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Maringá 2011 EDITORA DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ Reitor Prof. Dr. Júlio Santiago Prates Filho Vice - Reitor Profa. Dra. Neusa Altoé Diretor da Eduem Prof. Dr. Ivanor Nunes do Prado Editor - Chefe da Eduem Prof. Dr. Alessandro de Lucca e Braccini CONSELHO EDITORIAL Presidente Prof. Dr. Ivanor Nunes do Prado Editores Científicos Prof. Adson Cristiano Bozzi Ramatis Lima Profa. Dra. Ana Lúcia Rodrigues Profa. Dra. Analete Regina Schelbauer Prof. Dr. Antonio Ozai da Silva Prof. Dr. Clóves Cabreira Jobim Profa. Dra. Eliane Aparecida Sanches Tonolli Prof. Dr. Eduardo Augusto Tomanik Prof. Dr. Eliezer Rodrigues de Souto Prof. Dr. Evaristo Atêncio Paredes Profa. Dra. Ismara Eliane Vidal de Souza Tasso Prof. Dr. João Fábio Bertonha Profa. Dra. Larissa Michelle Lara Profa. Dra. Luzia Marta Bellini Profa. Dra. Maria Cristina Gomes Machado Profa. Dra. Maria Suely Pagliarini Prof. Dr. Manoel Messias Alves da Silva Prof. Dr. Oswaldo Curty da Motta Lima Prof. Dr. Raymundo de Lima Prof. Dr. Reginaldo Benedito Dias Prof. Dr. Ronald José Barth Pinto Profa. Dra. Rosilda das Neves Alves Profa. Dra. Terezinha Oliveira Prof. Dr. Valdeni Soliani Franco Profa. Dra. Valéria Soares de Assis EQUIPE TÉCNICA Projeto Gráfico e Design Marcos Kazuyoshi Sassaka Fluxo Editorial Edilson Damasio Edneire Franciscon Jacob Mônica Tanamati Hundzinski Vania Cristina Scomparin Artes Gráficas Luciano Wilian da Silva Marcos Roberto Andreussi Marketing Marcos Cipriano da Silva Comercialização Norberto Pereira da Silva Paulo Bento da Silva Solange Marly Oshima Maringá 2011 FORMAÇÃO DE PROFESSORES - EAD Conceitos Básicos em Educação Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental Clélia Maria Ignatius Nogueira Doherty Andrade 45 Coleção Formação de Professores - EAD Apoio técnico: Rosane Gomes Carpanese Normalização e catalogação: Ivani Baptista CRB - 9/331 Revisão Gramatical: Annie Rose dos Santos Edição e Produção Editorial: Jeferson Gonçalves de Lima Tatiana F. Cerqueira de Lima Capas: Jeferson Gonçalves de Lima Fotografia Capa: Alcides Leite Júnior Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Copyright © 2011 para o autor Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo mecânico, eletrônico, reprográfico etc., sem a autorização, por escrito, do autor. Todos os direitos reservados desta edição 2011 para Eduem. Nogueira, Clélia Maria Ignatius Conceitos básicos em educação matemática nos anos iniciais do ensino fundamental / Clélia Maria Ignatius Nogueira, Doherty Andrade -- Maringá: Eduem, 2011. 168p. :il. color. (Coleção formação de professores EAD; v. 45) ISBN: 978-85-7628-339-3 1. Matemática – Estudo e ensino. 2. Educação matemática. 3. Matemática - Ensino fundamental. I. Andrade, Doherty CDD 21. ed. 372.7 N778c Endereço para correspondência: Eduem - Editora da Universidade Estadual de Maringá Av. Colombo, 5790 - Bloco 40 - Campus Universitário 87020-900 - Maringá - Paraná Fone: (0xx44) 3011-4103 / Fax: (0xx44) 3011-4253 http://www.eduem.uem.br / eduem@uem.br 3 Sobre os autores Apresentação da coleção Apresentação do livro CAPÍTULO 1 O CONHECIMENTO MATEMÁTICO E AS TEORIAS DE APRENDIZAGEM CAPÍTULO 2 DIFERENTES ABORDAGENS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ESCOLAR CAPÍTULO 3 O SISTEMA DE NUMERAÇÃO DECIMAL CAPÍTULO 4 OPERAÇÕES FUNDAMENTAIS: SIGNIFICADOS, ALGORÍTMOS E PROBLEMAS CAPÍTULO 5 O SISTEMA MONETÁRIO BRASILEIRO CAPÍTULO 6 NÚMEROS COM VÍRGULA, DECIMAIS, RACIONAIS E POTÊNCIAS > 5 > 7 > 9 > 11 > 35 > 53 > 83 > 125 > 131 umárioS 5 CLÉLIA MARIA IGNATIUS NOGUEIRA Professora da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Graduada em Matemática (Fafit). Mestre em Análise Funcional (USP-São Carlos). Doutora em Educação Brasileira (Unesp-Marília). DOHERTY ANDRADE Professor da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Graduado em Matemática (Ufes). Mestre em Análise Matemática (PUC-RJ). Doutor em Análise Funcional (IME-USP). EDUARDO BRANDANI DA SILVA Professor do Departamento de Matemática da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Graduado em Matemática (Unicamp). Mestre em Matemática (Unicamp). Doutor em Engenharia Elétrica (Unicamp). obre os autoresS 7 A coleção Formação de Professores - EAD teve sua primeira edição publicada em 2005, com 33 títulos financiados pela Secretaria de Educação a Distância (SEED) do Ministério da Educação (MEC) para que os livros pudessem ser utilizados como material didático nos cursos de licenciatura ofertados no âmbito do Programa de Formação de Professores (Pró-Licenciatura 1). A tiragem da primeira edição foi de 2500 exemplares. A partir de 2008, demos início ao processo de organização e publicação da segunda edição da coleção, com o acréscimo de 12 novos títulos. A conclusão dos trabalhos deverá ocorrer somente no ano de 2012, tendo em vista que o financiamento para esta edição será liberado gradativamente, de acordo com o cronograma estabelecido pela Diretoria de Educação a Distância (DED) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior (CAPES), que é responsável pelo programa denominado Universidade Aberta do Brasil (UAB). A princípio, serão impressos 695 exemplares de cada título, uma vez que os livros da nova coleção serão utilizados como material didático para os alunos matriculados no Curso de Pedagogia, Modalidade de Educação a Distância, ofertado pela Universidade Estadual de Maringá, no âmbito do Sistema UAB. Cada livro da coleção traz, em seu bojo, um objeto de reflexão que foi pensado para uma disciplina específica do curso, mas em nenhum deles seus organizadores e autores tiveram a pretensão de dar conta da totalidade das discussões teóricas e práticas construídas historicamente no que se referem aos conteúdos apresentados. O que bus- camos, com cada um dos livros publicados, é abrir a possibilidade da leitura, da reflexão e do aprofundamento das questões pensadas como fundamentais para a formação do Pedagogo na atualidade. Por isso mesmo, esta coleção somente poderia ser construída a partir do esforço coletivo de professores das mais diversas áreas e departamentos da Universidade Esta- dual de Maringá (UEM) e das instituições que têm se colocado como parceiras nesse processo. Neste sentido, agradecemos sinceramente aos colegas da UEM e das demais insti- tuições que organizaram livros e ou escreveram capítulos para os diversos livros desta coleção. Agradecemos, ainda, à administração central da UEM, que por meio da atuação di- reta da Reitoria e de diversas Pró-Reitorias não mediu esforços para que os trabalhos presentação da ColeçãoA CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 8 pudessem ser desenvolvidos da melhor maneira possível. De modo bastante específico, destacamos o esforço da Reitoria para que os recursos para o financiamento desta co- leção pudessem ser liberados em conformidade com os trâmites burocráticos e com os prazos exíguos estabelecidos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Internamente enfatizamos, ainda, o envolvimento direto dos professores do Depar- tamento de Fundamentos da Educação (DFE), vinculado ao Centro de Ciências Huma- nas, Letras e Artes (CCH), que no decorrer dos últimos anos empreenderam esforços para que o curso de Pedagogia, na modalidade de educação a distância, pudesse ser criado oficialmente, o que exigiu um repensar do trabalho acadêmico e uma modifica- ção significativa da sistemática das atividades docentes. No tocante ao Ministério da Educação, ressaltamos o esforço empreendido pela Di- retoria da Educação a Distância (DED) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior (CAPES) e pela Secretaria de Educaçãode Educação a Distância (SEED/MEC), que em parceria com as Instituições de Ensino Superior (IES) consegui- ram romper barreiras temporais e espaciais para que os convênios para a liberação dos recursos fossem assinados e encaminhados aos órgãos competentes para aprovação, tendo em vista a ação direta e eficiente de um número muito pequeno de pessoas que integram a Coordenação Geral de Supervisão e Fomento e a Coordenação Geral de Articulação. Esperamos que a segunda edição da Coleção Formação de Professores - EAD possa contribuir para a formação dos alunos matriculados no curso de Pedagogia, bem como de outros cursos superiores a distância de todas as instituições públicas de ensino supe- rior que integram e ou possam integrar em um futuro próximo o Sistema UAB. Maria Luisa Furlan Costa Organizadora da Coleção 9 presentação do livroA Este livro foi especialmente elaborado para ser mais um texto-base para o curso de Licenciatura em Pedagogia, na Modalidade de Educação a Distância para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Procuramos usar uma linguagem simples e objetiva para facilitar o entendimento e o aprofundamento dos assuntos aqui tratados. Na apre- sentação do conhecimento matemático, nossa preocupação foi abordar, ainda que su- perficialmente, suas diferentes dimensões: histórica, filosófica, psicológica, sociológica, política e metodológica, pois compreender a natureza do conhecimento matemático e os mecanismos de produção desse conhecimento pode ser um facilitador da prática pedagógica do futuro professor. Na apresentação dos temas específicos que são trabalhados pelo professor dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, nossa preocupação foi contemplar os conceitos de modo claro e acompanhados sempre de sugestões de encaminhamento metodológi- co. Esses encaminhamentos metodológicos são fundamentados nas diversas teorias de aprendizagem