmente nesta etapa da Educação Básica. Entre estas, podemos 
destacar a formação de professores; relações frágeis entre os jovens 
estudantes, a gestão e os professores; estrutura escolar precária, com 
falta de recursos como laboratórios, etc.; a relação falha ou frágil 
estabelecida entre as tecnologias digitais e a docência, entre tantos 
outros aspectos. 
Destes destacados, chamo atenção à formação de professores 
e as condições de trabalho docente. Dados apresentados pelo 
Observatório do Plano Nacional de Educação, em sua meta 15, indicam 
que apenas 53, 8% dos professores do Ensino Médio atuam na área 
que possuem formação (OBSERVATÓRIO DO PNE, 2017). Sendo assim, 
quase metade dos professores atua em uma área na qual não tem 
formação, quando não existe falta de professores que demanda a 
 
2 Disponível em: http://academia.qedu.org.br/censo-escolar/distorcao-idade-serie. 
Acesso em: 26 ago. 2017. 
http://academia.qedu.org.br/censo-escolar/distorcao-idade-serie
- 21 - 
dispensa dos estudantes, falta de cumprimento de carga horária, entre 
outros desafios. 
Neste sentido, Krawczyk (2011, p. 756) aponta que buscamos 
muitas soluções para a evasão dos estudantes e esquecemo-nos de 
pensar “[...] estratégias de fixação dos professores, principalmente por 
meio da concentração de seu trabalho em uma só instituição e de 
remuneração diferenciada nas regiões de maior dificuldade de 
acesso”. Cabe também pensar que não se trata só da formação sobre 
os conteúdos, mas também, a formação para trabalhar com um 
público diferenciado, que é a juventude3. 
Com tantas dimensões a serem trabalhadas, a que mais se 
investiu nos últimos meses foi a questão curricular. O Governo atual 
 
3 Para mais informações sobre a conceituação de juventude destaco as referências 
de Tomazetti et al., (2012), Salva et al., (2017), Martinez (2017), entre outras. 
Existem também diferentes grupos de pesquisa e observatórios que investem na 
temática como o Observatório do Ensino Médio (Universidade Federal do Paraná) e 
os Observatórios da Juventude (Universidade Federal de Minas Gerais e 
Universidade Federal Fluminense). Sobre a juventude, uma das grandes discussões 
é a do jovem atuar simultaneamente como jovem (com características próprias 
como as relações de gênero, étnico-raciais, geracionais, de classe social, idade, 
consumo cultural, entre outras,) e como estudante, o que alguns autores como 
Perrenoud (1995) destacam como o “ofício de aluno”. Em nenhum momento o 
jovem com sua cultura é negado durante este texto, no entanto, o fundo da 
discussão tentar recuperar e evidenciar a atividade escolar do jovem estudante, 
aquilo que muitos autores consideram como trabalho escolar (CHARLOT, 2013) e que 
diz respeito à postura de estudante que envolve uma relação escolar/científica de 
atenção, atividade, exercício e reflexão (MASSCHELEIN; SIMONS, 2015). Os jovens se 
envolvem em diferentes dinâmicas de amizade e socialização, entretanto, não 
podemos ignorar o papel da escola como lugar de conhecimento e de aprendizagem. 
O aprender e estudar, dessa forma, se tornam o centro da discussão da relação com 
o saber, precisando então o jovem se equilibrar enquanto jovem e estudante 
simultaneamente, com múltiplas características e ações. 
- 22 - 
do Brasil aprovou a Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017, que 
altera da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, entre outras 
leis, modificando a organização curricular do Ensino Médio, impondo 
a escolarização em tempo integral e alterando os componentes 
curriculares, entre eles a absolutização da matemáticae da língua 
portuguesa em detrimento das outras disciplinas. Cada vez o currículo 
do Ensino Médio perde em termos de generalidade, perde 
possibilidades diversas para o pensamento dos jovens e aos poucos vai 
se tornando um espaço de produção de índices nacionais e 
internacionais de avaliação. Essa atitude tomada pelo governo implica 
o a crença de que o “problema” esteja só no currículo, esquecendo 
todos os outros desafios já destacados. 
Embora as perspectivas futuras não se mostrem favoráveis, 
existem elementos importantes na dimensão escolar que precisam ser 
ressaltados: a relação das crianças e dos jovens com o conhecimento 
escolar e o valor deste na vida deles. Como nos lembram Masschelein 
e Simons (2015) o escolar (aquilo que torna a escola em “escola”) 
trata-se justamente do valor do conhecimento e da possibilidade de 
tempo livre de reflexão, sem apelos produtivos ou utilitários4. Cabe 
 
4 Para Masschelein e Simons (2015) o escolar se trata da característica da escola, de 
ser um lugar de conhecimento, de prática, de exercício, e que implica negar os apelos 
produtivos do mercado ou utilitaristas advindos do capitalismo, retomando o 
sentido atribuído na antiguidade como educação e escola como tempo livre para 
pensar. Não tempo livre de relaxamento e de distração, mas discussão, atenção e 
reflexão que em outros momentos não seria possível fazer. Tempo livre para exercer 
o pensamento. 
- 23 - 
pensar: como os jovens estudam e percebem o conhecimento? Será 
que estudam porque gostam ou porque são empurrados pelos pais? 
Será que mesmo com a distância entre os conhecimentos e a vida 
cotidiana eles conseguem atribuir um sentido positivo ao 
conhecimento? Como eles se manifestam frente ao seu 
saber/aprender? Quais as aulas que eles mais gostam? Como eles se 
relacionam com os seus professores? 
Estas questões são fundamentais para entender as relações 
com o saber dos jovens estudantes no Ensino Médio ou em diferentes 
modalidades e etapas da Educação. Os índices de distorção idade-série 
revelam um “abismo” de reprovação, um espaço-tempo ofuscante 
entre os jovens e a escola, mas, em sua natureza estatística não são 
capazes de traduzir as aprendizagens dos jovens nesse espaço. 
De qualquer modo, pensar a relação com o saber é sempre 
fazer uma leitura “positiva” da realidade dos estudantes. É tentar 
apreender o que os jovens aprenderam invés de pensar no que eles 
não aprenderam. E, pensar o porquê de algumas aprendizagens não 
ter acontecido. Para Charlot (2000) a relação com o saber é a relação 
que o sujeito (criança, jovem ou adulto) estabelece com os 
saberes5/conhecimentos escolares, com o seu saber/aprender, e que 
 
5 Por ordem de organização, quando me refiro à relação com saber trato das 
diferentes relações, conexões, nexos realizados entre os jovens estudantes e as 
diferentes aprendizagens possíveis. A discussão entre saber e conhecer, entre saber 
e conhecimento é longa, no entanto, considerando o uso corrente na literatura em 
educação, ao falar de saberes escolares, trato-os como conhecimentos escolares. A 
relação com o saber remete diretamente à relação com o aprender (CHARLOT, 2000) 
- 24 - 
é sempre uma relação única, que envolve mobilização, atividade 
intelectual e que é desencadeada ao mesmo tempo em que tem por 
objetivo o prazer de aprender. 
Neste sentido, encaminhando a discussão sobre a relação com 
o saber, o objetivo do trabalho é discutir a conceituação de relação 
com o saber como elemento teórico-metodológico para a docência e 
a pesquisa sobre os jovens no Ensino Médio. Ao passo que discutimos 
os elementos da teoria de Charlot (2000, 2013) apontamos reflexões 
que podem se refletir tanto na prática pedagógica como na pesquisa 
em educação. 
 
