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Sthefany Vera Reumatologia 1 – Espondilite anquilosante ESPONDILOARTROPATIAS SORONEGATIVAS As espondiloartropatias soronegativas representam um grupo de doenças específicas, que são classificadas em conjunto por terem muitas características em comum, especialmente no que diz respeito ao tipo de lesão patológica básica, às formas clínicas de apresentação e a alguns achados laboratoriais característicos O grupo das espondiloartropatias: 1- Espondilite Anquilosante 2-Artrite Reativa (incluindo a Síndrome de Reiter) 3- Artrite Psoriásica 4- Artropatia Enteropática 5- Espondiloartrite de início na juventude 6- Espondiloartrite indiferenciada Fatores que reúnem as espondiloartropatias em um mesmo grupo: 1- Acometimento de Articulações Axiais 2- Lesão proeminente das Ênteses 3- Associação a determinadas Lesões Sistêmicas 4- Superposição entre suas formas clínicas 5- Tendência à Hereditariedade 6- Ausência do Fator Reumatóide 7- Associação com o HLA-B27 AS ÊNTESES O que são ênteses? Os ossos de uma articulação recebem as inserções de ligamentos, tendões, aponeuroses e cápsulas fibrosas articulares. Definimos como êntese o ponto de junção entre tais estruturas e o tecido ósseo. Dessa forma, as ênteses estão em todos os tipos de articulação. Tipos de articulação: 1- Fibrocartilaginosas (“Sindesmoses”): Discos intervertebrais, sínfise púbica, manúbrioesternal, porção superior da sacroilíaca. 2- Diartrodiais (Sinoviais): Articulações do esqueleto periférico e algumas do esqueleto axial (interapofisárias e porção média e inferior da sacroilíaca). I – ESPONDILITE ANQUILOSANTE (Doença de Marie-Strümpell ou Doença de Bechterew) Definição: “Espôndilo” significa vértebra e “anquilose” significa fusão. Assim, o termo espondilite anquilosante traduz inflamação + fusão vertebral. Entretanto, apesar de característica, a fusão da coluna vertebral surge apenas em estados avançados da doença. Como os principais autores em Reumatologia definem a espondilite anquilosante: “É uma doença inflamatória crônica que acomete basicamente as articulações do esqueleto axial, sendo a lesão da articulação sacroilíaca seu marco fundamental” “Pode ser considerada como o protótipo das condições que causam entesite, e que se caracterizam pelo comprometimento das articulações francamente ligamentares do quadril e da coluna vertebral.” “É uma espondiloartropatia soronegativa (fator reumatóide negativo) que se caracteriza pelo comprometimento progressivo das articulações sacroilíacas e vertebrais, de forma ascendente e com eventual ossificação destas articulações, em um processo denominado anquilose óssea.” “As articulações sacroilíacas são sempre afetadas, e alguns autores costumam usar o termo sacroileíte sintomática como sinônimo de espondilite anquilosante. As articulações periféricas também podem ser afetadas, porém, com menor frequência.” Epidemiologia: A Espondilite Anquilosante (EA) é uma das poucas condições reumatológicas que predominam em homens (3:1), com pico de incidência no início da vida adulta (média = 23 anos). O início após os 40 anos é incomum (5% dos casos). A epidemiologia da EA acompanha a distribuição do HLA-B27 na população, fato que demonstra a importância do fator genético nessa doença. Tal marcador está presente em 90% Sthefany Vera dos pacientes, ao passo que na população geral ele é encontrado em apenas 7% dos indivíduos caucasianos. Entre 1-7% dos portadores do HLA-B27 desenvolve EA, e não parece haver correlação entre sua presença e a gravidade do quadro. No entanto, hoje sabemos que o HLA-B27 responde por cerca de 50% do risco genético da EA, sendo que outros genes – relacionados ou não ao complexo principal de histocompatibilidade – também parecem necessários para a expressão clínica. A taxa de concordância entre gêmeos univitelinos gira em torno de 65% Patogenia: O grupo das espondiloartropatias soronegativas possui uma característica em comum muito importante: a ENTESITE. Trata-se de uma lesão que acomete as ênteses – como vimos: inserções ósseas de ligamentos, tendões, aponeuroses e cápsulas articulares A entesite, ou entesopatia, se caracteriza por uma reação inflamatória crônica com erosão do osso adjacente, seguida por um processo também crônico de reparação tecidual, durante o qual costuma haver neoformação óssea e evolução para anquilose – radiograficamente, a entesopatia se revela pela ossificação das enteses. Fig. 2: Lesão das ênteses na espondilite anquilosante. A - Sacroileíte (lesão mais característica) e B - Formação de um “esporão do calcâneo”. As articulações mais acometidas são aquelas de natureza “ligamentar”, como as do quadril e da coluna vertebral. A articulação mais precocemente (e caracteristicamente) envolvida é a sacroilíaca (FIGURA 2A). Contudo, toda articulação possui componentes ligamentares e, assim, virtualmente, qualquer uma pode ser envolvida por entesite. Além do quadril e da coluna, merecem destaque a entesite da sínfise púbica, do calcâneo (FIGURA 2B), da patela e da articulação manúbrio-esternal. Na coluna, são acometidos inicialmente os discos intervertebrais. A entesite começa na região anterior da vértebra, na inserção do ânulo fibroso do disco. Com o tempo, o osso neoformado (estimulado pela inflamação crônica) se transforma numa protuberância óssea denominada sindesmófito, formando “pontes” entre os corpos vertebrais (FIGURA 3). Após anos de atividade clínica pode surgir a alteração mais clássica da doença: A RÍGIDA COLUNA “EM BAMBU”. Nesse momento, a postura adotada pelo paciente é inconfundível, com cifose exagerada e perda da lordose lombar fisiológica (FIGURA 1). Outras anormalidades que podem ser encontradas na coluna são osteoporose difusa, Sthefany Vera aspecto “quadrado” das vértebras e destruição da interface entre os discos intervertebrais e o osso. A artrite periférica que acompanha a EA se diferencia da Artrite Reumatoide (AR) por não apresentar vilosidades sinoviais exuberantes, ainda que a sinóvia possa ter também um aspecto de hipertrofia e formação de pannus. Erosões cartilaginosas centrais causadas pela proliferação de tecido de granulação subcondral são raras na AR e comuns na EA! Na EA, a artrite periférica predomina em membros inferiores, apresentando mais comumente um padrão assimétrico. O envolvimento da coluna se faz de forma ASCENDENTE, começando pelas articulações sacroilíacas e coluna lombossacra, atingindo posteriormente a coluna torácica e cervical. É importante ressaltar que o envolvimento das articulações interapofisárias (sinoviais) também se faz presente, contribuindo para o processo de espondilite. AGORA A PERGUNTA: de onde vem o estímulo inflamatório da doença? Assim como na artrite reumatoide, ainda não temos uma resposta definitiva! Postula-se que o contato com agentes ambientais (ex.: certos microrganismos) possa deflagrar um descontrole do sistema imunológico em indivíduos geneticamente predispostos. O exato papel do HLA-B27 neste processo ainda não foi esclarecido. ATENÇÃO: Atente para importantes diferenças entre EA e AR: (1) a infecção avançada pelo HIV pode desencadear uma forma grave de espondilite anquilosante (na AR, a depleção de linfócitos T CD4+ associada à SIDA costuma amenizar a artrite); (2) enquanto na AR ocorrem tipicamente erosões do osso articular, na EA ocorre estímulo para neoformação óssea nas áreas afetadas (ex.: sindesmófitos); (3) a histopatologia da sinóvia na EA mostra predomínio de neutrófilos, macrófagos e hipervascularização, enquanto na AR encontramos agregados linfoides, célulasdentríticas e hiperplasia das células de revestimento da sinóvia (linning cells); (4) não se observa aumento da citrulinização proteica no tecido articular de portadores de EA. Manifestações clínicas: Como dissemos, a EA predomina em homens, e na maioria das vezes se inicia no final da adolescência/início da vida adulta. O PRIMEIRO SINTOMA costuma ser a DOR LOMBAR (pela sacroileíte), tipicamente unilateral (pelo menos no início), insidiosa e profunda, acompanhada de rigidez matinal ou após longos períodos de inatividade. Essa rigidez melhora com as atividades físicas, mas retorna