e nas tendências atuais da Educação Matemática. Este livro é composto de seis capítulos. A teoria é sempre permeada por atividades, que você deve realizar antes de passar para o tópico seguinte, porque o objetivo das atividades é permitir sua autoavaliação de aprendizagem. As diferentes dimensões do conhecimento matemático e um resumo teórico das principais teorias de aprendizagem acompanhado de discussões acerca das respecti- vas implicações no ensino da matemática são tratados no capítulo um. No capítulo dois, apresentamos diferentes abordagens para a educação matemática escolar. O foco central do capítulo três são os números naturais, sua história, evolução e a construção do Sistema de Numeração Decimal pela criança. O capítulo quatro é voltado para as operações aritméticas elementares, seus significados, algoritmos e os diferentes tipos de problemas. O capítulo cinco é dedicado ao estudo do Sistema Monetário Brasileiro. Os números decimais, frações e porcentagens são focalizados no capítulo seis. Esperamos contribuir para a sua formação de professor, preparando-o para a fundamental e com- plexa, porém prazerosa, tarefa de conduzir a construção do conhecimento matemático de crianças, apresentando-lhes, de maneira formal, o fantástico universo dos números. Clélia Maria Ignatius Nogueira Doherty Andrade CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 10 11 INTRODUÇÃO Trabalhar com crianças pequenas, apresentá-las à Matemática não é uma tarefa fácil e exige do professor mais do que conhecer diferentes metodologias. Cada criança é um universo e, muitas vezes, atividades que são pensadas para uma maioria podem não favorecer a aprendizagem de um aluno específico. É necessário que o professor enriqueça seu repertório para subsidiar, de maneira consistente seu fazer pedagógico e poder, primeiramente, reconhecer as dificuldades da criança e, na sequência, ser capaz de adaptar e propor atividades direcionadas àquela criança em particular. Embora diversas variáveis possam estar associadas – e mesmo produzirem dificuldades escolares de muitos alunos em relação à Matemática, nenhuma é mais a abrangente do que a formação do professor, pois grande parte dos problemas referentes aos processos de ensinar e de aprender Matemática pode ser superada pela mediação docente. E isto é mais evidente ainda nos anos iniciais de escolarização. O professor de Matemática deve desempenhar o papel de mediador entre o conhecimento matemático e o aluno na construção do conhecimento por este último. Para realizar esta tarefa com segurança, o professor precisa ter uma sólida formação em Matemática juntamente com outros conhecimentos específicos do ofício de ensinar. A concepção atual da Matemática é a de uma ciência dinâmica e aberta à incorporação de novos conhecimentos. Assim, cabe ao professor trazer o saber matemático para a escola e o transformar em conhecimento acessível ao seu aluno, pois este conhecimento, pela sua própria natureza, é difícil de ser comunicado diretamente, exigindo, em geral, estratégias bem elaboradas, preparação prévia e respeito às fases de desenvolvimento, cognitivo dos alunos. Assim, este primeiro capítulo discute a natureza do conhecimento matemático, analisando suas dimensões histórica, filosófica, psicológica e sociológica. O Conhecimento Matemático e as Teorias de Aprendizagem 1 CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 12 Para entender com a criança aprende, apresentamos as teorias de aprendizagem mais difundidas, contextualizando-as no ensino de Matemática. O CONHECIMENTO MATEMÁTICO: DIMENSÃO HISTÓRICA A matemática pode ser concebida de duas maneiras bem distintas: uma, apresentada nos livros técnicos e especializados e, particularmente, nos didáticos, nos quais o seu aspecto é de um todo harmonioso, com os assuntos se sucedendo mediante uma cadeia bem definida de pré-requisitos e, principalmente, sem nenhuma contradição (NOGUEIRA, 2002, p. 18). A outra maneira de se conceber a matemática é como um conjunto de conhecimentos construído pelas relações do homem com o meio em que vive, com o mundo, profundamente influenciado pelas relações sociais, ideias filosóficas dominantes em determinado momento histórico, pelo comércio, guerras, outras ciências, exigências tecnológicas etc. Esta última concepção fica evidente quando se envereda pela via da história da matemática. Ao buscarmos as origens e evolução do conhecimento matemático, ao procurarmos entender como ele foi construído, aparecem dúvidas, hesitações, contradições, mudanças de rumo, novas diretrizes. A matemática emerge como um bem cultural, que recebeu e recebe influências do meio externo, desmistificando a imagem de um saber à parte da humanidade, que é auto-suficiente, cuja formação de teorias e conceitos obedece apenas a necessidades internas e ao qual apenas teriam acesso os mais bem dotados intelectualmente. Conhecendo o processo de construção da matemática, compreendemos as dificuldades das crianças e a ideia de que o conhecimento matemático é impossível para as pessoas comuns desaparece, daí a importância do conhecimento da história da matemática. Por falta de registros, não é possível precisar o momento exato em que o homem começou a fazer matemática. As mais recentes descobertas científicas acerca da presença do homem na Terra demonstram que esta é muito mais antiga do que se acreditou durante muito tempo. Foram descobertos registros da presença dos primeiros hominídeos a andar sobre duas pernas, que é um dos critérios utilizados para diferenciar o homem dos demais primatas, surgiram na África, há aproximadamente quatro milhões de anos. Os registros sobre a construção das primeiras ferramentas de pedra criadas pelo chamado Homo habilis, natural da África, datam de dois milhões deanos atrás. De acordo com Karlson (1961), pode parecer estranho afirmar que o mundo sempre esteve e está repleto de matemática, pois estamos acostumados com uma matemática cheia de fórmulas que parecem ter sido inventadas por um indivíduo de óculos grossos, aparentemente distraído e que parece não habitar o mundo real. Porém, desde o seu aparecimento na Terra, para poder sobreviver, o homem contava, media, calculava, mesmo sem ter a menor consciência disso ou de si mesmo. Ademais, as pinturas de animais encontradas em cavernas da Espanha e da França e que foram feitas há mais de 20 mil anos,demonstram que o homem já estava familiarizado 13 com as formas e distribuições espaciais, porque descrevem algum tipo de ritual, com descrição bidimensional dos objetos no espaço. É fácil percebermos que as atividades anteriormente descritas não constituem uma operação matemática consciente, mas o homem estava tal como a criança nos estágios iniciais de seu desenvolvimento, agindo sobre os objetos e, desta forma, construindo seus conhecimentos sobre formas matemáticas e estabelecendo relações entre os objetos. A criança, para construir seu conhecimento matemático, repete grande parte dos procedimentos iniciais da humanidade na construção da matemática, por isso é fundamental que os professores conheçam, ainda que superficialmente, a história da matemática. Mas, como foi possível reconstruir a história da matemática? Pelo estudo dos elementos matemáticos no trabalho humano. Assim, da análise de ferramentas, armas, ornamentos encontrados em escavações arqueológicas; de indícios referentes ao conhecimento da roda, com ou sem raios; das edificações (moradias e templos); do comércio (relação de trocas) e da orientação no tempo e no espaço (calendários); podemos situar o aparecimento da matemática como tal, em algum ponto da história, entre 10 mil e 50 mil anos atrás. Uma das fontes mais importantes para a reconstrução da história da matemática é a agricultura. A agricultura, talvez a mais importante criação da humanidade (superada apenas, segundo alguns autores, pela revolução industrial), aparece no Oriente Médio, entre os rios Tigre e Eufrates, na região onde hoje é o Iraque há cerca de 10 mil anos atrás. Antes da agricultura, o homem sobrevivia da coleta imediata de alimentos, da caça e da pesca. Passando a plantar e a colher seus alimentos, o homem precisou desenvolver métodos para armazenar os produtos colhidos, estabelecer técnicas para a divisão da terra e para o plantio. Se na época da coleta a humanidade era nômade, isto é, precisava se deslocar sempre que o alimento ficava difícil em uma determinada região, a agricultura fixou o homem à terra, criou necessidades como divisão de terras, ferramentas e técnicas de irrigação e estocagem. Com os primeiros aglomerados populacionais surgiram gradualmente os ofícios mais elementares, como a carpintaria, a tecelagem e a cerâmica. Foram estabelecidas formas de governo com a consequente coleta de impostos exigindo conhecimentos mais aperfeiçoados da matemática. Um ponto que é preciso ter clareza, porque permite a compreensão da natureza do conhecimento matemático, é que desde o seu início até o momento atual, a matemática nunca teve sua construção interrompida. Em se tratando da construção desse conhecimento pelos matemáticos, uma geração de estudiosos formaliza o que a geração anterior construiu. É assim que se produz matemática. Neste sentido, os resultados (teoremas e fórmulas) não são registrados e comunicados da mesma forma e na mesma sequência como foram obtidos. Para O CONHECIMENTO MATEMÁTICO E AS TEORIAS DE APRENDIZAGEM CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 14 terem valor enquanto conhecimento científico, os resultados dos matemáticos são comunicados de maneira despersonalizada, generalizada e descontextualizada no tempo e no espaço e escritos de modo que a validade desse resultado possa ser testada por qualquer interessado, isto é, demonstrada. É essa forma de apresentação, harmoniosa, sem contradição dos resultados matemáticos que dá ao conhecimento matemático a impressão de ser acessível só aos gênios. A história derruba por terra essa ideia, por isso é fundamental que o professor a conheça. Atividade 1 1. Qual a ideia de matemática que surge de um estudo que não considere a sua história? E quando essa história é considerada? 