A origem da temática do “fracasso escolar” e desmistificações 
Para entender o “fracasso escolar” é preciso voltar na 
sociologia dos anos 70, principalmente a que se convencionou chamar 
de sociologia da reprodução (mais conhecida como sociologia da 
educação). 
Para Silva (1992, p.15), pode-se dizer que o grande tema da 
sociologia da educação é o “[...] dos mecanismos pelos quais a 
educação, ou mais concretamente, a escola, contribui para a produção 
e a reprodução de uma sociedade de classes”. O tema da reprodução 
é torna-se central, principalmente nas figuras de Althusser, Bowles e 
Gintis, Baudelot e Establet e, Bourdieu e Passeron. 
 
então este sentido sempre é possível de ser estabelecido e não é incorreta esta 
relação. 
- 25 - 
Para Althusser, Bowles e Gintis e Baudelot e Establet a escola 
tem um papel definido: preparar determinadas classes sociais para 
ocupar determinadas divisões sociais do trabalho. 
Althusser introduz o conceito de Aparelhos Ideológicos do 
Estado. Para este autor, o Estado dispõe de instituições como a escola 
e as igrejas as quais tem o papel de transmitir uma ideologia, valores 
e formas de agir a serem seguidos por cada uma das classes sociais. “A 
ideologia é constituída por aquelas crenças que nos levam a aceitar as 
estruturas sociais (capitalistas) existentes como boas e desejáveis” 
(SILVA, 1999, p. 31). A reprodução está aí garantida pela ideologia: 
para que mudar, ou transformar algo, se podemos fazer crer pelas 
práticas e pelo currículo que tudo está bem? 
Baudelot e Establet continuam a tese de Althusser 
argumentando que a reprodução se realiza no currículo, ou seja, 
currículos diferentes para diferentes classes sociais, com 
conhecimentos de status superior para as classes dominantes e de 
status inferior para as classes subordinadas. 
Bowles e Gintis, ao contrário das apostas curriculares que 
fizeram os outros autores, consideram que são as relações sociais que 
são fundamentais para a reprodução das classes sociais. A reprodução 
se faz no espelhamento das relações sociais de trabalho às relações 
educativas, por exemplo, ao enfatizar a aprendizagem 
 
[...] das atitudes necessárias para se qualificar um 
bom trabalhador capitalista. As relações sociais de 
- 26 - 
trabalho capitalista exigem certas atitudes por 
parte do trabalhador: obediência à ordens, 
pontualidade, assiduidade, confiabilidade, no caso 
do trabalhador subordinado; capacidade de 
comandar, de formular planos, de se conduzir de 
forma autônoma, no caso dos trabalhadores 
situados nos níveis mais altos da escola 
ocupacional (SILVA, 1999, p.33). 
 
Silva (1992) considera então o que os três grupos de autores 
têm em comum: uma visão de sociedade que enfatiza uma demanda 
(precisa de certo tipo de cidadão ou trabalhador) e que vê na escola a 
função de produzir e reproduzir esse sujeito, de forma mais produtiva 
e efetiva possível. A escola possui então uma função e, assim, entende-
se que essa vertente sociológica tenha ficado conhecida como 
funcionalista. 
Além destes autores, Bourdieu e Passeron na obra “A 
Reprodução” apontam que a escola é a principal reprodutora da 
sociedade. Para Bourdieu e Passeron a escola não inculca valores ou 
modos de pensar que são dominantes. Ela 
 
[...] se limita, ao usar, um código de transmissão 
cultural no qual apenas as crianças e jovens da 
classe dominante já foram iniciados no ambiente 
da família, a permitir a continuação desses no jogo 
da cultura e a confirmar a exclusão dos filhos de 
pais das classes subordinadas (SILVA, 1992, p. 18). 
 
Silva (1992) argumenta que a exclusão ou o fracasso não é pela 
ação de uma imposição da parte de alguém para que outro não 
- 27 - 
continue e não progrida no caminho escolar. O fracasso escolar se dá 
“naturalmente” devido a alguns que não conseguem vencer nessa 
corrida meritocrática. Obviamente, este natural não é natural, mas diz 
respeito a um conjunto de conceitos a serem esclarecidos. 
O conceitoprincipal dessa análise é o habitus. Explicado por 
Silva (1999) trata-se da incorporação das estruturas sociais 
internalizadas e, diz respeito ao conjunto de disposições psíquicas que 
envolvem relação com a linguagem, com os gostos, com a arte, com 
maneiras de ver o mundo, dominantes ou dominadas. Se as crianças 
das classes populares não têm o habitus dominante, nesta lógica, não 
tem possibilidades de compreender a estrutura dominante evocada na 
cultura escolar. 
Essa análise, no entanto, com base em dados estatísticos de 
entrada e de saída mostra e determina a reprodução: não existem 
possibilidades de que uma criança da classe popular tenha um bom 
desempenho na escola e consiga melhorar sua condição social. O que 
Bourdieu não considerou e que Charlot (2000) e outros autores 
perceberam é que as crianças e jovens não são guiados apenas pela 
posição social dos pais, por um habitus de classe: elas desenvolvem 
algum tipo de posição dentro do espaço escolar. Ou, aquilo que 
Charlot (2013) nos lembra: nossas condições subjetivas, mesmo sem 
alguma explicação clara dentro da sociologia, nos impulsionam a fazer 
coisas que extrapolam nossas condições. 
- 28 - 
Talvez, uma das teorizações mais claras que permitem fugir do 
determinismo da sociologia da educação é a abordagem teórica de 
Bernard Lahire (2002). Para o autor, o principal elemento que foge à 
sociologia, quando ela se envolve em análises macrossociais e 
estatísticas é a dimensão do individual. Como entender porque 
crianças e jovens de classes sociais populares, com características 
homogêneas podem agir de formas tão diversas? Ou melhor, porque 
filhos dos mesmos pais, nascidos na mesma época atuam de formas 
tão diversas? 
O que Lahire (2002) chama atenção é que o conceito de habitus 
de Bourdieu, de alguma forma busca algum tipo de homogeneidade e 
é determinista, no entanto, uma análise individual, algo que ele chama 
de uma “sociologia psicológica” revela que os sujeitos são plurais, ou 
seja, produtos de diferentes socializações, no seio da família ou em 
outros espaços, e adquirem disposições, contraditórias ou não, que se 
tornam algum tipo de senso que orienta as ações práticas. Para o 
autor: 
 
Um autor plural é, portanto, o produto da 
experiência – amiúde precoce - de socialização em 
contextos sociais múltiplos e heterogêneos. No 
curso de sua trajetória, ou simultaneamente no 
curso de um mesmo período de tempo, participou 
de universos sociais variados, ocupando aí posições 
diferentes (LAHIRE, 2002, p.36). 
 
