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AN02FREV001/REV 4.0 1 PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA A DISTÂNCIA Portal Educação ODONTOLOGIA HOSPITALAR Aluno: EaD - Educação a Distância Portal Educação AN02FREV001/REV 4.0 2 CURSO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR MÓDULO I Atenção: O material deste módulo está disponível apenas como parâmetro de estudos para este Programa de Educação Continuada. É proibida qualquer forma de comercialização ou distribuição do mesmo sem a autorização expressa do Portal Educação. Os créditos do conteúdo aqui contido são dados aos seus respectivos autores descritos nas Referências Bibliográficas. AN02FREV001/REV 4.0 3 SUMÁRIO MÓDULO I 1 HISTÓRICO E CONCEITOS 1.1 ATRIBUIÇÕES DO CIRURGIÃO-DENTISTA EM AMBIENTE HOSPITALAR 1.2 CAMPOS DE ATUAÇÃO DO CIRURGIÃO-DENTISTA NOS SERVIÇOS ODONTOLÓGICOS HOSPITALARES 2 LEGISLAÇÃO APLICADA À ODONTOLOGIA HOSPITALAR 3 EXAMES LABORATORIAIS COMPLEMENTARES 3.1 CITOLOGIA ESFOLIATIVA BUCAL 3.2 BIÓPSIA 3.3 PBA (PUNÇÃO-BIÓPSIA ASPIRATIVA) POR AGULHA FINA 3.4 EXAMES ANATOMOPATOLÓGICOS 3.5 EXAMES MICROBIOLÓGICOS 3.5.1 Identificação Bacteriana no Laboratório 3.5.2 Passos no Isolamento e Identificação de uma Bactéria 3.5.3 A Coloração de Gram 3.6 EXAMES BIOQUÍMICOS E HEMATOLÓGICOS 3.6.1 Eritrograma 3.6.2 Leucograma 3.6.3 Série Plaquetária 3.6.3.1 Tempo de sangramento 3.6.3.2 Tempo de protrombina 3.6.3.3 Tempo de tromboplastina parcial ativada 4 EXAMES COMPLEMENTARES: RADIOLOGIA (RADIOGRAFIAS CONVENCIONAIS, TOMOGRAFIA MÉDICA, TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA, FEIXE CÔNICO, ULTRASSONOGRAFIA, RESSONÂNCIA MAGNÉTICA) 4.1 RADIOGRAFIAS CONVENCIONAIS 4.1.1 Panorâmicas 4.1.2 Intraorais 4.1.3 Laterais AN02FREV001/REV 4.0 4 4.2 TOMOGRAFIAS 4.2.1 Tomografia Linear 4.2.2 Computadorizada Cone Beam 4.2.3 Computadorizada 4.3.4 Ultrassonografia 4.3.5 Ressonância Nuclear Magnética 5 NOÇÕES GERAIS DO ATENDIMENTO MULTIPROFISSIONAL MÓDULO II 6 ABORDAGEM ODONTOLÓGICA EM PACIENTES HIPERTENSOS E CARDIOPATAS 6.1 PRINCIPAIS CAUSAS DAS CARDIOPATIAS 6.2 PREPARO PARA CIRURGIA CARDÍACA 6.3 INFECÇÃO DAS VÁLVULAS CARDÍACAS OU TECIDOS ENDOTELIAIS DO CORAÇÃO 6.4 ANTICOAGULAÇÃO 6.5 USO DE ANESTÉSICOS EM PACIENTES CARDIOPATAS 7 ABORDAGEM ODONTOLÓGICA EM PACIENTES PNEUMOPATAS 8 ABORDAGEM ODONTOLÓGICA EM PACIENTES DIABÉTICOS 9 ABORDAGEM ODONTOLÓGICA EM PACIENTES NEFROPATAS 9.1 TRANSPLANTE RENAL 9.1.1 No Período Pré-Transplante 9.1.2 No Período Pós-Transplante 10 ABORDAGEM ODONTOLÓGICA EM PACIENTES HEPATOPATAS 11 ODONTOLOGIA NA UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA 11.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS 11.2 OBJETIVOS PARA ELABORAÇÃO DE PADRONIZAÇÕES DE HIGIENE ORAL 11.3 AVALIAÇÃO ODONTOLÓGICA MÓDULO III AN02FREV001/REV 4.0 5 12 PRINCÍPIOS DE QUIMIOTERAPIA, RADIOTERAPIA E TRANSPLANTE DE MEDULA ÓSSEA 12.1 RADIOTERAPIA 12.1.1 Mecanismos de Lesão Celular 12.2 QUIMIOTERAPIA 12.2.1 Tipos e Finalidades da Quimioterapia 12.2.2 Principais Drogas Utilizadas no Tratamento do Câncer 12.3 TRANSPLANTE DE CÉLULAS-TRONCO HEMATOPOÉTICAS 12.3.1 Medula-Óssea 12.3.2 Sangue Periférico 12.3.3 Tipos de TCTH, Fontes e Característica do Doador 13 EXAMES LABORATORIAIS DE INTERESSE NO ATENDIMENTO ODONTOLÓGICO EM ONCO-HEMATOLOGIA 14 PREPARO BUCAL E ATENÇÃO ODONTOLÓGICA EM: QUIMIOTERAPIA, UTILIZAÇÃO DE CATÉTERES VENOSOS, ENDOPRÓTESES NOS TUMORES ÓSSEOS, RADIOTERAPIA, TRANSPLANTE DE MEDULA ÓSSEA 14.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS 14.2 ASSISTÊNCIA ODONTOLÓGICA 14.3 PACIENTES QUE FARÃO USO DE ENDOPRÓTESES 14.4 PACIENTES QUE FARÃO USO DE CATETERES ENDOVENOSOS 14.4.1 Cateter Venoso Central de Longa Permanência Totalmente Implantado 14.4.2 Cateter Venoso Central de Longa Permanência Semi-Implantado 14.4.3 Complicações dos Cateteres Venosos Centrais de Longa Permanência 15 INFECÇÕES VIRAIS, FÚNGICAS E BACTERIANAS EM CAVIDADE ORAL 15.1 INFECÇÃO VIRAL 15.2 INFECÇÃO FÚNGICA 15.3 INFECÇÃO BACTERIANA 16 XEROSTOMIA 17 CÁRIE DE IRRADIAÇÃO 18 TRISMO 19 SANGRAMENTOS EM CAVIDADE ORAL 20 NEUROTOXICIDADE 21 MUCOSITE ORAL AN02FREV001/REV 4.0 6 22 OSTERORADIONECROSE 23 ALTERAÇÕES DO DESENVOLVIMENTO FACIAL DOS PACIENTES IRRADIADOS EM REGIÃO DE CABEÇA E PESCOÇO NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA E POSSIBILIDADES DE INTERVENÇÃO ODONTOLÓGICA MÓDULO IV 24 QUANDO SUSPEITAR DE CÂNCER: NEOPLASIAS PRIMÁRIAS/SECUNDÁRIAS COM MANIFESTAÇÃO EM CAVIDADE ORAL 24.1 SINAIS PRECOCES 24.1.1 Hipertrofia Gengival 24.1.2 Sangramento 24.1.3 Tumefações 24.1.4 Parestesia e Paralisia Facial 24.1.5 Edema e Aumento de Volume 25 ATENDIMENTO ODONTOLÓGICO DE PACIENTE COM DOENÇA HEMATOLÓGICA CRÔNICA, COM ÊNFASE EM HEMOFILIA, DOENÇA DE WON VILLEBRAND, DOENÇA FALCIFORME, TALASSEMIA, ESFEROCITOSE, AGRANULOCITOSE, PÚRPURAS, ANEMIA APLÁSICA E OUTRAS ANEMIAS CRÔNICAS 25.1 HEMOFILIA 25.2 DOENÇA DE VON WILLEBRAND 25.3 MÉTODOS AUXILIARES NA HEMOSTASIA DA CAVIDADE BUCAL 25.3.1 Antifibrinolíticos 25.3.2 Agentes Cauterizantes 25.3.3 Recomendações para Uso de Fatores de Coagulação em Tratamento Odontológico 25.3.4 Técnicas Anestésicas e de Controle da Dor 25.3.5 Tratamento Restaurador/Protético 25.3.6 Tratamento Endodôntico 25.3.7 Tratamento Ortodôntico 25.3.8 Exodontias 25.4 ANEMIAS AN02FREV001/REV 4.0 7 25.4.1 Anemia Falciforme 25.4.1.1 Manifestações orofaciais mais frequentes da Doença Falciforme 25.4.1.1.1 Neuropatia do nervo mandibular 25.4.1.1.2 Necrose pulpar assintomática 25.4.1.1.3 Dor orofacial 25.4.1.2 Analgesia e anestesia 25.4.1.3 Antibióticos 25.4.2 Talassemia 25.4.2.1 Tipos de Talassemia 25.4.3 Esferocitose 25.4.4 Aplasia de Medula 25.4.4.1 Tipos 25.4.5 Agranulocitose Congênita 25.4.6 Púrpuras 25.4.6.1 Etiologia REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AN02FREV001/REV 4.0 8 MÓDULO I 1 HISTÓRICO E CONCEITOS A Odontologia Hospitalar, apesar de não estar listada no Conselho Federal de Odontologia como uma especialidade, atualmente é uma área que se destaca pelo seu embasamento científico. É o campo de atuação do cirurgião-dentista generalista ou especialista em ambiente hospitalar, seja executando procedimento odontológico de baixa, média ou alta complexidade em pacientes internados ou não, seja visando participar do processo terapêutico de cura ou melhora da qualidade de vida, independentemente da doença que acomete o paciente (SILVA SANTOS e VALENTE JÚNIOR, 2013). Pode ser definida como o conjunto de ações preventivas, diagnósticas, terapêuticas e paliativas em saúde bucal, executadas em ambiente hospitalar, em consonância com a missão do hospital, e inseridas no contexto de atuação da equipe multidisciplinar. Seu principal foco é o atendimento em saúde bucal ao paciente em nível terciário (GRUPO TÉCNICO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR, 2012). Há décadas atrás, o tratamento do paciente era baseado somente na atuação médica. Uma das razões para essa prática é que a Medicina, durante muito tempo, foi confundida com a própria saúde. Ao longo dos anos, houve uma mudança no paradigma do cuidado à saúde, com a redefinição do papel do médico. A perspectiva do cuidado integral, em que várias profissões passaram a integrar a equipe de atenção ao paciente, ganhou espaço e foi incorporada às práticas em saúde. Na época atual, as profissões da saúde ocupam uma situação de destaque na sociedade moderna, que busca, de forma paulatina, a promoção da saúde como um todo. (QUELUZ e PALUMBRO, 2000). A inclusão dos diferentes grupos profissionais, com a consequente valorização dos diferentes saberes, propiciou melhora da qualidade do tratamento oferecido aos pacientes. Sem dúvida, um AN02FREV001/REV 4.0 9 paciente que recebe os cuidadosrespeitando-se a especificidade de cada área de atuação, sem perder o foco da integralidade, tem maiores chances de ser adequadamente tratado do ponto de vista biopsicossocial. Quando se fala em Odontologia integrada em uma equipe multiprofissional, deve-se ter em mente a abordagem do paciente como um todo e não somente nos aspectos relacionados aos cuidados com a cavidade bucal. Embora possa parecer redundante, é importante destacar uma expressão amplamente divulgada nos últimos anos em relação à Odontologia: “a boca faz parte do corpo”! Não nos esqueçamos disso! A atuação odontológica em nível hospitalar requer conhecimentos que permitam a condução do caso baseada em discussões que englobem os diferentes profissionais envolvidos. Muitas vezes, como por exemplo, no caso de pacientes que serão submetidos à radioterapia em região de cabeça e pescoço, o cuidado odontológico proporciona a diminuição de complicações agudas e tardias relacionadas à doença e sua terapia. Esse assunto será discutido com mais detalhes posteriormente, mas ilustra uma das possibilidades de intervenção da Odontologia. Além disso, o cirurgião-dentista preparado para a realização de procedimentos em nível hospitalar como internações, solicitações e interpretação de exames complementares e controle de infecções, auxilia de forma direta na diminuição de custos e na média de permanência do paciente no hospital. As alterações orais são frequentes e podem ser os primeiros sinais e sintomas de doenças ou de alterações sistêmicas relacionadas a determinadas terapias. Doenças infecciosas, autoimunes, metabólicas, neoplasias e quadros sindrômicos, dentre outros, se encaixam no escopo de doenças cujo tratamento odontológico requer o planejamento em conjunto com o médico responsável pelo paciente. De forma geral, pacientes que apresentem distúrbios orgânicos de origem sistêmica ou adquiridos são candidatos ao atendimento em ambiente hospitalar, dependendo de suas características clínicas. Outros pacientes que necessitam de atendimento em ambiente específico são aqueles que sofreram trauma envolvendo região de face. O atendimento hospitalar possibilita a realização dos procedimentos odontológicos necessários, permitindo: AN02FREV001/REV 4.0 10 Atendimento com maior segurança de pacientes com risco cirúrgico. Solicitação de exames específicos e mais detalhados, por parte do profissional. Facilidade para o paciente impossibilitado de frequentar o consultório odontológico. Oferecimento de acompanhamento clínico e específico. Relacionamento integral entre paciente, equipe e instituição (GODOI et al., 2009). 