tão logo o doente volte a permanecer em repouso. Passados alguns meses, muitos pacientes evoluem com piora da dor, que se torna bilateral e persistente, podendo apresentar exacerbações durante o repouso noturno de modo a obrigar o paciente a se levantar para aliviá-la. Observa-se também uma redução na amplitude de movimento da coluna lombar, especialmente nos planos ânteroposterior e laterolateral. O comprometimento das sacroilíacas pode ser evidenciado por manobras que tensionam essas articulações (FIGURAS 4, 5 e 6). Já a limitação da mobilidade lombar, por sua vez, pode ser avaliada pelo TESTE DE SCHÖBER (ver adiante). Inicialmente, a limitação lombar é devido ao espasmo da musculatura paraespinhal, porém, em fases avançadas, o principal motivo passa a ser a anquilose óssea. Sthefany Vera Outra característica marcante é a presença de hipersensibilidade óssea (refletindo a existência de entesite/osteíte subjacente). Nos locais acometidos pelo processo inflamatório, a digitopressão costuma desencadear dor! Tal fenômeno é mais evidente nas junções costocondrais, apófises espinhosas das vértebras, cristas ilíacas, trocânteres maiores, tuberosidades isquiais e tibiais e nos calcâneos. Artrite em grandes articulações “centrais” (quadril e ombro) é encontrada em 25-35% dos casos. Artrite periférica, geralmente assimétrica, pode ser vista em até 30%. Alguns pacientes, principalmente os mais idosos, podem apresentar um importante componente sistêmico, queixando- se prioritariamente de sintomas constitucionais inespecíficos (ex.: fadiga, anorexia, perda ponderal, febre baixa). RESUMINDO: Os achados iniciais da doença podem ser mínimos e, normalmente, giram em torno da dor lombar e rigidez matinal. Os pacientes, na maioria das vezes, não procuram auxílio médico, e persistem com os sintomas por anos, seja em caráter persistente ou intermitente. Os sintomas iniciais da EA são mais percebidos pela manhã, após períodos de inatividade física ou exposição ao frio, havendo melhora com a atividade física ou, como frequentemente descrito, após um “bom banho quente” O grau de comprometimento axial da EA é variável, indo desde artrite exclusiva da articulação sacroilíaca até anquilose completa da coluna. O ENVOLVIMENTO DAS VÉRTEBRAS SE FAZ DE FORMA ASCENDENTE E PROGRESSIVA. A ossificação das sínfises vertebrais é conhecida como “COLUNA EM BAMBU”. (FIGURA 7) Sthefany Vera O envolvimento da coluna torácica gera dor e cifose progressiva. Comumente se associa à lesão das articulações costovertebrais, costoesternais e manúbrio-esternal, justificando uma redução da expansibilidade torácica (podendo causar uma síndrome respiratória restritiva). Alguns pacientes referem uma dor que se confunde com a angina pectoris ou a síndrome de Tietze (costocondrite idiopática). O envolvimento da coluna cervical, com dor e rigidez, costuma ser tardio, levando anos para aparecer. Alguns pacientes apresentam episódios recorrentes de torcicolo. Outros evoluem com perda quase completa da extensão cervical, ficando muitas vezes impossibilitados de olhar para cima. Muitos pacientes, quando em posição ortostática e com os pés juntos, não mais conseguem encostar o occipto na parede (“teste occipto-parede”). TESTE DE SCHÖBER Com o paciente de pé marca-se a apófise espinhosa da 5ª vértebra lombar e traça-se outra marca horizontal 10 cm acima dela. Solicita-se então que o paciente faça uma flexão da coluna. Em condições normais, as duas marcas devem ficar a mais de 15 cm de distância (aumento de 5 cm ou mais da distância na posição ereta). Aumentos inferiores a 4 cm indicam comprometimento funcional da coluna lombar. A medida da expansibilidade do tórax deve ser feita na altura do quarto espaço intercostal em homens e logo abaixo das mamas em mulheres, sendo a diferença entre a inspiração e expiração máximas. O valor normal é ≥ 5 cm. Prognóstico e Evolução De uma forma geral, cerca de 30% dos pacientes do sexo masculino com EA relatam que os sintomas da doença influem negativamente em suas atividades laborativas. O restante apresenta uma forma branda da espondiloartropatia. O quadro estereotipado da EA representa uma pequena parcela de casos. Exteriorizando-se somente quando a doença está em estágios muito avançados, geralmente após dez anos de atividade. Há uma postura encurvada, com cifose dorsal exagerada, perda da curvatura lordótica normal da coluna lombar e coluna rígida, com o paciente adotando a posição do “esquiador”. A marcha se torna cambaleante e o paciente pode ter dificuldade no seu campo visual anterior. Na maioria dos pacientes, o processo de anquilose (ossificação) evolui com dor, mas uma vez que a anquilose se estabelece, a dor desaparece. Em uma minoria de pacientes, o processo de anquilose Sthefany Vera evolui silenciosamente, sem dor. A sinovite, entretanto, pode levar à dor importante que, certas vezes, pode ser incapacitante. Ainda não se sabe o que determina se um paciente terá apenas doença pélvica discreta, doença vertebral ascendente, doença articular periférica ou mesmo manifestações extra- articulares. A idade por ocasião do início da doença é de primordial importância. Cerca de 15% dos indivíduos que iniciam a doença na adolescência necessitarão de prótese total do quadril dentro de 20 anos, enquanto aqueles com início na terceira década correm um risco menor de terem acometimento do quadril e do pescoço. As complicações mais temidas da EA são as fraturas vertebrais, que podem ocorrer após trauma mínimo, pois os pacientes portadores de EA podem apresentar osteoporose ou osteopenia mesmo em fases iniciais da doença. As fraturas na região cervical são as mais comuns, com potencial para gerar lesão medular Pacientes portadores de EA apresentam menor sobrevida do que a população geral, principalmente devido aos traumas de coluna, insuficiência aórtica, insuficiência respiratória, nefropatia amiloide e complicações inerentes ao tratamento, como a hemorragia digestiva. Manifestações extra-articulares 1- Oftalmológicas: A uveíte anterior aguda é a manifestação extra-articular mais comum da EA, ocorrendo em 30-40% dos indivíduos em algum momento da evolução da doença, principalmente naqueles que têm o HLA-B27. Pode preceder a espondilite. Não existe qualquer relação do quadro ocular com a gravidade da doença. A uveíte é quase sempre unilateral e origina sintomas de dor, lacrimejamento excessivo, fotofobia e turvação da visão. Os episódios costumam ser autolimitados, por vezes recorrentes, mas só eventualmente exigem terapia com corticoides. Em alguns casos, a uveíte pode abrir um quadro de EA, como manifestação única. Outras complicações possíveis são o glaucoma secundário e a catarata. 2- Pulmonar: O comprometimento pulmonar mais comum na EA é caracterizado pelo desenvolvimento insidioso de fibrose pulmonar dos lobos superiores, que geralmente aparece após duas décadas de doença. Os pacientes podem se apresentarcom tosse produtiva crônica e dispneia progressiva. A formação de cistos (fibrose bolhosa) e a subsequente invasão por Aspergillus podem resultar nos micetomas e justificar uma eventual hemoptise. 3- Cardíacas: Até 10% dos pacientes com EA grave desenvolvem insuficiência aórtica, cardiomegalia e distúrbios permanentes de condução. O comprometimento cardíaco pode ser tanto silencioso quanto dominar o quadro clínico. As valvas aórticas encontram-se espessadas e com um certo grau de fibrose. A extensão do processo fibroso para o nódulo AV pode levar ao bloqueio AV completo (BAVT). 