- 29 - 
Toda argumentação feita nesse texto sobre o “fracasso 
escolar” é nada mais que uma forma de fugir à simplificações e 
culpabilizações existentes, que buscam justificar o fracasso de crianças 
e jovens na escola. Moll (1996) já destacava três perspectivas que 
vinham ao encontro dessas justificações: a abordagem psicologista, 
que atribui a falta de aprendizagem às estruturas do indivíduo, 
apelando principalmente para questões neurológicas, déficits, etc.; a 
abordagem biologicista que direciona a falta da aprendizagem à falta 
de nutrição adequada e problemas médicos e; a abordagem 
culturalista, que encaminha para problemas de deficiência cultural, 
falta de herança cultural familiar, entre outras. 
Todas as abordagens carregam uma falsa ilusão: a ilusão de que 
a culpa é individual e que não existe nada a fazer. Além disso, indicam 
elementos que essa argumentação já abordou como a questão da 
pluralidade do sujeito e a possibilidade de rompimento com um 
habitus de classe, através de diferentes socializações, no qual uma 
criança de classe popular pode se desenvolver, enfrentando e 
superando as estatísticas. 
Lahire (1997) em uma de suas pesquisas aponta que, dentre 27 
crianças em início de escolarização, embora todas fossem da classe 
popular, com famílias com características e condições similares, 
metade destas tinham bom desempenho na escola e mostravam a face 
do “improvável”. Esta é uma das grandes críticas que Lahire faria à 
sociologia desenvolvida em sua época: sempre quando sujeito tem um 
- 30 - 
desempenho maior que o esperado eles são colocados como 
exemplares únicos, peculiares, em que os métodos existentes não os 
permitem analisar e eles ficam no contigente. Neste sentido, Lahire se 
ocupa destes para mostrar que, em diferentes momentos, espaços e 
pequenas mudanças, inclusive na relação com os pais e demais 
familiares, as crianças e, consequentemente os jovens adquirem um 
estoque de disposições, e estas os diferenciam uma das outras. 
Quando dizemos que as crianças e jovens das classes populares não 
irão aprender e provavelmente repetirão à trajetória de seus pais, 
estamos ignorando dois potenciais: o das disposições adquiridas, e o 
da força subjetiva que eles podem acabar desenvolvendo. 
Charlot (2000) entende que o “fracasso escolar” tornou-se 
quase um sujeito, algo determinista: “ele não passa porque não 
aprende, tem fracasso escolar!”. O que Charlot argumenta é que esse 
“fracasso” se trata de uma situação de fracasso que, através de uma 
relação próxima e bem fundada com a escola, com o aprender e com 
os conhecimentos escolares pode ser superada. 
Pensar em termos de relação com saber implica um olhar 
atencioso sobre as crianças e jovens, buscando entender o que eles 
aprenderam e o que eles não aprenderam, buscando entender o 
porquê desses acontecimentos. Aí se desdobram elementos 
importantes para a docência e para a pesquisa. 
 
 
- 31 - 
Pensando as relações com o saber 
O que são as relações com o saber para Charlot (2000, 2013)? 
Para explicar, Charlot sugere alguns elementos, tais como: 
Mobilização, atividade intelectual, prazer, desejo e sentido. Para o 
autor, cada uma dessas ações, processos ou relações são 
fundamentais para entendermos sua teorização. É preciso conceituar 
cada uma e suas características para poder entender. 
Mas o que significa mobilização dentro dessa teoria? O que 
significa atividade intelectual do estudante? Como se obtém prazer na 
relação? E o sentido, o que lhe caracteriza? Ambos os conceitos 
articulam-se e aparecem antes ou depois, portanto não é possível 
organizá-los em uma ordem. Pode-se tentar organizar, considerando 
que toda relação está em movimento, e o próprio conceito de 
mobilização utilizado pelo autor indica movimento e ação. 
Começamos pela atividade. Charlot (2000) busca na sociologia 
e na antropologia os fundamentos para o estudo daquilo que designou 
como relação com o saber. Os autores e discussões feitas acima se 
constituem grande parte do referencial teórico utilizado pelo autor. 
Um dos principais referenciais de Charlot é o pensamento de 
Bourdieu, na qual Charlot baseou-se inicialmente e, para romper com 
o determinismo da relação entre escola e herança familiar, expandiu a 
ideia acrescentando a noção de atividade. A atividade do sujeito pode 
ser potencial e determinante para o rompimento com a correlação 
estatística entre classe social e fracasso escolar. Segundo o autor, 
- 32 - 
 
O ser humano ocupa uma posição no mundo, mas, 
a partir dessa posição, ele tem uma atividade sobre 
o mundo. A atividade do aluno na sala de aula e 
fora dela é tão importante quanto a sua categoria 
social ou sexual para se entender o que está 
acontecendo na escola (CHARLOT, 2013 p. 143). 
 
Para Charlot (2013), essa atividade, que é uma atividade 
intelectual e diferenciada de outras atividades é fundamental para 
aprender e, só aprende quem desenvolve uma atividade intelectual 
frente aos conhecimentos escolares e toma uma postura rigorosa 
frente ao seu saber/aprender. No entanto, Charlot (2013) ao 
apropriar-se do pensamento de Leontiev, explica que: só é atividade 
um conjunto de ações que possuem objetivo e motivo, coerentes 
entre si. 
 
Por que faço isso? É o motivo. Para que o faço? É o 
objetivo. Como atingir esse objetivo? Realizando 
ações, que requerem operações.Uma atividade 
tem uma eficácia e um sentido. Ela é eficaz quando 
as operações permitem chegar ao resultado visado. 
O sentido da atividade depende da relação entre 
objetivo e motivo. Quando ambos coincidem, é 
mesmo uma atividade; senão, é apenas uma ação 
(CHARLOT, 2013, p. 143-144). 
 
Essa coerência é importante para compreensão da atividade, 
principalmente no que confere ao sentido. 
 
Aprender requer uma atividade intelectual. Só se 
engaja em uma atividade quem lhe confere um 
- 33 - 
sentido. Quando esse sentido é afastado do 
resultado visado pela ação de estudar, o 
engajamento nesta é frágil. Ao contrário, quando 
motivo e objetivo coincidem, esta faz muito 
sentido e sente-se prazer ao desenvolvê-la e, ainda 
mais, ao atingir o objetivo. Atividade, sentido e 
prazer: esses são os termos da equação pedagógica 
a ser resolvida (CHARLOT, 2013, p. 146). 
 
