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1 Louyse Morais – Medicina – 108 Tratamento cirúrgico do câncer de mama O tratamento cirúrgico do câncer da mama começou em 1600-1700 já na Europa, onde já se existia a preocupação da cirurgia para os carcinomas de mama. A primeira mastectomia foi realizada em Alexandria, no ano de 180 d.C. Depois veio o Renascimento Europeu, com a Universidade de Oxford e Cambridge. Depois veio Jean Louis Petit, na França, com a mastectomia. Nessa época, pensava-se que o câncer de mama era uma doença local e que a cirurgia ampla curaria a paciente. No século XIX surgiram grandes cirurgiões – Paget (Inglaterra), Velpau (França) e Pancoast (EUA). William S. Hasted foi um cirurgião americano, papa da mastologia. A sua proposta de tratamento radical (mastectomia radical à Halsted) durou cerca de 100 anos. O cirurgião retirava toda a mama em monobloco, além dos músculos pequeno e grande peitoral e ainda se esvaziava a axila. Essa era a conduta que se conhecia para o tratamento do câncer até os anos 1950-1960. Por volta de 1950, surgiram novos cirurgiões. Em 1950, um cirurgião foi ainda mais radical, pois também retirou os mm. supra e infraclavicular, esvaziou a mamária interna – linfonodos atrás do esterno, e os linfonodos da região supraclavicular (Urban – 1950). Mastectomia Patey e Madden: esses cirurgiões estavam preocupados com o excesso de mutilação. Assim, buscavam melhores resultados estéticos, poupando os mm. Peitorais. Eram muito mais conservadores e muito menos mutilantes. Foi percebido que retirar toda a musculatura da região dificultava a mobilização do braço, especialmente o grande peitoral. Patey conservava o grande peitoral, e isso permaneceu até a década de 70. Quando chegou o Madden, ele preservou toda a musculatura em tumores que não a invadiam e colocou o pequeno peitoral para cima, fazendo apenas a remoção dos linfonodos axilares. Essa técnica durou até a década de 80. Tratamento cirúrgico radical • Mastectomia radical clássica (Halsted): remoção da mama, mm. Grande e pequeno peitoral, linfonodos axilares. • Mastectomia modificada (técnica Patey): remoção da mama, m. peitoral menor, linfonodos axilares. • Mastectomia modificada (técnica Madden): remoção da mama, linfonodos axilares. Cirurgias sub-radicais • Mastectomia preservadora de pele: reguarda a maior parte do envelope cutâneo, extrai o CAP. • Adenectomia mamária: remoção do corpo mamário, preserva o CAP. • Mastectomia total simples: remoção da mama, conserva os mm. Peitorais. Entendia-se na época de 1960/1970 que o câncer de mama era uma doença sistêmica e a cirurgia por si só não curava, quando começou a introduzir a quimioterapia adjuvante. O tratamento cirúrgico, ao longo dos anos, vem se modificando e sendo cada vez mais conservador, mutilando menos as pacientes. Depois, surgiram as quadrantectomias e as cirurgias subradicais – mastectomia preservadora de toda a pele que envolve a mama. Naturalmente, essas cirurgias têm uma indicação precisa, ou seja, não faz se o tumor comprometer a pele. Deve-se avaliar o tamanho do tumor e a proximidade dele em relação à pele e ao complexo aréolo-papilar (CAM). Assim, surgiu a adenomastectomia ou adenectomia mamária, que é a remoção apenas do tecido glandular da mama, preservando o CAM. Esses dois tipos de cirurgia não apresentam um estudo randomizado que comprove a segurança deles, mas há alguns critérios para que sejam indicados. Remoção da mama: mastectomia simples com a conservação do grande e pequeno peitoral. Nesse tipo de cirurgia, para indicar qual é a necessária para cada paciente, geralmente faz um tratamento individualizado. Primeiro, faz estadiamento do tumor, em tumores de até 2-3 cm as pacientes, naturalmente, vão ter uma indicação cirúrgica menos agressiva. Quando indicar mastectomia radical? • Tumores multicêntricos ou multifocais: quando tem vários focos (2-3 nódulos); em lesões com microcalficação sem tumor formado ainda, porque se consegue tirar todo o tecido glandular, e não deixa nenhum foco. A finalidade é retirar todos os focos de doença, pois, se ficar um, a paciente tem recidiva local. • Tumores pequenos com mama de volume reduzido: se a mama for muito pequena, ao retirar o tumor + a margem de 2 cm, fica com pouco tecido mamário para reconstituir a mama. Dessa forma, é melhor mastectomia com reconstrução mamária, pois o resultado estético supera. 