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A ANS e as operadoras de planos de saúde APRESENTAÇÃO O setor de saúde suplementar é responsável pela assistência de, aproximadamente, 1/4 da população brasileira, correspondente àquela que detém planos privados de saúde. Para a organização desse setor, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) realiza a normatização, a fiscalização e a punição, em especial das operadoras de planos de saúde (OPS), que se diferenciam entre si, dependendo da modalidade em que estão alocadas. Nesta Unidade de Aprendizagem, você irá compreender as características das diferentes modalidades de OPS, bem como irá conhecer a legislação vigente que regulamenta esse setor. Você também irá se aproximar do tema do processo de ressarcimento de OPS ao Sistema Único de Saúde (SUS). Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Diferenciar as modalidades e as características das OPS.• Reconhecer a legislação que regulamenta planos e seguros privados de assistência à saúde.• Descrever o papel da ANS e o processo de reembolso ao SUS.• INFOGRÁFICO Para compreender as características das diferentes modalidades de operadoras de planos de saúde (OPS), é necessário considerar a sinistralidade delas. Neste Infográfico, conheça as variáveis, a interpretação e o significado que compõem o cálculo da sinistralidade, visando a subsidiar o discernimento acerca dos valores apresentados pelas OPS provenientes de diferentes modalidades. CONTEÚDO DO LIVRO O setor de saúde suplementar é composto por diferentes agentes que compõem esse mercado, sendo estes representados por operadoras de planos de saúde (OPS), administradoras de benefício, corretoras, prestadores de serviço, contratantes dos planos de saúde e pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). No capítulo A ANS e as operadores de planos de saúde, da obra Faturamento e auditoria em saúde, base teórica desta Unidade de Aprendizagem, veja como são abordadas as modalidades das OPS, bem como aspectos de regulamentação do setor, por meio das Leis nº 9.656/98 e nº 9.961/00 — esta última criou a ANS —, além do processo de ressarcimento ao Sistema Único de Saúde (SUS). Boa leitura. FATURAMENTO E AUDITORIA EM SAÚDE Alexandra Bulgarelli do Nascimento A ANS e as operadoras de planos de saúde Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Diferenciar as modalidades e características das operadoras de planos de saúde. Reconhecer a legislação que regulamenta planos e seguros privados de assistência à saúde. Descrever o papel da Agência Nacional de Saúde Suplementar e o processo de reembolso ao SUS. Introdução O setor de saúde suplementar é formado por operadoras de planos de saúde, administradoras de benefícios, corretoras, contratantes de planos privados de saúde — individuais e coletivos —, bem como por presta- dores de serviço e pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Neste capítulo, você vai conhecer as características e modalidades das operadoras de planos de saúde. Você também vai ver como ocorre a conformação e a regulamentação do setor de saúde suplementar. Além disso, vai conhecer melhor a ANS e a sua interface com o Sistema Único de Saúde (SUS), que se dá por meio do mecanismo de ressarcimento. Naturalmente, você vai estudar esses temas com base no cenário das práticas de auditoria. 1 Modalidades e características das operadoras de planos de saúde O sistema de saúde brasileiro é composto por instituições públicas e pri- vadas. Ou seja, há um setor público e um setor complementar de natureza privada que vende os seus recursos em saúde, em especial de alta com- plexidade, para o setor público. Além disso, existe um setor suplementar, de natureza privada, cuja fi nalidade é oferecer à população o acesso aos planos privados de saúde (BRASIL, 1990a). Existem hospitais privados que assistem pacientes advindos do setor público de saúde e também pacientes que possuem plano de saúde privado, bem como aqueles que realizam o pagamento direto dos recursos utilizados — o que é denominado “desembolso direto”. O relacionamento entre o hospital privado — que integra o setor complementar — e o setor público ocorre porque este não dispõe de toda a estrutura necessária para responder às demandas de saúde da população. Em especial, a estrutura pública é deficitária no que diz respeito a procedimentos de alta complexidade, como