A atividade carrega consigo a eficácia (se alcancei com o 
objetivo) e o sentido que atribuo a ela. Pode-se dizer que estudamos 
por diferentes motivos: passar de ano, ganhar um presente, porque 
gostamos ou nos sentimos desafiados; para aprender, entre outros. Na 
mesma linha, Perrenoud (1995) e Charlot (2013) realizam críticas ao 
utilitarismo no qual crianças e jovens se envolvem, estudando por 
diferentes motivos e não necessariamente para aprender. Benjamim 
(2007) o faz da mesma forma, evocando que os jovens e a universidade 
se venderam à burguesia, e se relacionam com o conhecimento na 
corrida do trabalho, do capital e do diploma, configurando a falta de 
objetivos, motivos e ações coerentes. Charlot advoga então que, os 
sujeitos agem com motivos e objetivos diversos e não conseguem 
construir uma relação sólida com o saber/aprender e com os 
conhecimentos. Disso decorre o sentido e/ou a falta dele. 
O sentido é complexo, e, algumas perguntas podem nos ajudar 
a pensar: “[...] qual o sentido de ir à escola? [...] qual é o sentido de 
estudar, ou de se recusar a estudar? Qual é o sentido de aprender e 
de compreender, quer na escola, quer fora da escola?” (CHARLOT, 
- 34 - 
2013, p. 144-145). “Para ele [o estudante], qual sentido tem tal ou qual 
método pedagógico, tal ou qual relação com os docentes? O que ele 
considera uma aula interessante? São questões básicas” (CHARLOT; 
REIS, 2014, p.75). 
Perrenoud (1995) contribui com a discussão sobre o sentido da 
atividade escolar, ao afirmar que o sentido sempre é construído. 
Porém, é construído sob diferentes situações, como pela 
imposição/necessidade feita pelo professor. Pode ser construído com 
base na herança biológica ou genética. Pode ser construído e 
negociado entre professor e estudante, pois os professores têm o 
poder de combinar atividades, flexibilizar, dispor de estratégias, que 
podem favorecer que o estudante se mobilize. 
Perrenoud (1995) vai além do estudante: indica que o 
professor tem papel importante quando se trata de reconhecer as 
relações que os estudantes estabelecem, criando formas de privilegiar 
o diálogo. Cada estudante possui razões e juízos de valores que 
precisam ser respeitados e, didaticamente negociados. A questão do 
sentido da atividade escolar é de extrema importância para Perrenoud 
(1995), pois segundo o autor, só existe aprendizagem a partir da 
construção de sentido. 
Charlot (2013) indica que, como o sentido e construído ou 
atribuído pelo estudante, pode ser que esse sentido seja constituído 
em relação com algo, como 
 
- 35 - 
[...] uma palavra, um enunciado, um 
acontecimento que possam ser postos em relação 
com os outros em um sistema, ou em um conjunto; 
faz sentido para um indivíduo algo que lhe 
acontece e que tem relações com outras coisas de 
sua vida, coisas que ele já pensou, questões que ele 
já se propôs. É significante (ou, aceitando-se essa 
ampliação, tem sentido) o que produz 
inteligibilidade sobre algo, o que aclara algo no 
mundo. É significante (ou por ampliação 
novamente, tem sentido) o que é comunicável e 
pode ser entendido em uma troca com outros. Em 
suma, o sentido é produzido por estabelecimento 
de relação, dentro de um sistema, ou nas relações 
com o mundo ou com os outros (CHARLOT, 2000, 
p. 56). 
 
Em suma, quando um conteúdo no qual me relaciono traz à 
memória algo importante ou interessante, quando aquilo diz respeito 
a alguma disciplina pela qual me interesso, quando algo vai ao 
encontro das minhas expectativas, isso faz sentido pra mim! No 
entanto, nem tudo faz sentido, por isso, muitas vezes, como citado em 
Perrenoud (1995) o sentido também é forçado pela imposição, pela 
necessidade/obrigação de fazer, e, dessa forma, pode ser que “[...] o 
aluno age por um motivo não relacionado com o próprio saber” 
(CHARLOT, 2013, p. 145). Corre o risco de que este sentir/sentido não 
seja prazeroso, sendo que o prazer também é importante pra 
fortalecer a relação com o saber. 
Charlot (2013, p. 159) traz um exemplo claro sobre o sentido 
da atividade: “Uma vez, um adolescente francês me disse: ‘Na escola, 
- 36 - 
eu gosto de tudo, menos das aulas e dos professores’. É claro que, 
mesmo nesse caso a escola tem sentido para o aluno, mas esse sentido 
não está relacionado com o aprender”. O sentido é sempre atribuído 
pelo sujeito: nem sempre tem relação direta com o aprender, com os 
conhecimentos, mas como as relações que o sujeito estabelece são 
múltiplas, a escola pode tornar-se um lugar agradável, se excluirmos 
os momentos da aula. Salva et al., (2017) em sua pesquisa, ao 
entrevistar um estudante obtém a mesma resposta. Entre estudar, 
aprender, conhecer coisas novas, estar bem formado para o futuro 
seja ele qual for, e o valor do conhecimento escolar, existe algo a 
pensar: algo está errado nessa equação. 
Na teoria da relação com o saber o prazer é algo importante. 
Só se tem prazer naquilo que faz sentido, só fazemos uma atividade se 
ela faz sentido, e só tem sentido se tem prazer, se motivo e objetivo 
coincidem, e se aquilo que fazemos torna-se efetivamente atividade. 
Só fazemos uma atividade se nos mobilizamos. Charlot (2013) alerta: 
pensamos nos estudantes como sujeitos dispostos a aprender, porém, 
nem sempre é assim. 
O que me move e me impulsiona a estudar? O que me 
mobiliza? Charlot (2000, p. 55) entende que: “Mobilizar é por recursos 
em movimento. Mobilizar-se é reunir suas forças, para fazer uso de si 
próprio como recurso”. Charlot (2013, p. 159) distingue mobilização 
de motivação: “Não gosto muito dessa ideia de motivar os alunos, 
porque, muitas vezes, esse ato de motivar é o mesmo que enrolar os 
- 37 - 
alunos para que eles façam alguma coisa que não estão afim de fazer”. 
Assim, considera o autor: “A motivação é externa, ao passo que a 
mobilização é um fenômeno interno: motiva-se alguém de fora, 
enquanto mobiliza-se a si mesmo de dentro” (CHARLOT, 2013, p.160). 
Charlot (2000) entende que, a mobilização envolve 
diretamente duas ideias: a de recursos e a de móbil (razões para 
realizar o movimento). O autor entende que, ao discutir a mobilização 
é impossível não entrar na ideia de desejo. 
 
Todo o estudo que tomar a relação com o saber 
como noção central não poderá desvencilhar-se do 
alicerce psicanalítico; não que isso proíba outras 
abordagens, mas a partir da teorização da relação 
de objeto, do desejo e do desejo de saber, a seguir, 
da inserção social desses em relações (que ligam o 
psicológico ao social) é que será possível correr o 
risco de trabalhar e evoluir a noção; uma evolução 
que não esquecerá algo essencial; sob pena de 
fazer-lhe perder o seu sentido: não há sentido, 
senão o do desejo (BEILLEROT 19-- apud CHARLOT, 
2000, p. 47). 
 