4- Renais: Cerca de 1-3% dos casos de EA acabam desenvolvendo amiloidose secundária, que se manifesta principalmente por proteinúria. Outra forma de dano renal que pode ser adquirido no curso desta espondilartropatia é a nefropatia por IgA. 5- Neurológicas: Além dos reconhecidos riscos de deslocamentos e fraturas, especialmente da coluna cervical, os pacientes com EA ainda podem desenvolver uma insidiosa “síndrome da cauda equina”. Os sintomas iniciais incluem perda sensorial nos dermátomos sacrais (“anestesia perineal em sela”), dor e fraqueza dos membros inferiores, com hiporreflexia e flacidez. Também faz parte do quadro a perda do tônus dos esfíncteres retal e urinário. O diagnóstico pode ser confirmado por TC ou RNM. 5- Intestinais: Até 60% dos pacientes pode ser que apresentem inflamação no cólon ou íleo (doença inflamatória intestinal), o que geralmente é assintomático. No entanto, em cerca de 5-10% dos pacientes com EA abrem o quadro florido de doença inflamatória intestinal. Sthefany Vera Diagnóstico Novos critérios de classificação foram desenvolvidos para o diagnóstico de EA! Na realidade, esses novos critérios fazem referência a uma Espondiloartrite Axial, termo que, ao contrário de “Espondilite Anquilosante”, descreve de forma mais acurada a doença em suas fases iniciais (isto é, enquanto ainda não surgiu anquilose óssea – há apenas entesite e artrite). O motivo para a criação de novos critérios de classificação da EA foi o mesmo aventado para a AR: a necessidade de aumentar a sensibilidade de detecção precoce da doença! As novas terapias biológicas (bloqueadores do TNF-alfa) trouxeram grande benefício para alguns doentes, impedindo o surgimento de deformidades esqueléticas irreversíveis. Assim, tornou-se premente identificar os portadores de EA antes que tais deformidades aparecessem, de modo que eles pudessem se beneficiar dos novos medicamentos. Com os critérios antigos, frequentemente isso não era possível, pois os mesmos só identificam a doença em suas fases avançadas! Até 2009, o diagnóstico de EA era baseado nos tradicionais critérios modificados de Nova York. O elemento fundamental desses critérios era a presença de sacroileíte definitiva na radiografia simples de bacia (com esclerose óssea evidente), achado que – hoje sabemos – pode ser considerado tardio. Idealmente, a doença já deveria ter sido diagnosticada e tratada antes do surgimento de sacroileíte definitiva no RX e demais alterações citadas nos referidos critérios. A RNM é muito mais sensível que o RX simples para detectar sacroileíte, pois antes do surgimento de esclerose óssea, a RNM já detecta edema da medula óssea justa-articular (uma alteração que precede a esclerose e a anquilose). No entanto, até 2009 a RNM não fazia parte dos critérios diagnósticos (em 1984, a RNM sequer havia sido incorporada à prática médica). Assim, nos dias de hoje, o diagnóstico de EA deve se basear nos critérios da Sociedade Internacional para a Avaliação das Espondiloartrites (em inglês: ASAS). Diagnóstico diferencial Devemos pensar em outros diagnósticos como outras espondiloartrites, hiperostose difusa esquelética idiopática, a síndrome SAPHO (Sinovite, Acne, Pustulose, Hiperostose e Osteomielite) e estados hiperostóticos como intoxicação pela vitamina A e fluorose. Um paciente em estágio final de EA é facilmente reconhecido devido ao seu quadro bastante característico, entretanto: A confusão com Artrite Reumatoide Em estágios iniciais, quando existe artrite periférica, pode haver confusão com artrite reumatoide. Isso ocorre mais comumente em crianças, fazendo confusão com artrite crônica juvenil. O comprometimento do quadril, das articulações sacroilíacas e da coluna, em associação com episódios de uveíte anterior aguda, indicam o diagnóstico. Diagnóstico diferencial No início dos sintomas, as radiografias não costumam apresentar alterações. Com a evolução da doença, inicia-se um borramento na imagem das articulações sacroilíacas (FIGURA 2A), com esclerose e erosões subcondrais irregulares, Sthefany Vera mais pronunciadas no terço inferior. Apesar de ser classicamente bilateral, a sacroileíte, no início do quadro, pode ser unilateral. A progressão das erosões ósseas pode causar uma imagem conhecida como “pseudo-alargamento” do espaço articular, inicialmente. Com o avançar da doença e a fibrose articular, pode-se observar obliteração articular. A incidência ântero-posterior da pelve não é a mais adequada para flagrar as alterações iniciais da sacroileíte, já que a inclinação anterior normal do quadril impede a visão total das sacroilíacas. A incidência mais apropriada é a de Ferguson (inclinação cefálica de 30°). Nos pontos de inserção tendinosa, como púbis e calcâneo, o esqueleto apresenta erosões, esclerose e neoformações ósseas. As radiografias laterais do calcanhar podem revelar esporões ósseos no local de inserção do tendão calcâneo (FIGURA 2B). O comprometimento vertebral inicia-se na região lombar e se faz de forma ascendente, culminando em ossificação dos ligamentos tendinosos (sindesmófitos – FIGURA 3) de toda a coluna. Quando os pacientes iniciam lesão da coluna lombar, é sinal que já existe sacroileíte bilateral (lembrar que a doença é ascendente). Quando muitos sindesmófitos são vistos bilateralmente em uma radiografia, surge o aspecto típico de “coluna em bambu” – FIGURA 7, caracterizando um estágio avançado (e pouco comum) de doença. Pode ainda ser observado o aspecto “quadrado” dos corpos vertebrais, resultante da osteíte de sua parte anterior com erosão óssea e perda da concavidade anterior das vértebras lombares, além de esclerose subcondral no limite superior da vértebra. A RNM é muito sensível e específica para identificar inflamação intra- articular incipiente. Como já dito, os sindesmófitos da espondilite anquilosante (assim como os das espondilites enteropáticas) têm distribuição bilateral simétrica e uniforme na coluna. Já nas artrites reativas, na síndrome de Reiter e espondilite psoriásica, distribuem-se aleatoriamente. Assim, lembrar sempre: O aspecto em “cera fluida” é dado pelo comprometimento do ligamento espinhal anterior que se encontra calcificado. Tratamento Os objetivos do tratamento da EA são: alívio sintomático, melhora da capacidade funcional, minimizar as manifestações extra-articulares e prevenir as deformidades articulares e suas possíveis complicações. Os pacientes devem ser encorajados a manter uma postura ereta, a dormir em decúbito dorsal em colchão firme e a praticar exercícios físicos regulares de baixo impacto, como a natação. É importante uma abordagem multiprofissional, principalmente com tratamento fisioterápico. Exercícios respiratórios visam a conservação ou aumento da expansibilidade torácica. Para se evitar complicações pulmonares, os pacientes não devem fumar, pois já possuem, em geral, uma expansibilidade torácica reduzida. Os AINE (Anti-Inflamatórios Não Esteroidais) são comprovadamente efetivos no controleda dor e rigidez da doença, devendo ser utilizados como terapia de primeira linha para todos pacientes sintomáticos com EA. Dados recentes apontam que o uso contínuo de AINE pode retardar a progressão radiográfica da doença. Aparentemente não há superioridade de uma classe de AINE sobre outra, porém, alguns autores sugerem iniciar com indometacina (na dose de 75 a 150 mg/dia). Os Coxibs (inibidores seletivos da COX-2) também podem ser utilizados com boa eficácia. Sthefany Vera Analgésicos como paracetamol ou opioides podem ser utilizados em pacientes que não obtêm melhora sintomática com o uso de AINE. Os glicocorticoides sistêmicos (prednisona) não devem ser prescritos; além de não melhorarem os sintomas, ainda podem piorar a osteoporose vertebral e justarticular relacionada à doença. Já os corticoides intra-articulares podem ser usados em alguns casos de artrite periférica ou sacroileíte refratária, mas o resultado geralmente é inferior ao observado em pacientes com AR. No entanto, parece que a injeção intra-articular sacroilíaca de corticoide parece ter bons resultados. A sulfassalazina (na dose de 2-3 g/dia) pode ser utilizada, com discreto benefício, principalmente em pacientes com artrite periférica. Um curso de sulfassalazina pode ser tentado nesses pacientes antes do início do tratamento com agentes biológicos (neutralizadores do TNF-alfa). O metotrexato, apesar de amplamente utilizado, não apresenta evidências consistentes de sua eficácia. A leflunomida, a talidomida e o pamidronato já foram sugeridos como tratamentos alternativos com discreto benefício. O advento dos agentes biológicos neutralizadores do TNF-alfa propiciou o sucesso terapêutico da EA, pois com seu uso demonstrou- se melhora dos sintomas, melhora radiográfica e melhora dos indicadores objetivos e subjetivos (questionários que avaliam a EA) da