1.1 ATRIBUIÇÕES DO CIRURGIÃO-DENTISTA EM AMBIENTE HOSPITALAR O entendimento de que não se pode cuidar do paciente, de forma integral, sem o respeito às diferentes formações e saberes, facilita a compreensão das atribuições do dentista no ambiente hospitalar. Mas quais são elas? • Cuidado ao paciente cuja doença sistêmica possa ser fator de risco para agravamento e/ou instalação de doença bucal, ou cuja doença bucal possa ser fator de risco para agravamento e/ou instalação de doença sistêmica. • Participação nas decisões da equipe multiprofissional, incluindo internação, diagnóstico, solicitação de exames, prescrição, intervenção odontológica, acompanhamento e alta, sendo responsável por tomada de decisão em intervenção na cavidade bucal em consonância com essa equipe. • Realização de registro e acesso em prontuário médico, em consonância com as normativas do hospital. • Orientação das ações em saúde bucal e supervisão da equipe sob sua responsabilidade (GRUPO TÉCNICO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR, 2012). AN02FREV001/REV 4.0 11 1.2 CAMPOS DE ATUAÇÃO DO CIRURGIÃO-DENTISTA NOS SERVIÇOS ODONTOLÓGICOS HOSPITALARES Os campos de atuação do cirurgião-dentista nos serviços odontológicos hospitalares incluem: • Diagnóstico de lesões bucais e auxílio no tratamento de manifestações bucais oriundas de doenças sistêmicas. • Diagnóstico e tratamento das condições bucais que possam acarretar complicações infecciosas, hemorrágicas, neurológicas ou cardiovasculares, seja em função das condições locais e sistêmicas, seja em decorrência de tratamento ao qual o paciente está submetido. • Diagnóstico e tratamento das condições bucais que possam colaborar para a manutenção ou piora de desordens sistêmicas graves. • Atuação prévia a terapias que possam acarretar complicações orofaciais ou sistêmicas futuras. • Atendimento a pacientes internados que apresentem dor e/ou infecção de origem odontológica. • Atendimento de quaisquer condições que justifiquem intervenção em ambiente hospitalar, em função do risco de complicações infecciosas ou hemorrágicas tanto em nível local quanto sistêmico (GRUPO TÉCNICO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR, 2012). 2 LEGISLAÇÃO APLICADA À ODONTOLOGIA HOSPITALAR Assim como em outras áreas, a Odontologia Hospitalar possui regulamentações próprias. Por se tratar de uma área de atuação relativamente recente, alguns princípios legais norteadores ainda estão em construção e aprimoramento. Muitos deles estão inseridos dentro da atuação da Odontologia, como um todo. Segundo o artigo 26 do Código de Ética Odontológico (aprovado pela Resolução CFO-118/2012), que trata da Odontologia hospitalar, compete ao AN02FREV001/REV 4.0 12 cirurgião-dentista internar e assistir pacientes em hospitais públicos e privados, com e sem caráter filantrópico, respeitadas as normas técnico-administrativas das instituições. “CAPÍTULO X - DA ODONTOLOGIA HOSPITALAR Art. 26. Compete ao cirurgião-dentista internar e assistir paciente em hospitais públicos e privados, com ou sem caráter filantrópico, respeitadas as normas técnico-administrativas das instituições. Art. 27. As atividades odontológicas exercidas em hospital obedecerão às normatizações pertinentes. Art. 28. Constitui infração ética: I - fazer qualquer intervenção fora do âmbito legal da Odontologia; e, II - afastar-se de suas atividades profissionais, mesmo temporariamente, sem deixar outro cirurgião-dentista encarregado do atendimento de seus pacientes internados ou em estado grave.” A Agência Nacional de Saúde (ANS), que regulamenta e fiscaliza a saúde suplementar no Brasil, emitiu a Resolução nº 211, que passou a vigorar em junho de 2010, prevendo a cobertura de estrutura hospitalar para tratamento odontológico, quando o mesmo não possa ser realizado em consultório convencional. Outra publicação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a RDC nº 7, de fevereiro de 2010, dispõe sobre os requisitos mínimos para funcionamento das UTIs, estabelecendo que devem ser garantidos diversos serviços à beira do leito, entre eles assistência odontológica, que deve estar integrada às demais atividades assistenciais prestadas ao paciente, sendo discutidas conjuntamente pela equipe multiprofissional. O Projeto de Lei 2776/08, de autoria do deputado Neilton Mulim (PR-RJ) torna obrigatória em todo o país a presença destes profissionais em Unidades de Tratamento Intensivo e clínicas e hospitais, públicos ou privados, que tenham pacientes internados. Em 18 de abril de 2012 foi aprovado, na forma de substitutivo a esse, o Projeto de Lei nº 363, que torna obrigatória a prestação de assistência odontológica a pacientes em regime de internação hospitalar; aos portadores de doenças crônicas, e, ainda, aos atendidos em regime domiciliar na modalidade home care. AN02FREV001/REV 4.0 13 3 EXAMES LABORATORIAIS COMPLEMENTARES Na primeira consulta odontológica, além do exame clínico da cavidade oral e estruturas adjacentes, é necessário que o profissional realize cuidadosa anamnese do paciente. Neste momento, conheceremos o perfil do paciente, seu histórico familiare suas condições atuais de saúde. Em algumas situações, devem ser requisitados exames complementares para definição do diagnóstico e elaboração do plano de tratamento, respeitando-se as necessidades de cada paciente. Os exames complementares fornecem informações importantes e devem ser direcionados considerando as informações previamente obtidas. 3.1 CITOLOGIA ESFOLIATIVA BUCAL A citologia esfoliativa bucal (CEB) é uma técnica de fácil aplicação, baixo custo e pouca expectativa de dor. Pode ser utilizada na identificação de atipias celulares relacionadas a lesões potencialmente malignizáveis (leucoplasias, queilite actínica, e outras) ou não, e ainda, de neoplasias. Outra área de utilização dessa técnica é a pesquisa de micro-organismos. Para citar dois exemplos dessa possibilidade de aplicação, destacamos a pesquisa do Paracoccidioides brasiliensis, que é o fungo causador da Paracoccidioidomicose. O outro exemplo é sobre a pesquisa do Herpes Simplex virus tipo 1 (HSV-1) em lesões de mucosite na cavidade oral de pacientes em tratamento antineoplásico, que abordaremos nos módulos posteriores. A CEB consiste na raspagem da superfície mucosa e transferência do conteúdo obtido para a superfície de uma lâmina de vidro, obtendo-se um esfregaço. O material deve ser imediatamente fixado em álcool e posteriormente corado. O procedimento é destinado à análise microscópica de células superficiais da mucosa bucal e, quando necessário, complementado por biópsia. Pode ser indicado para avaliação do grau de atipia celular no caso de suspeita de lesões neoplásicas, bem como para caracterização de tipos de exsudatos ou para visualização/identificação AN02FREV001/REV 4.0 14 de agentes infecciosos ou parasitários (KIGNEL, 2007; GRUPO TÉCNICO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR, 2012). A coleta do material pode ser realizada com espátula de madeira, de metal ou de escovas, chamadas cytobrushes. O patologista orientará a realização de determinada coloração, dependendo da hipótese diagnóstica (SILVA SANTOS e VALENTE JÚNIOR, 2013). 3.2 BIÓPSIA O conceito da palavra biópsia vem do latim (bio = vida) e do grego (opsis = observação) (KIGNEL, 2007). A biópsia é uma prática bastante difundida na Medicina, mas menos utilizada na Odontologia. Embora seja um procedimento simples e rápido, deve ser realizada por um profissional com habilidade capaz de selecionar corretamente a área a ser biopsiada, respeitar a anatomia do local, armazenar e transportar corretamente a amostra. Neste procedimento, ocorre a remoção cirúrgica de fragmento de tecido em um indivíduo vivo. O material deve ser imediatamente imerso em formol a 10% e encaminhado ao laboratório anatomopatológico, no qual será submetido à análise macroscópica e microscópica, que visa identificar a lesão por meio do diagnóstico histopatológico. No caso de biópsia para outros tipos de avaliação (cultura, reação de polimerase em cadeia, imunofluorescência, dentre outros), o preparo do material deverá ser feito conforme orientação do laboratório (GRUPO TÉCNICO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR, 2012). Diferentes técnicas de biópsia podem ser utilizadas dependendo do local, tamanho e aspecto da lesão. A biópsia pode ser incisional, em que há retirada de parte representativa da lesão, ou excisional, na qual a lesão inteira é cirurgicamente retirada. A biópsia incisional deve ser realizada em duas situações: nos casos de lesões muito extensas ou múltiplas e quando existe suspeita de malignidade, visto que as lesões malignas necessitam de margens cirúrgicas e a biópsia excisional pode dificultar tratamentos futuros, uma vez que se corre o risco de perder a referência do local exato e do limite da lesão. A biópsia excisional pode ser realizada AN02FREV001/REV 4.0 15 em lesões bem delimitadas, de dimensões modestas e que não sugiram malignidade (SILVA SANTOS e VALENTE JÚNIOR, 2013). 