Charlot, ao considerar isso, afirma que é indiscutível o tema do 
desejo, porque o sujeito é sujeito de desejo, o sujeito é desejo, e 
sempre é desejo de algo, de um objeto, do Outro. Porém, argumenta: 
 
Inversamente, não posso concordar com uma 
abordagem que pretende fundamentar o desejona 
pulsão (em uma perspectiva biologizante que faz 
regredir de Lacan a Freud) e introduz o social 
apenas em um segundo, ou terceiro momento 
(CHARLOT, 2000, p. 47). 
- 38 - 
 
Embora Charlot (2000) não entre na discussão psicanalítica, ela 
tem um grande valor e pode nos ajudar a esclarecer várias dúvidas. 
Desse modo, para entender essa perspectiva psicanalítica na qual se 
ocupam Freud e Lacan me valho de Benetti (2006) ao falar do desejo, 
do Inconsciente e das relações possíveis entre psicanálise e educação. 
Prazer tem relação com espera, com anseio, com desejo. Talvez, só 
seja possível construir uma relação forte ou sólida com o saber, 
quando prazer e desejo se encontram, se o desejo de estudar, de 
aprender, de mover de lugar ou condição torna-se um imperativo a ser 
vivido. De qualquer modo, não são todos os estudantes que 
conseguem estabelecer a mesma relação. 
Para Benetti (2006), com base em Lacan e outros autores, os 
seres humanos estão sempre em busca de satisfação. O próprio Freud 
(2014) escreve que o destino do homem (por não estar definido em 
nenhum lugar) é o da felicidade, da satisfação e, do afastamento dos 
desprazeres da vida. 
Na teoria psicanalítica, os sujeitos buscam incansavelmente 
por um objeto absoluto, a Coisa, que lhe trará satisfação total e que 
não existe, por isso torna-se o motor da vida, que a faz continuar, 
sempre em busca dessa satisfação. A criança quando nasce e encontra-
se com a mãe pensa encontrar isso, mas, é interditada pela cultura, no 
que se refere ao incesto e, a partir daí, buscará sempre uma forma de 
satisfação completa. 
- 39 - 
Pensar essa busca de satisfação nos permite pensar o 
contrário, o vazio que existe em cada um de nós e que nos mobiliza, 
ou, nas palavras de Salva, Ramos e Tomazetti (2017, p.76): “[...] como 
dialogar onde falta silêncio?”. Portanto, lembro-me de Melucci (2004, 
p.74) em um trecho de seu livro: 
 
NAN-IN, UM MESTRE JAPONÊS da era meiji, 
recebeu a visita de um professor universitário que 
queria informações sobre o zen. Nan-in serviu o 
chá. Encheu a taça do seu hóspede até a borda e 
depois continuou a derramar o líquido. O professor 
observou o chá transbordar até não conseguir mais 
se conter: “Está cheia”, disse, “não cabe mais chá!”. 
“Como esta taça”, disse Nan-in, “tu estás repleto 
das tuas opiniões e conjecturas. Como posso 
explicar-te o zen, se antes não esvazias tua taça?” 
(MELUCCI, 2004, p. 74). 
 
É o nosso vazio que nos faz ir atrás. Quando estamos cheios não 
vamos à busca, mas quando nos é aberto espaço então nos 
mobilizamos em busca da nossa satisfação. A taça de chá representa 
isso: a possibilidade que cada um tem de buscar aquilo que nos 
preenche, mas, para isso, precisamos nos esvaziar, precisamos da 
dúvida, da incerteza, precisamos colocar para fora, verbalizar, 
dialogar. Quem tem certeza de tudo não busca mais conhecimento. É 
a falta da certeza, o vazio que promove o movimento. A curiosidade e 
a desconfiança movem a ciência e, a curiosidade epistemológica, como 
nos lembra Freire (2016) é que pode promover com que estudantes 
sejam movidos por um desejo de estudar e aprender. 
- 40 - 
Considerando a questão do desejo e as discussões acima 
realizadas, nos questionamos: quando falamos que a mobilização do 
estudante depende do seu desejo, e que é ele que se mobiliza, como 
fazer com que ele se envolva nas atividades se não houver esse 
desejo? Charlot (2000) não nos dá nenhuma saída para pensar a 
questão do desejo. Inclusive, Nogueira (2013) ao refletir sobre as 
contribuições de Lahire para a educação, destaca que sua ampla noção 
de disposição e de constituição do sujeito através das socializações 
esbarra no mesmo problema: a sociologia se afasta da psicologia e da 
psicanálise para constituir-se, e, no entanto, lhe falta uma teoria da 
subjetividade, ou seja, esse terreno dos desejos que a teoria 
psicanalítica afirma não existir controle, envolvendo assim os desejos 
pulsionais. 
A teoria de Bourdieu sobre o habitus e as teorias que dela 
provêm não podem, completamente, lidar com a dinâmica entre 
interno e externo. Assim, sempre existe espaço de diálogo entre aquilo 
que é incorporado socialmente, ou seja, a orientação social do 
individual (NOGUEIRA, 2013) e aquilo que constitui a psique do sujeito. 
Mesmo Charlot não aceitando a perspectiva psicanalítica, ainda assim 
consideramos importante e do ponto de vista teórico, nos permite 
entender melhor as relações dos estudantes com o mundo exterior, 
inclusive dos seus posicionamentos frente aquilo que eles acreditam. 
Sabemos que o desejo é necessário, mas não existe uma 
formula para fazer com que o estudante tenha o desejo de estudar. 
- 41 - 
Neste sentido, ir à Psicanálise e perceber outras noções tornou-se uma 
possibilidade viável para entender melhor a questão do desejo. 
Cerletti (2004, p.28) fortalece esse pensar dizendo que: “[...] não é 
possível ensinar a ‘amar’ a sabedoria, como certamente, não é possível 
ensinar a apaixonar-se”. Neste sentido, quando falamos do desejo 
estamos falamos de algo irredutível e intransferível, pessoal, subjetivo. 
Nenhum professor tem ferramentas para fazer com quem alguém 
deseje algo, o estudante deseja ou não. Cabe ao professor estimular a 
atividade do estudante, o seu pensamento, convidando-o para pensar, 
ou, como nos orienta Pereira (2013), fazer circular a palavra, promover 
a verbalização, a expressão e o pensamento, como caminho para a 
libertação dos medos, esvaziamento e possibilidade de desejar algo 
diferente, como o conhecimento. 
Para Masschelein e Simons (2015) o interesse se dá pelo 
contato: a medida que as crianças e jovens são apresentados ao 
mundo escolar e os conhecimentos escolares, a imersão neles, a 
possibilidade de um novo mundo frente aos seus olhos é que lhes pode 
ser interessante e lhes provocar o desejo. 
Nesse sentido, considero que a relação com o saber que os 
jovens constroem e estabelecem na escola se dá através do 
engajamento em uma atividade intelectual, que produz prazer e é 
mobilizado por este, atribuindo sentido à relação e potencializando 
que aprenda. Assim, atividade intelectual, com motivos e objetivos 
coerentes, uma relação prazerosa e desejosa com o saber, que o 
- 42 - 
mobiliza a estudar e aprender mais, são os elementos que compõe a 
teorização de Charlot. O desafio é investigar como os jovens 
estudantes se relacionam com o saber, com a escola, com os 
professores, quais seus anseios, o que querem aprender e o que os 
professsores fazem com essas informações. Dessa forma, o texto não 
propõe uma solução, mas aponta um caminho: o diálogo, a circulação 
da palavra. 
 