cirurgias cardíacas e neurológicas, transplantes, hemodiálise, etc. O mesmo ocorre em relação à vinculação com as operadoras de planos de saúde — pertencentes ao setor de saúde suplementar —, que contratam os serviços disponíveis no setor privado para atender aos seus beneficiários. As operadoras de planos de saúde pertencem ao setor de saúde suplementar e têm a finalidade de viabilizar o atendimento — no segmento da assistência médica e/ou da assistência odontológica — aos beneficiários contratantes dos planos de saúde nos diferentes níveis de atenção à saúde. Portanto, é estabe- lecida uma relação de consumo entre quem vende o acesso aos serviços de saúde, ou seja, as operadoras de planos de saúde, e quem compra o acesso a esses serviços. Essa relação pode ocorrer por meio de contratos individuais ou coletivos, sejam eles empresariais ou por adesão. O setor de saúde suplementar, além de contar com operadoras de planos de saúde, é composto pelas administradoras de benefícios e pelas correto- ras de planos de saúde, que têm um papel importante na sustentabilidade e na dinamicidade do setor. Diante desse contexto de conformação do setor de saúde suplementar, é fundamental você conhecer as diferentes modalidades de operadoras de planos de saúde contidas nele, uma vez que cada uma delas possui características peculiares que qualificam a sua inserção no mercado. A ANS e as operadoras de planos de saúde2 As administradoras de benefícios de saúde iniciaram as suas atividades nos anos 2000, com a finalidade de ocupar um espaço no mercado da saúde suplementar no que se refere à comercialização e à gestão dos planos de saúde. Sua regulamentação ocorreu em 2009, por meio da Resolução Normativa (RN) nº. 196, de 14 de julho. Veja quais são as modalidades de operadoras de planos de saúde: medicinas ou odontologias de grupo, seguradoras, cooperativas, autogestões e associa- ções filantrópicas (BRASIL, 2000). A seguir, você vai conhecer as diferentes características dessas modalidades por meio dos seguintes elementos: relação de propriedade das operadoras, controle da sinistralidade, rede de atendimento e natureza do negócio. No caso das operadoras do tipo medicina ou odontologia de grupo, a sua propriedade é detida por um proprietário ou por um agrupamento delimitado de sócios ou acionistas, com abertura do capital da organização na bolsa de valores. Nesse sentido, a natureza do negócio está concentrada no segmento da assistência à saúde, não havendo outros negócios paralelos. Em decorrência disso, essas operadoras visam a maximizar os seus lucros, o que ocorre por meio de práticas de auditoria mais agressivas, investimento robusto no desenvolvimento de uma rede de atendimento própria — na qual há maior controle dos custos assistenciais — e simplificação da oferta de serviços, o que se desdobra num controle mais consistente da sinistralidade. Veja alguns exemplos de medicinas ou odontologias de grupo: Grupo NotreDame Intermédica, Amil, Odontoprev, etc. Nas operadoras de planos de saúde do tipo seguradoras, a propriedade é detida por um grupo empresarial, composto por acionistas. Como há um grupo empresarial, a organização diversifica os seus negócios por meio de um leque de atuações no mercado de seguros financeiros e de seguros de imóveis, veículos, equipamentos, vida e saúde, que representa o negócio com menor rentabilidade entre os oferecidos. Assim, como o negócio de saúde não é o principal em seu portfólio de produtos, essesagrupamentos empresariais optam pela contratação de prestadores de serviço, em detrimento do desenvolvimento de uma rede de atendimento com infraestrutura própria. Veja exemplos de seguradoras: SulAmérica, Bradesco, Porto Seguro, Sompo, etc. 3A ANS e as operadoras de planos de saúde Além disso, as seguradoras — se comparadas às diferentes modalidades de operadoras de planos de saúde — se originaram tardiamente, na década de 1980. Elas surgiram com a proposta de oferecer aos seus beneficiários a prática de reembolso, tendo como chamariz a possibilidade de uso de recursos de saúde, como consultas em médicos da preferência do consumidor, e a promessa da totalidade do reembolso dos custos despendidos. Em relação ao controle da sinistralidade, ele existe, no entanto não com a mesma intencionalidade presenciada nas operadoras do tipo medicina de grupo. As operadoras do tipo cooperativas — na segmentação da assistência médica — são representadas pelo Sistema Unimed. Esse sistema se configura pela cooperação entre médicos, que adquirem uma parcela da cota da coo- perativa para prestarem atendimento aos seus beneficiários. Em geral, essa modalidade de operadora possui um único negócio, ou seja, o plano de saúde realiza investimento moderado em rede de atendimento própria, e o controle da sinistralidade, em muitos momentos, fica prejudicado em decorrência dos interesses dos médicos cooperados, que utilizam a estrutura da operadora para realizar procedimentos. Embora na segmentação de assistência médica o Sistema Unimed seja o grande exemplo, na segmentação de assistência odontológica existem mais cooperativas no mercado. Já as autogestões são operadoras — portanto, empresas privadas — que, em linhas gerais, viabilizam a assistência para funcionários e dependentes de empresas públicas. Esses funcionários e dependentes não são chamados de “beneficiários”, mas de “participantes” do plano de saúde, pois contribuem mensalmente, participando mutuamente dos benefícios que o plano de saúde traz para o agrupamento de vidas. Diante disso, as autogestões — numa pro- porção muito menor do que as demais modalidades de operadoras — possuem rede própria para atendimento, o que dificulta o controle da sinistralidade, uma vez que a cultura organizacional das autogestões consiste em atender de forma mais ampla às necessidades de saúde dos participantes do plano. Veja exemplos de autogestões: Cassi, Metrus, Cabesp, Fundação Cesp, etc. Por fim, as operadoras filantrópicas são aquelas cuja origem remonta ao início do século XX, quando os trabalhadores se organizavam em caixas de aposentadoria e pensão para terem — a partir de um regime mutualístico — acesso à assistência médica e a auxílios previdenciários. Nesse momento histórico, diante da falta de um sistema de saúde organizado, essas operadoras vendiam, em especial para as classes operárias, o acesso à assistência médica por meio do que hoje se denomina “planos de saúde”. Esse tipo de operadora persistiu ao longo do tempo, mas atualmente está quantitativamente reduzido, em decorrência da elevada concorrência presente no setor de saúde suplementar, A ANS e as operadoras de planos de saúde4 bem como diante da sua forte regulação — o que impõe grandes exigências para a permanência no mercado. Um exemplo de operadora filantrópica é a associação Classes Laboriosas. Portanto, para compreender a dinâmica do setor de saúde suplementar, bem como a atuação em auditoria, é necessário conhecer a finalidade da atividade das operadoras de planos de saúde e as suas diferentes modalidades. Afinal, as práticas do profissional de auditoria são submetidas às peculiaridades da operadora em que ele atua e ao posicionamento da instituição no mercado. O mercado de saúde suplementar é dinâmico e requer acompanhamento do padrão do setor. Para conhecer o número de beneficiários por segmentação e modalidade de operadora, bem como os indicadores e outras informações do setor de saúde suple- mentar, navegue no site da ANS. Lá, você vai encontrar vários dados do setor, inclusive na Sala de Situação, uma ferramenta on-line que contribui para a compreensão do setor. 2 Regulamentação dos planos e seguros privados de assistência à saúde No Brasil, o setor de saúde suplementar teve a sua origem no fi nal da década de 1960, durante o governo militar. Nesse momento histórico, o sistema de saúde vigente era o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) — e, anos mais tarde, o Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social (Inamps) (PIETROBON; PRADO; CAETANO, 2008). O acesso a esses sistemas de saúde era seletivo e direcionado aos traba- lhadores formais e seus dependentes, ou seja, àqueles com registro na carteira de trabalho. Além disso, a estrutura de serviços e atendimento era precária e não comportava a quantidade e a densidade das necessidades em saúde das pessoas, o que gerava grande tempo de espera para o atendimento, bem como baixa resolubilidade dos problemas de saúde. Diante desse contexto, o governo militar, tendo como exemplo o sistema de saúde estadunidense, recentemente implantado e centrado na iniciativa privada, opta por subsidiar o início das operadoras de planos de saúde no Brasil. Assim, essas operadoras passam a comercializar planos de saúde pri- vados