1. Como você acredita que a matemática foi construída? 2. Como é possível reconstruir a história da matemática? 3. Para você, o desenvolvimento da matemática, em seu início, estava relacionado aos problemas do cotidiano? E atualmente? O CONHECIMENTO MATEMÁTICO: A DIMENSÃO FILOSÓFICA Existem dificuldades no ensino de matemática que se referem à própria natureza do conhecimento matemático, mas existem também, dificuldades decorrentes de uma visão um tanto irreal ou distorcida da disciplina, uma espécie de preconceito que surge logo a partir dos primeiros contatos da criança com a matemática, atitude esta que o professor deve evitar. A maioria absoluta dos alunos que pretendem ser professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental manifesta um profundo desgosto em relação à matemática. Esse desgosto é transmitido às crianças, muitas vezes inconscientemente, pelo professor. Por outro lado, a importância da disciplina matemática na educação de crianças e jovens é inquestionável. Integrando o conjunto de disciplinas que compõem o núcleo comum, a matemática faz parte dos currículos escolares da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e Médio de todos os países do mundo, com uma carga horária igual ou superior à das demais disciplinas, com exceção da língua pátria. Como ciência, a importância da matemática é indiscutível, pois ela se constitui em ferramenta indispensável para o desenvolvimento da maioria das ciências. Como ramo do conhecimento ou forma de pensamento, em praticamente todos os sistemas filosóficos, a matemática recebe um tratamento diferenciado por si só e sobretudo pela influência do papel que lhe é atribuído para todos os relacionamentos 15 interdisciplinares. Disto resultam diferentes concepções de matemática. De maneira geral, concepção é a ideia que fazemos de alguma coisa, é a maneira como enxergamos ou entendemos algo. A concepção que o pesquisador, o autor de um texto ou o professor tem da matemática produz reflexos em seus estudos teóricos, em seus textos ou na metodologia a ser utilizada em sala de aula. Daí a importância de estudarmos as diversas concepções de matemática. As diferenças entre tais concepções se evidenciam, particularmente, ao analisarmos as relações entre a matemática e a realidade. O estudo dessas diferentes concepções é que caracterizamos como as dimensões filosóficas do conhecimento matemático. AS CONCEPÇÕES PLATÔNICA E ARISTOTÉLICA DA MATEMÁTICA Para o filósofo grego Platão (427-347 a.C.), tudo o que acreditamos ser parte do mundo real constitui aparências. Isto é, existiria um mundo das Formas ou Ideias que serviriam de modelos ideais dos objetos do mundo físico ou das situações ideais que o homem deve se esforçar para alcançar. Assim, por exemplo, nesse mundo ideal existiria a ideia de “cadeira” e as cadeiras que existem em nosso mundo são cópias ou representações imperfeitas desta “cadeira ideal”. Esse ideal se refere às ideias que formamos em nossa mente acerca de alguma coisa e que nos serve de modelo. Por exemplo, se pretendemos costurar um vestido, primeiro o “idealizamos” em nosso pensamento; depois fazemos um “molde”, um “modelo”, para só então costurarmos o vestido. O vestido, depois de pronto, será sempre uma cópia imperfeita do modelo idealizado. Nesse mundo ideal, existiriam também as formasaritméticas (as ideias dos números) e as formas geométricas (ideias de ponto, reta, plano, círculo). Do ponto de vista platônico, a matemática trata apenas de objetos que existem no mundo das ideias e o trabalho do matemático é “descobrir” relações que já existem e não são criadas por ele. O ponto de vista do filósofo Aristóteles (384-322 a.C.) é oposto ao de Platão. Para ele, a matemática seria constituída de construções elaboradas pelos matemáticos a partir da percepção dos objetos do mundo real. A contradição das ideias dos dois grandes pensadores gregos pode ser descrita, de maneira resumida, como a oposição entre o que é de responsabilidade do sujeito (raciocínio, razão, ideias) e o que é de responsabilidade do objeto (percepções, sensações) na construção do conhecimento. Platão acreditava que a matemática fazia parte do mundo das ideias e assim o matemático, utilizando apenas a razão, o raciocínio dedutivo, “descobriria” as “verdades matemáticas” que jamais poderiam ser verificadas mediante uma experiência com objetos do mundo real. Aristóteles, por sua vez, acreditava que a matemática era constituída a partir das percepções sensoriais que os matemáticos tinham dos objetos O CONHECIMENTO MATEMÁTICO E AS TEORIAS DE APRENDIZAGEM CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 16 do mundo real e, portanto, as verdades matemáticas poderiam ser comprovadas com experiências do mundo real. AS CONCEPÇÕES KANTIANA E CARTESIANA DA MATEMÁTICA O filósofo alemão Kant (1724-1804) defendia que a responsabilidade pelo conhecimento não era nem só do sujeito e nem só do objeto, mas da interação entre ambos. A matemática seria, para Kant, a comprovação de sua tese, pois as verdades matemáticas seriam obtidas mediante a dedução (raciocínio do matemático, razão), mas poderiam ser comprovadas empiricamente, isto é, mediante a experiência. Dito de outra forma, os resultados da matemática são obtidos no mundo das ideias, mas podem ser aplicados e comprovados no mundo real. O francês René Descartes (1596-1650) comparava o conhecimento em geral a uma grande árvore, em que as raízes seriam a metafísica (filosofia), o tronco, a física e as outras ciências como a astronomia, a medicina, a química, constituiriam os ramos. A matemática seria a seiva que alimentava a árvore cartesiana. Para o filósofo francês, a matemática significava a condição de possibilidade de conhecimento em qualquer ramo. POR QUE ENSINAR MATEMÁTICA? Se você se dispuser a fazer uma pequena pesquisa acerca das opiniões de seus colegas sobre quais seriam as razões para que a matemática faça parte do currículo escolar, você encontrará três argumentos que representam todos os demais. Para alguns, a função da matemática no currículo é desenvolver o raciocínio; para outros, a matemática precisa ser ensinada e aprendida porque está presente na vida cotidiana e a última possibilidade, porque ela é a ferramenta para as demais ciências. É claro que o professor atua em sala de aula procurando atingir os objetivos que ele acredita ser o motivo pelo qual a matemática deve ser ensinada, revelando a sua concepção de matemática, que, guardadas as devidas proporções, podem ser classificadas como platônica, aristotélica ou cartesiana. A crença de que a matemática desenvolve o raciocínio lógico se sustenta filosoficamente nas ideias de Platão. Já a justificativa de que a matemática está presente no cotidiano e tem aplicações na vida prática se fundamenta nas ideias de Aristóteles. A concepção de que a matemática serve de ferramenta para as outras ciências reproduz as ideias de Descartes. Para os platônicos, a matemática é uma área do conhecimento pronta, acabada e perfeita, cuja estrutura formal serve de modelo para as demais ciências. A matemática seria uma axiomática, isto é, a partir de um conjunto de afirmações imediatamente evidentes, admitidas universalmente como verdadeiras, mesmo sem demonstração – os axiomas –, o sistema matemático é logicamente deduzido. Ao compreender as deduções lógicas presentes na construção da matemática, a criança estaria desenvolvendo o raciocínio, objetivo final da matemática escolar. 17 Assim, com esse objetivo, ou de acordo com a concepção platônica de matemática, seu ensino não necessitaria de atividades práticas. Bastaria a apresentação pelo professor das definições, exemplos, teoremas e exercícios padrões que a criança aprenderia repetindo-os, até compreender os raciocínios envolvidos e ser capaz de reproduzi-los. Para os aristotélicos, que acreditam que a matemática está presente no mundo, o seu ensino deve ser centrado basicamente em atividades práticas, em experiências que levem ao desenvolvimento da observação e da imaginação. Assim, o ensino da matemática deveria partir sempre de situações contextualizadas no cotidiano da criança. A matemática só teria sentido em função de suas aplicações. Combinando com a visão cartesiana, quanto mais interdisciplinares forem as aplicações, melhor. Entendemos que o mais adequado é uma postura intermediária, sustentada na concepção kantiana. A matemática não está apenas na mente do homem e nem apenas no mundo. Ela foi construída pelo sujeito a partir de dados observáveis no mundo. Dessa forma, o ensino deve partir daquilo que é observável, isto é, de situações-problema do dia a dia das crianças e conduzir o pensamento das crianças devagar, pouco a pouco, às abstrações características da matemática. É preciso que o professor compreenda que, apesar de ter sua origem nas coisas do mundo concreto, a matemática é constituída essencialmente de abstrações e generalizações. Atividade 2 1. Analisando as concepções de matemática, qual delas você acredita que esteja mais presente no ensino atual? 