doença, mesmo em pacientes com doença de longa duração e anquilose vertebral completa. Existem ainda indícios de melhora da densidade mineral óssea durante o tratamento com esses agentes. Os efeitos colaterais do uso dessas medicações são: infecções graves, incluindo a tuberculose disseminada; distúrbios hematológicos, como a pancitopenia; distúrbios dismielinizantes; piora da insuficiência cardíaca congestiva; aparecimento de autoanticorpos para LES, além de sintomas clínicos da doença; reações de hipersensibilidade nos locais de aplicação; e doença hepática grave. O uso de agentes anti-TNF-alfa está indicado para pacientes com doença ativa que não obtiveram resposta ao uso de pelo menos dois AINEs diferentes. Antes do início do tratamento, todos os pacientes devem realizar teste tuberculínico (PPD) e radiografia de tórax. Pacientes com PPD ≥ 5 mm devem receber profilaxia para tuberculose. A resposta da uveíte a esses agentes não é previsível. Condutas cirúrgicas, como a osteotomia em cunha, podem estar indicadas em alguns casos e, para aqueles com artropatia destrutiva do quadril, a artroplastia total (prótese) é mandatória. O resultado a longo prazo costuma ser satisfatório. Sthefany Vera II – OSTEOARTROSE Definição: A Osteoartrose (OA), também chamada de osteoartrite, é uma doença degenerativa das articulações sinoviais (diartroses), caracterizada clinicamente por dor e limitação funcional (“insuficiência articular”), radiologicamente pela presença de osteófitos, redução do espaço articular e esclerose do osso subcondral e, histopatologicamente pela perda da integridade da cartilagem articular – elemento alvo desse processo mórbido. Ao contrário do que se pensava, a osteoartrose não é uma consequência normal do envelhecimento, e sim uma doença que depende da interação de fatores genéticos, biomecânicos e metabólicos. Epidemiologia: É a “campeã” das doenças articulares em termos de frequência na população – é a mais prevalente das reumatopatias. É importante no aspecto econômico por ser a maior causa específica de dias de trabalho perdidos e pelo alto custo de seu tratamento (uso crônico de AINEs e analgésicos). Os estudos epidemiológicos, entretanto, possuem resultados discrepantes, já que alguns se baseiam apenas na definição radiológica, enquanto outros, além disso, exigem a sintomatologia. Pelo aspecto clínico isoladamente, a prevalência na população geral é de 3,5% e 10% nos maiores de 60 anos. Ressalta-se que isso é motivo de confusão na literatura, pois a grande maioria dos indivíduos com critérios radiológicos para OA não apresenta sintomas clínicos! A visualização de osteófitos típicos numa articulação característica já é suficiente para definir a OA, sob o ponto de vista epidemiológico. Baseando-se nesse critério, você se surpreenderá com as estatísticas: Fatores de risco: Para facilitar o entendimento, podemos dizer que existem fatores relacionados ao próprio paciente (idade, sexo, predisposição genética, obesidade, trauma, patologias prévias ortopédicas ou não ortopédicas) ou a sua atividade profissional e/ou esportiva. Idade A idade é o fator de risco mais importante. Como vimos, a partir dos 45 anos a prevalência de OA aumenta em progressão geométrica, sendo bastante incomum antes disso. A explicação mais aceita é que o grau de atividade metabólica da cartilagem articular diminui progressivamente com o passar do tempo. Em jovens, os condrócitos respondem à estimulação mecânica aumentando a síntese de matriz extracelular, e por isso a cartilagem desses indivíduos é naturalmente mais espessa e elástica. No idoso, o turnover da matriz cartilaginosa se encontra reduzido e os condrócitos já não respondem com a mesma eficiência aos estímulos mecânicos, o que justifica uma cartilagem mais fina, com maior propensão ao desgaste e lesão do osso subjacente. Sexo feminino A importância do sexo feminino para o risco de OA há muito é conhecida. Mulheres idosas possuem risco desproporcionalmente aumentado de OA em todas as articulações! Acredita-se que a deficiência de hormônios sexuais após a menopausa seja o principal fator contribuinte. Predisposição genética A predisposição genética parece ser significativa somente em algumas articulações. Por exemplo: cerca de 50% dos casos de OA de quadril são “familiares”, isto é, outros membros da família também são afetados, enquanto na OA dos joelhos o fator genético é menos importante, presente em apenas 30% (alguns estudos não encontraram nenhuma associação genética convincente). Em famílias com muitos membros afetados por OA do quadril, foram identificadas mutações em genes envolvidos com a secreção de matriz Sthefany Vera extracelular pelos condrócitos (ex.: o alelo FRZB, cuja presença reduz a síntese de proteínas da matriz cartilaginosa). Obesidade A obesidade, curiosamente, aumenta o risco de OA das mãos. Acredita-se que o acúmulo de gordura corporal esteja relacionado à maior circulação de algum fator metabólico que predisponha à OA. No caso da OA dos joelhos, a obesidade é o principal fator de risco, basicamente por exercer ação mecânica direta! A carga nesta articulação pode ser estimada multiplicando-se o peso corpóreo por seis (isto é, se o indivíduo pesa 100 kg, a força exercida sobre os joelhos é de 600 kg)! De um modo geral, pacientes obesos têm mais OA que os não obesos, além do que a intensidade dos sintomas tende a ser maior nos primeiros. A perda ponderal melhora o quadro clínico da OA. Desalinhamento anatômico da articulação O desalinhamento anatômico da articulação (ex.: rotura de menisco,ligamento, cápsula, fratura óssea com incongruência das superfícies articulares), por levar a um desequilíbrio de forças mecânicas intra-articulares (com sobrecarga focal sobre a cartilagem), é um importantíssimo fator na gênese da OA. Isso pode ser bem exemplificado na doença de Legg-Perthes (osteonecrose da cabeça femoral na infância), na displasia acetabular e no genu valgum ou genu varum congênitos. Atividades profissionais e esportivas Atividades profissionais e esportivas que sobrecarregam determinadas articulações também aumentam o risco. Assim se explica a maior prevalência de OA em homens em relação às mulheres, quando analisamos as faixas etárias abaixo dos 45 anos. No caso dos joelhos, atividades repetitivas de flexão são as mais incriminadas (agachar, ajoelhar, subir escadas). A rotura de menisco e a meniscectomia são fatores de risco para a OA de joelho em homens de meia-idade. Doenças metabólicas sistêmicas Certas doenças metabólicas sistêmicas, como a ocronose e a hemocromatose (deposição nas cartilagens de ácido homogentísico e ferro, respectivamente) também favorecem o surgimento de OA por interferirem no turnover da matriz cartilaginosa. Osteoporose e Tabagismo Agora, a osteoporose e o tabagismo apresentam correlação negativa com a OA, como se fossem “fatores protetores”!!! O mecanismo fisiológico dessa associação “benéfica” ainda não foi esclarecido. Patologia: O que encontramos na articulação acometida pela OA? Alterações da Cartilagem: a osteoartrose é uma doença caracterizada pela perda progressiva da cartilagem articular. Alterações típicas podem ser facilmente percebidas através de artroscopia ou analisando-se o corte longitudinal de uma peça anatômica. Nas fases iniciais, percebe-se uma irregularidade da superfície cartilaginosa, que chamamos de fibrilação. Com o avanço do processo, surgem fendas e erosões na cartilagem articular, tipicamente com distribuição focal (áreas com sobrecarga de peso); elas evoluem para o desnudamento do osso subcondral, que aparece como uma superfície branca e polida, semelhante ao marfim (eburnação). Ao corte da peça anatômica, observa-se redução da espessura da camada cartilaginosa, que pode desaparecer por completo em certos locais. Sthefany Vera A cartilagem possui alterações em sua composição, tornando-se mais hidratada e com menor quantidade de proteoglicanas (condromalácia). Na sua porção mais superficial há perda de condrócitos, enquanto na zona mais profunda, adjacente ao osso, existem focos de regeneração celular. Alterações do Osso Subcondral: a injúria microtraumática permanente ao