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A ROTINA NA EDUCAÇÃO INFANTIL Nesta aula, vamos estudar um assunto que faz parte de todo planejamento e que dá segurança ao professor na hora de atuar com as crianças,trata-se da rotina na Educação Infantil. Quando falamos em rotina, nesse contexto, não nos referimos ao hábito de fazer a mesma coisa todo dia, quase que de forma mecânica. Estamos falando da estrutura básica, da espinha dorsal das atividades do dia, e cujos assuntos, que vão completar essa estrutura, vão sendo alterados de acordo com cada programação. Por isso, é importante termos muito cuidado para não cair na mesmice. A rotina diária é, portanto, o desenvolvimento prático do planejamento.É também a sequência de diferentes atividades que acontecem no dia a dia da creche e é essa sequência que vai possibilitar que a criança seoriente na relação tempo-espaço e se desenvolva. Quando a estrutura da rotina é mantida, a criança pode se apropriar dela e, conhecendo seu andamento, dar sugestões, propor mudanças, ficar contente com a aproximação de uma atividade muito apreciada. É importante termos consciência de que a criança é capaz de se situar no tempo, e de saber distinguir os diferentes momentos que existem na creche durante o dia. Uma rotina adequada é um instrumento construtivo para a criança,pois permite que ela estruture sua independência e autonomia, além de estimular a sua socialização. Podemos perguntar: qual é a melhor rotina para crianças de um determinado grupo? Como devemos organizar as atividades diárias? Vamos discutir, então, questões relativas à organização das atividades no tempo. Para isso, vamos nos basear no texto de Maria Carmen Barbosa e Maria da Graça Horn, cujo título é Organização do Espaço e do Tempo na Escola Infantil. Na página 68 desse texto, temos a seguinte afirmação: O cotidiano de uma Escola Infantil tem de prever momentos diferenciados que certamente não se organizarão da mesma forma para crianças maiores e menores. Diversos tipos de atividades envolverão a jornada diária das crianças e dos adultos: o horário da chegada, a alimentação, a higiene, o repouso, as brincadeiras – os jogos diversificados – como o faz de conta, os jogos imitativos e motores, de exploração de materiais gráfico e plástico – os livros de histórias, as atividades coordenadas pelo adulto e outras. Ainda nesse texto, as autoras falam que todos os momentos da rotina das crianças precisam permitir inúmeras experiências. Assim, para organizar essas atividades no tempo, é fundamental levar em consideração três diferentes necessidades das crianças: As necessidades biológicas, como as relacionadas ao repouso, à alimentação, à higiene e à sua faixa etária; as necessidades psicológicas, que se referem às diferenças individuais como, por exemplo, o tempo e o ritmo que cada um necessita para realizar as tarefas propostas; as necessidades sociais e históricas que dizem respeito à cultura e ao estilo de vida, como as comemorações significativas para a comunidade onde se insere a escola e também as formas de organização institucional da escola infantil. (BARBOSA; HORN, 2001, p. 68). É interessante aqui reforçar a ideia de que a rotina deve prever pouca espera das crianças, principalmente durante os períodos de higiene e de alimentação. E o que é possível fazer para que isso não ocorra? A espera pode ser evitada se organizarmos a nossa sala de aula de maneira que a criança tenha a possibilidade de realizar outras atividades, de forma mais autônoma, tendo livre acesso a espaços e materiais, enquanto o professor está atendendo uma única criança. Vejamos o que diz o texto da Secretaria do Menor. O cotidiano na pré-escola (SECRETARIA DO MENOR, 1990 p. 73) O dia não é uma massa amorfa de momentos infindáveis, mas uma sequência organizada e flexível. Da mesma forma que subdividir a área da creche/pré-escola em salas que favoreçam agrupamentos menores contribui para a criação de um espaço seguro e aconchegante, subdividir o tempo. No livro Creches: crianças, faz de conta & cia., de Zilma de Oliveira e sua equipe, afirma-se a ideia de que podemos organizar as atividades realizadas durante o dia na creche/pré-escola em quatro grupos: organização coletiva, atividades de cuidado pessoal, atividades dirigidas e atividades livres. Vamos agora falar sobre cada um dos grupos de atividade. Atividades de organização coletiva Esses momentos de atividades organizadas coletivamente são vividos diferentemente pelas várias turmas de crianças. As crianças menores necessitam mais da atenção dos adultos para tomarem parte das atividades de modo tranquilo. Para tanto, mais uma vez a organização prévia do ambiente e o planejamento dessas atividades se fazem necessários. Podem ser diferentes atividades para livre escolha. As crianças definem o que desejam fazer, e para isso é necessário que o ambiente, em termos de materiais e espaços, dê condições. Isso não significa que o professor não deva intervir e acompanhar o que as crianças decidem fazer, ao contrário, é esse um momento adequado para interações e observações em relação às crianças. Vamos ler um texto da revista Creche/Pré-Escola – Secretaria do Menor – 3 anos de experiência (São Paulo) que nos fala sobre o cotidiano do berçário:(SECRETARIA DO MENOR, 1990, p.63) [...] A proteção que o berçário requer não significa isolamento, pois osbebês podem ser reagrupados para participarem de atividades conjuntas com outras crianças. [...] O cotidiano no berçário se desenrola em torno de uma série de atividades que têm por função alimentar, garantir higiene e repouso, estimular a autonomia e o desenvolvimento além de oferecer apoio afetivo a bebês que são pessoas singulares, com necessidades próprias à idade, e que na creche/pré-escola vivem em grupo. Por exemplo, um educador percebe que uma criança que já almoçou está quase dormindo no cadeirão. A boa organização do berçário dá conta de levar essa criança para dormir, independentemente do horário do almoço não ter terminado e de outras crianças estarem almoçando. Ao mesmo tempo, favorece que as outras crianças que não almoçaram tenham uma atividade e não fiquem apenas esperando pelo almoço. [...] As atividades do berçário ligadas à higiene e à alimentação ocupam um longo tempo no dia. Mas os bebês necessitam, para seu desenvolvimento adequado, de atividades pedagógicas sistematizadas e intencionais. Vivendo parte do dia em ambiente coletivo, é comum em algumas creches, que o bebê seja esquecido no berço no período entre os cuidados. Ainda é prática, entre nós, que a rotina diária dos bebês seja mamar – arrotar – trocar – dormir e entre uma ação e outra esperar... O bebê é visto como um tubo digestivo, sem outros desejos ou necessidades. Ora, essa não é a concepção de bebê entre muitos psicólogos e pedagogos que insistem sobre a riqueza de sua vida e a velocidade de suas aprendizagens. O olhar que não acompanhava o objeto que se desloca, logo é controlado e o bebê segue o deslocamento de sua mãe, do educador. O rosto do adulto privilegiado, daquele que cuida, até há pouco impessoal, é agora reconhecido e o bebê teme seu desaparecimento. Já as crianças maiores podem participar na própria organização das atividades. Uma festa, por exemplo, é uma atividade coletiva que pode ser organizada junto com as crianças. O mesmo pode ser feito com relação a um passeio, uma visita fora da instituição. É muito importante ouvir as crianças, muitas vezes elas podem nos surpreender com grandes ideias e com um senso de respeito e de ordem maior do que podemos imaginar. Até mesmo do ponto de vista do tempo, os adultos se ocupam muito para dobrar roupas, arrumar as camas, pois a ideia que predomina é a de que o adulto deve fazer essas tarefas pelas crianças. É certo que, para a criança do berçário, a dependência existe, mas as crianças maiores podem ser estimuladas a assumir pequenas tarefas de cuidar de seus objetos. Atividades de cuidado pessoal Não devemos separar o “cuidar” do “educar”. Todos os momentos podem ser pedagógicos e de cuidados no