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1 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 Pneumologia DERRAME PLEURAL Pleura e Cavidade Pleural: A pleura é formada por duas membranas serosas, uma que recobre o pulmão (pleura visceral) e uma que reveste a face interna da parede torácica (pleura parietal). A cavidade pleural, considerada virtual, em condições normais contém uma pequena quantidade de líquido (0,1 a 0,2 ml/kg). O líquido apresenta função lubrificante, diminuindo a aderência e melhorando o deslizamento entre os folhetos pleurais. Os dois folhetos pleurais são formados por duas camadas: mesotelial e submesotelial. - Camada Mesotelial: formada principalmente por células mesoteliais, além de monócitos, macrófagos e raramente neutrófilos. - Camada Submesotelial: dividida em 4 compartimentos. → Lâmina basal. → Membrana elástica. → Tecido conjuntivo frouxo. → Tecido fibroelástico profundo. O líquido entra no espaço pleural por meio dos capilares sanguíneos da pleura parietal e é drenado por meio dos vasos linfáticos da pleura parietal. O líquido também pode entrar no espaço pleural por meio dos espaços intersticiais do pulmão através da pleura visceral ou por meio da cavidade peritoneal através de pequenos orifícios existentes no diafragma. Derrame Pleural: - A produção de líquido é maior que sua absorção. - Produção excessiva de líquido pleural (proveniente dos espaços intersticiais do pulmão, da pleura parietal ou da cavidade peritoneal), ou diminuição da absorção por meio dos vasos linfáticos. - A insuficiência cardíaca é a principal causa de derrame pleural. Mecanismos: Os mecanismos mais frequentes que causam acúmulo de líquido na cavidade pleural são: - Aumento da pressão hidrostática sobre o folheto visceral → insuficiência cardíaca congestiva. - Diminuição da pressão oncótica → hipoproteinemia/hipoalbuminemia. - Aumento da concentração de K+ → processos inflamatórios ou infecciosos. - Obstrução da circulação linfática → neoplasias malignas metastáticas. Sintomas: Os sintomas dependem de muitos fatores: - O volume e a velocidade de formação do derrame pleural. - A reserva cardiopulmonar do paciente. - A existência ou não de processo inflamatório (o grau e o tipo de inflamação). - O tipo e a extensão da doença primária. Tríade de Sintomas: Dor Torácica + Tosse + Dispneia Dor Torácica: - Ventilatória-dependente. - Bem localizada. - Pontadas. - Intensidade moderada. Tosse: - Seca. - Esporádica. - Pouco intensa. 2 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - Causada por estímulos inflamatórias na pleura parietal ou por colapso das paredes dos brônquios adjacentes ao derrame pleural. Dispneia: - Multifatorial. - Relacionada mais com o tempo de aparecimento e com a velocidade de acúmulo do derrame do que propriamente com o seu volume. Exame Físico: - As alterações são notadas quando há no mínimo 300 mL de líquido na cavidade pleural. - Taquipneia pode estar presente nos derrames volumosos, mas a respiração pode ser superficial mais frequente devido apenas à dor. - Expansibilidade torácica diminuída no lado do derrame pleural. - Frêmito toracovocal diminuído no lado do derrame pleural. - Macicez à percussão do tórax, o que possibilita delimitar no exame físico a área do derrame pleural. - Ausculta: murmúrios vesiculares diminuídos ou abolidos, atrito pleural e sopro pleurítico. Exames de Imagem: Radiografia de Tórax: - Três incidências principais: PA, perfil e decúbito lateral. - Avalia se o derrame está livre na cavidade pleural ou loculado (preso). - O derrame pleural bilateral está associado a transudato, tuberculose de disseminação hematogênica, neoplasia metastática e colagenoses. - O derrame pleural volumoso que ocupa todo ou quase todo o hemitórax geralmente é neoplásico. - O derrame pleural lobulado costuma ser infeccioso. - Massa intrapulmonar, adenomegalias mediastinais e lesões osteolíticas favorecem o diagnóstico de neoplasia. - Lesões pulmonares em lobos superiores (micronódulos, nódulos e estrias) favorecem o diagnóstico de tuberculose. - O raio X de tórax em decúbito lateral permite visualizar se o derrame pleural está livre ou restrito a alguma área (loculado). - O derrame pleural é medido no raio X de tórax em decúbito lateral. A toracocentese é realizada apenas se a medida da distância do derrame pleural até a parede torácica for maior que 1 cm. Tomografia Computadorizada de Tórax: - Diferencia o derrame pleural causado por lesões sólidas pleurais e por doenças pulmonares. - Não diferencia exsudatos de transudatos, pois ambos apresentam densidades muito semelhantes. - A TC com contraste possibilita diagnosticar os empiemas, que são mais densos devido à presença de pus e causam espessamento pleural. Ultrassonografia de Tórax: - Utilizada para guiar a toracocentese, principalmente em derrames pleurais pequenos, além de identificar a presença de fibrina ou debris, sinais compatíveis com derrame pleural complicado ou