2 Louyse Morais – Medicina – 108 • Impossibilidade de margens cirúrgicas livres no momento da cirurgia conservadora: se a lesão é única, deve-se avaliar até que ponto tem margem livre de doença com segurança para fazer quadrantectomia. Às vezes, ao ampliar as margens livres da mama, não se consegue obter margens livres de doença. Dessa forma, decide por mastectomia. • Carcinoma localmente avançado: definidos pelo tamanho do tumor e status da axila. Tumores acima de 4-5 cm, com axila clinicamente negativa (T3 ou T4), naturalmente, são candidatas à mastectomia e não à cirurgia conservadora. Tratamento cirúrgico conservador Por definição, são as chamadas quadrantectomias, em que se retira apenas 20% do conteúdo da mama. Em 1981, Umberto Veronesi, cirurgião italiano, lançou o primeiro protocolo randomizado europeu. Ele dizia que pacientes com tumores menores que 2 cm com axila clinicamente negativa são candidatas a cirurgia conservadora – quadrantectomia seguida de radioterapia e depois cirurgia plástica, para melhor resultado estético. Ele fez análise comparativa ao longo de dez anos. Depois, surgiram trabalhos comparando a sobrevida entre esses métodos cirúrgicos. As pacientes candidatas à cirurgia conservadora têm que estar dentro dos critérios, porque o que mais se temia na época era a recidiva local. Critérios para cirurgia conservadora • Seleção das pacientes • Princípios técnicos da cirurgia oncológica • Mínimo de radicalidade cirúrgica para controle local da doença • Margens cirúrgicas livres • Dissecção axilar seletiva • Biópsia do linfonodo sentinela • Radioterapia complementar • Resultado estético A seleção das pacientes tinha que levar em consideração o princípio da cirurgia oncológica: fazer segmento da mama; fazer controle local retirando o segmento; durante a cirurgia, fazer estudo das margens da lesão; fazer dissecção axilar seletiva; radioterapia complementar e sempre esperando bom resultado estético. Tempos operatórios • Incisão: obedecendo as linhas de força da pele; • Exérese do segmento: retirada do segmento; • Abordagem linfonodal: linfadenectomia; • Drenagem cirúrgica: dreno de vácuo aspiração; • Reconstrução mamária: retira segmento da mama e aproxima bordos da mama que ficaram, faz sutura o mais estética possível. Para ter uma segurança boa, avalia as margens cirúrgicas. Na época que Veranezzi fez o protocolo, se preconizava que a margem mais segura seria de 2 cm. Quanto maior a margem, menor a possibilidade de recidiva local. Só fazia cirurgia conservadora se tivesse patologista, o qual fazia, na hora da cirurgia, o estudo da margem cirúrgica, informando se elas estão livres ou não. A disponibilidade de patologista, especialmente em cidades de interior, não é boa, então se fazia em centros que dispusessem de um bom serviço anatomopatológico. Além da consideração das margens da pele, da borda e da pele tumoral (margens livres), é preciso considerar as margens profundas, em que se disseca até a margem profunda da fáscia do m. do grande peitoral. O ideal é que a lesão seja única, de baixo grau e circunscrita. A recidiva era menor em tumores de baixo grau. Em caso de componente intraductal intenso com lesão espiculada e tecido mamário denso, exige-se margens mais amplas. Situações de margens insuficientes até obter margens livres com ampliação pode resultar em mastectomia. Hoje emdia, é muito difícil de acontecer, porque outros recursos foram incorporados. Por exemplo, em mamas densas em pacientes jovens, pode-se fazer a ressonância magnética, que dá possibilidade de se estudar mais até onde vai a lesão. A RNM também possibilita ver focos não vistos na mamografia e USG. Para o tratamento conservador, o tumor tem que ser único. O tamanho da mama é importante, pois mamas grandes possibilitam resultado estético bom. Está