trabalho com crianças pequenas. Tudo dependede como pensamos e realizamos as nossas ações. Uma das preocupações básicas das atividades de cuidado pessoal é com a saúde, entendendo a saúde como sendo o bem-estar físico, psicológico e social da criança. A higiene, o sono e a alimentação são algumas das principais condições para a sua vida, especialmente quando se trata de viver em coletividade com adultos e crianças, como é o caso das creches. Nesses ambientes, é muito fácil a transmissão de doenças, já que várias pessoas manuseiam os objetos, utilizam os mesmos banheiros etc. Por isso, é necessária uma atenção maior em relação à limpeza e aos hábitos adequados de higiene. Isso não quer dizer que se deva conter as crianças nas brincadeiras e impedir que elas se sujem. Saúde também significa o prazer e a alegria que, para as crianças, manifesta-se pela liberdade para brincar e se sujar enquanto brincam. Crianças a partir dos dois anos podem realizar de forma independente atividades como: lavar as mãos e o rosto, escovar os dentes etc., com a devida participação e orientação do professor. Também a alimentação é muito importante e não deve ser encarada como momento de dificuldade e de tensão. Na tentativa de proporcionar à criança uma alimentação variada, rica em proteínas etc., alguns professores acabam obrigando a criança a comer, mesmo que ela não goste ou não esteja com vontade. É importante observarmos alguns detalhes, tais como: o uso do guardanapo (importante se queremos que as crianças comam com educação), a utilização correta dos talheres, e a ingestão de líquidos no momento adequado. Outro aspecto muito negativo é o fato de se levar para os refeitórios um número muito grande de crianças no mesmo horário (café/almoço/lanche/ jantar). Surgem daí muitas dificuldades. Devemos então compor grupos menores e fazer escala de horários. Uma ideia interessante é contar com o auxílio de algumas crianças durante as refeições: eles adoram ajudar a servir. A montagem de um buffet, no qual alguns ficam servindo enquanto os outros passam, costuma dar certo. É possível organizar na creche brincadeiras e músicas que envolvam questões de higiene e alimentação, a serem realizadas com as crianças. É importante destacar que, no processo de aquisição de hábitos, a repetição frequente de atitudes é fundamental. Uma questão polêmica refere-se à introdução do copo ou caneca em substituição mamadeira, pois, no Brasil, é comum as famílias prolongarem em demasia o hábito da mamadeira, assim como o da chupeta. Por volta dos dois anos, já é possível introduzir o copo na hora das refeições. Caso a criança se recuse a utilizá-lo, não devemos obrigá-la a isso. Essa mudança deve ser feita gradativamente, sem exigir da criança sua adesão imediata a essa nova maneira de se alimentar. O sono é outro fator relevante para a saúde da criança. O sono não pode ser entendido sempre da mesma maneira para cada criança e para cada faixa etária, pois cada um possui seu ritmo próprio em relação às horas de sono que necessita para seu descanso. Dessa forma, quanto menor a criança, mais tempo ela dormirá. À medida em que vai crescendo, a criança não necessitará mais de tantas horas de sono à tarde. Algumas creches/pré-escolas, no entanto, costumam obrigar as crianças a dormirem após o almoço, não respeitando as necessidades individuais de cada uma delas. Às vezes, utilizam algumas estratégias que até parecem naturais (ouvir música clássica, assistir vídeo), mas o ideal é que sejam ofertadas outras opções de atividades para as crianças que não querem ou não conseguem dormir. Alguns espaços podem ser adaptados para esse propósito: o canto da leitura, do desenho etc. Sabe-se que, em muitos casos, o problema da exigência dos momentos de sono da criança é o resultado da falta de pessoal. Ou seja, é nesse horário que a atendente descansa. Mas isso não é correto. É preciso que haja profissionais em número suficiente para que seja feito um escalonamento. Um ponto importante: as crianças nunca devem dormir