loculado. Toracocentese: - O derrame pleural de etiologia desconhecida exige a realização de uma toracocentese diagnóstica. - Em casos de etiologia conhecida ou altamente provável (insuficiência cardíaca congestiva por exemplo), devemos tratar a causa e aguardar até 3 dias para melhora. - A toracocentese é realizada apenas quando o derrame pleural apresenta mais de 1 cm (ou 10 mm) de altura no raio X de tórax em decúbito lateral. - A toracocentese é realizada em ambiente ambulatorial, com o paciente preferencialmente sentado, com os braços apoiados sobre um anteparo na altura dos ombros, sob anestesia local e utilizando uma agulha fina. - Sempre que disponível, devemos utilizar a ultrassonografia para guiar a toracocentese, 3 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 pois ela identifica a localização exata do derrame pleural, para que a punção seja realizada. Quando a ultrassonografia não está disponível, devemos utilizar a ausculta e a percussão para identificar a localização do derrame pleural. - Devemos evitar realizar a punção abaixo do 9º EIC, devido ao risco de punção abaixo do diafragma (cavidade abdominal). - A introdução da agulha deve ser realizada na borda superior do arco costal inferior, devido ao risco de lesionar o feixe vasculonervoso (artéria, veia e nervo intercostal) localizado na borda inferior de cada arco costal. - A toracocentese geralmente é realizada entre a linha axilar posterior e a coluna vertebral. - A toracocentese geralmente é realizada em 3 situações: → Diagnóstica: coleta de pequena quantidade de líquido pleural para análise. → Alívio: retirada de grande quantidade de líquido pleural para alívio dos sintomas relacionados a um derrame pleural volumoso (principalmente dispneia). → Descompressiva: pneumotórax hipertensivo para melhora rápida dos sintomas até a realização da drenagem torácica. - Devemos solicitar TP e contagem de plaquetas antes de realizar a toracocentese para evitar complicações. - Podemos drenar no máximo 1,5L de líquido a cada procedimento. Se drenarmos volume maior, o paciente pode desenvolver edema pulmonar de reexpansão. Contraindicações à Toracocentese: - RNI > 1,5. - Plaquetopenia. - Anticoagulação. - Pequeno volume de líquido. Complicações da Toracocentese: - Pneumotórax. - Hemotórax. - Infecção do líquido pleural. - Edema pulmonar de reexpansão (quando retira-se mais de 1,5 L de líquido). Biópsia com agulha de Cope: - Biópsia da pleura parietal utilizando uma agulha específica (agulha de Cope). - Para a biópsia ser efetiva, deve haver a coleta de no mínimo 5 fragmentos de pleura parietal. Aspecto do Líquido Pleural: - Sanguinolento: neoplasia, trauma. - Turvo: lipídios, excesso de proteínas ou células. - Leitoso: quilotórax. - Purulento: empiema. Celularidade: - Células polimorfonucleares (neutrófilos) > 50%: processoinflamatório agudo, derrame pleural parapneumônico, pancreatite. - Linfócitos > 50%: neoplasia, tuberculose, linfoma. Exames Laboratoriais: - Proteínas. - Glicose. - Desidrogenase láctica (DHL). - Adenosina deaminase (ADA): solicitar apenas quando há suspeita de tuberculose. - pH. - Análise citológica. - Celularidade. - Cultura. 4 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 Dosagem Sérica: - Proteínas totais. - Glicose. - DHL. Critérios de Light: Transudato: → ICC: aumento da pressão hidrostática. → Cirrose Hepática, Síndrome Nefrótica e Desnutrição: diminuição da pressão coloidosmótica (oncótica). Insuficiência Cardíaca: - A insuficiência ventricular esquerda é a causa mais comum de derrame pleural por transudato. - Quantidade aumentada de líquido nos espaços intersticiais do pulmão maior que a capacidade de remoção do líquido pelos vasos linfáticos da pleura parietal. - O derrame pleural causado por ICC normalmente é bilateral. - Devemos tratar a causa do derrame pleural, ou seja, a ICC, por meio de diuréticos, como a furosemida. - A toracocentese deve ser realizada apenas se o paciente apresenta dor torácica ou febre (ou outros sinais de infecção), se o derrame pleural não é bilateral ou não há cardiomegalia ou se não houver resposta ao tratamento com diurético. Hidrotórax Hepático: - Aproximadamente 5% dos pacientes com cirrose hepática e ascite têm derrames pleurais. - O principal mecanismo responsável é a passagem direta do líquido peritoneal para o espaço pleural por meio dos pequenos orifícios existentes no diafragma. - O derrame pleural localiza-se à direita e frequentemente é volumoso a ponto de causar dispneia. - Geralmente, devemos realizar toracocentese. Exsudato: Parapneumônico: - Associado à infecção pulmonar (pneumonia ou abcesso pulmonar). - Aproximadamente 20% das pneumonias cursam com derrame pleural. - 60% das pneumonias mais graves e extensas, que demandam internação hospitalar, apresentam derrame pleural. - Devemos identificar precocemente o comprometimento pleural. - Determinar se o derrame pleural é complicado ou não complicado apresenta grande impacto no desfecho clínico dos pacientes. - Quando há suspeita clínica de derrame parapneumônico, devemos realizar uma toracocentese diagnóstica. - Líquido: seroso, turvo ou purulento. - Celularidade: inflamação neutrofílica. - O pH do líquido pleural é um dos parâmetros utilizados para definir se há indicação ou não de uma toracocentese. 