contraindicado em tumores multicêntricos, como já falado. Seguimento Toda paciente que faz mastectomia ou cirurgia conservadora tem o seguimento. No pós operatório, o seguimento pode ser anual ou semestral. Geralmente pede que a paciente venha semestralmente nos dois primeiros anos, depois disso faz anual. O maior medo é a recidiva local, que aparece geralmente de 1 a 2 anos depois da cirurgia. Quando há alguma lesão, principalmente na sutura, com áreas de 3 Louyse Morais – Medicina – 108 fibrose e não se tem certeza se é recidiva local ou uma fibrose do manuseio cirúrgico, é melhor fazer uma biópsia. Faz RNM para o planejamento terapêutico no caso de recidiva local e a mastectomia de resgate. Quando se optou por tratamento conservador e depois a paciente recidivou, naturalmente ela é candidata ao procedimento de mastectomia de resgate. Antigamente, pensava-se que a sobrevida livre de doença era diferente em pacientes que já foram direto para a mastectomia, com sobrevida maior. Hoje em dia, sabe-se que fazer cirurgia conservadora e depois mastectomia de resgate não modifica a sobrevida, a desvantagem é apenas ter que submeter a paciente a dois procedimentos cirúrgicos. Mastectomia preservadora da pele: resultado estético muito bom pela conservação do CAM. Os tumores têm que ser pequenos, as mamas não podem ser muito volumosas, nem muito flácidas, pois estas têm excesso de pele. São candidatas as pacientes mais jovens, com inturgescência de pele muito boa e pele bem firme. Ao retirar o tecido glandular e colocar a prótese retromamilar, o resultado estético é muito bom. Geralmente, está indicado para tumores mais centrais. Não existe estudo randomizado comparando a eficácia dessas técnicas mais modernas em relação à mastectomia. Mastectomia preservadora Deve-se observar as margens cirúrgicas, principalmente se ocorrem na pele. O ideal é preservar a mama em envelope – preserva carta e deixa envelope mamário, em que a carta é o tecido glandular. Em tumores muito próximos da pele, esse tipo de cirurgia está contraindicado. Estudos mostram que pacientes com tumores de 2,5 a 3 cm, a possibilidade de recidiva é muito baixa. Durante a cirurgia, deve-se marcar a região retroareolar e chamar atenção do patologista para observar melhor essa região, pois a rede ductal é a que forma mais tumores. Toda cirurgia tem complicação – 3 a 9% dos casos. Quando se vai dissecando o plano, retirando o tecido glandular e deixando o tecido gorduroso abaixo da pele, muitas vezes, ao ser mais agressivo, compromete a vascularização da pele, o que causa necrose de pele e aréola. Tem que ser um cirurgião habilidoso e experiente. Por fim, avaliar necessidade de radioterapia adjuvante. Cirurgia da axila • Halstead: dissecção de toda mama e cadeia axilar, com máxima radicalidade; • Veronesi e Fisher (1980): tratamento conservador; • Giuliano (1994): biópsia do linfonodo sentinela; • Veronesi (1995): primeiro estudo randomizado com linfonodectomia axilar x BLS menor A princípio, até 1990, toda a axila era esvaziada, seja na mastectomia seja na cirurgia conservadora. Veronesi começou a estudar esse conteúdo axilar. Halstead sempre dissecava a axila em três planos e Veronesi e Fisher introduziram o tratamento conservador. Veronesi publicou o primeiro trabalho com biópsia do linfonodo sentinela. Ele, como pesquisador de oncologia, grande professor europeu, na época raciocinou da seguinte forma: observou que 80% das mulheres submetidas à quadrantectomia tinham a axila negativa, daí surgiu a pesquisa do linfonodo sentinela. Giuliano, em 1994, desenvolveu a biópsia do linfonodo sentinela, inicialmente para o melanoma no braço/perna. Ele esvaziava cadeia linfática da axila e da região inguinal da pele, então ele expandiu para a mama. Veronesi fez o mesmo estudo, porém com radioisótopo, e publicou em 1995 o primeiro estudo randomizado com linfonodectomia axilar x linfonodo sentinela. Ele preconizou a técnica do linfonodo sentinela para pacientes que tinham tumores menores que 2 cm e axila clinicamente negativa. Com o avançar do tempo, estudou mais a biópsia desse