para a população, tendo como principal produto, inicialmente, os planos 5A ANS e as operadoras de planos de saúde individuais. Entretanto, nesse momento, não houve a implantação de processos de regulamentação do setor recém-criado, o que na prática significou que as operadoras de planos de saúde atuaram livremente no mercado. Até a regulamentação do setor de saúde suplementar, em 1998, as operadoras de planos de saúde atuavam livremente no mercado — por meio da elaboração de contratos com cláusulas de exclusão e/ou limite de utilização de recursos em saúde. Com frequência, as operadoras limitavam a utilização de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) a 10 diárias por ano. Na prática, se um paciente tivesse utilizado 12 diárias de UTI no ano, a operadora arcaria com o pagamento total ao prestador de serviço hospitalar, mas as duas diárias excedentes seriam repassadas ao paciente ou à sua família. Até a regulamentação do setor, também ocorriam reajustes inflacionários e recor- rentes, realizados sem parâmetros claros. Como você pode imaginar, ao longo dos anos, esses aumentos impactaram de forma significativa a renda das famílias que possuíam plano de saúde privado. A partir de meados de 1990, o cenário de desregulamentação do setor de saúde suplementar ficou insustentável. Inúmeras queixas chegavam à Procu- radoria de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon), tendo como motivos os reajustes abusivos, as negativas de atendimento, etc. Para regulamentar o setor, em 1998, durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, foi sancionada a Lei nº. 9.656, de 3 de junho, conhecida popularmente como Lei dos Planos de Saúde (BRASIL, 1998). É importante você considerar que essa lei foi modificada por meio de medidas provisórias e leis. Por exemplo, a Medida Provisória (MP) nº. 2.177- 44, de 24 de agosto de 2001, incluiu, no art. 1º da Lei nº. 9.656/1998, entre as várias definições estabelecidas, o conceito de plano de saúde. Veja: I — Plano Privado de Assistência à Saúde: prestação continuada de serviços ou cobertura de custos assistenciais a preço pré ou pós estabelecido, por prazo indeterminado, com a finalidade de garantir, sem limite financeiro, a assistência à saúde, pela faculdade de acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde, livremente escolhidos, integrantes ou não de rede cre- denciada, contratada ou referenciada, visando a assistência médica, hospitalar e odontológica, a ser paga integral ou parcialmente às expensas da operadora contratada, mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta e ordem do consumidor (BRASIL, 1998, documento on-line). A ANS e as operadoras de planos desaúde6 Essa definição é muito relevante, pois determina que o plano privado de saúde garanta acesso aos serviços de saúde de forma bastante ampliada, o que não acontecia anteriormente à publicação da lei e da MP que a alterou. Tal MP, inclusive, subsidiou a publicação da RN nº. 195, de 14 de julho de 2009, que estabelece as características dos contratos entre as operadoras de planos de saúde e os respectivos contratantes. Outro aspecto que deve ser destacado em relação aos avanços que a Lei nº. 9.656/1998 trouxe se refere à normatização das regras de reajuste de planos individuais. Tais regras foram incluídas por meio da MP nº. 2.177-44/2001, art. 35, § 2º: “Nos contratos individuais de produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, independentemente da data de sua celebração, a aplicação de cláusula de reajuste das contraprestações pecuniárias dependerá de prévia aprovação da ANS” (BRASIL, 1998, documento on-line). Esse aspecto demonstra um dos papéis que a futura ANS desempenhará: a regulamentação do reajuste anual dos planos individuais. Tal regulamentação visa a responder a uma demanda trazida pelos consumidores de planos privados de saúde nas últimas décadas. Portanto, na Lei nº. 9.656/1998, é prevista uma agência governamental reguladora do setor de saúde suplementar, a ANS, efetivamente criada em 2000, por meio da Lei nº. 9.961, de 28 de janeiro (BRASIL, 2000). A Lei nº. 9.961/2000 estabelece que a ANS estará vinculada ao Ministério da Saúde (BRASIL, 2000). Essa determinação reforça a ideia de que no Brasil, com a atuação do SUS, dispõe-se de um sistema de saúde público–privado. Nesse contexto, cabe à ANS regular, normatizar, controlar e fiscalizar