osso subcondral estimula os osteoblastos a sintetizarem matriz óssea, justificando o achado da esclerose óssea. Algumas regiões do osso desnudo, por absorverem as altas pressões do espaço articular, sofrem necrose provocando a formação de cistos subcondrais. Os OSTEÓFITOS já podem ser formados desde as fases iniciais da OA, pelo processo de regeneração cartilaginosa, que se encontra acentuado na doença, porém, predominando em regiões não expostas a altas pressões (bordos das cartilagens). Com a invasão da cartilagem neoformada por vasos sanguíneos, ocorre ossificação secundária. Assim, os osteófitos são prolongamentos osteocartilaginosos encontrados nas margens da articulação acometida, e são achados característicos da OA. Sinovite: o termo “osteoartrite” pode ser utilizado no lugar de “osteoartrose” justamente pela existência de sinovite em casos avançados. Contudo, a inflamação da sinóvia na OA não é tão acentuada como nas artrites inflamatórias (artrite reumatoide, espondiloartropatias, colagenoses, artrite por depósito de cristais, artrite infecciosa etc.). Acredita-se que seja decorrente à liberação de múltiplos fragmentos ósseos e cartilaginosos que se desprendem de uma superfície articular altamente degenerada. Esses fragmentos eventualmente são visualizados na artroscopia. Casos avançados também se acompanham por formação de cristais microscópicos de fosfato e pirofosfato de cálcio dentro do líquido sinovial. Acredita-se que tais cristais, por induzirem a liberação de enzimas proteolíticas e citocinas, participem no processo inflamatório crônico que acompanha a OA “terminal”. Patogênese: Classificamos a osteoartrose como primária ou idiopática (de causa desconhecida) – que possui alguns padrões articulares clássicos (ver adiante) e representa o grupo mais frequente – e secundária, causada por trauma, malformações anatômicas, doenças congênitas (ex.: Legg- Perthes), osteonecrose, endocrinopatias (hipotireoidismo, acromegalia) e distúrbios metabólicos (ex.: hemocromatose, doença de Wilson, ocronose). Os condrócitos, apesar de viverem em um tecido avascular (a cartilagem), são células ativas, que numa situação normal possuem metabolismo extremamente lento. Eles são os responsáveis pela síntese da matriz cartilaginosa, composta por fibras de colágeno tipo II, ácido hialurônico e proteoglicanas. Os próprios condrócitos também produzem enzimas capazes de degradar as macromoléculas dessa matriz – as metaloproteinases. Três são as principais: colagenase, gelatinase e estromelisina. Fisiologicamente, o balanço entre síntese e degradação da matriz cartilaginosa é mantido na medida em que a atividade dessas proteinases é regulada por inibidores fisiológicos locais, tais como o TIMP (Inibidor Tecidual de Metaloproteinases). Na osteoartrose, por sua vez, o balanço é NEGATIVO: a degradação é maior do que a síntese. Além disso, na tentativa de reparar o dano, os condrócitos sintetizam macromoléculas diferentes (ex.: colágeno tipo X), inadequadas para a composição do tecido cartilaginoso normal. Uma série de citocinas produzidas pelas células da sinóvia contribui para esse desequilíbrio, especialmente interleucina-1 e TNF-alfa (mediadores pró-inflamatórios), capazes de inibir a síntese de proteoglicanas e estimular a ação das metaloproteinases. Hoje em dia sabemos, por exemplo, que o estresse biomecânico pode tornar os condrócitos mais sensíveis à ação do TNF-alfa e da IL-1. Sthefany Vera Contudo, a patogênese da osteoartrose ainda não foi totalmente elucidada. Manifestações clínicas: Como vimos, a maioria dos pacientes com sinais radiológicos de OA não apresenta sintomas. O motivo é que as fases iniciais da doença (onde se encontra um grande número desses indivíduos) são caracterizadas por lesão restrita à cartilagem articular, um tecido insensível à dor. Ademais, a intensidade dos sintomas não possui relação direta com o grau de OA na radiografia!!! As articulações mais acometidas pela OA são: a primeira metatarsofalangeana (“hálux valgo”), as interapofisárias (coluna vertebral), Interfalangeanas Distais (IFD) e Proximais (IFP), carpometacarpiana do primeiro quirodáctilo (polegar), os joelhos e o quadril. Outras articulações também podem ser envolvidas, como os cotovelos. Curiosamente, as Metacarpofalangeanas (MCP) não são tipicamente afetadas (ao contrário da artrite reumatoide), assim como a articulação do tornozelo (exceto em formas secundárias de OA – por exemplo: pós- trauma). A OA geralmente costuma respeitar determinados padrões de acometimento articular. Os principais estão na próxima Tabela, relacionados ao tipo mais comum de indivíduo no qual a doença se manifesta. O principal sintoma da OA é a DOR ARTICULAR, precipitada ou piorada pelo uso da articulação. A dor começa segundos ou minutos após o início do movimento, podendo permanecer por horas após o repouso. Tem um caráter tipo “aperto” ou “constricção”. Eventualmente é desencadeada pelo próprio pesodo corpo sobre a junta. Com o tempo, até cerca de 50% dos pacientes passam a referir dor em repouso e 30% apresentam dor noturna que pode dificultar o sono. Mas de onde vem a dor da OA??? Seu mecanismo depende de vários fatores, tais como: (1) instabilidade articular, levando ao estiramento de ligamentos e da cápsula articular, ambas estruturas muito sensíveis à dor; (2) pressão intraóssea elevada, principalmente na placa subcondral, secundária à inflamação (vista na RNM como edema de medula óssea); (3) sinovite; (4) dor muscular; (5) síndromes periarticulares secundárias – bursite, tenossinovite. Além da dor, o paciente pode se queixar de rigidez articular desencadeada pelo repouso. Ao contrário da rigidez matinal típica das artrites inflamatórias (que persistem > 1h), a rigidez matinal da OA não dura mais do que 30min (geralmente apenas alguns minutos). Queixas de “insegurança” e instabilidade articular também são frequentes (ex.: joelho). Muitos pacientes passam a, literalmente, ter medo de deambular! Outros referem perda da amplitude de movimento da articulação acometida, sendo impedidos de realizar determinadas tarefas (ex.: amarrar o sapato, no caso da OA de quadril). Em fases avançadas, pode haver limitação funcional grave e incapacitante, sendo necessário o tratamento cirúrgico. A fraqueza e atrofia dos músculos periarticulares são achados comuns, explicados pelo desuso da articulação. Essa fraqueza contribui para a dor da OA, por aumentar a instabilidade articular, forçando os ligamentos e tendões. Sthefany Vera O EXAME FÍSICO do paciente revela dados sugestivos. A articulação acometida (ex.: joelho) tipicamente apresenta um ligeiro aumento de volume, de consistência firme, com pontos dolorosos periarticulares. Normalmente, não há sinais de derrame articular. A movimentação passiva pode ser dolorosa e apresentar crepitações audíveis ou palpáveis. Nos casos mais avançados, é comum a presença de deformidade articular. Também ocorre limitação do movimento passivo independente da dor. Sinais francos de instabilidade articular podem ser observados. Eventualmente, o paciente possui evidências de sinovite leve a moderada, com muita dor à movimentação, edema, aumento da temperatura e discreto derrame articular. Denominamos esses casos “OA inflamatória”, cuja abordagem terapêutica será um pouco diferente. É importante afastar outras causas de artrite que podem ocorrer em pacientes com OA, especialmente a pseudogota (depósitos de cristais de pirofosfato de cálcio) e a artrite séptica. Na dúvida, uma artrocentese deverá ser realizada! O conceito de que a AO é invariavelmente progressiva é incorreto. Em vários pacientes, ocorre estabilização da doença. Alguns pacientes experimentam regressão da dor articular e até mesmo das alterações radiográficas!!! Dois importantes sinais podem ser facilmente percebidos no paciente com OA das mãos: Os NÓDULOS DE HEBERDEN (figura 2) consistem numa expansão firme de osso recoberto de cartilagem, que se torna proeminente sobre o dorso das articulações interfalangeanas distais; os NÓDULOS DE BOUCHARD (figura 2) são aumentos semelhantes aos de Heberden, porém localizados sobre as articulações interfalangeanas proximais. Esses