linfonodo. Hoje, praticamente, faz essa biópsia para qualquer paciente, independente do tamanho do tumor mamário, desde que a axila seja negativa. Isso gerou uma morbidade a menos, pois especialmente as pacientes obesas tinham edema do braço, que podia ser imediato ou tardio. O linfedema tardio era um transtorno na vida do paciente, com predisposição a erisipela, peso, incômodo pelo braço inchado etc. Nas pacientes magras, a chance do linfedema era menor, mas nas obesas, a chance era de 100%. Isso foi uma nova era para a cirurgia. Técnicas • Azul patente: corante que injeta na mama durante a cirurgia, podendo injetar na região peritumoral, no subcutâneo na pele ou retroareolar. A professora gosta do subcutâneo periareolar. Isso foi muito desenvolvido por Giuliano. 4 Louyse Morais – Medicina – 108 • Radioisótopo: feito por veronesi. Os resultados são iguais aos da azul patente, mas esse método é mais caro. Se a paciente for operar de manhã, manda ela injetar o tecnécio um dia antes, no dia seguinte tem uma sonda que coloca dentro da axila e vai até o linfonodo que causa mais barulho na sonda. O azul patente é um método mais barato, que dispensa rádioisótopo e não precisa de cintilografia. No serviço público, normalmente usa a azul patente. A técnica do linfonodo sentinela faz da seguinte forma: retira linfonodo, durante a cirurgia, manda para o patologista, que faz cortes na peça cirúrgica, congela, faz a citologia e pesquisa células neoplásicas. Se ele for positivo, imediatamente esvazia axila, se for negativo, não esvazia. • Complicações da cirurgia: Linfedema – incidência muito baixa, infecção, seroma, parestesia, lesões do plexo braquial. • Contraindicações: carcinoma inflamatório e axila clinicamente positiva (na dúvida se o linfonodo é metastático ou reacional, faz biópsia por PAAF). • Indicações: axila clinicamente negativa. Cirurgia da axila – conduta • Linfonodo negativo (citologia negativa ou micrometástase); • Axila clinicamente ou citologia/patologia positiva – linfadenectomia. Biópsia do linfonodo sentinela positiva • 1-2 LS+: linfadenectomia pode ser omitida, tumor < 5 cm, axila negativa, cirurgia conservadora, RT convencional na mama. • 3 ou LS+: linfoadenectomia. Hoje em dia, é discutível se é preciso remover os linfonodos de toda a axila ou não. O estudo mais promissor, que hoje é protocolo, indica que se houver 1 ou 2 linfonodos sentinela positivo pode ou não fazer a linfoadenectomia (alguns autores, consideram não fazer se for apenas um positivo). Em 3 ou mais, faz linfoadenectomia. Cirurgia da mama: retirar sempre a peça em monobloco, faz incisão elíptica (incisão Halstead). Lembrar da cauda de Spence. O patologista, ao encontrar os linfonodos, congela-os e vai “catando”. Quanto mais linfonodos forem congelados e retirados, mais o esvaziamento foi bem feito. Importância da anatomia da mama: ao fazer o esvaziamento da axila, o contraste entra no primeiro linfonodo que incorporaria a metástase. Se ele estiver negativo, teoricamente, os outros também estão. Pode acontecer uma metástase rara que pula esse primeiro linfonodo. A imagem acima é para mostrar a incisão da mastectomia,que é transversal, também chamada de incisão de Stuart. A foto mostra a retirada de um retalho de pele, com mais ou menos 1 cm de gordura. Retalhos muito grossos deixam muito tecido glandular encostado na gordura. Para dissecar, normalmente usa bisturi elétrico. O tecido brancacento é o tecido glandular. 5 Louyse Morais – Medicina – 108 Cavo da axila: vasos da axila, pinçando os vasos para depois cortar com bisturi elétrico ou fio. Usa normalmente fio de algodão para vasos mais calibrosos, para microvasos, usa bisturi elétrico. Acima, resultado final. Faz as suturas das bordas da pele, usa um dreno de vácuo-aspiração para drenar toda a secreção, pois tem muito tecido gorduroso. Enquanto não cicatrizar 100%, há muita secreção serosa saindo do dreno. Acima, cirurgia conservadora – quadrantectomia. Centraliza o tumor no quadrante, faz incisão elíptica, manda para o patologista para ele dizer se é necessário ampliar borda. Acima, biópsia do linfonodo sentinela.