todas as atividades realizadas por operadoras de planos de saúde e administradoras de benefícios. Diante da regulamentação do setor de saúde suplementar, os beneficiários com planos privados vigentes na época tiveram duas opções: manter-se no plano contratado, inclusive com a manutenção de cláusulas de exclusão e limites de utilização, ou migrar para um novo plano de saúde. Esse processo durou seis meses e ocorreu no segundo semestre de 1998, de forma que as migrações deveriam ser finalizadas em 1º de janeiro de 1999. No entanto, é importante você compreender que a migração dos chamados “planos antigos” ou “não regulamentados” para os “planos novos” ou “regu- lamentados” implicava a necessidade de o consumidor do plano arcar com um reajuste expressivo nas mensalidades, o que impactou o orçamento de várias famílias, em especial das que tinham planos individuais. Esse contexto fez com que muitas famílias não migrassem para os planos novos, o que gerou um passivo de contratos — que existem ainda hoje e são chamados de “planos não regulamentados”. 7A ANS e as operadoras de planos de saúde No Quadro 1, a seguir, veja o número de beneficiários por tipo de plano contratado; os dados são de março de 2020. Note que há planos com e sem seg- mentação odontológica, bem como planos não regulamentados, o que demonstra que essa categoria ainda está presente no cotidiano de trabalho das operadoras. Fonte: ANS (2020, documento on-line). Cobertura assistencial e tipo de contratação do plano Planos Novo Antigo Total Assistência médica com ou sem odontologia 43.601.550 3.511.887 47.113.437 Individual ou familiar 8.021.550 990.848 9.012.398 Coletivo empresarial 30.516.845 1.322.935 31.839.780 Coletivo por adesão 5.062.322 1.110.204 6.172.526 Coletivo não identificado 596 0 596 Não informado 237 87.900 88.137 Exclusivamente odontológicos 25.617.207 275.022 25.892.229 Individual ou familiar 4.234.143 2.107 4.236.250 Coletivo empresarial 18.872.010 234.436 19.106.446 Coletivo não identificado 1.803 0 1.803 Não informado 72 10.108 10.180 Quadro 1. Beneficiários por tipo de plano contratado (dados de março de 2020) Como você viu, o setor de saúde suplementar brasileiro, caracterizado pela segmentação da assistência médica e da assistência odontológica, avançou bastante nas últimas décadas. Tal avanço aconteceu em especial em relação à organização do setor e ao estabelecimento de infraestrutura regulatória para a sua atuação. Disso decorre a complexidade desse segmento, que exige profissionais qualificados. A ANS e as operadoras de planos de saúde8 3 A ANS e o processo de reembolso ao SUS A ANS se confi gura como um órgão governamental de regulação do setor de saúde de natureza privada. Sua missão é “Promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde, regular as operadoras setoriais — inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores — e contribuir para o desenvolvimento das ações de saúde no país” (ANS, [2020b], documento on-line). Portanto, ela busca manter a sustentabilidade do setor de saúde suplementar no Brasil, em especial defendendo interesses dos consumidores de planos privados. Inicialmente, a estrutura organizacional da ANS foi estabelecida por meio da RN nº. 197, de 16 de julho de 2009. Posteriormente, ela foi readequada por meio de outras RNs. Atualmente, a Resolução Regimental (RR) nº. 1, de 17 de março de 2017 (ANS, 2017), determina a estrutura básica da ANS, formada pelas áreas listadas a seguir. Diretoria Colegiada (Dicol) ■ Presidência (Presi) ■ Diretoria de Desenvolvimento Setorial (Dides) ■ Diretoria de Normas e Habilitação das Operadoras (Diope) ■ Diretoria de Normas e Habilitação dos Produtos (Dipro) ■ Diretoria de Fiscalização (Difis) ■ Diretoria de Gestão (Diges) ■ Secretaria Geral da Diretoria Colegiada (Seger) Procuradoria Federal junto à ANS (Proge) Ouvidoria (Ouvid) Corregedoria (PPCOR) Auditoria Interna (Audit) Câmara de Saúde Suplementar (Camss) Comissão de Ética (Ceans) A ANS está vinculada ao Ministério da Saúde e, portanto, compõe a estrutura do sistema de saúde brasileiro. Desde a origem do SUS — por meio da Lei Orgânica da Saúde (Lei nº. 8.080, de 19 de setembro de 1990) e da Lei nº. 8.142, de 28 de 9A ANS e as operadoras de planos de saúde dezembro de 1990 —, o qual estabelece acesso universal à saúde em território brasileiro, muito se debate sobre a utilização da estrutura