nódulos são, na verdade, osteófitos palpáveis, quase patognomônicos de OA (especialmente os de Heberden). Diagnóstico e achados radiológicos: O diagnóstico da OA é feito através da história, exame clínico e exame radiológico. Agora vamos rever os principais achados da OA na radiografia. Os critérios estão listados na Tabela a seguir. Sthefany Vera O encontro de alguns desses achados associados a um quadro clínico compatível sugere fortemente o diagnóstico da OA! Como veremos adiante, com base nos critérios diagnósticos, somente na OA de mãos a radiologia não tem valor diagnóstico. A gravidade da OA também pode ser estimada pelos sinais radiológicos. Uma redução muito acentuada ou perda do espaço articular e a presença de cistos subcondrais (decorrentes de necrose focal do osso) são sinais de OA grave. O colapso do osso subcondral é um evento terminal. Outros exames de imagem podem auxiliar na avaliação do paciente com OA. A tomografia computadorizada é superior à radiografia convencional na avaliação da articulação do ombro. A ressonância nuclear magnética é o exame de escolha para o diagnóstico de várias condições associadas à OA: rotura de menisco, rotura do ligamento cruzado, osteonecrose, lesão do manguito rotador do ombro etc. Este exame também pode nos fornecer dados sobre a composição da cartilagem articular. Exame do líquido sinovial: o derrame articular da OA é do tipo não inflamatório, com menos de 2.000 leucócitos por mm3 , predominando as células mononucleares, com glicose normal. Exame de sangue: as provas de atividade inflamatória (hemograma, VHS, proteína C reativa) estão caracteristicamente normais na OA, bem como o FAN e o fator reumatoide. Em idosos, podemos encontrar FR positivo em baixos títulos, mas tal achado se correlaciona com a idade avançada do paciente, e não à presença de um processo inflamatório autoimune. Peculiaridades das articulações acometidas Mãos: É a forma mais comum de OA primária ou idiopática, sendo bem mais frequente no sexo feminino, comprometendo inicialmente as mulheres de meia-idade. Possui nítida predisposição familiar. Sthefany Vera Está associada à obesidade e à OA de joelhos. Os nódulos de Heberden (IFD) são característicos. Os nódulos de Bouchard (IFP) são menos comuns. A presença dos nódulos faz com que essa forma de apresentação seja também conhecida como OA NODAL. A OA de mãos pode se apresentar de forma insidiosa com dor e rigidez nas mãos, ou como um quadro articular agudo e recorrente, com sinais de sinovite. Eventualmente, podemos encontrar pequenos cistos gelatinosos, contendo ácido hialurônico, no dorso dos dígitos, especialmente na inserção do tendão do extensor dos dedos na base da falange distal. O prognóstico desse tipo de OA costuma ser bom. Existe, contudo, um subtipo de OA nodal que cursa com acometimento articular mais agressivo, em que há maior destruição da cartilagem e do osso subcondral, sendo comum o achado radiológico de cistos e erosões ósseas. A deformidade e o comprometimento funcional podem ser graves. A sinóvia é mais extensamente infiltrada por mononucleares. Esse subtipo é conhecido como OA NODAL EROSIVA. A OA da articulação carpometacarpiana do polegar, também conhecida como RIZARTROSE, pode ocorrer de forma isolada ou em associação com a OA das interfalangeanas. Quando isolada, é mais comum em homens e não possui relação com a obesidade, nem com a predisposição genética. O paciente apresenta dor ao movimento de pinçar e pode desenvolver uma deformidade quadrangular na base do polegar. Em 1990, o American College of Rheumatology se reuniu para desenvolver CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS CLÍNICOS para a OA de mãos. O diagnóstico é dado pela presença da dor ou rigidez nas mãos (critério obrigatório) associada a, pelo menos, três dos critério: - Aumento do volume, com consistência firme, de pelo menos duas entre dez articulações selecionadas (ver abaixo*) / - Aumento do volume, com consistência firme, de pelo menos duas articulações interfalangianas distais / - Menos de três articulações metacarpofalangianas aumentadas / - Deformidade em pelo menos uma das dez articulações selecionadas. *As dez articulações selecionadas (cinco de cada lado) são: 2a e 3a interfalangianas distais, 2a e 3a interfalangianas proximais, carpometacarpianasdos polegares. Joelho: A OA de joelho pode ser uni ou bilateral e é mais comum no sexo feminino. É a forma mais relacionada à obesidade. Algumas atividades profissionais e esportivas podem predispor a esse tipo de OA, bem como fraturas, roturas de menisco ou ligamento cruzado ou desalinhamentos congênitos (genu varum, genu valgum). A OA de joelho pode acometer toda articulação ou, mais comumente, apenas um compartimento dela. O compartimento medial é o mais acometido (75% dos casos), seguido pelo patelofemoral (50%) e pelo lateral (25%). Existem duas categorias estereotipadas de pacientes que apresentam OA de joelho: (1) mulheres de meia-idade ou idosas, que apresentam OA primária, frequentemente relacionada à obesidade e ao comprometimento das mãos; (2) homens de meia-idade, com OA secundária à lesão de menisco ou meniscectomia. O paciente se queixa de dor à deambulação, dificuldade em subir escadas e rigidez articular matinal. O acometimento do compartimento medial pode levar à deformidade tipo genu varum (“pernas arqueadas”) – ver figura 6. Mais raramente, o acometimento do compartimento lateral pode induzir genu valgum. Sthefany Vera Para o DIAGNÓSTICO CLÍNICO da OA de joelho, segundo o American College of Rheumatology, o paciente deve apresentar dor no joelho (critério obrigatório) associada a, pelo menos, três dos critérios abaixo: - Idade maior que 50 anos. - Rigidez matinal durando menos de 30min. - Crepitação. - Aumento articular de consistência firme. - Dor à palpação. - Ausência de aumento da temperatura. Mais recentemente, o American College of Rheumatology apresentou CRITÉRIOS CLÍNICO-RADIOLÓGICO- LABORATORIAIS para o diagnóstico de OA dos joelhos, que muito aumentaram a especificidade do diagnóstico (a sensibilidade dos critérios exclusivamente clínicos é discretamente maior): Dor no joelho (critério obrigatório) + Osteófitos no Raio X OU Rigidez matinal < 30 minutos, mais... Crepitação com movimentação ativa, mais... Idade > 40 anos ou Líquido sinovial típico de OA. O curso da doença geralmente é insidioso, com longos períodos de estabilidade e episódios de agudização (sinovite). Um ponto de extrema importância é a fraqueza associada do quadríceps. Exercícios diários de extensão da perna contribuem para a melhora da dor nesses pacientes, contanto que não sejam indicados durante o quadro de sinovite. Em alguns pacientes, a evolução é grave, levando a um quadro de dor intratável ou ao colapso ósseo, necessitando nesse momento de cirurgia de correção (artroplastia de joelho). Quadril: Alguns autores citam que a OA de quadril é mais comum no sexo masculino, e outros dizem que não há diferença entre os sexos. A literatura não confirma uma relação com a obesidade, porém, mostra associação negativa com a osteoporose. Na maioria das vezes, o comprometimento é unilateral. Existem três tipos anatômicos de OA de quadril – (1) superolateral (60% dos casos), mais comum no sexo masculino; (2) inferomedial (25%), mais comum no sexo feminino; e (3) concêntrico (15%), mais comum no sexo feminino. Cerca de 20% dos casos de OA de quadril são secundários a patologias previamente reconhecidas (displasia acetabular, doença de Legg- -Perthes, deslocamento congênito do quadril, diferença de comprimento entre os membros inferiores). O restante compõe o grupo da OA de quadril “primária”. Todavia, atualmente se acredita que grande parte dos casos de OA de quadril primária seja, na verdade, decorrente de defeitos congênitos mais sutis, como uma displasia acetabular não identificada na infância, que por conta da incongruência entre as superfícies articulares leva a um desgaste acelerado da cartilagem, manifestando-se como OA na vida adulta. Seja como for o principal sintoma é a dor à deambulação, referida na nádega, na virilha, na coxa ou até mesmo no joelho (25% dos casos). A