Finalizando: o diálogo como caminho para compreender as relações 
com o saber 
O sentido de entender as relações com o saber, com os 
conhecimentos escolares, com a relação com os professores, com os 
colegas, com os familiares, com o espaço escolar e tantas outras está 
no diálogo. O diálogo (FREIRE, 1983) é uma necessidade existencial, e 
sempre envolve um espaço-tempo de falar e ouvir. Em nosso caso 
como professores e pesquisadores, ouvir se torna fundamental, do 
contrário falamos mais do que ouvimos. 
Lahire (2002) ao falar da pluralidade da constituição dos 
sujeitos está chamando atenção a outro fato: a pesquisa precisa 
prestar atenção ao individual, àquilo que foge as estatísticas, que não 
é o “normal”. Salva et al., (2017) constata que existem um conjunto de 
fatores que contribuem para o afastamento dos jovens estudantes do 
Ensino Médio e, consequentemente a situação de fracasso escolar, tais 
como: 
- 43 - 
 
[...] as relações professor-estudante, estudante-
estudante; a falta de diálogo entre estudantes e 
professores; a metodologia e os recursos utilizados 
na escola que não correspondem à expectativa dos 
jovens estudantes; a precariedade da estrutura 
física da escola; o envolvimento com drogas; osproblemas familiares; as dificuldades dos 
professores de ensinar os/as jovens estudantes a 
fazer com que compreendam aspectos relativos ao 
objeto de conhecimento e ascendam a um 
processo mais complexo que implica construir uma 
relação com o mundo e pensar sobre ele; a falta de 
sentido dos saberes escolares para a vida dos/das 
jovens, ou talvez, nossa incapacidade de 
compreender os sentidos que os jovens constroem 
sobre os conhecimentos escolares e, por fim, a 
indiferença do corpo docente e dos gestores em 
relação aos primeiros movimentos de afastamento 
dos/as jovens, muitas vezes, mesmo sem intenção, 
contribuindo para o processo de afastamento 
(SALVA et al., 2017, p.12-13). 
 
Essas compreensões só foram possíveis quando os 
pesquisadores citados se colocaram em posição de diálogo, pois, 
dialogando é que se aprende a falar com os jovens. Em outro trabalho 
(MARTINEZ, 2017) já apontei elementos importantes na pesquisa em 
educação ao olhar para os jovens, principalmente constituindo 
espaços onde os jovens podem falar, podem dialogar, e ao passo que 
narram também se percebem como sujeitos, colocam-se em 
movimento identitário. 
De qualquer modo, não é só para pesquisa que é importante 
escutar os jovens. Escutar os jovens talvez nos possibilite pensar 
- 44 - 
pedagogias voltadas à juventude (MARTINEZ; SALVA, 2016), buscando 
entrelaçar os elementos típicos da escolarização (MASSCHELEIN; 
SIMONS, 2015) com as tecnologias digitais, a cultura juvenil, entre 
outros aspectos. 
As relações com o saber tornam-se uma lente importante para 
o trabalho pedagógico e a pesquisa, ao destacarem que aqueles jovens 
que ainda estão na escola, aprendem de formas diferenciadas, se 
relacionam entre si e com seus professores e, que de alguma maneira, 
demonstram o que estão dispostos ou não a aprender, falando sobre 
aquilo que vêem sentido e o que não lhes “diz nada”, estabelecem 
algum tipo de relação com os conhecimentos. 
Para finalizar este texto, até dar início a outro, é preciso indicar 
que a única forma de alcançar ou caminhar em direção a essa utopia 
educativa de ensinar e aprender, e romper com a reprovação, com a 
falta de aprendizagem, com o tédio, é se colocando no lugar daquele 
que ao ensinar aprende, e ao aprender ensina (FREIRE, 2016). É 
ouvindo o que os jovens têm a dizer. 
 
- 45 - 
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http://www.observatoriodopne.org.br/metas-pne/15-formacao-professores
- 48 - 
As ocupações nas escolas em 2015 e 2016 e o 
protagonismo da juventude 
 
João Paulo de Souza da Silva6 
Danielle Scheffelmeier Mei7 
 
Introdução 
Este capítulo tem como objetivo refletir sobre os movimentos 
estudantes secundaristas que aconteceram em 2015 nas cidades de 
São Paulo, Rio de Janeiro e Goiás; e em 2016, quando aconteceram em 
diversas cidades brasileiras, em especial no Paraná8. O movimento 
estudantil se destaca e realiza importantes momentos de resistência e 
enfrentamento ao governo desde o período da Ditadura Civil-Militar, 
quando as reivindicações também se voltavam para as políticas 
educacionais adotadas na época, por parte do poder público. 
Naquele período histórico, os estudantes secundaristas se 
uniam aos universitários, criando certa unidade nas ações. Na década 
de 1990, os movimentos se intensificam com a participação nos 
 
6 Doutorando em Educação PPGE-UFPR. Professor da rede pública de ensino de 
Curitiba e nos cursos de Pedagogia e Teologia das Faculdades São Braz, no mesmo 
munícipio. E-mail: jpaulodesouza@hotmail.com7 Jornalista e mestra em comunicação pela UFPR. E-mail: 
danielle.scheffelmeier@gmail.com 
8 Uma prévia deste conteúdo foi apresentada no EDUCERE 2017 e, neste capítulo, os 
autores trazem informações mais completas e novos referenciais teóricos. 
mailto:jpaulodesouza@hotmail.com
mailto:danielle.scheffelmeier@gmail.com
- 49 - 
grêmios estudantis em diversas escolas do Brasil, que convocavam os 
estudantes a tomarem posicionamento em relação às decisões que 
estas tomavam. 
As ocupações acontecidas na segunda década do século XXI se 
caracterizam por um formato menos pautado em estruturas 
hierárquicas e com maior participação das bases, numa 
horizontalidade do movimento, organizado em “redes”, em 
contraposição à linearidade vertical historicamente presente no 
movimento estudantil. 
As escolas se transformaram em espaços de construção 
coletiva, com o estabelecimento de laços de amizade e é possível aferir 
que as perspectivas de mudança no mundo social estão vinculadas às 
ações coletivas em nome de um objetivo comum. O objetivo da 
ocupação: “Não fechem a minha escola”, foi maior que as desavenças 
interpessoais. Assim, os alunos enfrentaram os conflitos e saíram 
fortalecidos, de maneira que não deixassem o coletivo se “quebrar”. A 
escola ganhou novos arranjos e a sala de aula foi dilatada, 
incorporando outros espaços e recursos disponíveis. 
 
“Não fechem minha escola” 
O governo do Estado de São Paulo anunciou um plano de 
reorganização da rede pública no mês de setembro de 2015, causando 
a reação de estudantes, pais e professores afetados pelo plano. Eles 
começaram a exigir a suspensão do plano, com alegação de que não 
- 50 - 
houve diálogo e as justificativas pedagógicas eram frágeis. A 
reestruturação da rede estadual de ensino previa o fechamento de 93 
escolas, além da imposição de apenas um dos ciclos para 754 escolas, 
o que afetaria 311 mil alunos e 74 mil professores. A ideia do governo 
do Estado era dividir a escola em ciclos, separando os alunos em 
diferentes unidades: Ensino Fundamental I, Ensino Fundamental II e 
Ensino Médio. Contrários às posturas do governo e da imprensa, surge 
uma movimentação surpreendente com o lema “Não fechem a minha 
escola”. 
 