2. A tese ainda hoje defendida de que a matemática é uma axiomática se fundamenta em qual corrente filosófica? 3. E a de que a matemática está presente no mundo? 4. Qual é a sua concepção de matemática? 5. É possível uma prática pedagógica que unifique as concepções de Platão, Aristóteles e Descartes? O CONHECIMENTO MATEMÁTICO: A DIMENSÃO PSICOLÓGICA Para tratarmos da dimensão psicológica do conhecimento matemático, nos fundamentamos na teoria do estudioso suíço Jean Piaget (1896-1980). Com base na origem e nos modos de estruturação dos conhecimentos, Piaget os classificou em três tipos: o conhecimento físico, o lógico-matemático e o social. Desse modo, conhecer a natureza do conhecimento é fundamental para escolher as estratégias metodológicas adequadas a cada um deles. O CONHECIMENTO MATEMÁTICO E AS TEORIAS DE APRENDIZAGEM CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 18 Conhecimento físico: é o conhecimento dos objetos e elementos presentes no mundo físico, isto é, na realidade externa, como, por exemplo, tamanho, cor, forma textura, espessura, os sons produzidos pelos objetos, o peso, flexibilidade, temperatura etc. Essas propriedades “estão” nos objetos e podem ser percebidas pela observação e experiência. Saber que um objeto vai cair se o largamos no ar é também um exemplo de conhecimento físico. Conhecimento lógico-matemático: está intimamente ligado ao conhecimento físico, todavia é elaborado a partir de ações ou relações estabelecidas sobre ou entre os objetos. Exemplificando, quando falamos que um objeto é maior do que o outro, a propriedade maior não está em nenhum dos objetos, mas na relação estabelecida pelo sujeito. Para entender melhor, imagine que temos cinco maçãs sobre uma mesa. A cor, o cheiro e a forma das maçãs são conhecimentos físicos que podemos depreender das maçãs em si. Agora, ao afirmarmos que uma maçã é maior do que a outra, essa propriedade de “ser maior” não é das maçãs em si, mas surge de uma comparação (ação mental) entre elas que é estabelecidapelo sujeito. E mais, essa maçã, que é maior do que outra, pode ser menor do que uma terceira, por isso esse conhecimento não é da maçã, é extraído da relação estabelecida entre elas. É um conhecimento matemático. Da mesma forma, quando olhamos para as cinco maçãs, vemos as maçãs, não o número cinco. Essa quantidade foi abstraída a partir de uma relação estabelecida entre todas as maçãs sobre a mesa. A quantidade ou o número, portanto, não é um conhecimento que se depreende dos objetos em si, mas da abstração feita a partir de uma ação ou relação, ou, dito de outra forma, o número é uma relação criada mentalmente por cada indivíduo. Desse modo, embora resulte da ação, o conhecimento lógico-matemático não é empírico, porque as ações, nesse caso, são mentais, têm origem na mente de cada indivíduo. Ideias como igual, diferente, similar, maior, fino, comprido, cinco, mesmo peso, velocidade, tempo etc. não existem no mundo externo, observável, mas sim na mente do sujeito a partir das relações estabelecidas entre os objetos. Conhecimento social: é obtido por meio das ações do indivíduo e de suas interações com outras pessoas. Por exemplo, na situação acima, a cor, o cheiro e a forma das maçãs são exemplos de conhecimento físico; a quantidade ou a afirmação de que uma maçã é maior do que a outra são exemplos de conhecimento matemático. Agora, saber que o nome daquela “coisa” sobre a mesa é maçã, que ela é uma fruta, que o nome da sua cor é vermelho são exemplos de conhecimento social, porque é necessária a interação social para apreendê-lo. Além disso, os conhecimentos físico e matemático possuem validade universal, enquanto que o social pode variar, dependendo da cultura. Na Inglaterra, por exemplo, os nomes seriam apple e red. A origem do conhecimento social está nas convenções desenvolvidas pelas 19 pessoas, como, por exemplo, as regras morais, os valores, a cultura, os sistemas de símbolos e a própria linguagem. Sua principal característica é a arbitrariedade da sua natureza. Apesar de terem origens diferentes, pois o conhecimento físico tem sua origem no objeto, o conhecimento lógico-matemático tem origem no sujeito e o conhecimento social tem origem nas convenções sociais, e os três necessitam de uma estrutura lógico-matemática para a sua assimilação e organização. ESTRUTURAS LÓGICO-MATEMÁTICAS Como exemplo de estrutura lógico-matemática, podemos citar a classificação. Classificar é uma forma de pensamento lógico que vai aos poucos sendo construída pela criança. Consiste na ação de agrupar objetos por semelhança, e a classificação não está nos objetos, mas no classificador. É ele quem escolhe a propriedade, característica ou atributo para selecionar determinados objetos. Por exemplo, uma criança, ao ser convidada a guardar seus brinquedos em diversas caixas, pode fazê-lo mediante diversos critérios. Pode guardar em uma caixa os que têm roda, em outra os que servem para brincar com água, em outra os bichinhos. Outra criança poderia separar os mesmos brinquedos guardando numa caixa os que são de madeira, noutra os de plástico e em outra os que são de tecido. Ao guardar seus brinquedos segundo determinados critérios, a criança está classificando, selecionando. Em outras palavras, está colocando em determinada caixa apenas os que possuem uma ou mais características em comum, como ter rodas, por exemplo. Identificar, selecionar e classificar são atividades básicas para todo tipo de conhecimento e desde muito cedo começam a fazer parte do cotidiano da criança. É mexendo com objetos que a criança distingue seus atributos e estabelece relações sobre eles. Então, vejamos em nosso exemplo das maçãs: precisamos da classificação para saber que a maçã é vermelha (quer dizer, comparamos, mentalmente, a cor da maçã com outros objetos vermelhos que já conhecemos – conhecimento físico). Da mesma forma, precisamos dessa estrutura de classificação para sabermos nos comportar socialmente, como para reconhecer um “palavrão”. Para isso, é preciso separar mentalmente o palavrão das palavras que são aceitas socialmente, o que constitui um conhecimento social. É possível entender melhor agora o que foi dito quando estudamos as dimensões filosóficas do conhecimento matemático: ele tem origem nas percepções sensoriais, mas constituem essencialmente abstrações! O conhecimento ou, segundo alguns autores, o pensamento matemático tem origem nas percepções e ações da criança, desde o seu nascimento, e continua a se desenvolver durante toda a vida do indivíduo. No decorrer de seu desenvolvimento o conhecimento matemático assume muitas faces, como: percepção (discriminação de quantidades), linguagem (a O CONHECIMENTO MATEMÁTICO E AS TEORIAS DE APRENDIZAGEM CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 20 gramática das palavras usadas para contar), resolução de problemas (problemas verbais), procedimentos mentais (cálculo mental), compreensão (esquema parte- todo), dedução, indução, generalização, localização espacial e temporal etc. Portanto, as atividades matemáticas não estão restritas apenas às atividades que utilizam números! O conhecimento matemático está presente tanto em conteúdos no contexto da educação formal, quanto em atividades extraclasses, compreendendo tanto conhecimento intuitivo e informal quanto codificações abstratas escritas. Ele envolve tanto atividades de repetição quanto as mais elevadas formas da criatividade humana. Atividade 3 1. Quais as características do pensamento matemático que o diferencia das demais maneiras de pensar? 2. Cite diferentes formas de expressão do pensamento matemático. 3. O raciocínio lógico-matemático está presente apenas quando se trata de conhecimento matemático? O CONHECIMENTO MATEMÁTICO: DIMENSÃO SOCIOLÓGICA Quando se trata de analisar o conhecimento matemático mediante sua dimensão sociológica, existem três aspectos que devem ser abordados: a) A influência do contexto social na construção do conhecimento matemático pela humanidade; b) A influência da interação social no processo de construção do conhecimento matemático pelas crianças; c) A importância do conhecimento matemático na vida social das pessoas. O CONTEXTO SOCIAL NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO MATEMÁTICO Já vimos anteriormente que a matemática foi construída pelo homem porque este, em sua luta pela própria sobrevivência, teve necessidade de compreender os fenômenos da natureza para transformá-la e continuar se desenvolvendo. Como a natureza é rica em fenômenos, o homem foi observando e tentando entender e explicar tudo o que ocorria à sua volta, durante muitos séculos. Um ótimo exemplo da influência do contexto social na construção dos conhecimentos matemáticos é a construção do número. Durante muitos séculos, a humanidade não teve necessidade de construir um sistema de palavras-número, ou mesmo de contar. A contagem só se tornou necessária quando surgiram muitos 21 indivíduos semelhantes, que um rápido olhar não pudesse diferenciá-los. Atualmente, ainda há tribos cujo sistema de numeração se resume a “um, dois e muitos” e isso não por incapacidade lógica, pois essas mesmas tribos são capazes de identificar, por meio de oito palavras distintas, as sutis diferenças entre os piados de um mesmo pássaro! Existem povos que habitam as geleiras da Sibéria que também contam da maneira anteriormente descrita, mas possuem vinte palavras diferentes para a palavra gelo e quarenta para a palavra neve! Para Santos (2002), a matemática foi construída ao mesmo tempo como uma forma de pensamento e como uma ferramenta que o