oferecida pelo setor público de saúde pelos consumidores de planos de saúde privados (BRASIL, 1990a, 1990b). Esse debate gira em torno da proporção da população brasileira com plano de saúde privado: aproximadamente 25%. Discute-se o direcionamento de re- cursos para o financiamento de ambos setores — público e privado —, o qual é inversamente proporcional ao quantitativo de usuários. Ou seja, o setor público de saúde assiste 3/4 da população brasileira com menos da metade dos recursos de que a saúde suplementar dispõe para assistir 1/4 da população (ANS, 2019). Portanto, o que está em pauta é a disputa por recursos e a responsabilidade dos setores público e privado no atendimento às necessidades de saúde da população. Nesse sentido, em 2011, foi publicado o Decreto nº. 7.508, de 28 de junho, da presidente Dilma Rousseff. O art. 28 desse decreto trata de como a assistência farmacológica vincula-se ao acesso universal à assistência prestada no âmbito do SUS. Veja: Art. 28. O acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica pressupõe, cumulativamente: I — estar o usuário assistido por ações e serviços de saúde do SUS; II — ter o medicamento sido prescrito por profissional de saúde, no exercício regular de suas funções no SUS; III — estar a prescrição em conformidade com a RENAME e os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas ou com a relação específica complementar estadual, distrital ou municipal de medicamentos; e IV — ter a dispensação ocorrido em unidades indicadas pela direção do SUS. § 1º Os entes federativos poderão ampliar o acesso do usuário à assistência farmacêutica, desde que questões de saúde pública o justifiquem. § 2º O Ministério da Saúde poderá estabelecer regras diferenciadas de acesso a medicamentos de caráter especializado (BRASIL,2011, documento on-line). A partir do Decreto nº. 7.508/2011, da RN nº. 240, de 3 de dezembro de 2010 (posteriormente revogada), e do art. 32 da Lei nº. 9.656/1998, a perspectiva de ressarcimento ao SUS pelos serviços prestados pelo setor público aos benefici- ários de planos de saúde começou a se estabelecer de forma mais consistente. Em 2014, a RN nº. 358, de 27 de novembro, foi publicada pela ANS, tra- zendo uma nova normativa sobre o processo de ressarcimento ao SUS. O ressarcimento envolve os seguintes passos: A ANS e as operadoras de planos de saúde10 1. o beneficiário de plano de saúde privado é assistido em serviços de média ou alta complexidade do setor público de saúde; 2. ao término do atendimento, o serviço de saúde público emite a Autoriza- ção de Internação Hospitalar (AIH) ou a Autorização de Procedimentos Ambulatoriais de Alta Complexidade (Apac); 3. os dados — descritos na AIH ou na Apac — alimentam o banco de dados do Sistema de Informação Hospitalar do SUS (SIH-SUS) e o Sistema de Informações sobre Orçamento Público em Saúde do SUS (Siops-SUS); 4. para a emissão da AIH e da Apac, é imprescindível informar o número do Cartão Nacional de Saúde, popularmente conhecido como “Cartão SUS”; 5. nos sistemas de informação do SUS, a ANS regularmente mapeia os beneficiários de planos de saúde que utilizaram serviços públicos de saúde — a partir dos dados disponíveis no Sistema de Informações de Beneficiários (SIB); 6. ao identificar esses beneficiários, a ANS elabora uma notificação e a envia à operadora de planos de saúde; 7. a operadora de planos de saúde recebe a notificação da ANS e a analisa por meio de um mecanismo de auditoria; 8. caso o atendimento prestado pelo setor público não esteja na cobertura contratual junto à operadora, esta pode contestar a notificação; 9. superada a fase de eventual contestação da notificação, a operadora tem o prazo de 15 dias para pagamento integral ou parcelamento do valor informado pela ANS; 10. em caso de inadimplência da operadora em relação ao pagamento no- tificado pela ANS, a operadora é inscrita no Cadastro Informativo dos créditos de órgãos e entidades federais não quitados (Cadin), inclusive com inscrição em dívida ativa da ANS e execução judicial; 11. já no caso do pagamento efetuado pelas operadoras à ANS, os valores monetários arrecadados são direcionados ao Fundo Nacional de Saúde, que constitui uma das frentes de financiamento do SUS. Para ilustrar os mecanismos de ressarcimento ao SUS, a ANS dispõe de um esquema. Veja na Figura 1. 