O estudante brasileiro sempre esteve na vanguarda 
dos principais acontecimentos políticos e sociais do 
país. [...] se deve ao fato de sempre ter havido nos 
meios estudantis nacionais uma profunda 
insatisfação no que se refere à condução do 
destino político e social do Brasil (BENEVIDES, 
2006, p. 74). 
 
Por sua vez, os meios de comunicação de massa tentaram 
construir uma imagem negativa da escola pública, apresentando-a 
como uma instituição sucateada, violenta, frequentada por alunos 
desinteressados e desmotivados, oriundos de famílias problemáticas. 
No entanto, a ação dos alunos produziu uma comoção social, pois o 
movimento “Não fechem a minha escola” se distanciava deste 
estereótipo. As escolas foram palcos de atividades culturais e de 
formação geridas e planejadas pelos alunos; uma demanda antiga dos 
estudantes, conquistada apenas durante a ocupação. A música foi um 
- 51 - 
combustível das manifestações; além de clássicos como “Roda Viva”, 
novos hinos foram criados: “Trono do Estudar”, “Ocupar e Resistir” e 
“Mãe, Pai”. 
Além disso, é preciso destacar a posição de liderança tomada 
pelas meninas, que participaram ativamente da organização das 
ocupações, do planejamento das ações coletivas realizadas nas ruas e 
também na divisão das tarefas, tendo em vista que os secundaristas 
atuaram na limpeza, manutenção, segurança e alimentação dentro 
das escolas ocupadas. Esse posicionamento pode ser percebido no 
documentário “Lute Como Uma Menina”9, que relata as ações nas 
ocupações paulistas, e está disponível no site Youtube. 
Tendo em vista os conteúdos e ações desenvolvidas pelos 
estudantes, é possível destacar o conceito de “mídia radical”, de John 
Downing (2002), ou seja, maneiras diferenciadas que os movimentos 
adotam para comunicar sua mensagem. As produções culturais, como 
as músicas citadas anteriormente, são maneira de os movimentos 
comunicarem sua mensagem para além da mídia de massa, dando 
visibilidade às suas demandas. “A mídia radical é baseada na cultura 
popular, que, segundo a definição do autor, é uma expressão autêntica 
das aspirações do público. Manifesta-se nas produções de música e 
 
9 Documentário enaltece a luta das meninas nas ocupações em SP. Disponível em: 
https://catracalivre.com.br/geral/educacao-3/indicacao/documentario-enaltece-
luta-das-meninas-nas-ocupacoes-em-sp. Acesso em 11 de set de 2017. 
https://catracalivre.com.br/geral/educacao-3/indicacao/documentario-enaltece-luta-das-meninas-nas-ocupacoes-em-sp
https://catracalivre.com.br/geral/educacao-3/indicacao/documentario-enaltece-luta-das-meninas-nas-ocupacoes-em-sp
- 52 - 
dança e tem um importante papel na oposição, sendo uma 
contradição às produções de massa” (MEI, 2013, p. 95). 
Downing classifica como mídia radical trabalhos de grafite em 
outdoors, volantes e cartazes, podendo chegar à produção autônoma 
de conteúdo informativo. Ele apresenta o conceito da "chama lenta", 
ou seja, conteúdos que visam um convite efetivo à mudança e que se 
distanciam das abordagens tradicionais da mídia para consumo 
rápido. No entanto, a efetiva tomada de consciência e mudança leva 
tempo, mas as produções “mais rápidas”, como as canções 
apresentadas, chamam a atenção do público para a causa, e seriam 
mais efetivas se este trabalho tivesse continuidade. 
Downing (2002) frisa que a mídia radical é o principal 
sustentáculo da comunicação democrática, permitindo a difusão de 
ideias dos movimentos sociais, pois não há dependência do mercado 
ou de anúncios. Sendo assim, A comunicação democrática traz 
também características de intenção, pois o emissor visa o 
envolvimento efetivo do receptor. 
 
Intenção é a atividade direcionada a um objetivo, 
envolvendo, portanto, a volição. Na comunicação, 
intenção é tentativa consciente do emissor de 
influenciar o receptor através de uma mensagem, 
sendo a resposta do receptor uma relação baseada 
na hipótese das intenções da parte do emissor 
(SANTAELLA, 2001, p. 20). 
 
- 53 - 
No contexto apresentado por Santaella, a comunicação “[...] é 
inevitável, irreversível e irrepetível" (SANTAELLA, 2001, p. 21). Nas 
diversas ocupações, observou-se a experiência de aulas mais 
dinâmicas (rompendo a barreira das quatro paredes das salas), 
debates e eventos culturais aos finais de semana, ideias que surgiram 
nas ocupações e podem se tornar um novo modelo de prática escolar. 
Com estas aulas mais dinâmicas, foi possível perceber que 
temáticas de gênero, que antes não eram abordadas nas escolas, 
passam a fazer parte do cotidiano dos estudantes. O debate sobre 
gênero na escola vem tomando mais corpo no país desde os 
seminários realizados para a construção do Plano Nacional de 
Educação, em 2014. Na ocasião, a Câmara dos Deputados e o Senado 
suprimiram o termo “gênero” da proposta, abolindo então temáticas 
que previam os itens identidade de gênero e orientação sexual nos 
currículos escolares. O documento original, por sua vez, previa que o 
debate fosse aprofundado nas escolas, dentro das disciplinas, a fim de 
garantir direitos como o acesso universal à educação e o combate ao 
preconceito, além de criar medidas inclusivas para a educação no país. 
 
Na escola, o currículo, as disciplinas, as normas 
regimentais, as formas de avaliação, os materiais 
didáticos, a linguagem, constituem-se em 
instâncias que refletem e produzem as 
desigualdades de gênero, de sexo, de raça, etc., e 
podem incentivar o preconceito, a discriminação, o 
sexismo (FURLANI, 2003, p. 69). 
 
- 54 - 
As ocupações dos estudantes se mostraram espaços efetivos 
para que estas temáticas permeassem a escola. Foram diasnos quais 
assuntos como a divisão igual de tarefas, o diálogo e a diversidade 
estavam na escola de maneira prática e efetiva, levando à reflexão 
sobre estas temáticas. 
Houve a participação de pais, mães e responsáveis nos 
movimentos dos estudantes, causando certo afloramento de 
consciência política dentro das escolas, para exigir do poder público a 
educação pública de qualidade. Como se percebe, a participação incita 
a mobilização dos indivíduos, essencial no desenvolvimento da 
cidadania, pois assim a o poder de ação dos cidadãos é ampliado. É 
possível utilizar a classificação de Ilse Scherer-Warren (1996) para as 
redes que, no caso dos estudantes secundaristas, podem ser 
verificadas nas diversas lutas espalhadas pelos Estados, que acabam 
por ter características parecidas, como os “aulões”, a produção de 
mídia radical e as reivindicações, que eram similares. Sendo assim, os 
estudantes tinham o "mesmo inimigo a combater", utilizando a 
definição de Manuel Castells (1998). 
As redes que se constroem possibilitam “[...] o intercâmbio de 
informações e esclarecimentos entre grupos, além da troca de 
experiências que pode ser proveitosa em um determinado local” (MEI, 
2013, p. 96). Para que haja a multiplicação de informações, há "nós" 
ou elos (SCHERER-WARREN, 2006), ou seja, as lideranças, mediadores 
e organizadores que transmitem as informações. A comunicação é 
- 55 - 
determinante para a mobilização e para a união dos estudantes, nas 
trocas de ideias e na divulgação sobre o que acontecia dentro das 
escolas para além dos seus muros. É possível aferir que houve 
conscientização dos estudantes, que se sentem mais empoderados e 
perdem a posição “passiva” diante das medidas tomadas pelos 
governos. 
Nilda Stecanela (2010) aborda as realidades e manifestações 
culturais dos jovens para além do ambiente da escola regular. É no 
cotidiano, portanto, que o aprendizado também acontece. A autora 
analisa a maneira como os jovens “[...] fabricam sua própria vida, 
reinventando seus modos de ser jovem, a partir de sua situação juvenil 
e aprendendo em suas trajetórias não escolares a partir de suas 
experiências cotidianas” (STECANELA, 2010, p. 31). Eles tomam, 
portanto, uma posição política em relação à sua realidade: 
 