3.3 PBA (PUNÇÃO-BIÓPSIA ASPIRATIVA) POR AGULHA FINA A PBA é uma técnica pouco utilizada pelo dentista no dia a dia, no entanto é bastante empregada pelos cirurgiões de cabeça e pescoço. É feita a aspiração de células por meio de agulha fina acoplada a um sistema a vácuo. O exame tem por objetivo a identificação de padrões morfológicos celulares, bem como a detecção de infecções por intermédio da cultura microbiana do material coletado. Em região de cabeça e pescoço é mais utilizada para diagnóstico de lesões em linfonodos, glândulas salivares maiores e tireoide, mas existem relatos de emprego da técnica para diagnóstico de suspeitas de tumores odontogênicos, lesões intraosseas e em glândulas salivares menores (GRUPO TÉCNICO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR, 2012). A técnica é simples, pouco invasiva, indolor, mas exige certa prática por parte de quem a realiza. Uma agulha de até 1mm de diâmetro exterior é introduzida na lesão com a seringa em posição de repouso e, em seguida, provoca-se a sucção de tecido com o movimento de retração da seringa. Após a remoção do tecido, as lâminas são submersas em material fixador (álcool a 95%) e enviadas ao laboratório para coloração e análise (SILVA SANTOS e VALENTE JÚNIOR, 2013). 3.4 EXAMES ANATOMOPATOLÓGICOS Os exames anatomopatológicos são realizados a partir da observação macroscópica e microscópica de fragmentos de tecidos e órgãos obtidos nos procedimentos cirúrgicos. Sempre que se realiza a biópsia é necessário o encaminhamento da amostra para realização do exame, com o objetivo de se definir o diagnóstico, de maneira precisa. AN02FREV001/REV 4.0 16 O patologista pode indicar a complementação do exame com técnicas de imuno-histoquímica, imunofluorescência, colorações especiais para identificação de microrganismos e de estruturas teciduais específicas. Em geral, seus resultados são incluídos no laudo anatomopatológico. 3.5 EXAMES MICROBIOLÓGICOS As características da cavidade oral, como alta umidade, temperatura relativamente constante (34 a 36°C), pH próximo da neutralidade e grande disponibilidade de nutrientes, permitem o estabelecimento de uma microbiota altamente complexa, composta por grupos bacterianos que habitam, seletivamente, as diversas áreas da boca. A composição da microbiota oral varia com a idade do hospedeiro, hábitos alimentares, hormônios, fluxo salivar, condições imunológicas e outros fatores, como higienização e alcoolismo. Podem ser encontrados micro-organismos Gram- positivos, Gram-negativos e anaeróbios. A microbiota da cavidade oral é colonizada por cerca de 400 a 500 diferentes tipos de micro-organismos, distribuídos no epitélio bucal, dorso da língua, superfície dental e epitélio do sulco gengival (ANDRADE et al., 2011). A microbiota oral pode variar quantitativa e qualitativamente, dependendo da localização na cavidade oral. Na mucosa oral jugal há predomínio de tipos facultativos, principalmente Streptococcus viridans. Na gengiva predominam anaeróbios e micro-organismo facultativos. A superfície dentária tem características que facilitam a instalação de agentes aeróbios, anaeróbios e micro-organismos facultativos. Embora a circulação do ar na cavidade oral pareça excluir a possibilidade de crescimento de agentes anaeróbios, as tensões do oxigênio variam nos diferentes sítios intraorais. Assim, espécies anaeróbias podem ser encontradas, frequentemente, nas placas subgengivais, nos sulcos periodontais e capuzes pericoronários (MACHADO, 1993; NISENGARD e NEWMAN, 1994). AN02FREV001/REV 4.0 17 Na placa dentária podem ser encontrados Streptococcus facultativos, Difteroides facultativos, Leptotrichia buccallis, Veillonella spp, Fusobacterium e Neisseria. As superfícies dentárias favorecem o desenvolvimento de Streptococcus sanguis e mutans, Nocardia e Actinomyces. Um ambiente de baixa tensão de oxigênio e rico em nutrientes,como o do sulco periodontal, cria condições favoráveis para o crescimento e proliferação de anaeróbios, espiroquetas, Fusobacterium, bacteróides, Peptostreptococcus, Actonomyces e outras formas facultativas (MACHADO, 1993; NISENGARD e NEWMAN, 1994). A microbiota encontrada na língua é constituída por Streptococcus facultativos (principalmente S. salivarius e S. mittis), Veillonella spp, Sthaphilococcus spp, Bacteroides, Neisseria, Fusobacterium e alguns cocos e bastonetes gram- negativos. Já a microbiota da saliva é resultante do deslocamento de micro- organismos a partir das outras estruturas da cavidade oral. O estreptococo mais frequente na saliva é o S. salivarius (MACHADO, 1993). Os Streptococcus são micro-organismos gram-positivos e constituem a principal população de agentes da cavidade oral, com espécies distintas associadas a diferentes nichos na boca. Por exemplo, Streptococcus sanguis e S. mutans são encontrados na placa dentária, enquanto o S. salivarius é achado principalmente na língua e S. mitis, em outros tecidos mucosos. Outro grupo de micro-organismos gram-positivos, frequentemente localizados na cavidade oral são os Staphylococcus. As duas principais espécies de Staphylococcus são o S. aureus e S. epidermidis. O S. aureus é um patógeno potencial e pode ser encontrado assintomaticamente na nasofaringe dos indivíduos. É, provavelmente, a partir desse sítio que a bactéria alcança a cavidade oral. Essa espécie não possui papel patogênico significativo nas infecções intraorais. 3.5.1 Identificação Bacteriana no Laboratório O isolamento e a identificação de bactérias auxiliam o tratamento, pois quando se suspeita que pacientes estejam com uma infecção bacteriana, é usual proceder-se ao isolamento de colônias visíveis em cultura pura, em placas de meio AN02FREV001/REV 4.0 18 de cultura sólido e, então, identificar o micro-organismo. A identificação é baseada em princípios taxonômicos aplicados à situação microbiológica em curso. Os métodos clássicos para a identificação de bactérias são baseados em características morfológicas e bioquímicas. Técnicas de biologia molecular, para a caracterização de genes específicos ou segmentos, estão se tornando comuns nos laboratórios de diagnóstico. FIGURA 1 - CRESCIMENTO DE MICRO-ORGANISMOS GRAM POSITIVOS E GRAM NEGATIVOS EM MEIO DE ÁGAR CHOCOLATE FONTE: MENDONÇA, 2008. FIGURA 2 - CRESCIMENTO DE MICRO-ORGANISMOS GRAM POSITIVOS EM MEIO DE ÁGAR SANGUE Fonte: Mendonça, 2008 FONTE: MENDONÇA, 2008. AN02FREV001/REV 4.0 19 FIGURA 3 - CRESCIMENTO DE MICRO-ORGANISMOS GRAM NEGATIVOS EM MEIO DE ÁGAR MCCONKEY FONTE: MENDONÇA, 2008. Termos taxonômicos (classificação) Família: um grupo de gêneros relacionados. Gênero: um grupo de espécies relacionadas. Espécies: um grupo de linhagens relacionadas. Tipo: um conjunto de linhagens dentro de uma espécie (biótipo, sorotipo). Linhagem: um isolado específico dentro de uma espécie particular. O termo mais comumente usado é o nome da espécie, por exemplo, Streptococcus pyogenes, cuja abreviação é S. pyogenes. A primeira define o gênero, no caso, Streptococcus, e a segunda a espécie, neste caso, pyogenes. A primeira letra do nome do gênero é sempre maiúscula, mas o nome da espécie é todo em minúsculas. Ambos os nomes são italizados ou grifados. 3.5.2 Passos no Isolamento e Identificação de uma Bactéria Passo 1: amostras de fluidos orgânicos são espalhadas em placas contendo meio de cultura sólido e colônias isoladas de bactérias (visíveis a olho nu) aparecem após a incubação das placas por um a vários dias. Cada colônia consiste de milhões AN02FREV001/REV 4.0 20 de células de bactérias. A observação das características dessas colônias em relação a tamanho, forma, textura, cor e reações de hemólise (se crescidas em meio Agar sangue) é altamente importante como o primeiro passo na identificação bacteriana. Outra importante característica para a identificação é se a bactéria requer ou não oxigênio para crescer. Passo 2: as colônias isoladas são coradas pelo método de Gram e células individuais de bactérias são observadas ao microscópio. Passo 3: as bactérias são identificadas usando-se colônias isoladas. Isto frequentemente requer outras 24 horas de incubação adicional. 3.5.3 A Coloração de Gram A colônia é dessecada sobre uma lâmina e tratada como segue. Passo 1: coloração com cristal violeta Passo 2: fixação com lugol, que estabiliza a coloração com o cristal violeta. Todas as bactérias se coram em azul ou púrpura. Passo 3: extração com álcool ou outro solvente, que descora algumas bactérias (gram negativas) e não outras (gram positivas). Passo 4: coloração secundária com safranina. As bactérias gram positivas já estão coradas com o cristal violeta e permanecem azuis. As bactérias gram negativas se coram em rosa. Ao observarmos a aparência das bactérias ao microscópio, perguntamos: Elas são gram positivas ou negativas? Qual a sua morfologia (bacilos, cocos, espiraladas, pleomórficas, etc.)? As células ocorrem de forma isolada, em cadeias ou em pares? Qual o tamanho das células? Além da coloração de Gram, há outros métodos de coloração menos comumente empregados, por exemplo, a coloração de esporos ou cápsulas (FOX, 2013). AN02FREV001/REV 4.0 21 A detecção e identificação de agentes antimicrobianos, seja em infecções localizadas ou em infecções sistêmicas, dependem dos seguintes fatores: Tratamento prévio com antimicrobianos. Coleta de amostra representativa. Tipo de infecção e repercussão clínica. Transporte por meio que garanta a viabilidade dos micro-organismos. Semeadura em meios adequados e suficientes para o crescimento. Isolamento e antibiograma de bactérias representativas para a hipótese diagnóstica (NIGRO e HARADA, 2013). 