sem a presença de um adulto para atender a qualquer eventualidade, como passar mal, acordar aos sustos, por exemplo. Além disso, o horário é de descanso das crianças e não do profissional, que nesse momento está trabalhando. O momento do banho é particularmente especial para a criança na creche. No berçário, é importante que tudo possa estar organizado para garantir um contato harmonioso entre professores e bebês para evitar os sustos e choros. Assim, deve-se prever os materiais a serem utilizados, cuidar da temperatura correta da água, arrumar as roupas antecipadamente e escolher os brinquedos para entreter a criança antes, durante e após o banho. A partir do maternal, pode-se dar banhos de mangueira nas crianças, ou mesmo instalar chuveiros externos quando as condições climáticas assim permitirem. Mesmo os banhos no banheiro podem significar uma situação muito propícia a aprendizados, como colocar e tirar roupas e calçados e ajudar uns aos outros. Atividades dirigidas Na creche, normalmente, as atividades de cuidado pessoal ocupam grande parte do horário diário, particularmente em turmas de crianças com até um ano, e as atividades dirigidas acabam por ser limitadas no tempo, entendendo como atividades dirigidas aquelas que o professor realiza com uma ou poucas crianças, procurando chamar a atenção para algum elemento novo do ambiente, como uma figura, uma brincadeira com som etc. No momento em que as crianças aprendem a andar, em geral, após o primeiro ano de vida, é relevante realizar passeios pela creche, chamando a atenção da criança para o ambiente, fazendo-a tocar nos objetos e se comunicar com as outras crianças. Deve, também, o adulto coordenar inúmeras atividades com as crianças, a partir de uma certa idade, tais como: contar histórias, fazer teatro com fantoches, ensinar músicas e brincadeiras de roda, brincar de esconde-esconde e tantas outras. Pode também auxiliar a criança na sua apreensão de novos conhecimentos sobre o mundo, em termos de linguagem ou sobre relações entre objetos e fatos (“caiu”, “acabou”). Já para as turmas com crianças com mais de 18 meses, podemos realizar inúmeras atividades e elas ocupam mais tempo durante a jornada diária. O leque de atividades é maior, pois as atividades mais convencionais permitem desdobramentos e estas passam a ser melhor compreendidas pelas crianças. O interessante é propor atividades à criança e deixá-la segura para escolher a forma de participar. Isso significa respeitar seu ritmo, confiar na criança, na sua capacidade de ação e na liberdade que tem para expressar seus sentimentos. Com isso, as crianças, desde pequenas, tornam-se mais confiantes, mais desinibidas, mais curiosas, tomam iniciativas e buscam soluções, fatores indispensáveis para seu desenvolvimento. Ao mesmo tempo, podem se tornar mais cooperativas e solidárias. Atividades livres (isto é, menos dirigidas pelo professor) Essas atividades devem fazer parte da programação diária de todos os grupos de crianças, desde o berçário até a turma dos maiores. Não significa que não haja intervenção do professor e que se possa pensar que as atividades livres podem ser realizadas sem a devida atenção do professor. Cabe a este organizar espaços e momentos para que as crianças livremente explorem o ambiente e escolham suas atividades específicas, mas é sempre interessante que o professor intervenha na coordenação das brincadeiras quando assim for necessário e, também, integre-se como participante. O que se espera do professor é a habilidade de respeitar as ideias que surgem no grupo de crianças, pois elas são conseqüências de experiências vividas. Ainda é importante reforçar o valor da privacidade. As crianças devem ter seu material pessoal identificado pelo nome e o professor deve mostrar que conhece suas preferências. Alguns momentos distantes dos colegas podem significar possibilidades para uma exploração individual. O professor, nesses casos, deve respeitar e acompanhar atentamente esses momentos e procurar avaliar a necessidade de intervir.