A extensão da atividade política, apesar de 
inúmeras vezes formal, e principalmente a 
perspicácia de certos olhares contemporâneos, 
fizeram emergir a compreensão, característica dos 
tempos atuais, de que as relações de poder 
permeiam e perpassam toda a sociabilidade 
(RUBIM, 2000, p. 21). 
 
Nessa perspectiva, é possível destacar que a intenção dos 
estudantes em trazer para debate suas reivindicações e, ao mesmo 
tempo, houve certa mobilização. Segundo a definição de Bernardo 
Toro (1996, p. 5) “[...] mobilizar é convocar vontades para atuar na 
- 56 - 
busca de um propósito comum, sob uma interpretação e um sentido 
também compartilhados”. A mobilização, por sua vez, parte da 
premissa da escolha do indivíduo em querer participar, e que esta 
escolha é feita a partir do aprendizado e da reflexão crítica da 
realidade. “Aprender é uma aventura criadora, algo, por isso mesmo, 
muito mais rico do que meramente repetir a lição dada. Aprender para 
nós é construir, reconstruir, constatar para mudar” (FREIRE, 2014, p. 
68). Nessa perspectiva, a pessoa se vê como responsável e capaz de 
promover transformações com determinadas atitudes e ações. 
 
A formação de uma nova mentalidade na 
sociedade civil, que se perceba a si mesma como 
fonte criadora da ordem social, pressupõe 
compreender que os “males” da sociedade são o 
resultado da ordem social que nós mesmos 
criamos e que, por isso mesmo, podemos modificar 
(TORO, 1996, p. 8). 
 
Os estudantes, quando mais conscientes da sua posição e da 
sua importância na sociedade, agem como atores em sua realidade 
social. É interessante trazer as concepções de Juarez Dayrell sobre as 
juventudes, demonstrando que os jovens vivem realidades diferentes 
em cada localidade, devido às condições sociais e culturais. Segundo o 
autor, os jovens devem ser considerados como sujeitos, ou seja, “[...] 
um ser singular, que tem uma história, que interpreta o mundo e dá-
lhe sentido, assim como dá sentido à posição que ocupa nele, às suas 
relações com os outros, à sua própria história e à sua singularidade” 
- 57 - 
(DAYRELL, 2003, p. 24). Utilizando conceitos de Bernard Charlot, o 
autor destaca que o ser humano está sempre em construção e em 
relação com a sociedade e o meio. No entanto, segundo Freire, a 
tomada de consciência pode acontecer de uma hora para a outra, 
todavia a consciência crítica, não, a qual “[...] somente se dá com um 
processo educativo de conscientização. Este passo exige um trabalho 
de promoção e critização” (FREIRE, 2007, p. 39). 
Jesús Martin-Barbero demonstra que as pessoas recebem 
diversas interferências ao longo de suas vidas do meio em que vivem, 
da mídia e da própria escola. Segundo o autor, as identidades sociais e 
os interesses pessoais dos indivíduos se formam também na família, 
no bairro ou nos locais onde as pessoas habitam ou mesmo interagem. 
Nesta mesma linha, o autor François Dubet coloca que a formação 
atual dos jovens é constituída de diferentes influências, sendo que eles 
recebem interferências da família, do ambiente escolar, e estes 
espaços são heterogêneos. Neste contexto, a escola perde espaço na 
monopolização da cultura, competindo com a cultura de massa e a 
circulação de informações. O estudante, ao receber interferência de 
outras fontes, se torna um pouco mais “autônomo” em relação à sua 
formação. 
Conforme o movimento dos estudantes provocou a 
conscientização dos adolescentes e jovens, também é preciso lembrar 
que os governos estaduais, em especial de São Paulo, passaram a 
endurecer as condutas de perseguição e retaliação a estudantes: 
- 58 - 
 
A polícia foi acusada de carregar listas com fotos e 
nomes de secundaristas e apoiadores do 
movimento. O caso mais simbólico provavelmente 
foi da escola Fernão Dias, na zona oeste de São 
Paulo. A ação daqueles estudantes acabou se 
tornando um marco na luta dos secundaristas, 
depois de a unidade permanecer uma semana 
sitiada pela Polícia Militar. A partir desse evento, as 
ocupações se espalharam em todo estado (MEI, 
SILVA, 2017). 
 
O auge do movimento se deu com a verificação de 213 
ocupações em São Paulo, no dia 4 de dezembro de 2015. Ao mesmo 
tempo, crescia a violência policial contra as ocupações e a aprovação 
do governador Geraldo Alckmin (PSDB) caía para 28%. Diante deste 
cenário, o governo decidiu suspender a reorganização, buscando 
reconstituir a sua imagem, já desgastada com o ápice da crise hídrica. 
O governador foi a público suspender o projeto após 25 dias de 
mobilização, e em seguida, o então secretário estadual da Educação, 
Herman Voorwald, pediu demissão. É importante destacar que o plano 
de reestruturação da Secretaria de Educação Paulista foi oficialmente 
adiado, mas as ações continuaram por baixo dos panos. Em 2016, salas 
de aulas, períodos inteiros e escolas fecharam, e o governo justificou 
as mudanças alegando uma demanda menor de alunos. 
 
 
 
- 59 - 
Pelo Brasil: Desdobramentos das manifestações em outros Estados 
A adesão de muitos Estados e estudantes de diferentes 
contextos ampliou a pauta e confirmou a fragmentação e 
horizontalidade do movimento. Mesmo em São Paulo, as 
reivindicações, a forma das ocupações e os métodos de protesto 
mudavam de escola para escola. Ainda assim, o movimento dos 
estudantes paulistas repercutiu em ações em outras regiões do Brasil. 
No Rio de Janeiro, mais de 70 escolas foram ocupadas, com estudantes 
pedindo melhora na infraestrutura e mais verba para a educação. O 
Ceará teve dez escolas ocupadas em apoio à greve de professores da 
rede estadual. 
Contrários a um novo modelo de gestão proposto pelo governo

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