dor normalmente piora com a rotação interna da coxa. A rigidez articular acaba por dificultar tarefas do cotidiano, como amarrar os sapatos. Para o DIAGNÓSTICO, pelo American College of Rheumatology, o paciente deve apresentar dor no quadril (critério obrigatório) associada a, pelo menos, dois dos critérios abaixo: - VHS < 20 mm/h - Osteófitos no RX (acetabular ou femoral) - Redução do espaço articular no RX Coluna vertebral: Espondilose é o termo utilizado para definir a doença degenerativa da coluna vertebral, que possui, na verdade, dois componentes: (1) degeneração do disco intervertebral; e (2) osteoartrose das articulações interapofisárias (facetárias). Pela estreita relação biomecânica entre o disco intervertebral e as articulações apofisárias, tais patologias aparecem em conjunto, na mesma localização, tendo preferência pela coluna cervical, geralmente em torno de C5 (espondilose cervical), e pela coluna lombar, geralmente em torno de L3, L4 e L5 (espondilose lombar). Esses Sthefany Vera são justamente os segmentos lordóticos da coluna vertebral (o primeiro de maior mobilidade e o segundo de maior sustentação de peso). Do ponto de vista patológico e radiológico, a espondilose, em sua forma completa, reúne as seguintes alterações: redução do espaço discal, osteófitos nas bordas do corpo vertebral e os sinais clássicos da OA nas articulações apofisárias (redução ou perda do espaço articular, esclerose subcondral e osteofitose). Observe a figura 7. Curiosamente, os sintomas álgicos (cervicalgia, lombalgia) não possuem relação importante com os sinais radiológicos de espondilose. Devemos ressaltar que grande parte dos indivíduos acima de 45 anos de idade possui algum sinal de espondilose degenerativa no exame radiológico, embora a maioria não refira sintoma algum. Por isso, só poderemos atribuir os sintomas álgicos à espondilose se afastarmos primeiro outras causas de cervicalgia ou lombalgia. A dor da espondilose provavelmente se origina da tensão de estruturas ligamentares, musculares, no ânulo fibroso discal e na própria articulação apofisária. É uma dor que piora com o movimento da coluna, sendo maior ao acordar e no final do dia (após a atividade física). A dor da OA apofisária piora com a extensão da coluna, enquanto que a dor da doença discal costuma piorar com a flexão da coluna. A dor cervical pode irradiar para o ombro, e a dor lombar pode irradiar para as nádegas e coxa. Tanto a cervicalgia quanto a lombalgia atribuídas à espondilose são mais frequentes na faixa etária entre 45-65 anos! Após a terceira idade, a rigidez ou a imobilidade articular “protegem” o paciente da dor (pelo estiramento articular), apesar da evolução dos sinais radiológicos. Algumas complicações bem documentadas da espondilose são: 1- Compressão radicular: os osteófitos facetários podem reduzir o forame intervertebral, comprimindo as raízes nervosas, provocando cervicobraquialgia ou lombociatalgia. 2- Mielopatia Espondilótica Cervical: a espondilose grave é uma das principais causas descritas de mielopatia cervical. O aumento progressivo dos osteófitos vertebrais e a hipertrofia do ligamento flavo podem levar à compressão, tanto das raízes cervicais como da própria medula cervical. O acometimento radicular pode levar à cervicobraquialgia, à perda da sensibilidade e amiotrofia nos membros superiores. A mielopatia espondilótica cursa insidiosamente com paraparesia espástica, marcha atáxica, etc. A doença deve ser reconhecida pela ressonância nuclear magnética e tratada com uma cirurgia de descompressão do canal medular. 3- Compressão da artéria vertebral: a artéria vertebral passa através dos forames transversos de C6 a C1. A espondilose cervical, ao reduziro espaço desses forames, pode comprimir a artéria vertebral durante a rotação da cabeça, provocando insuficiência vertebrobasilar (vertigem, diplopia, paraparesia). 4- Estenose do canal vertebral lombar: a redução do canal vertebral por osteófitos apofisários pode levar a uma dor claudicante (desencadeada pela deambulação) na região lombar, que irradia para as nádegas e membros Sthefany Vera inferiores e alivia caracteristicamente com a flexão da coluna. Esta dor faz diagnóstico diferencial com a claudicação intermitente da síndrome de Leriche (aterosclerose da bifurcação aórtica). 5- Espondilolistese: deslizamento de um corpo vertebral sobre o outro, geralmente entre L4 e L5 ou entre L5 e S1, produzindo lombalgia. Tratamento: Como – até o momento – não é possível intervir no processo fisiopatológico básico da OA (impedindo a degeneração ou aumentando a síntese de cartilagem), o tratamento é basicamente sintomático, visando aliviar a dor e a melhorar a função articular. A terapêutica da OA pode ser dividida em não farmacológica, farmacológica e cirúrgica. 1. Medidas NÃO Farmacológicas Nos casos de OA com sintomatologia leve a moderada, a terapia não farmacológica deve ser a única medida prescrita! São estratégias que visam uma diminuição na sobrecarga articular através da redução ponderal, uso de bengalas, andadores e a utilização de calçados acolchoados ou palmilhas especializadas, geralmente prescritas por ortopedistas. Na OA de joelho, o uso de fitas adesivas ou joelheiras fenestradas para realinhamento da articulação pode diminuir a velocidade de evolução da doença. A perda de peso, mesmo de poucos quilos, tem um impacto extremamente favorável em retardar o aparecimento da dor e melhorar a já existente. Os exercícios físicos devem ser prescritos no intuito de melhorar o condicionamento físico, reforçar a musculatura periarticular e ampliar a mobilidade da articulação acometida. O mais consagrado é a extensão de pernas (utilizando caneleiras), para fortalecer o quadríceps, elemento fundamental na terapia da OA de joelho. Recomendam-se também atividades aeróbicas como: natação, hidroginástica e caminhadas. A fisioterapia motora tem papel crucial. A aplicação de frio ou calor local pode elevar o limiar de dor e reduzir a espasticidade muscular. Períodos de repouso programado ao longo do dia também são fundamentais. Para alívio da dor, pode-se lançar mão da Estimulação Nervosa Elétrica Transcutânea (TENS) e da acupuntura, com resultados variados entre os pacientes. 2. Medidas Farmacológicas Atualmente, as Medidas Farmacológicas na OA visam exclusivamente o controle dos sintomas (especialmente a dor), já que não atuam no processo patológico básico e não retardam a progressão da doença. Estão indicadas na OA com sintomatologia grave, ou nos casos refratários à terapia não farmacológica. Analgésicos (paracetamol) O paracetamol ou acetaminofeno (tylenol) é a droga de escolha para o controle da dor na OA sem sinais inflamatórios, sendo a primeira droga a ser prescrita na grande maioria dos pacientes com OA. Deve ser prescrito na dose de 1 g VO 6/6h. Parece que seu efeito analgésico é equiparável ao dos AINEs, com a vantagem de ter menos efeitos adversos. A analgesia é mantida por tempo limitado, já que a doença tende a evoluir com períodos de estabilidade (especialmente quando as medidas não farmacológicas são bem- sucedidas). Analgésicos opioides, como o tramadol e a codeína, têm seu espaço no tratamento da dor na osteoartrose. Seu uso é reservado aos pacientes com dor intensa, refratária à analgesia com analgésicos comuns e AINE. O creme de capsaicina a 0,025% traz algum alívio, pois depleta as terminações nervosas de substância P, um neuropeptídeo mediador da dor. Essa medicação tópica é encontrada em farmácias de manipulação a um preço mais acessível. Anti-Inflamatórios Não Esteroidais (AINEs) Os AINEs estão indicados nos casos de dor refratária ao paracetamol ou nos casos de OA inflamatória (edema articular, dor noturna, Sthefany Vera rigidez matinal por mais de 30min). Nos pacientes sem história de doença péptica, recomendase iniciar com ibuprofeno (800 mg 8/8h), naproxeno (500 mg 12/12h) ou diclofenaco (75 mg 12/12h). Nos pacientes com intolerância gastrointestinal, a escolha é para os AINEs seletivos para a COX-2 (celecoxib). Os inibidores seletivos COX-2 apresentam eficácia semelhante aos AINEs não seletivos, e estão associados a uma menor toxidade gastroduodenal. Todavia, atualmente se sabe que eles aumentam o risco de eventos adversos cardiovasculares e, por isso, alguns desses fármacos já até foram retirados do mercado (rofecoxib e valdecoxib). Uma alternativa aos inibidores COX-2 é usar inibidores não seletivos com drogas gastroprotetoras (misoprostol, famotidina ou omeprazol). A prescrição é por tempo limitado, pois longos períodos aumentam sobremaneira o risco de efeitos adversos. Os AINEs estão também indicados para tratar complicações locais da OA, como a bursite pré- patelar, bursite anserina e a artrite da pseudogota. Corticoides Intra-Articulares Podem ser utilizados nos casos refratários de dor monoarticular, trazendo alívio por 4-6 semanas. Têm como efeito teórico indesejável a diminuição da capacidade de regeneração da cartilagem articular. Por isso, as injeções de esteroides de depósito devem ter no mínimo periodicidade trimestral (no máximo, quatro aplicações por ano). A OA que melhor responde à injeção intra- - articular de corticoide é a carpometacarpiana do polegar. O corticoide não deve ser injetado nas interfalangeanas, pois estimula a precipitação de cristais de apatita e calcificação articular. 