homem utilizava para organizar suas ideias e para ajudar a entender as leis que governamos fenômenos naturais. Pela via da história, podemos perceber que foram os problemas enfrentados pelo homem, em cada cultura e época, que serviram de base para o desenvolvimento da matemática. Como exemplo, as enchentes do Nilo impulsionaram o desenvolvimento da geometria egípcia; o forte comércio da região da Mesopotâmia fez com que os babilônios tivessem uma aritmética bastante desenvolvida. INTERAÇÃO SOCIAL NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO MATEMÁTICO PELAS CRIANÇAS Conforme vimos quando estudamos a dimensão histórica, a origem dos conhecimentos matemáticos é social. Ela foi construída a partir das necessidades da humanidade e ganha grande impulso com o surgimento da agricultura que permite a fixação do homem primitivo e a consequente vida em sociedade. Discorrendo ainda sobre conhecimentos matemáticos, como uma criança aprenderia as palavras-número (nome dos números) se não tivesse alguém para ensiná-la? E não apenas as palavras-número, mas toda a simbologia, a linguagem da matemática, os algoritmos, os teoremas, as fórmulas? O conhecimento acumulado pela ciência matemática necessita da transmissão social para ser assimilado pelo indivíduo. Além disso, não é possível negar a importância do estabelecimento de ligações entre a matemática escolar e as situações do cotidiano para que a criança possa atribuir significado às operações e procedimentos matemáticos. Esse tipo de contextualização, que objetiva aproximar o saber escolar com a matemática usada na vida da criança, estabelece uma importância fundamental à dimensão social dos conhecimentos matemáticos. Os problemas matemáticos que surgem nessas contextualizações e que possuem maior significado para as crianças são problemas sociais. A importância do fator social não se esgota nessas situações; na verdade, a interação da criança com seu professor e com seus pares constitui-se mesmo em condição indispensável tanto para a construção individual do conhecimento O CONHECIMENTO MATEMÁTICO E AS TEORIAS DE APRENDIZAGEM CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 22 matemático quanto para a aprendizagem da matemática escolar pela criança. São diversos os autores, entre eles Piaget, Vygotsky e Gardner, que ressaltam a importância das relações interpessoais nos processos de ensino e de aprendizagem. O falar sobre o que se está estudando é um ótimo facilitador da aprendizagem. Por exemplo, tente explicar para seus familiares ou colegas de trabalho o que você está estudando nesta disciplina. Você verá que, à medida que você tenta tornar o assunto compreensível para as demais pessoas, você também o entenderá melhor. Se seus ouvintes fizerem perguntas ou discordarem do que está sendo dito e você tiver que argumentar para convencê-los, melhor ainda. Você perceberá o conhecimento se solidificando e que você terá menos dificuldades para lembrar-se do tema em outras ocasiões. Essa crença na importância da interação social fez com que a Resolução de Problemas e o Uso de jogos em sala de aula fossem as abordagens educacionais mais recomendadas para a prática pedagógica na Educação Matemática escolar porque possibilitam às crianças conversarem sobre o que estão aprendendo; permite que discutam, elaborem conjecturas, argumentem, enfim, pensem matematicamente. A IMPORTÂNCIA DO CONHECIMENTO MATEMÁTICO NA VIDA SOCIAL DAS PESSOAS A matemática dos anos iniciais do Ensino Fundamental, muitas vezes, é a única a que uma grande parcela da população brasileira tem acesso. Assim, o trabalho inicial com a matemática é essencial para a vida futura do cidadão, não apenas no que se refere à formação de conceitos, como, também, na competência no cálculo mental para saber utilizá-lo em situações de vida real e no trabalho com segurança. Os anos iniciais do Ensino Fundamental constituem o início de um caminho que o aluno deverá trilhar para se transformar em cidadão, aprendendo a decifrar os códigos da cultura matemática; compreendendo informações quantificadas apresentadas sob a forma de “tabelas e gráficos”; e, ainda, se tornando capaz de identificar embalagens enganosas, preços de falsas liquidações ou mesmo os chamados crediários a perder de vista. A matemática é um poderoso instrumento de compreensão do mundo e a interpretação adequada de seus conceitos, aliada à habilidade de efetuar mentalmente cálculos simples e estimar quantidades (pelo menos a ordem de grandeza), habilita a pessoa a exercer sua cidadania de forma mais imediata. É essa habilidade (e a confiança nela) que nos encoraja a duvidar, questionar e a apresentar argumentos matemáticos baseados em estimativas. Esse deve ser o principal objetivo do ensino de matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental: preparar o indivíduo para o exercício pleno da sua cidadania e a sua interação com o mundo. 23 Atividade 4 1. Quais os três aspectos que devem ser abordados quando nos referimos à dimensão sociológica do conhecimento matemático? Explique cada um deles. 2. Você concorda com essa divisão? Justifique. 3. Você seria capaz de estabelecer uma ordem de importância para esses aspectos? Justifique. 4. O ensino de matemática como é realizado atualmente contempla igualmente os três aspectos da dimensão sociológica? Justifique. TEORIAS DE APRENDIZAGEM E O ENSINO DE MATEMÁTICA Diversas pesquisas foram realizadas, principalmente a partir das primeiras décadas do século XX, tentando decifrar como é que aprendemos levando em consideração um problema que intriga os pensadores desde a Antiguidade: “como é que o sujeito se relaciona com o meio em que está inserido”, dito de outra forma, “como é que o sujeito se relaciona com o objeto”. Traduzindo para o contexto escolar, como é que a criança (sujeito) aprende (se relaciona com) um conhecimento (objeto). O que é considerado objeto nas diversas teorias é tudo o que existe no “meio”; as pessoas, as coisas, a arte, a cultura, os conhecimentos, etc. Desses estudos resultaram o que estamos chamando de Teorias de Aprendizagem. Vamos tratar aqui apenas das mais difundidas entre nós: o comportamentalismo (Behaviorismo) de Skinner; o construtivismo genético de Jean Piaget; o sócio-interacionismo de Vygotsky, as iInteligências múltiplas de Gardner e as contribuições das neurociências, sempre destacando suas implicações no ensino da matemática. BEHAVIORISMO OU COMPORTAMENTALISMO O principal estudioso dessa teoria foi o norte-americano Frederic B. Skinner (1904-1990). Fundamentado na teoria filosófica empirista, o modelo behaviorista de aprendizagem é centrado em condições externas e no comportamento dos alunos. Como se pauta em “mudanças de comportamento” para verificar se aconteceu alguma aprendizagem, é essencial a existência de parâmetros para medir, comparar, testar, experimentar, prever e controlar eventos para explicar o objeto da investigação. O behaviorismo de Skinner não aceita que a mente humana possa ter uma realidade diferente da corpórea. De maneira bastante simplificada, podemos dizer que para o empirismo o conhecimento é adquirido “de fora para dentro”, através dos sentidos ou da experiência, isto é, a criança aprende pela observação e repetição de experiências. É como quando o professor de física ou de biologia diz que vai dar uma aula “prática” e O CONHECIMENTO MATEMÁTICO E AS TEORIAS DE APRENDIZAGEM CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 24 leva as crianças ao laboratório. Só que é ele, professor, que “realiza” as experiências, enquanto as crianças olham. Ou mesmo quando a criança até realiza a experiência, mas a realiza seguindo uma série de instruções programadas pelo professor.Essas teorias constituem a base da escola tradicional, aquela voltada para o que é ensinado. A concepção predominante nesse caso é a de que o professor dá educação para a criança. A criança recebe (passivamente) educação. Ou, o professor transmite o conhecimento e a criança se apropria do que foi transmitido. Algumas metáforas podem ser utilizadas para descrever os fundamentos dessa teoria, como: a criança é um “vaso” onde se pode colocar o conhecimento, a criança é uma “folha em branco” na qual o professor pode escrever à vontade ou a criança é um bocado de barro que pode ser moldado na forma desejada pela sociedade. A prática escolar behaviorista apresenta planejamento rígido, organização, execução das atividades sob a responsabilidade do professor que ainda julga e utiliza diversos artifícios para reforçar positivamente os comportamentos ensinados. Essa concepção destaca, ainda, a necessidade de reforço, a importância de assegurar oportunidades em sala de aula, para que o aluno tenha condições de emitir os comportamentos esperados para os objetivos estabelecidos. Assim, ensinar consiste em explicar (até a exaustão) e aprender consiste em repetir (ou exercitar) o ensinado até ser capaz de reproduzi-lo fielmente. De acordo com essa teoria, embora não seja dito abertamente, o ser humano é passivo ao meio e pode ser manipulado e controlado pela simples alteração das situações em que se encontra. O ensino da matemática quando se tem o comportamentalismo como concepção de aprendizagem é muito próximo do estado atual, apresentado a sequência: definições, exemplos e muitos exercícios, dominando as salas de aula. Assim, o professor “ensina”, apresenta as definições, dá exemplos e depois uma série de exercícios do mesmo modelo dos exemplos apresentados para as crianças resolverem. A crença é de que a aprendizagem é decorrente de uma hierarquia de experiências (grau de dificuldade dos exercícios). A observação e a imitação como princípios de ensino deixam clara a importância dos aspectos perceptivos nessa concepção de aprendizagem. Atividade 5 1. Qual a importância do professor conhecer as teorias de aprendizagem? 