11A ANS e as operadoras de planos de saúde Figura 1. Mecanismos de ressarcimento ao SUS. Fonte: ANS ([2020a], documento on-line). Para que o ressarcimento ocorra de forma correta e ágil, duas RNs da ANS são importantes. Veja a seguir. RN nº. 389, de 26 de novembro de 2015: dispõe sobre a obrigatoriedade de as operadoras de planos de saúde informarem à ANS o número do Cartão Nacional de Saúde de seus beneficiários. RN nº. 367, de 18 de dezembro de 2014: estabelece o Índice de Va- loração do Ressarcimento (IVR), a partir do qual a ANS determina o valor monetário para ressarcimento dos serviços prestados pelo setor público aos beneficiários de planos privados de saúde (a ser pago pelas operadoras de planos de saúde). A ANS e as operadoras de planos de saúde12 É fundamental que você conheça tais RNs, uma vez que elas evidenciam os mecanismos disponíveis para o redirecionamento de recursos do setor su- plementar para o setor público de saúde, o que coloca em pauta a importância dos processos de auditoria nas operadoras de planos de saúde. As operadoras devem atentar à identificação e ao atendimento das necessidades em saúde, com indicação técnica dos beneficiários, dada a possibilidade de ocorrência de processos de ressarcimento ao SUS (no caso de uso do setor público por beneficiários de planos privados de saúde). Como você viu, é importante compreender a organização do setor de saúde suplementar brasileiro, percebendo-o inserido no sistema de saúde vigente e composto por duas segmentações: assistência médica e odontológica. Nelas, atuam operadoras, administradoras, operadoras, prestadores de serviços, contratantes e a ANS — cuja construção histórica se estabeleceu por meio da Lei nº. 9.656/1998 e da Lei nº. 9.961/2000, que regulamentaram o setor, estabelecendo modalidades de operadoras de planos de saúde, tipos de contratação de planos, regras de reajuste e mecanismos de ressarcimento de operadoras de planos de saúde ao SUS. Isso, em última análise, demonstra a complexidade do setor suplementar de saúde. ANS. Caderno de informação da saúde suplementar: beneficiários, operadoras e planos. Rio de Janeiro: ANS, 2019. Disponível em: http://www.ans.gov.br/images/stories/ Materiais_para_pesquisa/Perfil_setor/Dados_e_indicadores_do_setor/total-cad-info- -jun-2019.pdf. Acesso em: 30 jul. 2020. ANS. Dados gerais. Rio de Janeiro: ANS, 2020. Disponível em: https://www.ans.gov.br/ perfil-do-setor/dados-gerais. Acesso em: 20 jul. 2020. ANS. Espaço ressarcimento ao SUS. Rio de Janeiro: ANS, [2020a]. Disponível em: http:// www.ans.gov.br/aans/quem-somos. Acesso em: 20 jul. 2020. ANS. Quem somos. Rio de Janeiro: ANS, [2020b]. Disponível em: http://www.ans.gov. br/aans/quem-somos. Acesso em: 20 jul. 2020. ANS. Resolução regimental - RR nº 1, de 17 de março de 2017. Rio de Janeiro: ANS, 2017. Disponível em: http://www.ans.gov.br/component/legislacao/?view=legislacao&tas k=TextoLei&format=raw&id=MzM5MA==. Acesso em: 30 jul. 2020. BRASIL. Decreto nº 7.508, de 28 de junho de 2011. Regulamenta a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990 [...]. Brasília: Presidência da República, 2011. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7508.htm. Acesso em: 30 jul. 2020. 13A ANS e as operadoras de planos de saúde BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a pro- moção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 1990a. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080.htm. Acesso em: 30 jul. 2020. BRASIL. Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990. Dispõe sobre a participação da comu- nidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências inter- governamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 1990b. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/leis/L8142.htm. Acesso em: 30 jul. 2020. BRASIL. Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998. Dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde. Brasília: Presidência da República, 1998. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9656compilado.htm. Acesso em: 30 jul. 2020. BRASIL. Lei nº 9.961 de 28 de janeiro de 2000. Cria a Agência Nacional de Saúde Suplemen- tar – ANS e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9961.htm. Acesso em: 30 jul. 2020. PIETROBON, L.; PRADO, M. L.; CAETANO, J. C. Saúde suplementar no Brasil: o papel da Agência Nacional de Saúde Suplementar na regulação do setor. Physis, v. 18, n. 4, p. 767-783, 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0103-73312008000400009&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 30 jul. 2020. Leituras recomendadas ANS. Resolução de diretoria colegiada – RDC nº 39, de 27 de outubro de 2000. Dispõe sobre a definição, a segmentação e a classificação das Operadoras de Planos de Assistência à Saúde. Rio de Janeiro: ANS, 2000. Disponível em: http://www.ans.gov.br/component/legi slacao/?view=legislacao&task=TextoLei&format=raw&id=Mzgw. Acesso em: 30 jul. 2020. ANS. Resolução normativa nº 197, de 16 de julho de 2009. Institui o Regimento Interno da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, e dá outras providências. Rio de Janeiro: ANS, 2009.Disponível em: http://www.ans.gov.br/component/legislacao/?vi ew=legislacao&task=TextoLei&format=raw&id=MTY2NQ==. Acesso em: 30 jul. 2020. ANS. Resolução normativa - RN n° 358, de 27 de novembro de 2014. Dispõe sobre os procedimentos administrativos físico e híbrido de ressarcimento ao SUS [...]. Rio de Janeiro: ANS, 2014. Disponível em: http://www.ans.gov.br/component/legislacao/?v iew=legislacao&task=TextoLei&format=raw&id=MjgyNw==. Acesso em: 30 jul. 2020. ANS. Resolução normativa - RN n° 367, de 18 de dezembro de 2014. Rio de Janeiro: ANS, 2014. Disponível em: http://www.ans.gov.br/component/legislacao/?view=legislaca o&task=TextoLei&format=raw&id=Mjg2Nw==. Acesso em: 30 jul. 2020. ANS. Resolução normativa - RN nº 389, de 26 de novembro de 2015. Dispõe sobre a trans- parência das informações no âmbito da saúde suplementar [...]. Rio de Janeiro: ANS, 2015. Disponível em: http://www.ans.gov.br/component/legislacao/?view=legislaca o&task=TextoLei&format=raw&id=MzEzNw==. Acesso em: 30 jul. 2020. A ANS e as operadoras de planos de saúde14 Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun- cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. INSTITUTO DE ESTUDOS DE SAÚDE SUPLEMENTAR. Gestão e tecnologia para sustenta- bilidade do benefício-saúde. Curitiba: IESS, 2018. Disponível em: https://www.iess.org. br/cms/rep/Gestao_e_tecnologia_para_sustentabilidade.pdf. Acesso em: 2 jul. 2020. LARA, N. C. C. Despesas com internações de operadora de autogestão segundo o porte hospitalar. Curitiba: IESS, 2015. Disponível em: https://www.iess.org.br/cms/rep/poster-4. pdf. Acesso em: 2 jul. 2020. NEVES, V. Controvérsia entre operadoras de saúde e SUS pode encarecer planos. Jornal da USP, 1 nov. 2018. Disponível em: https://jornal.usp.br/atualidades/controversia- -entre-operadoras-de-saude-e-sus-pode-encarecer-planos/. Acesso em: 2 jul. 2020. 15A ANS e as operadoras de planos de saúde DICA DO PROFESSOR Para compreender as peculiaridades em relação ao planos privados de saúde, é necessário conhecer seus tipos de contratação. Nesta Dica do Professor, acesse o conteúdo da Resolução Normativa nº 195/09, que discorre sobre as características dos planos individuais e coletivos. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! NA PRÁTICA Os mecanismos de modulação da utilização de planos privados de saúde devem ser utilizados de forma estratégica, visando a garantir sua finalidade. No entanto, quando aplicado de forma que impacte negativamente os ganhos das famílias, pode- se desdobrar na sobreutilização do setor público de saúde, desencadeando o processo de ressarcimento ao SUS — o qual deve ser um ponto de atenção na gestão de planos privados de saúde. Neste Na Prática, entenda a relação entre a modulação da utilização de planos de saúde e a ocorrência do ressarcimento ao SUS. SAIBA MAIS Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Controvérsia entre operadoras de saúde e SUS pode encarecer planos Esta matéria é muito interessante e busca trazer diferentes perspectivas sobre o assunto do ressarcimento ao SUS. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Despesas com internações de operadora de autogestão segundo o porte hospitalar Este material traz os resultados de um estudo realizado em 2015, em uma autogestão. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Gestão e tecnologia para sustentabilidade do benefício-saúde Neste material, é apresentado um panorama nacional e internacional sobre a incorporação tecnológica e sua influência na sinistralidade de planos privados de saúde. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
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