3. Medida Cirúrgica Em casos refratários de OA de joelho ou ombro, a lavagem articular com soro fisiológico e consequente remoção de debris pode trazer alívio sintomático por alguns meses. Entretanto, um estudo randomizado sugeriu que o benefício se deve, em grande parte, ao efeito placebo. A remoção de fragmentos de cartilagem por artroscopia pode prevenir a rigidez articular e eliminar a dor, especialmente em pacientes com predominância de sintomas mecânicos. A artroplastia total da articulação, com colocação de uma prótese articular, é reservada para pacientes com osteoartrose grave que possuem, apesar da terapêutica otimizada, dor refratária e incapacidade funcional. A cirurgia tem sido bastante eficaz, sobretudo, nas lesões de joelho e quadril. Podemos dizer que foi a medida terapêutica que mais modificou a história natural de pacientes com OA grave!!! Sthefany Vera LOMBALGIA Definimos dor lombar como a dor que ocorre no território das vértebras lombares, podendo se estender aos membros. Na literatura anglo-saxã, é mais bem definida com o termo “low back pain” e se refere ao território entre a borda inferior das costelas e a dobra glútea. Essa definição, mais ampla, permite também englobar as patologias dos rotadores de coxa e estabilizadores de pelve, bem como a sacroileíte, como causa de dor lombar baixa. Definimos dor lombar como a dor que ocorre no território das vértebras lombares, podendo se estender aos membros. Na literatura anglo-saxã, é mais bem definida com o termo “low back pain” e se refere ao território entre a borda inferior das costelas e a dobra glútea. Essa definição, mais ampla, permite também englobar as patologias dos rotadores de coxa e estabilizadores de pelve, bem como a sacroileíte, como causa de dor lombar baixa. Chamamos delombalgia primária (ou mais comumente mecânica, idiopática ou inespecífica) aquela que decorre presumivelmente da interação entre músculos, discos, ossos, tendões, fáscias e ligamentos de maneira inadequada e disfuncional (causando, portanto, dor), sem, no entanto, haver substrato macroscópico e anatômico bem definido para a sintomatologia. Isso não quer dizer que um paciente com lombalgia mecânica não possa ter achados degenerativos na sua anatomia, apenas entende-se que os achados não explicam a sintomatologia. Quando uma dor lombar é atribuída a um achado específico (como uma herniação, por exemplo), diz-se que é uma dor lombar secundária. Com relação à temporalidade, de maneira geral, entende-se como aguda uma dor que dura menos de 4 a 6 semanas; subaguda até 12 semanas; e crônicas as dores com mais de 12 semanas. A dor lombar constitui uma causa frequente de morbidade e incapacidade, sendo sobrepujada apenas pela cefaleia na escala dos distúrbios dolorosos que afetam o homem. Cerca de 84% dos adultos apresentarão algum episódio de lombalgia durante a vida, mas a grande maioria será autolimitada (Cassidy; Carroll; Côté, 1998). A dor lombar possui forte componente laboral, sendo a maior causa de afastamento e invalidez no nosso país (Meziat Filho; Silva, 2011). É importante conhecer o histórico trabalhista do paciente e ter em mente que muitas das queixas poderão ser eventualmente amplificadas pelo cenário social e laboral. Exame físico O exame físico é talvez a ferramenta mais importante na avaliação do paciente com lombalgia. Evidentemente, na história, emergirão possíveis responsáveis, mas é no exame físico que a maioria dos clínicos tem dificuldade, ou por falta de conhecimento ou por falta de tempo. Deve-se ter em mente, portanto, que não existe atendimento rápido de paciente com lombalgia. O exame físico invariavelmente será longo e, por vezes, permeado por necessidade de manobras distratoras ou confirmatórias, pois alguns achados são amplificados ou falseados por litígio trabalhista (por exemplo, fraqueza ou sinais de irritação radicular) Na inspeção estática, a primeira etapa inclui a busca por deformidades ou assimetrias, além de sinais cutâneos de doença. Alguns pacientes se queixarão de dor lombar, por exemplo, e terão alterações cutâneas sugestivas de infecção por herpes-zóster. A inspeção dinâmica presta-se especialmente para a amplitude. O paciente deve ser orientado a fletir, estender, rodar e fletir lateralmente a coluna. Devem ser registradas eventuais dores e limitações. Pacientes com artrose de corpo vertebral ou disco costumam ter mais dor à flexão ao passo que pacientes com acometimento de facetas e apófises em extensão têm mais dor em extensão. É possível que sintomas de estenose de canal se exacerbem com a extensão da coluna. A palpação deve ser voltada especialmente aos corpos vertebrais, pois fraturas tendem a apresentar dor intensa e pontual. Ademais, é possível, na palpação, encontrar bandas tensas Sthefany Vera com eventual ponto gatilho, simbolizando síndrome miofascial. A síndrome miofascial é uma desordem muscular devida à contratura patológica e sustentada de uma banda muscular com restrição passiva ao alongamento. O achado no exame físico de banda tensa com ponto específico (ponto gatilho) com amplificação da dor, reprodução dos sintomas relatados e sintomas satélites, como parestesia, irradiação ou choque, confirma o diagnóstico. O tratamento é feito com reversão física do ponto gatilho (com agulhamento ou técnicas manuais de soltura). O exame neurológico é uma parte muito importante do exame do paciente com dor lombar com suspeita de radiculopatia, mielopatia ou estenose de canal. O exame precisa ter achados positivos em pacientes com radiculopatia ou mielopatia, praticamente anulando a chance dessas etiologias quando está normal. No caso da estenose de canal, frequentemente é positivo também, mas, pela sua intermitência, pode ser normal. O exame consiste em análise da sensibilidade superficial, sensibilidade profunda, motricidade e pela realização das manobras irritativas. A maior parte das radiculopatias por compressão discal (a causa mais comum de radiculopatia), ocorrem no nível de L5 e S1. O exame neurológico dessas condições é quase totalmente obtido com o exame do pé do paciente, o que o torna bastante conveniente. Dentro das manobras irritativas, as mais importantes são: 1. Manobra de Lasègue: extensamente conhecida, até mesmo pelos pacientes (o que é um problema nos litígios), envolve a elevação da perna esticada até cerca de 70 graus. O teste é positivo quando o paciente reclama de reprodução dos seus sintomas entre os ângulos de 30 e 70 graus (West, 2015). A manobra de Lasègue se presta a detectar radiculopatias baixas (L4 em diante, apenas). Pode haver sinal contralateral, neste caso com maior especificidade para radiculopatia; 2. Distensão femoral: com o paciente em decúbito ventral, o examinador flete o joelho maximamente. Se não houver sintomas, a coxa é estendida passivamente com o joelho fletido. O sinal é positivo se houver reprodução dos sintomas em território compatível (L2 a L4).
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