3.6 EXAMES BIOQUÍMICOS E HEMATOLÓGICOS O hemograma é o exame complementar mais solicitado e destina-se à avaliação qualitativa e quantitativa dos elementos figurados do sangue. É um conjunto de avaliações das células do sangue que, reunido aos dados clínicos, permite conclusões diagnósticas e prognósticas de grande número de patologias. As variações neste exame podem ter impacto direto na prática odontológica. Embora seja um exame que apresente limitações do ponto de vista diagnóstico, seus resultados podem identificar ou sugerir algumas alterações na condição imunológica, quadros de anemia (que podem interferir na cicatrização) e no processo de coagulação do paciente. Como exame complementar, indica apenas as alterações nos desvios de normalidade, mas não pode indicar o local onde ocorre o distúrbio que provoca as alterações, sendo, portanto, um exame inespecífico. Normalmente, do hemograma constam subsídios de três ordens: 1 - distúrbios da série vermelha, 2 - distúrbios da série branca e, 3 - dados sobre as plaquetas (LOPES, 2007; GRUPO TÉCNICO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR, 2012). AN02FREV001/REV 4.0 22 FIGURA 4 – REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DO SISTEMA HEMATOPOÉTICO FONTE: Autor desconhecido. Disponível em: <http://www.ingoh.com.br/site/materia.php?CodMateria=14>. Acesso em: 15 jan. 2014. Hemograma Completo Série vermelha (eritrócitos) – Hemácias – Hemoglobina – Hematócrito Série branca (Leucócitos) – Neutrófilos – Eosinófilos – Basófilos – Linfócitos – Monócitos AN02FREV001/REV 4.0 23 Plaquetas 3.6.1 Eritrograma É o estudo da série vermelha (eritrócitos ou hemácias). Em indivíduos normais, as hemácias possuem tamanho mais ou menos uniforme. Quando uma hemácia tem tamanho normal ela é chamada de normocítica. Quando ela apresenta coloraçãonormal é chamada de normocrômica. Simplificando o processo de trocas de oxigênio e dióxido de carbono que ocorre em nosso organismo, é correto dizer que as hemácias são responsáveis por levar oxigênio aos tecidos do corpo. Esses elementos apresentam a forma de um disco bicôncavo e possuem membrana maleável, que permite seu trânsito tanto dentro nos grandes vasos quanto nos pequenos capilares. No seu interior, encontramos a hemoglobina, que é uma proteína que se fixa ao oxigênio disponível no pulmão, formando a oxi-hemoglobina. Ao chegar aos tecidos, o oxigênio é liberado e é utilizado pelas células. Avaliação do Eritrograma Os resultados a serem avaliados variam com o sexo e idade. Número de glóbulos vermelhos - valores normais: – Homem de 4.600.000 - 6.200.000 – Mulher de 4.200.000 - 5.400.000 Hematócrito: índice calculado em porcentagem, definido pelo volume total das hemácias ocupado em 100mL de sangue. Além de fornecer certas medidas médias dos eritrócitos, o hematócrito fornece a chamada relação plasma-glóbulo, isto é, quanto de eritrócitos e de plasma existe em uma determinada quantidade de sangue. A contagem eritrocitária ou hematimetria é de 4.500.000 a 6.500.000 glóbulos vermelhos por mm3 de sangue no homem, de 4.000.000 a 5.600.000 nas mulheres não grávidas e de 3.900.000 a 5.600.000 nas grávidas. Em recém- AN02FREV001/REV 4.0 24 nascidos, a contagem é de 4.000.000 a 5.600.000 e nas crianças de 3 meses a 12 anos a contagem varia de 4.500.000 a 4.700.000 glóbulos vermelhos por mm3 de sangue. Um glóbulo vermelho tem a vida média de 120 dias e apresenta como função conhecida, o transporte da molécula de hemoglobina, sem dispêndio de energia (LOPES, 2007; GRUPO TÉCNICO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR, 2012). Valores de hematócrito – Homem de 42 - 50% – Mulher de 40 - 48% – Recém-nascidos tem valores altos que vão abaixando com a idade até o valor normal de um adulto. Hemoglobina: a medida do valor da hemoglobina define a anemia. Segundo a OMS é considerado anemia quando um adulto apresentar Hb < 12,5g/dl Valores – Homens: 13-18gdl – Mulheres: 12-15gdl A partir dos valores de eritrócitos, da porcentagem de hemoglobina e do hematócrito, é possível o cálculo de outras medidas chamadas de índices hematimétricos. Os mais importantes são: Volume corpuscular médio (VCM) VCM = hematócrito X 10 número de hemácias em milhões Os valores normais oscilam entre 78 e 90 µ3. Hemoglobina corpuscular média (HbCM) HbCM = hematócrito X 10 hematócrito AN02FREV001/REV 4.0 25 Os valores normais são de 24-34 pg em crianças, 27-34 pg em mulheres e 27-34 pg em homens. Concentração da Hemoglobina corpuscular média (CHbCM) CHbCM = hemoglobina X 10 hematócrito Os valores normais são de 24 a 37% em crianças, 31,5 a 36% em mulheres e 31,5 a 36% em homens (LOPES, 2007; GRUPO TÉCNICO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR, 2012). A identificação de valores da hemoglobina abaixo das taxas de normalidade aumenta a chance de ocorrência de dificuldade de cicatrização após procedimentos odontológicos, pois é necessário que o nível de oxigênio nos tecidos seja capaz de suprir as necessidades celulares no processo cicatricial. Outro aspecto de importância relacionado aos níveis de hemoglobina na prática odontológica diz respeito aos pacientes com hemoglobinopatias. Esses pacientes podem apresentar alterações no crescimento facial, que discutiremos posteriormente. 3.6.2 Leucograma É o estudo da série branca ou leucócitos. Os leucócitos representam um grupo heterogêneo de células que têm como função proteger o organismo de processos infecciosos. Como a cavidade oral é um ambiente rico em micro- organismos, variações na capacidade de defesa orgânica podem permitir o desenvolvimento de infecções. Essa situação pode ser observada, por exemplo, em pacientes submetidos à quimioterapia antineoplásica. Normalmente convivemos de maneira “pacífica” com as bactérias encontradas no sulco periodontal, mas nos estados de imunossupressão observam- se frequentemente processos infecciosos periodontais acometendo margens gengivais e causados por bactérias anaeróbias. AN02FREV001/REV 4.0 26 O adulto normalmente apresenta de 5.000 - 10.000 leucócitos por 100mL de sangue. Esses valores podem ser afetados pelo gênero e idade da pessoa. Outras variantes podem ser a condição física do indivíduo, menstruação, gravidez, etc. Em presença de valores acima de 10.000leucócitos/ mm3 caracteriza-se um quadro de leucocitose e abaixo de 4.000leucócitos/ mm3, de leucopenia. Em um paciente normal, observam-se os seguintes tipos de leucócitos: - Monócitos - Linfócitos - Eosinófilos - Basófilos - Neutrófilos Leucograma - Contagem diferencial - Monócito: é um leucócito agranulócito e uma das maiores células da série branca; podem ter vacúolos, em função da recente fagocitose. São consideradas células ainda não totalmente maduras, circulantes e somente atingem o estado final de desenvolvimento quando saem da corrente sanguínea para os tecidos, transformando-se então em macrófagos tissulares ou histiócitos. Os macrófagos constituem sistema de defesa contra agentes infecciosos. - Linfócito: é um leucócito agranulócito e a célula predominante nas crianças. Seu aumento é chamado de linfocitose. Em adultos, seu aumento pode ser indício de infecção viral ou leucemia linfocítica crônica. As células maduras são encontradas no sangue circulante em porcentagens variáveis, podendo ser encontradas ainda nos órgãos linfoides primários e secundários. Os órgãos linfoides primários são a medula óssea e o timo. Nesses locais, ocorre a linfocitopoese em que células hematopoéticas pluripotentes encontram condições próprias para se fixar e proliferar. Já os órgãos linfoides secundários são representados pelos linfonodos, pelo baço e por outros agrupamentos linfoides como as placas de Peyer e as tonsilas. AN02FREV001/REV 4.0 27 - Eosinófilo: é um leucócito granulócito; quando seu número aumenta é chamado de eosinofilia, e ocorre em casos de processos alérgicos ou parasitoses. - Basófilo: é um leucócito granulócito e, em um indivíduo normal, só é encontrada até uma célula (em termos percentuais). - Neutrófilo: é um leucócito granulócito e também a célula mais encontrada em adultos. Seu aumento pode indicar infecção bacteriana, mas pode estar aumentada em infecção viral. Os neutrófilos são importantes armas de defesa do organismo, sendo por isso bastante numerosos no sangue circulante (de 58 a 65% do todos os leucócitos). São capazes de fazer fagocitose, englobando partículas de pequenas dimensões (LOPES, 2007; GRUPO TÉCNICO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR, 2012). QUADRO 1 - REAÇÃO ESCALONADA NO HEMOGRAMA Granulócitos Porcentagem Valores absolutos Neutrófilos 58 a 65% 3.200 a 6.000 Promielócitos 0 0 Mielócitos 0 0 Metamielócitos 0 0 Bastonetes 2 a 5% 100 a 200 Segmentados 5 a 6% 370 a 400 Eosinófilos 2 a 4% 150 a 240 Basófilos 0 a 1% 40 a 80 Granulócitos Porcentagem Valores absolutos Linfócitos Adulto: 20 a 30% 1.200/ mm3 Crianças: 25 a 45% 2.000 a 3.500/ mm3 FONTE: LOPES, A. Exames Complementares – Parte A: Hemograma. In: KIGNEL, S. Estomatologia – Bases do diagnóstico para o clínico geral. Santos: Santos, 2007. p. 57-67. Inclusões anormais no Leucograma Blastos: células precursoras AN02FREV001/REV 4.0 28 – Linfoblastos: leucemia linfoide, linfoma – Mieloblastos: leucemia mieloide Inclusões citoplasmáticas que podem ser encontradas em neutrófilos: - Granulações tóxicas: quando há um aumento na produção dos granulócitos, há uma diminuição no tempo da maturação das células precursoras dosneutrófilos. Por isso, os neutrófilos aparecem no sangue com os grânulos primários. Estão presentes em casos de infecções. - Vacúolos: são estruturas resultantes da fagocitose. Podem aparecer nos neutrófilos e monócitos. Seu relato só é importante quando aparece nos neutrófilos e estão presentes em casos de infecções graves. 