2. Em que se fundamenta o behaviorismo? 3. Estabeleça os principais aspectos do behaviorismo. 4. Como age em sala de aula um professor que se apoia teoricamente em Skinner? E no empirismo? 5. Qual é o tipo de indivíduo que estamos formando quando sustentados pelo behaviorismo? 25 SÓCIO-INTERACIONISMO DE VYGOTSKY A teoria histórico-cultural parte do pressuposto de que a criança é um ser social desde o seu nascimento. Desse modo, se forem proporcionadas as condições adequadas de vida e de educação desde o seu nascimento, a criança será capaz de desenvolver seu pensamento, sentimentos, hábitos morais e sua personalidade. Por condições adequadas entende-se aqui a mediação social ou a ajuda de outros indivíduos. Para essa corrente, o pensamento da criança vai do social para o individual. Por ter como seu principal representante o psicólogo russo Liev S. Vygotsky (1896-1934), essa teoria é também conhecida como a escola de Vygotsky ou ainda como sócio-interacionismo. O ser humano é ativo e o seu pensamento é construído gradativamente no ambiente histórico e social, pois as transformações na estrutura de interação social refletem nas estruturas do pensamento humano, orientando seu modo de agir, de perceber o real e a constituição da sua consciência. Para Vygotsky, todavia, a realidade não é um fenômeno ou um objeto que possamos receber “pronta”; ao contrário, apreender a realidade exige uma construção que envolve a socialização e, portanto, a comunicação entre os indivíduos. A linguagem, nesse contexto, desempenha papel preponderante no desenvolvimento do pensamento e no processo de aprendizagem. Essa é a principal razão para o cuidado que devemos tomar para não confundir a importância atribuída por essa corrente à linguagem com uma “defesa” do ensino por “transmissão oral”. A proposta de educação que se fundamenta nessa teoria de aprendizagem tem como princípio que a ação do indivíduo é essencial no desenrolar de seu próprio processo psicológico. Assim, para Vygotsky, só nos apropriamos de algum conceito quando aprendemos a fazer uso social dele. Por exemplo, uma criança só vai “conhecer” um copo, por exemplo, quando for capaz de utilizá-lo com o seu uso social. Para isso, ela precisa interagir com alguém que sabe usá-lo. Vygotsky não aceita a tese de que a criança passa por diversos estágios cognitivos, pois existiria, segundo ele, uma contínua interação entre as inúmeras diversidades das condições sociais e a base biológica do comportamento humano. Em resumo, o aspecto mais difundido do sócio-interacionismo de Vygotsky são as fortes relações entre pensamento e linguagem. É a palavra que dá forma ao pensamento, modificando suas funções psicológicas, percepção, atenção, memória, capacidade de solucionar problemas e o planejamento da ação. O conceito mais inovador e, portanto, mais importante dessa teoria é o de zona de desenvolvimento proximal. De maneira bem simples, essa “zona de desenvolvimento proximal” seria determinada pela consideração, de maneira simultânea, do desenvolvimento real da criança e do seu desenvolvimento potencial. O CONHECIMENTO MATEMÁTICO E AS TEORIAS DE APRENDIZAGEM CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 26 O desenvolvimento real é determinado pela sua capacidade ou não de solucionar problemas e o desenvolvimento potencial é a capacidade de desempenhar tarefas com a ajuda de adultos ou companheiros mais capazes. Essa possibilidade de alterar o comportamento da criança mediante a interferência de um adulto é que impediria, segundo Vygotsky, o estabelecimento de estágios de desenvolvimento cognitivo como proposto por Piaget, pois, dependendo das interferências recebidas, as crianças evoluiriam de maneira diferente. Os fatores biológicos, de acordo com essa teoria, prevalecem sobre os sociais apenas nos primeiros anos de vida, porque gradativamente as interações sociais com adultos ou companheiros mais experientes são interiorizadas, provocando o redimensionamento do comportamento e do pensamento. O professor é entendido, nesse contexto, como o mediador do processo de ensino e aprendizagem. É o professor que possibilita ao aluno o acesso às relações humanas que não estão normalmente à disposição em seu cotidiano. O princípio básico para a educação é: quem sabe faz junto com quem não sabe, mostrando, explicando, perguntando, propondo problemas, estimulando o aluno a investigar para que, de maneira gradativa, quem está aprendendo vá adquirindo uma autonomia que lhe dê segurança para realizar todo o processo sozinho. Desse modo, a ação do indivíduo é fundamental no desenrolar de seu próprio processo psicológico. O ensino de matemática nessa perspectiva deve, primordialmente, mostrar a relação direta do que se está estudando e a realidade, evitando que o saber matemático continue aparentando estar na contramão do saber da vida. Como a interação social é essencial ao processo de ensino-aprendizagem, a metodologia mais adequada é o estudo em grupos. Essa sistemática de trabalho nas aulas de matemática é compatível com as estratégias de “Resolução de Problemas” e “Uso de Jogos” que, além de serem propícias à contextualização, também são ricas em situações que permitem discussões interessantes. Atividade 6 1. Destaque três pontos que você considerou importantes na teoria de Vygotsky 2. Caracterize o ensino de matemática fundamentado no sócio-interacionismo de Vygotsky. 3. Explique, com suas próprias palavras, o que é zona de desenvolvimento proximal e qual a sua importânciapara a sala de aula. 4. O que você acha do trabalho em grupos com crianças? 27 O CONSTRUTIVISMO DE JEAN PIAGET O suíço Jean Piaget (1896-1980) é o mais conhecido dos teóricos que defendem a visão construtivista. Durante muito tempo, sempre que se falava em Piaget ou em Psicologia Genética imediatamente se pensava nos níveis ou estágios. São eles: 1. Sensório-motor (0 a 2 anos): governado pelas percepções sensoriais e esquemas motores. A criança explora o mundo mediante seus sentidos e seu corpo. 2. Intuitivo ou pré-operatório (2 a 7 anos): marcado pelo aparecimento da linguagem oral, que permite à criança “agir em pensamento” e o estabelecimento da representação simbólica da realidade. O pensamento é ainda egocêntrico, por ser rígido e ter a própria criança como ponto de referência. Como o pensamento ainda depende muito da percepção (do que vê, ouve etc.), a criança deste período não é capaz de reversibilidade, que é a capacidade de fazer mental e simultaneamente duas ações opostas, ou seja, “retornar em pensamento ao ponto de partida” e “desfazer” em pensamento alguma ação realizada concretamente. Por exemplo, quando dividimos o conteúdo de um copo de água em dois outros copos, a criança desse período acha que a quantidade de água mudou. Ela não consegue “retornar mentalmente a água ao copo inicial”, isto é, desmanchar em pensamento a ação realizada para ter a certeza de que nada foi retirado nem acrescentado. Ela se prende, ao que vê. Dependendo do tamanho dos copos, ela pode dizer que aumentou ou diminuiu a quantidade de água. É a essa situação (da quantidade mudar em função da forma) que chamamos de ausência de conservação de quantidade. 3. Operatório (7 a 11 anos) apresenta preponderância do pensamento lógico. Porém, apesar de basear suas conclusões muito mais no raciocínio do que na percepção, a criança só pensa “concretamente”, isto é, precisa de apoio concreto para realizar suas ações mentais. Por isso que a criança nessa faixa etária precisa do apoio dos dedos, de risquinhos ou desenhos para realizar operações ou resolver problemas. A criança aqui já é capaz de reversibilidade, que, conforme Piaget, tem origem nas ações dos primeiros meses de vida, quando a criança afasta a mamadeira e depois a puxa de volta, por exemplo, desenvolvendo a capacidade de coordenar ações e processos. 4. Lógico – formal (a partir dos 12 anos) o sujeito já raciocina sobre o possível, isto é, não precisa mais do apoio concreto. Em outras palavras, o pensamento fica livre das limitações da realidade e o sujeito é capaz de pensar abstratamente. É importante que fique bem claro que as idades estabelecidas como limitantes para os períodos são apenas prováveis. A teoria piagetiana vai além desses aspectos, particularmente as pesquisas referentes ao desenvolvimento do conhecimento lógico-matemático, do conhecimento físico, do conhecimento social e cultural; as origens e o desenvolvimento da linguagem e o desenvolvimento moral são fundamentais para a compreensão do processo educacional. O conhecimento, para Piaget, é uma construção contínua desde o nascimento do indivíduo, havendo continuidade entre os quatro estágios de desenvolvimento O CONHECIMENTO MATEMÁTICO E AS TEORIAS DE APRENDIZAGEM CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 28 cognitivo pelos quais todos nós passamos, sem pular nenhum. As pesquisas piagetianas relativas ao desenvolvimento do conhecimento lógico-matemático, do conhecimento físico, do conhecimento social e cultural; as origens e o desenvolvimento da linguagem e o desenvolvimento moral são essenciais para a compreensão do processo educacional. Na verdade, seria importante que todo educador conhecesse não apenas os conteúdos específicos a ensinar, mas, também, quais são os mecanismos operatórios da inteligência necessários à compreensão dos diferentes