5 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - Níveis de glicose entre 40 e 60 mg/dL e DHL > 1000 UI/dL ajudam a determinar a gravidade e a necessidade de drenagem torácica. - A análise microbiológica deve ser realizada rotineiramente e não deve atrasar o início da antibioticoterapia ou de outras condutas pertinentes ao se aguardar o seu resultado. - O tratamento baseia-se na administração precoce de antibióticos. - Caso o tamanho do derrame pleural possibilite a realização da toracocentese, devemos realizar o procedimento, visto que ele ajuda a orientar o diagnóstico do agente infeccioso pleural e também é considerado uma medida terapêutica. - A existência de pus na cavidade pleural confirma o diagnóstico de empiema. Nesse caso, o paciente deve realizar drenagem torácica no bloco cirúrgico. - Abordagens cirúrgicas mais invasivas: → Videotoracoscopia ou decorticação por toracotomia. → Indicadas em caso de drenagem pleural prolongada, existência de várias locais com derrame pleural, expansão pulmonar inadequada, fístula persistente com cavidade residual e para melhor higiene da cavidade pleural. - O derrame pleural loculado apresenta maior densidade/espessamento devido ao maior número de células inflamatórias. Tuberculose: - A tuberculose pleural é a forma mais comum de tuberculose extrapulmonar no adulto. - É uma das principais causas de derrame pleural. - Quadro Clínico: sintomas clássicos da tuberculose (tosse há mais de 3 semanas, sudorese noturna e febre vespertina) ou apenas uma síndrome aguda caracterizada por tosse, febre, dispneia e dor torácica. - Líquido pleural: citrino, mas, em raras situações, pode ser hemorrágico. - Exsudato altamente proteico (proteínas > 4,5 g/dL), com níveis de DHL elevados. - A dosagem da adenosina deaminase (ADA) está aumentada. Entretanto, derrames pleurais causados por linfomas, artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico e empiema também podem cursar com níveis aumentados de ADA. - Celularidade: predomínio de linfócitos. - O rendimento diagnóstico da cultura é melhor no fragmento pleural (positividade de aproximadamente 60%). - A pesquisa de BAAR no escarro não deve ser negligenciada, pois não é infrequente haver tuberculose pulmonar e pleural concomitantes. - A biópsia pleural pode apresentar padrões morfológicos variáveis, desde exsudativo até granulomatoso completo ou incompleto, assim como exibir bacilos. - O padrão-ouro para o diagnóstico de tuberculose pleural é o isolamento do 6 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 Mycobacterium tuberculosis em escarro ou em líquido ou fragmento pleural. - A biópsia pleural pode evidenciar granulomas. - O tratamento da forma pleural da tuberculose baseia-se no uso de 4 fármacos (rifampicina, isoniazida, pirazinamida e etambutol) por 2 meses, seguido de rifampicina e isoniazida por 4 meses. Neoplasia: - Derrames pleurais malignos representam o um estágio avançado da doença neoplásica. - Em até 25% das vezes, o derrame pleural é a primeira apresentação do câncer. - O pulmão é o sítio primário mais frequente: 1 em cada 4 pacientes com câncer de pulmão desenvolve derrame pleural maligno. - Os três tumores, responsáveis por aproximadamente 75% dos casos, são pulmão, mama e linfoma. - O líquido pleural pode ser um transudato (síndrome da veia cava, lesão obstrutiva endobrônquica com atelectasia pulmonar) ou um exsudato. - O aspecto do líquido varia de amarelo-claro até visivelmente hemorrágico. - Celularidade: predomínio de linfócitos. - A citologia oncótica pode confirmar na primeira análise a existência de células neoplásicas em até 65% dos casos. - A avaliação histológica do fragmento pleural por meio de biópsia fechada com agulha de Cope ou por via cirúrgica continua a ser necessária para obter o diagnóstico de neoplasia e identificar o tipo histológico do tumor. - O manejo do derrame pleural maligno recidivante baseia-se principalmente no controle dos sintomas, visto que nenhuma intervenção indicou melhorar a sobrevivência dessa população. - Apenas pacientes que obtiverem alívio de seus sintomas com a toracocentese devem realizá-la. - As duas principais abordagens terapêuticas são: → Pleurodese. → Drenagem crônica da cavidade pleural por meio de um cateter de longa permanência. Mesotelioma: - Tumor primário que se origina das células mesoteliais que revestem a cavidade pleural. - A maioria está associada com a exposição ao asbesto. - Principais sintomas: dor torácica e dispneia. - A toracoscopia ou a biópsia pleural aberta geralmente são necessárias para confirmar o diagnóstico.
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