3.6.3 Série Plaquetária No hemograma, as plaquetas são observadas em relação à quantidade e ao seu tamanho. Seu número normal é de 150.000 a 400.000 por microlitro de sangue. Em valores menores que 150.000, observamos quadros de plaquetopenia, que se relacionam com riscos aumentados de sangramento. Definimos hemostasia como o conjunto de mecanismos fisiológicos que têm por finalidade a manutenção do sangue no interior dos vasos sanguíneos. Em uma pessoa normal, observa-se o equilíbrio entre a formação e a degradação dos coágulos decorrentes das injúrias vasculares. Para verificação de eventuais distúrbios de hemostasia, solicitam-se os seguintes exames, além da contagem de plaquetas: 3.6.3.1 Tempo de sangramento Expressa de forma menos sensível a avaliação qualitativa e quantitativa das plaquetas. É utilizado para avaliar anormalidades da interação plaqueta-parede AN02FREV001/REV 4.0 29 vascular, quer seja realizado pelo Teste de Duke ou pelo de Ivy; o TS é um teste pouco reprodutível e sujeito à grande número de variáveis. A solicitação de contagem das plaquetas é mais adequada, pois somente contagens abaixo de 90.000/mL alteram o tempo de sangramento. Atualmente, a realização dos exames de Tempo de Protrombina e Tempo de Tromboplastina Parcial Ativada praticamente extinguiu a solicitação do TS, por serem mais sensíveis. 3.6.3.2 Tempo de protrombina Possibilita avaliar a via extrínseca da cascata de coagulação. O princípio do teste baseia-se na adição no plasma de Ca (CaCl) e fator tecidual com posterior mensuração do tempo necessário para a formação do coágulo. Razão do tempo de protrombina = tempo de protrombina do paciente tempo do pool (normal) Para a padronização dos resultados emitidos por laboratórios diferentes (em função de diferentes kits), estabeleceu-se o International Normalizatted Ratio (INR). O ISI (Índice de Sensibilidade) varia de acordo com o kit utilizado. Valores de referência: 3 a 9 minutos 3.6.3.3 Tempo de tromboplastina parcial ativada É utilizado para o estudo da via extrínseca e comum da coagulação. O princípio do teste baseia-se na adição no plasma de Ca (CaCl) e fosfolípides purificados com posterior mensuração do tempo necessário para a formação do coágulo. A detecção pode ser feita de forma visual, mecânica ou óptica automatizada. Desta forma, os valores de referência podem variar conforme kit e população, situando-se geralmente entre 25 e 34 segundos. Para fins comparativos, calcula-se a Razão de Protrombina (RT). AN02FREV001/REV 4.0 30 Razão de Protrombina = Tempo de tromboplastina do paciente Tempo do pool (normal) Valores de referência: inferior a 60s (Nigro e Harada, 2013). Outros exames complementares que podem auxiliar no diagnóstico são provas de função renal (uria, creatinina) e hepática (proteínas séricas totais, transaminase glutâmico-pirúvica – TGP; transaminase glutâmico-oxalacética – TGO; bilirrubinas; gamaglutamiltransferase – GAMA - GT, hemoglobina glicada (Hb A1c), provas sorológicas para identificação de doenças infecciosas, inflamatórias e autoimunes, dentre outras condições (GRUPO TÉCNICO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR, 2012). 4 EXAMES COMPLEMENTARES: RADIOLOGIA (RADIOGRAFIAS CONVENCIONAIS, TOMOGRAFIA MÉDICA, TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA, FEIXE CÔNICO, ULTRASSONOGRAFIA, RESSONÂNCIA MAGNÉTICA) Os exames de imagem desempenham papel fundamental no diagnóstico ou no acompanhamento da resposta terapêutica de diversas doenças. Os exames de imagem que utilizam radiação ionizante devem ser solicitados com rigoroso critério de indicação, uma vez que a exposição a esse tipo de radiação pode causar alterações teciduais. Os efeitos biológicos nos tecidos podem ser classificados em determinísticos, que levam à morte celular, ou estocásticos, que ocorrem em função da alteração aleatória no DNA de uma única célula que continua a se reproduzir. Segundo Mancusi Sobrinho (2013), os exames de raios-X de crânio podem ser divididos em: AN02FREV001/REV 4.0 31 4.1 RADIOGRAFIAS CONVENCIONAIS 4.1.1 Panorâmicas A ampla cobertura de área examinada, a baixa dose de radiação e o pouco custo financeiro para o paciente são algumas das razões para a sua crescente aceitação. Em pacientes com alterações posturais, impossibilidade de locomoção e demências, a técnica é inviável, pois depende da colaboração do paciente. 4.1.2 Intraorais São as tomadas radiográficas na qual o filme é colocado no interior da cavidade oral para obtenção da radiografia. Apresentam dificuldade de realização em crianças, pacientes com dificuldade de compreensão ou com movimentos espásticos, no entanto podem ser utilizados recursos estabilizadores, como os posicionadores de filmes radiográficos, para facilitar a execução da técnica. Técnicas periapicais *Bissetriz: técnica na qual o feixe de raios-X deve incidir perpendicularmente à bissetriz do ângulo formado entre o filme e o dente. *Paralelismo: técnica na qual o feixe de raios-X deve incidir perpendicularmente ao filme e ao longo eixo dos dentes. Para isso são utilizados posicionadores para manter o filme paralelo ao longo eixo do dente. *Técnica interproximal: também conhecida como técnica de Bite-wing, por usar um filme provido de uma asa de mordida. Essas radiografias permitem melhor observação das faces mesial e distal dos molares e pré-molares, e de suas cristas marginais. Auxilia no diagnóstico de cáries e adaptações cervicais de restaurações proximais. AN02FREV001/REV 4.0 32 Técnica oclusal: geralmente é indicada como um exame complementar aos achados obtidos quando do emprego das técnicas periapicais. A radiografia oclusal permite melhor verificação dos tecidos ósseos das arcadas e da localização vestibular/palato. Pode ser utilizada no estudo de fraturas dos maxilares, pesquisa de sialolitos nos condutos de Wharton, nas mensurações ortodônticas para determinação do tamanho dos maxilares e no estudo de fendas palatinas. Podem ainda detectar supranumerários, corpos estranhos, lesões císticas, etc... 4.1.3 Laterais Tomadas radiológicas da mandíbula para o ângulo e ramo, da mandíbula para o corpo, da cabeça e lateral cefalométrica. São indicadas para avaliar lesões em corpo, ângulo e ramo ascendente da mandíbula. Posteroanteriores (PA): PA de mandíbula: utilizada para o diagnóstico de fraturas na cabeça da mandíbula, pois o tracionamento medial do côndilo é facilmente observado em tomada posteroanterior. PA de seios da face: indicada para diagnóstico de sinusopatias, especialmente em pacientes internados com dor em região maxilar ou neutropênico, na presença de dentes íntegros. Cefalométricas: solicitadas frequentemente pelos ortodontistas e raramente encontradas em hospitais. Axial para a base do crânio: axial invertida de Hirtz ou submento vértex. Oferece boa visibilidade da cabeça da mandíbula, sendo indicada quando um trismo impede a abertura da boca para PA de mandíbula e o objetivo é observar os côndilos. Permite ainda observação da base do crânio com nitidez. AN02FREV001/REV 4.0 33 4.2 TOMOGRAFIAS 4.2.1 Tomografia Linear Também conhecida como tomografia convencional, esta modalidade foi o primeiro método de obtenção de imagens tomográficas. Suas principaiscaracterísticas são formação da imagem diretamente em filmes radiográficos e várias projeções no mesmo filme. 4.2.2 Computadorizada Cone Beam Esse tipo de tomografia é realizado em tomógrafos específicos para crânio, como o Newton 3D e o Icat. O desenvolvimento desta nova tecnologia está provendo à Odontologia a reprodução da imagem tridimensional dos tecidos mineralizados maxilofaciais, com mínima distorção e dose de radiação significantemente reduzida em comparação à TC tradicional (SCARFE et al., 2006). 4.2.3 Computadorizada É um exame no qual a radiação emitida em torno de um plano anatômico do paciente é medida por um conjunto de detectores e processada por um computador. Dados numéricos de imagens contidos em cortes tomográficos adquiridos sequencialmente, no plano axial, permitem a reconstrução em outros planos (PARKS, 2000). Geram imagens em três dimensões, ajudando a observar os limites e dimensões das lesões. AN02FREV001/REV 4.0 34 4.3.4 Ultrassonografia A ultrassonografia (US) ou ecografia é um método exclusivamente anatômico, propiciando a realização da “macroscopia patológica” in vivo por meio de vibrações de alta frequência 7-10MHz que se refletem nas interfaces de tecidos de diferentes densidades. Essa técnica é utilizada principalmente nas patologias das glândulas tireoide e paratireoide, glândulas salivares e massas cervicais (FOP/UNICAMP, 2013) e as intensidades utilizadas para fins diagnósticos não produzem alterações nos tecidos que atravessa. 