tipos de conhecimento, o físico, o lógico-matemático e o social. Dois pontos são primordiais para toda proposta educativa que considera a teoria piagetiana: • A ação está na base de todo desenvolvimento cognitivo e de toda aprendizagem; • O principal objetivo de toda educação é o desenvolvimento da autonomia, isto é, tornar a criança segura, criativa, independente, capaz de resolver problemas e de ser agente da sua própria aprendizagem. Assim, a sala de aula de matemática deve criar condições para que a aprendizagem seja um processo ativo de elaboração, com o aluno construindo seu conhecimento. Aqui, o professor não é a figura central do processo, o detentor do saber, o “ator principal”, mas o orientador, o “perguntador”, que apresenta as questões, o “diretor do espetáculo”. As estratégias da “Resolução de Problemas”, do “Uso de Jogos”, a que recomenda a “Utilização de Novas Tecnologias” adaptam-se muito bem aos pressupostos piagetianos. A principal preocupação é com a abordagem global de situações; as atividades propostas devem privilegiar os processos de pensamento essenciais em matemática, como, por exemplo, comparar, abstrair, generalizar, analisar, sintetizar, estabelecer relação parte-todo etc. Em uma ação pedagógica voltada para a construção do conhecimento, não interessam resultados “fiéis” e “repetitivos”, mas o que interessa é que os alunos não cometam os mesmos erros. O objetivo maior não é a objetividade, mas a abertura, admitindo diferentes percursos de soluções e rejeitando, sempre que possível, classificações em termos de “certo” ou “errado”. O “erro” do aluno é considerado como importante auxiliar para que o professor reveja estratégias e compreenda qual é o problema que seu aluno está enfrentando. Portanto, solicitar a explicação do aluno sobre “como” resolveu um problema, ou “por que” o resolveu de determinada maneira deve ser uma constante na prática pedagógica diária, independente da solução apresentada estar “certa” ou “errada”. Atividade 7 1. Explique o que significa no contexto piagetiano afirmar que “o conhecimento não se transmite, mas se constrói”. 29 2. Destaque as principais características do conhecimento físico, do lógico- matemático e do social. 3. Qual o significado atribuído à palavra ação no contexto da teoria piagetiana? OUTRAS TEORIAS Estudamos até aqui as três principais teorias que fundamentam as propostas pedagógicas. Atualmente, estão sendo realizadas muitas pesquisas interdisciplinares para compreender os processos mentais envolvidos na construção do conhecimento. Vamos apresentar poucas linhas a respeito de algumas delas, com a intenção de deixar você informado sobre o assunto. A razão para que este estudo não se aprofunde mais é porque ainda não estão bem estabelecidas as implicações pedagógicas de cada uma delas, com exceção da Teoria das Inteligências Múltiplas. Ciência Cognitiva: essa ciência procura, mediante a realização de experiências, responder questões relacionadas com a natureza do conhecimento, seus componentes, suas origens, seu desenvolvimento e como se manifesta. Seu objeto de estudo é o conhecimento, qualquer tipo de conhecimento. Para essa ciência, humanos, animais e máquinas possuem inteligência, cada uma de um tipo diferente. A ciência cognitiva se fundamenta em diversas disciplinas, como a filosofia, a antropologia, a psicologia, a neurociência, a informática. O principal ponto a ser considerado nessa teoria é que os processos de representações mentais estão relacionados ao sistema biológico e ao sociocultural, mas constituem um sistema separado e distinto desses dois. TEORIA DAS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS O formulador dessa teoria é o norte-americano Howard Gardner, um dos expoentes da ciência cognitiva. Gardner desenvolveu sua pesquisa com base em estudos realizados em Neurobiologia e relatou ter encontrado indícios acercade possíveis “tipos naturais” de inteligência humana. Para esse pesquisador, a cultura desempenha papel importante no desenvolvimento dessas inteligências. Em outras palavras, cada sociedade ou cultura é caracterizada por uma natureza cognitiva própria, com formas de expressão específicas em nível de pensamento. Gardner identificou inicialmente sete “inteligências” em cada pessoa ou, dito de outra forma, a inteligência é composta por um espectro de sete competências, todas com a mesma dimensão e importância, a saber: linguística, lógico-matemática, interpessoal, intrapessoal, musical, espacial e corporal. O desenvolvimento mais ou menos apurado dessas competências depende de uma organização educacional que ajude a criança a atingir seu potencial máximo em cada uma delas. Para isso é necessária uma variedade de disciplinas e atividades, todas de igual importância. É importante destacar que todos os componentes interagem entre si, O CONHECIMENTO MATEMÁTICO E AS TEORIAS DE APRENDIZAGEM CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 30 equilibrando-se em razão de deficiência em um ou mais deles. Somos todos localmente deficientes, ninguém é fortemente competente nas sete áreas e, portanto, somos parcialmente competentes ou mesmo incompetentes em algum aspecto. Todavia, globalmente, sempre somos competentes, pois em alguma área nos destacamos. Nessa perspectiva, a escola deve estimular a emergência dessas áreas, alimentando os interesses despertados, oferecendo canais adequados para sua manifestação e desenvolvimento. Não deve esquecer as áreas em que a criança se apresenta menos promissora, pois é imprescindível estimular um desenvolvimento harmonioso do amplo espectro de competências. Recentemente, Gardner acrescentou uma oitava competência, a naturalista, que seria a capacidade de lidar com as várias espécies do meio ambiente. Um ensino de matemática que se fundamente nessa perspectiva deve privilegiar a realização de um trabalho de natureza interdisciplinar. Atividade 8 1. Estabeleça uma proposta para o trabalho pedagógico com números em sala de aula e descreva duas atividades sobre este tema que proporcionem o desenvolvimento de pelo menos cinco “inteligências” entre as descritas por Gardner. CONTRIBUIÇÕES DAS NEUROCIÊNCIAS Quando os neurologistas passaram a estudar mais profundamente as lesões cerebrais causadas por acidentes, eles descobriram que os dois hemisférios do cérebro humano, o esquerdo e o direito, cada um deles possui funções bem distintas. Eles verificaram que pessoas que antes de um acidente não tinham nenhum tipo de problema, dependendo da localização da lesão cerebral perdiam capacidades diferentes. Por exemplo, se o hemisfério lesado fosse o esquerdo, as capacidades afetadas seriam as relacionadas à palavra escrita ou falada. É comum nos depararmos com afirmações do tipo: “só consigo aprender quando escrevo”, ou “preciso ler em voz alta para memorizar alguma coisa” ou, ainda, “só entendo alguma coisa quando faço um esquema, um desenho”. Essas “sensações” são relativas às nossas preferências cerebrais individuais. Essas informações são importantes para o professor, pois ele deve utilizar diferentes formas de comunicação se pretende contemplar as preferências cerebrais distintas de seus alunos. Nesse sentido, é importante para o professor saber que a representação de um conhecimento não se dá apenas de maneira verbal (palavra falada ou escrita), mas 31 depende de representações mentais fornecidas pelas diferentes linguagens. Assim, um mesmo conceito deve ser apresentado em diferentes formas de representação, para procurar atender ao maior número possível de alunos. Hemisfério cerebral esquerdo: controla o uso da fala, da escrita, da leitura, as capacidades numéricas, o raciocínio lógico, os processos simbólicos, abstratos, analíticos e metodológicos. Funciona no nível do consciente e transforma as percepções em representações racionais. Esse hemisfério governa todo o lado direito do corpo (é trocado: o hemisfério esquerdo governa o lado direito e vice-versa). Ele permite a consciência das sequências temporais e da linearidade dos acontecimentos. Os intelectuais possuem preferências tipicamente lógico-racionais. Analisam as questões dedutivamente, não divagam, pensam de maneira convergente, agem de maneira sequencial. Costumam planejar o tempo e, metaforicamente, dizemos que são “pessoas capazes de ver a árvore, mas não a floresta”. Essa última expressão, do ponto de vista matemático, indica que preferem lidar com objetos (grandezas) discretos, descontínuos ou contáveis. Hemisfério cerebral direito: está relacionado às formas não-verbais do pensamento; à imaginação, à apreensão espacial das formas, à sensibilidade, aos ritmos e às cores. A percepção dos conceitos se dá globalmente. Esse hemisfério governa todo o lado esquerdo do corpo. Permite a consciência das informações simultâneas e viso- espaciais. Os artistas possuem essas funções cerebrais bem desenvolvidas e seu pensamento apoia-se, especificamente, na intuição e na síntese. O comportamento dessas pessoas não se exprime de maneira linear e sequencial e elas não costumam se preocupar em planejar o tempo. A metáfora, nesse caso, é são “pessoas que percebem melhor a floresta do que a árvore”. Essa última expressão, do ponto de vista matemático, indica que preferem lidar com objetos (grandezas) sem interrupção, contínuos ou que podem ser medidos. Podemos, na matemática, utilizar as representações escrita, simbólica, pictórica ou gráfica, para um mesmo conceito. Por exemplo: Adição: é a operação que “junta” duas quantidades em um só total. Para adicionar duas laranjas a outras três laranjas, é preciso juntar todas, fazendo duas mais três e o total é cinco (Representação verbal). Adição: 2 + 3 = 5 (Representação simbólica). Adição: (Representação pictórica). O ensino de matemática está utilizando o lado esquerdo do cérebro quando as atividades desenvolvidas permitem que os alunos debatam entre si; apresenta tarefas O CONHECIMENTO MATEMÁTICO E AS TEORIAS DE APRENDIZAGEM CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 32 com meios descontínuos (tampinhas, grãos, fichas, palitos, pessoas etc.) e se referem à contagem e à aritmética. Por outro lado, o hemisfério direito está sendo solicitado quando as atividades desenvolvidas permitem que ele descubra regularidades, isto é, um padrão que se repete, em um desenho ou em uma sequência de palavras. Ou ainda, em atividades realizadas com objetos contínuos (barbantes, réguas, superfícies, tecidos etc.) e que se relacionam às medidas e à geometria. Um exemplo de atividade envolvendo regularidade é escrever na lousa: gato, maçã, cachorro, banana, macaco, laranja, cavalo.... O aluno deve descobrir que a próxima palavra deve ser o nome de uma fruta. Atividade 9 1. Exemplifique uma situação de uma aula de matemática em que o professor está explorando o hemisfério cerebral direito dos alunos. 