4.3.5 Ressonância Nuclear Magnética É considerada como um dos maiores avanços da medicina em matéria de diagnóstico por imagem neste século. Seus princípios são bastante complexos e envolvem conhecimentos nas mais diversas áreas das ciências exatas. A grande vantagem da RNM está na segurança, já que não usa radiação ionizante. Os prótons dos tecidos são submetidos a um campo magnético e tendem a alinharem- se contra ou a favor desse campo. O contraste da imagem em RNM é baseado nas diferenças de sinal entre distintas áreas ou estruturas que comporão a imagem. A RNM tem a capacidade de mostrar características dos diferentes tecidos do corpo com um contraste superior à tomografia computadorizada na resolução de tecidos ou partes moles. Apesar de grande aplicabilidade, a RNM tem algumas desvantagens. Por utilizar campos magnéticos de altíssima magnitude, é potencialmente perigosa para aqueles pacientes que possuem implantes metálicos em seus organismos, sejam marca- passos, pinos ósseos de sustentação, clips vasculares, etc. Esses pacientes devem ser minuciosamente interrogados e advertidos dos riscos de aproximarem-se de um campo magnético e apenas em alguns casos, com muita observação, os exames podem ser permitidos. Outra desvantagem está na pouca definição de imagem que a RNM tem de tecidos ósseos normais, se AN02FREV001/REV 4.0 35 comparada à tomografia computadorizada, pois esses emitem pouco sinal (FOP/UNICAMP, 2013). 5 NOÇÕES GERAIS DO ATENDIMENTO MULTIPROFISSIONAL Segundo Veloso (2005), o crescimento exponencial do conhecimento criou novas necessidades no mundo do trabalho. O autor destaca que, na Antiguidade, os sábios eram ao mesmo tempo filósofos, matemáticos, astrônomos, engenheiros, artistas, escritores, etc. Na área da saúde, até a primeira metade do século passado, poucos profissionais formalmente habilitados dominavam todo o conhecimento e exerciam todas as ações do setor. Nos tempos atuais, é totalmente impossível que apenas alguns profissionais exerçam, com toda eficiência necessária, o conjunto amplo e complexo das ações de saúde. As necessidades da demanda de saúde e o crescente desenvolvimento científico e tecnológico produziram estratégias e mecanismos para efetivar o trabalho em equipe, com qualidade e eficiência. Uma equipe de saúde pode ser definida basicamente como a associação de profissionais de formação distinta com o propósito básico de promover o cuidado de indivíduos em termos da saúde global dos mesmos. Nos últimos anos, o trabalho em equipe tem sido particularmente valorizado no contexto hospitalar, uma vez que a assistência a pacientes internados envolve a integração de práticas que demandam habilidades técnicas complementares (PERES et al., 2011). O trabalho em equipe consiste em uma modalidade de trabalho coletivo que se configura na relação recíproca entre intervenções técnicas e a interação dos agentes. No processo de trabalho em saúde, os profissionais constroem consensos que configuram um projeto assistencial comum, em torno do qual se dá a integração da equipe de trabalho (PEDUZZI, 2001; CAMELO, 2011). Este tipo de trabalho enseja a oportunidade de se construir uma visão global de cada situação, mediante uma interlocução entre os diferentes profissionais envolvidos no seguimento terapêutico, contribuindo para alcançar um melhor prognóstico para os pacientes hospitalizados. Profissionais com formação e tempo de experiência diferentes AN02FREV001/REV 4.0 36 podem contribuir de forma diversa para o desenvolvimento do trabalho em equipe (QUEIROZ e ARAÚJO, 2009; CAMELO, 2011). Podemos exemplificar a articulação das ações e dos saberes que se busca no trabalho multiprofissional a partir da descrição do caso hipotético de um paciente com Doença Falciforme, que é uma hemoglobinopatia. Sua sintomatologia varia de acordo com o genótipo da doença, mas se observam, com frequência, crises álgicas nos pacientes. Então vamos lá: temos uma criança de três anos de idade, que mama durante toda a noite, ingere alimentos com grande teor de açúcar e a mãe só escova os seus dentinhos uma vez por dia! Essa criança tem mais dois irmãos com a doença, que demandam internações constantes e a mãe se sente sobrecarregada. Como podemos conscientizar essa mãe quanto aos cuidados de higiene oral e sua importância? A única esperança é trabalhando multiprofissionalmente, com uma abordagem integrada. O envolvimento do psicólogo, médico, nutricionista e assistente social pode amenizar o impacto da doença nessa família e facilitar a assimilação e a disposição para que a mãe tenha maior cuidado com a condição oral da criança. Situações similares a esta se repetem diariamente nas instituições hospitalares. Os pacientes frequentemente agregam as dificuldades do seu cotidiano ao seu tratamento de saúde. A recuperação da dimensão cuidadora e a busca da integralidade na atenção à saúde são desafios colocados para a organização do cuidado no interior dos hospitais. Dentro do hospital, a atenção integral depende da conjugação do trabalho de vários profissionais, ou seja, o cuidado recebido pelo paciente é produto de grande número de pequenos cuidados parciais que vão se complementando, a partir da interação entre os vários cuidadores que operam no hospital (FUEERWERKER e CECÍLIO, 2007). O trabalho em equipe só é possível quando os trabalhadores constroem uma interação entre si, trocando conhecimentos e articulando um campo de produção do cuidado, já que este é comum à maioria dos trabalhadores de um hospital. Esse campo de cuidado, além da interação, possibilita, a cada um, usar todo o seu potencial criativo na relação com o usuário/paciente, para juntos produzirem o cuidado (FRANCO e MERHY, 2003, CAMELO, 2011). AN02FREV001/REV 4.0 37 Os cuidados com o equilíbrio e a autorregulação do organismo de um indivíduo no meio hospitalar exigem o trabalho de profissionais de diversas áreas da saúde, inclusive do Cirurgião-Dentista, que receberá destaque neste curso. A Odontologia Hospitalar permite melhor desempenho no compromisso de assistência ao paciente, uma vez que a prática visa aos cuidados das alterações bucais que demandam intervenções de equipes multiprofissionais nos atendimentos de alta complexidade.A Odontologia em si não poderia se isolar de outras profissões, e sim com- partilhar a sua responsabilidade com outros profissionais da saúde. Desde o início, a prática das profissões da área da saúde teve como objetivo diagnosticar e promover o tratamento das enfermidades. A expressão “arte de curar”, que todos costumam citar atribuindo-a à profissão médica, explica essa orientação. Portanto as profissões de saúde, além deste objetivo, buscam de forma paulatina a promoção de saúde como um todo, e, para tanto, é necessário uma gama de equipes multidisciplinares com enfoque preventivo (ARANEGA et al., 2012). Concordamos com Euzébio et al. (2013), que consideram que a incorporação do cirurgião-dentista à equipe multiprofissional pode contribuir para a visão holística que deve ser oferecida ao paciente hospitalizado, a fim de proporcionar o seu bem-estar e dignidade, prevenindo infecções, diminuindo o tempo de internação e o uso de medicamentos, tendo em vista que os problemas bucais interferem na saúde geral do indivíduo, assim como as alterações sistêmicas podem se manifestar na cavidade bucal. É imprescindível que, cada vez mais, a formação dos profissionais de saúde e, no âmbito deste texto, do cirurgião-dentista, contemple o “olhar” ao paciente como um todo, valorizando a perspectiva do respeito à multiprofissionalidade. FIM DO MÓDULO I 38 AN02FREV001/REV 4.0 38 PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA A DISTÂNCIA Portal Educação CURSO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR Aluno: EaD - Educação a Distância Portal Educação 39 AN02FREV001/REV 4.0 39 CURSO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR MÓDULO II Atenção: O material deste módulo está disponível apenas como parâmetro de estudos para este Programa de Educação Continuada. É proibida qualquer forma de comercialização ou distribuição do mesmo sem a autorização expressa do Portal Educação. Os créditos do conteúdo aqui contido são dados aos seus respectivos autores descritos nas Referências Bibliográficas. 40 AN02FREV001/REV 4.0 40 MÓDULO II 6 ABORDAGEM ODONTOLÓGICA EM PACIENTES HIPERTENSOS E CARDIOPATAS As cardiopatias constituem um grupo de doenças que afetam a capacidade do coração, como um todo, podendo ser classificadas como congênitas ou adquiridas. Esse grupo de doenças é responsável por altas taxas de mortalidade. Além disso, a morbidade associada compromete a qualidade de vida do paciente e o coloca em risco, no caso da realização de intervenções clínicas sem que o profissional possua o conhecimento adequado sobre seu quadro. 6.1 PRINCIPAIS CAUSAS DAS CARDIOPATIAS 1) Doença coronariana crônica; 2) Doença coronariana aguda; 3) Hipertensão arterial; 4) Doenças valvares; 5) Insuficiência mitral; 6) Doenças da valva aórtica; 7) Insuficiência aórtica. Não há um sintoma específico que permita a identificação precisa de uma cardiopatia, no entanto ao se avaliar o conjunto de sintomas e histórico do paciente é possível estabelecer uma hipótese diagnóstica consistente. O paciente que apresenta comprometimento cardiovascular necessita ser cuidadosamente avaliado pelos profissionais envolvidos no seu cuidado. No caso de intervenções odontológicas, todas as informações relativas à sua condição clínica devem ser 41 AN02FREV001/REV 4.0 41 atualizadas e, sempre que necessário, a programação para os procedimentos deve ser feita em conjunto com o cardiologista. Neste momento é importante avaliar os fatores de risco associados ao quadro preexistente, como história familiar de cardiopatias, estresse, obesidade, sedentarismo, dentre outras condições. Vale a pena chamarmos a atenção para o fato de que o atendimento odontológico provoca, em muitos pacientes, uma situação de ansiedade e estresse, que pode desencadear complicações nos pacientes cardiopatas, mesmo os assintomáticos. O cirurgião-dentista deve estar atento também para as condições do atendimento ao paciente cardiopata. Aspectos relacionados ao controle da dor, posicionamento da cadeira odontológica e a transmissão de conforto e segurança ao paciente pelo profissional terão impacto positivo no atendimento. 6.2 PREPARO PARA CIRURGIA CARDÍACA Em caso de pré-cirurgias de valvas cardíacas, pré-cirurgias paliativas ou de correção de cardiopatias congênitas, e ainda em pré-transplante cardíaco e/ou pulmonar, o cirurgião-dentista da equipe de odontologia hospitalar deve: • Realizar anamnese e exame clínico. • Solicitar exame de imagem. É essencial a radiografia panorâmica; as radiografias periapicais e a tomografia computadorizada são de caráter complementar. • Estabelecer plano de tratamento. Os pacientes que serão submetidos a cirurgias cardíacas devem estar com a cavidade oral livre de potenciais focos de infecção. A presença de cáries e comprometimento endodôntico ou periodontal pode levar à disseminação por via sanguínea dos micro-organismos envolvidos nesses casos e provocar septicemia, colocando o sucesso do tratamento e a vida do paciente em risco. O preparo odontológico prévio requer, além dos procedimentos curativos, a orientação ao paciente, incluindo sempre que possível um familiar, sobre os cuidados de higiene oral e modificações de hábitos deletérios para a saúde bucal. 42 AN02FREV001/REV 4.0 42 6.3 INFECÇÃO DAS VÁLVULAS CARDÍACAS OU TECIDOS ENDOTELIAIS DO CORAÇÃO Outra condição que merece atenção na prática odontológica é a possibilidade de ocorrência da endocardite bacteriana, pois infecções de origem odontológica estão entre possíveis causas da endocardite infecciosa. Procedimentos odontológicos, como cirurgias (exodontia, cirurgia periodontal) ou raspagem, provocam bacteremia e podem ser responsáveis pelo processo infeccioso. A endocardite bacteriana pode ser causada pela infecção do endotélio das válvulas ou das câmaras cardíacas, das artérias ou das próteses valvares. A patogenia da endocardite infecciosa envolve a formação de endocardite trombótica, a qual é posteriormente colonizada por bactérias, que podem ser oriundas de bacteremia. Os micro-organismos frequentemente envolvidos são Streptococcus viridans, Streptococcus bovis, estafilococos e enterococcus. As reações de defesa contra essa colonização completam o quadro. Protocolos de profilaxia antibiótica ainda são discutíveis, embora muitas instituições adotem as recomendações da Associação Americana de Cardiologia (GRUPO TÉCNICO DE ODONTOLOGIA HOSPITALAR, 2012; BORTOLOTTO et al., 2013). 6.4 ANTICOAGULAÇÃO Os anticoagulantes são medicamentos indicados para uso em situações como acidente vascular cerebral, trombose venosa profunda, fibrilação atrial, cardiopatias isquêmicas e válvulas cardíacas protéticas. Esses pacientes apresentam alto risco de hemorragias e, dependendo do procedimento, o uso do anticoagulante deve ser descontinuado alguns dias antes do tratamento odontológico, após discussão e planejamento em conjunto com o médico responsável pelo paciente. Os procedimentos odontológicos cirúrgicos precisam ser planejados de modo que o cirurgião-dentista tenha em mãos o exame RNI (índice de 43 AN02FREV001/REV 4.0 43 normalização internacional) recente. Se o RNI apresentar valor superior a 3,0 os procedimentos cirúrgicos odontológicos devem ser adiados e a dose deverá ser ajustada pelo médico. Deve ser realizada profilaxia antibiótica, no entanto é importante avaliar a possibilidade de interação dos antibióticos (bem como de anti-inflamatórios e analgésicos) com o anticoagulante. QUADRO 2 - CONTROLE DE ANTICOAGULAÇÃO ORAL PRÉ-INTERVENÇÃO ODONTOLÓGICA PROCEDIMENTO PRAZO RNI Dentística Não há necessidade de avaliaro RNI - Necropulpectomia Não há necessidade de avaliar o RNI - Biopulpectomia 30 dias até 3,0 Raspagem subgengival 15 dias até 3,0 Cirurgia periodontal 15 dias até 3,0 Cirurgia bucal 15 dias até 3,0 FONTE: BORTOLOTTO, L. A.; NEVES, I. L. I.; MONTANO, T. C. P. Cardiopatias: Complexidades envolvidas com procedimentos odontológicos. In: SILVA, Santos P. S.; VALENTE, Júnior L. A. Medicina Bucal: A Prática na Odontologia Hospitalar. São Paulo: Santos, 2013. p. 155-182. A hipertensão arterial sistêmica é um problema grave de saúde pública no Brasil e no mundo. Ela é um dos mais importantes fatores de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares, cerebrovasculares e renais, sendo responsável por pelo menos 40% das mortes por acidente vascular cerebral, por 25% das mortes por doença arterial coronariana e, em combinação com o diabete, 50% dos casos de insuficiência renal terminal. Com o critério atual de diagnóstico de hipertensão arterial (PA 140/90 mmHg), a prevalência na população urbana adulta brasileira varia de 22,3% a 43,9%, dependendo da cidade onde o estudo foi conduzido. Pacientes com hipertensão arterial sistêmica não diagnosticada ou mal controlada apresentam risco para sangramento após procedimentos cirúrgicos. Aqueles que necessitam de tratamento odontológico devem estar com a pressão arterial controlada, de 44 AN02FREV001/REV 4.0 44 preferência com níveis pressóricos inferiores a 140/90 mmHg (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2006). As sessões de atendimento devem ser curtas e a pressão arterial deve ser aferida, bem como a frequência cardíaca. É fundamental que seja realizado o controle da dor para que a pressão arterial não se eleve, tanto durante quanto após o procedimento. Para isso, precisamos que a técnica anestésica seja bem executada e o paciente tenha o adequado suporte medicamentoso, respectivamente. O uso dos anti-inflamatórios não esteroidais, frequentemente indicados após procedimentos odontológicos cruentos, requer cuidados, pois seu uso prolongado pode reduzir a efetividade da ação anti-hipertensiva de alguns medicamentos. 6.5 USO DE ANESTÉSICOS EM PACIENTES CARDIOPATAS A utilização de anestésicos não é uma contraindicação absoluta no caso de pacientes com algum tipo de cardiopatia. Nos casos em que o paciente apresenta risco elevado de complicações, como por exemplo, insuficiência cardíaca descompensada, recomenda-se a utilização de anestésicos sem vasoconstritores. No entanto, algumas desvantagens são associadas a esse procedimento, pois a ausência do vasoconstrictor pode aumentar o tempo de sangramento e diminuir o controle da dor, aumentando o tempo do procedimento e gerando mais tensão para o paciente. Por isso, sempre que for possível o uso do vasoconstrictor, deve-se dar preferência por sua utilização. Procedimentos clínicos e cirúrgicos podem ser realizados com lidocaína a 2%, com ou sem vasoconstrictor, avaliadas as razões para incluir a administração do vasoconstrictor. A escolha do uso do anestésico deve basear-se em: - tempo do procedimento; - necessidade de redução do sangramento local, para adequada visualização; - necessidade de prolongamento do período do bloqueio anestésico; 45 AN02FREV001/REV 4.0 45 - histórico clínico do paciente (BORTOLOTTO et al., 2013). 7 ABORDAGEM ODONTOLÓGICA EM PACIENTES PNEUMOPATAS Os pacientes pneumopatas são aqueles que apresentam algum tipo de doença respiratória, com aumento progressivo na dificuldade de realizar atividades diárias. Frequentemente a doença associa-se com cansaço e falta de ar, por isso é importante considerarmos esses sintomas no planejamento do atendimento ao paciente com alguma pneumopatia. No caso do paciente apresentar alterações respiratórias leves, recomenda- se que a cadeira odontológica esteja posicionada a 45°, facilitando a respiração pelo alívio da pressão sobre o tórax, o que permite que os pulmões se inflem de maneira adequada. Em algumas circunstâncias, não é possível realizar o atendimento em consultório sem a presença de oxigênio suplementar e nessas situações o tratamento deve ser realizado em ambiente hospitalar. A anamnese desse perfil de paciente precisa verificar, além da condição clínica atual, o uso de medicamentos como broncodilatadores ou corticoide, e a presença de outras comorbidades. Assim como em outros tipos de transplantes, os pacientes que serão submetidos ao transplante pulmonar deverão receber tratamento odontológico e orientação rigorosa no sentido da manutenção da saúde oral, com o objetivo de erradicar potenciais focos de infecção. Para os pacientes já transplantados, é necessário lembrarmos que: A avaliação médica é de fundamental importância para a realização de um plano de tratamento odontológico seguro; Pacientes apresentam aumento da susceptibilidade às infecções, pelo uso de medicações imunossupressoras; Recomenda-se a profilaxia antibiótica antes de procedimentos invasivos. 46 AN02FREV001/REV 4.0 46 8 ABORDAGEM ODONTOLÓGICA EM PACIENTES DIABÉTICOS O Diabetes Mellitus consiste em um grupo de doenças metabólicas caracterizadas, principalmente, pelo aumento excessivo da quantidade de glicose no sangue, fato que geralmente ocorre por conta da deficiência na produção de insulina pelo organismo, ou presença em menor quantidade de receptores de glicose nas células do corpo (CARNEIRO NETO et al., 2012). As manifestações orais variam segundo o estágio da doença e fatores como o controle do tratamento podem influenciar, sendo frequentemente observados: e hipossalivação; e ardência bucal; ; ; ; ; ; ; ; ; . Durante a consulta inicial é necessário identificar o tipo de diabetes e classificar o paciente de acordo o grau de risco para a conduta odontológica. Conhecer o nível glicêmico, a frequência de episódios de hipoglicemia e a pressão arterial do paciente são condições obrigatórias para evitar complicações. Um cuidado simples, mas que pode diminuir o estresse é o agendamento das consultas no início da manhã e com programação de tempo de atendimento curto. Em caso de consultas demoradas, devemos incluir na programação a interrupção do atendimento para refeição rápida e ida ao banheiro e avisar ao paciente para manter sua dieta e terapêutica normais antes da consulta, evitando quadros de hipoglicemia. 