2. Agora, prepare uma atividade sobre o mesmo assunto que você escolheu para a questão anterior, mas que explore o hemisfério cerebral esquerdo de seus alunos. 3. Reflita sobre suas facilidades e dificuldades cognitivas e verifique qual é a sua “preferência” cerebral. Proposta de Atividades 1. Faça um resumo acerca dos aspectos histórico, filosófico, psicológico e sociológico do conhecimento matemático. 2. Faça um quadro que evidencie o princípio básico do behaviorismo, da teoria de Piaget, da teoria de Vygotsky, de Gardner e da Neurociência. Coloque também, nesse mesmo quadro, os pontos positivos e negativos de cada teoria; o papel do professor e comodeveria ser o ensino de matemática fundamentado em cada uma dessas teorias. E, com base nesses dados, escolha uma das teorias para embasar a sua prática e justifique sua escolha. Observe que as diversas teorias de aprendizagem não são mutuamente excludentes; de fato são complementares. Esta atividade tem objetivo de tornar isso claro. 3. Para entender o desenvolvimento da criança, nada melhor do que observá- la e procurar compreender o que percebemos à luz do que temos estudado. 33 Sugerimos, então, que você escolha uma situação do dia-a-dia da escola para observar atentamente as crianças e registrar suas observações. Podem ser situações de brincadeira, de leitura, de conversa, de escrita, de lanche, de passeio ou qualquer outra que você julgue interessante. Registre suas observações de acordo com o roteiro a seguir: a) Anote a idade das crianças, a data, o local e o tempo que durou a observação. Descreva a situação de observação (o que as crianças faziam, com quem, que materiais tinham à disposição, como era o local em que se encontravam etc.). b) Observe como as crianças se comportam, o que falam e para quem, como interagem entre si e com os adultos. Procure registrar tudo o mais minuciosamente possível, inclusive as falas. Para isso, organize um pequeno relatório de suas observações e faça uma primeira análise das informações coletadas, procurando responder o que você aprendeu observando as crianças e que aspectos de suas observações podem ser relacionados àquilo que você tem estudado sobre desenvolvimento humano e educação1. 1 Questão adaptada dos Cadernos de Formação – Psicologia da Aprendizagem do projeto Pedagogia Cidadã da Unesp. Anotações O CONHECIMENTO MATEMÁTICO E AS TEORIAS DE APRENDIZAGEM CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 34 Anotações 35 INTRODUÇÃO De um modo geral, podemos dizer que por volta de 1800 a matemática era ensinada nas escolas da maioria dos países do mundo, sendo que seu ensino consistia basicamente em como resolver problemas utilizando regras. Os livros dessa época eram de natureza comercial, porque continham um grande número de problemas e regras relativas a negócios e ao comércio, e não se destinavam a ensinar crianças, já que raramente se ensinava mais do que contagem e operações com números pequenos a crianças menores de dez anos. No início do século XX, começou a preocupação com a aplicação dos conteúdos escolares à vida real dos adultos, e esse fato gerou abusos como ensinar juros e taxas para crianças do então ensino primário. No final dos anos 20 do século XX, iniciou-se a preocupação com a idade mental adequada à aprendizagem de alguns tópicos de matemática. Foram feitos estudos que exerceram enorme influência nos currículos escolares nos vinte anos seguintes. Mesmo com todas as mudanças ocorridas no ensino brasileiro, os currículos atuais continuam reproduzindo o modelo dessa época, com os sete primeiros anos do Ensino Fundamental enfatizando a aritmética e os dois últimos apresentando a álgebra e os fatos mais simples da geometria indutiva. O Ensino Médio continua com a álgebra, a geometria é a dedutiva e aparece a trigonometria. Durante as décadas de 50 e 60 do século XX, o ensino de matemática, em diferentes países, foi influenciado por um movimento que ficou conhecido como Matemática Moderna. Esse movimento teve seu início quando os Estados Unidos entraram na Segunda Guerra Mundial e ficou patente para os militares que os soldados pouco sabiam de matemática. Em outubro de 1957, quando os russos lançaram o primeiro satélite Sputinik, o governo norte-americano e todo o país ficaram convencidos de que estavam atrasados em relação aos russos em ciências e em matemática. Segundo Nogueira (2002), a reforma curricular proposta pela Matemática Moderna consistiu basicamente em se largar a matéria tradicional em favor de campos Diferentes Abordagens em Educação Matemática Escolar 2 CONCEITOS BÁSICOS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 36 novos da matemática, e o que se pretendia era diminuir a distância entre o saber ensinado e o saber da disciplina. Para isso, a matemática moderna precisava utilizar a linguagem da teoria dos conjuntos. É quando a teoria dos conjuntos passou a ser ensinada em todos os níveis de ensino. Não existia nenhuma preocupação pedagógica com o ensino da matemática, o que se percebia era a intenção de transformar a criança ou adolescente em um matemático-mirim, preocupado com a exatidão, o rigor e a estrutura lógica da matemática. É somente a partir dos anos 60 do século XX que o fracasso escolar se tornou uma preocupação mundial e, desde então, inúmeras teorias foram elaboradas procurando esclarecer porque isto acontece sem que nenhuma delas obtivesse pleno êxito. Ao longo desse período, no mundo todo, foram propostas mudanças curriculares, aconteceram rupturas teóricas e ideológicas, multiplicaram-se as orientações metodológicas baseadas em diferentes teorias de aprendizagem, mas a realidade educacional a tudo resiste. A mesma situação se aplica ao ensino da matemática. Diversas propostas já foram colocadas em prática, algumas alterando apenas os conteúdos das propostas curriculares, outras se fixando na questão metodológica, além daquelas que propunham alteração tanto nos conteúdos quanto na forma de tratá-los, porém, qualquer que seja a proposta, o seu sucesso depende, essencialmente, do professor. Salvo exceções, todavia, a obsessão pela ação, a premência em “passar do discurso à prática” não permite que os professores reflitam sobre seu fazer pedagógico. A maioria dos professores compartilha da conhecida concepção de ensino e aprendizagem: “ensinar consiste em explicar exaustivamente e aprender consiste em repetir (ou exercitar) o ensinado até repeti-lo fielmente”. Essa atuação na Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental é um erro grave, pois todos os esforços devem convergir para o desenvolvimento do pensamento lógico-matemático da criança. Essa reflexão tem a maior importância, pois se os professores não compreendem porque realizam determinadas atividades em sala de aula, se não têm clareza de seus objetivos, das possíveis contribuições ou limitações que estas possuem, podem conduzir de maneira inadequada suas ações. Como consequência desse fato, os próprios professores poderão diminuir as possibilidades de uma intervenção pedagógica que contribua para o desenvolvimento do pensamento lógico-matemático da criança. O professor de matemática deve desempenhar o papel de mediador entre o conhecimento matemático e o aluno na construção do conhecimento por este último. Para realizar essa tarefa com segurança, o professor precisa ter uma sólida formação em matemática juntamente com outros conhecimentos específicos do ofício de ensinar. O conhecimento matemático teórico, pela sua própria natureza, é difícil de ser comunicado diretamente, exigindo, em geral, estratégias bem elaboradas, preparação 37 prévia e respeito às fases de desenvolvimento cognitivo dos alunos. Ao fazer essa transposição, o professor necessita conhecer os obstáculos envolvidos no processo de construção de conceitos e procedimentos matemáticos, bem como as dificuldades de natureza epistemológica. Para nós, não existe um único processo de ensino-aprendizagem. Consideramos que existem dois processos distintos: um é o processo de ensinar, em que o sujeito é o professor, que realiza a mediação entre o aluno e o conhecimento, o que foi muito bem estudado por Vygotsky. O outro é o processo de aprender, em que o sujeito é o aluno e que foi exaustivamente estudado por Piaget, determinando, entre outros aspectos importantes,
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