47 AN02FREV001/REV 4.0 47 É necessário assegurar que o paciente esteja tomando suas medicações. Por exemplo, se o paciente evita tomar o café da manhã, mas toma a dose normal de insulina, o risco de um episódio de hipoglicemia aumenta. Para alguns procedimentos, como a sedação consciente, o cirurgião-dentista pode requisitar que o paciente altere sua dieta normal antes do procedimento. Nestes casos, a dose da medicação pode necessitar ser modificada em consulta com o médico do paciente (FERNANDES et al., 2010). Ainda em relação às medicações, devemos sempre nos manter atualizados quanto às doses utilizadas e tempo de uso. Não podemos nos esquecer de também verificar se algum medicamento prescrito pelo cirurgião-dentista pode apresentar interação com a insulina. Podemos citar como exemplo que a utilização de anti- inflamatórios não esteroidais tem a capacidade de ocasionar quadros de hipoglicemia pela potencialização da ação da insulina. Quando for necessário prescrever analgésicos, devemos dar preferência à Dipirona ou ao Paracetamol. Outro aspecto de grande relevância no tratamento é que a glicemia capilar e a pressão arterial devem ser aferidas no início de cada consulta odontológica. Pacientes em jejum e com glicemia menor ou igual a 70mg/dl devem ter suas consultas remarcadas. Se o paciente não estiver com a doença controlada, o cirurgião-dentista não deverá executar nenhum procedimento eletivo. O uso de anestésicoscom vasoconstrictores é aconselhável, pelo seu efeito anestésico mais duradouro, diminuindo o estresse do paciente. Estes podem ser empregados com segurança na maioria dos pacientes diabéticos em condições estáveis. Entretanto, Barcellos et al. (2000) não recomendam o uso de soluções anestésicas contendo adrenalina, uma vez que este hormônio provoca a quebra do glicogênio em glicose, podendo ocasionar hiperglicemia. Além disso, como o paciente diabético está sujeito à isquemia por causa da microangiopatia, esta condição pode agravar-se quando a adrenalina for administrada. Vasoconstritores sintéticos do tipo felipressina (ANDRADE, 2000) ou anestésicos locais sem vasoconstritores podem ser utilizados com mais segurança. Quanto ao uso de antibióticos, este não é necessário nos procedimentos odontológicos de rotina, mas na presença de infecções bucais devem ser prescritos, pois frequentemente esses pacientes apresentam baixa resistência e retardo da cicatrização (FERNANDES et al., 2010). 48 AN02FREV001/REV 4.0 48 Antibióticos: Tratamento odontológico: - Pacientes compensados - não é indicada profilaxia antibiótica. - Doença mal controlada - mesmo na ausência de sinais de infecção, preconiza-se profilaxia antibiótica. - Não devem ser prescritos antibióticos sob a forma de suspensão oral que contenham glicose na sua composição (CARNEIRO NETO et al., 2012, REZENDE et al., 2013). Preferencialmente, indica-se o uso de Penicilina associada ou não, ao Metronidazol. No caso de pacientes com alergia à Penicilina, podemos lançar mão da Eritromicina ou da Clindamicina. 9 ABORDAGEM ODONTOLÓGICA EM PACIENTES NEFROPATAS O termo nefropatia refere-se à designação genérica de doença renal. Dentre elas, a insuficiência renal crônica é a mais grave e a que produz maior impacto ao organismo (SILVA et al., 2013). Esses pacientes requerem bastante atenção do cirurgião-dentista, pois apresentam, com frequência, diminuição na imunidade e consequente aumento no alto risco a infecções. Quando consideramos que a cavidade oral é sítio de grande variedade e quantidade de micro-organismos, esta região pode funcionar como porta de entrada dos mesmos – principalmente em presença de processos endodônticos, cáries e lesões periodontais – causando quadros de bacteremia e colocando a vida do paciente em risco. Além das manifestações sistêmicas que acometem o paciente com quadro de nefropatia, a cavidade oral pode ser diretamente afetada pelas alterações metabólicas e fisiopatológicas associadas à patologia e às suas modalidades terapêuticas. Várias alterações têm sido associadas à insuficiência renal e correlacionam-se com a gravidade da condição. Estima-se que 90% dos pacientes renais apresentarão sintomas orais (COSTA FILHO et al., 2006). 49 AN02FREV001/REV 4.0 49 Manifestações orais: ões do paladar pseudomembrana, que desaparece quando os níveis de ureia retornam ao normal) A partir do conhecimento da fisiopatologia da doença e compreendendo a complexidade do tratamento desses pacientes, o cirurgião-dentista da equipe de odontologia hospitalar deve: • Realizar diagnóstico e tratamento de lesões bucais decorrentes da disfunção renal. • Instituir programa de prevenção de cárie nos casos de xerostomia grave em pacientes dialíticos. • Caso haja necessidade de execução de procedimentos curativos, o cirurgião-dentista do serviço de odontologia hospitalar deve encaminhar o paciente para o serviço de odontologia de contrarreferência. A execução de procedimentos curativos deve ser feita no próprio hospital nos casos de urgência e/ou nos casos que suscitarem limitações locais e sistêmicas que justifiquem o atendimento hospitalar. Para procedimentos eletivos ou sem outras contra indicações formais, o atendimento pode ser realizado em consultório odontológico, desde que se faça o planejamento em conjunto com o médico responsável pelo paciente. Como a Odontologia é uma área que frequentemente se utiliza de fármacos em sua prática, é importante destacar que a insuficiência renal crônica está 50 AN02FREV001/REV 4.0 50 associada a alterações significativas na prescrição e no metabolismo de medicamentos. Grande número de drogas é eliminado do corpo pela excreção renal, que envolve filtração, secreção e reabsorção. A ligação de certas drogas a proteínas plasmáticas está reduzida na insuficiência renal ou pela redução na concentração de proteínas plasmáticas. Desta forma o nível total de droga pode ter uma variação terapêutica e a quantidade de droga livre (forma ativa) pode estar elevada (COSTA FILHO et al., 2006). 9.1 TRANSPLANTE RENAL 9.1.1 No Período Pré-Transplante O cirurgião-dentista da equipe de odontologia hospitalar deve: • Solicitar exame de imagem. É essencial a radiografia panorâmica; as radiografias periapicais e a tomografia computadorizada são de caráter complementar. • Realizar anamnese e exame clínico. • Estabelecer plano de tratamento. Caso haja necessidade de execução de procedimentos curativos que representem risco de complicações para o paciente durante e após o transplante, o cirurgião-dentista do serviço de odontologia hospitalar deve encaminhar o paciente para o serviço de odontologia de contrarreferência. É indicada avaliação odontológica pelo profissional do serviço de odontologia hospitalar após a conclusão do tratamento na unidade básica saúde/centro de especialidade odontológica e previamente ao início do transplante, com objetivo de confirmar a realização integral do procedimento odontológico solicitado. 51 AN02FREV001/REV 4.0 51 A execução de procedimentos curativos deve ser feita no próprio hospital nos casos de urgência e/ou nos casos que suscitarem limitações locais e sistêmicas que justifiquem o atendimento hospitalar. 9.1.2 No Período Pós-Transplante O cirurgião-dentista da equipe de odontologia hospitalar deve: • Realizar diagnóstico de lesões bucais nos pacientes imunossuprimidos. • Em caso de agravos na cavidade bucal que representem risco de complicações para o paciente nos primeiros seis meses após o transplante, executar os procedimentos nos casos de urgência e/ou nos casos que suscitarem limitações locais e sistêmicas que justifiquem o atendimento hospitalar. • Após seis meses do transplante, encaminhar o paciente para o serviço de odontologia de contrarreferência (unidade básica de saúde/centro de especialidades odontológicas). Alguns cuidados exercem papel fundamental na segurança do atendimento oferecido ao paciente com nefropatia. Um deles é, no caso de pacientes que são submetidos à diálise, que não se deve realizar procedimentos invasivos no mesmo dia. Essa orientação se deve ao fato de que se utiliza heparina durante o procedimento de diálise, com o objetivo de obter ação anticoagulante. Com relação à prescrição de antibióticos, é recomendável utilizar a menor dose efetiva, pelo menor tempo possível. A indicação é optar por antibióticos que tenham sua excreção por via hepática, como azitromicina e clindamicina. Por outro lado, a cefalexina e a penicilina devem ser evitadas, pois são excretadas pelos rins. Alguns medicamentos podem apresentar interação, comprometendo o sucesso da terapêutica e aumentando a morbimortalidade nos pacientes. O uso simultâneo de eritromicina e ciclosporina é contraindicado, visto que a eritromicina provoca um aumento na toxicidade da ciclosporina, provavelmente devido ao aumento da sua absorção. O uso concomitante de metronidazol e ciclosporina também é contraindicado, uma vez que o metronidazol reduz o metabolismo da ciclosporina, podendo resultar em nefrotoxidade (COSTA FILHO et al., 2006). 52 AN02FREV001/REV 4.0 52 Os anti-inflamatórios não esteroides devem ser evitados, pois