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Katia Renner MusicalCulturaCulturaMusical C ul tu ra M usi cal Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-85-387-2890-0 Cultura Musical_indd.indd 1 12/4/2012 14:46:55 Katia Renner Cultura Musical IESDE Brasil S.A. Curitiba 2012 IESDE Brasil S.A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br Todos os direitos reservados. © 2008 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais. Capa: IESDE Brasil S.A. Crédito da imagem: Jupiter Images/DPI Images CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ _________________________________________________________________________________ R331c Renner, Katia, 1948- Cultura musical / Katia Renner. - Curitiba, PR : IESDE, 2012. 332p. : 24 cm Inclui bibliografia ISBN 978-85-387-2890-0 1. Instrumentos musicais. I. Título. 12-1554. CDD: 784.19 CDU: 780.6 14.03.12 21.03.12 033887 _________________________________________________________________________________ Mestre em educação na área de Música pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Especialista em Avaliação Educacional pela Fundação para o Desenvolvimento de Recursos Humanos (FDRH). Licenciatura em Pedagogia pela Faculdade de Filosofia Nossa Senhora Medianeira (FFNSM). Licenciatura em Música pela UFRGS. Katia Renner Sumário O som e suas características ....................................................9 O som ................................................................................................................................................9 O ruído .......................................................................................................................................... 21 Silêncio .......................................................................................................................................... 23 O mecanismo da audição: o som chegando ao nosso cérebro ................................ 23 Instrumentos desconhecidos: been ................................................................................... 32 A música e seus elementos básicos ................................... 35 Evolução e desenvolvimento ................................................................................................ 35 Civilização musical .................................................................................................................... 36 O que é música ........................................................................................................................... 38 Elementos básicos da música ............................................................................................... 46 As escutas do Século XX ......................................................................................................... 61 Instrumentos desconhecidos: sistro ................................................................................... 64 Notação musical ....................................................................... 67 O som ............................................................................................................................................. 67 Elementos gráficos da escrita musical ............................................................................... 69 A escrita das notas musicais .................................................................................................. 73 Instrumentos desconhecidos: harmônio ........................................................................103 Instrumentos musicais .........................................................107 Idiofones .....................................................................................................................................107 Membranofones ......................................................................................................................113 Aerofones ...................................................................................................................................116 Instrumentos musicais e seus recursos eletrônicos ....................................................126 A revolução tecnológica .......................................................................................................137 Instrumentos desconhecidos: tiorba ...............................................................................140 A orquestra e seus instrumentos ......................................143 Os sons que nos cercam .......................................................................................................143 A partitura ..................................................................................................................................184 Instrumentos musicais: serpentão ....................................................................................188 Vozes que cantam .................................................................191 A voz humana ...........................................................................................................................191 A produção da voz ..................................................................................................................197 Outros aspectos ligados ao canto .....................................................................................201 Vozes humanas e suas classificações ...............................................................................205 Instrumentos desconhecidos: koto ..................................................................................223 Gêneros, formas e estilos musicais ..................................227 Algumas formas musicais: abertura .................................................................................230 Gêneros e estilos populares ................................................................................................239 Instrumentos desconhecidos: charango ........................................................................249 A música ocidental e sua história .....................................253 Dentro da cronologia, além do tempo ............................................................................253 Instrumentos desconhecidos: cítara ................................................................................277 A música brasileira .................................................................281 Vida brasileira ...........................................................................................................................281 Os gêneros musicais do Brasil .............................................................................................289 Alguns astros de nossa música atual ................................................................................303 Instrumentos desconhecidos: senza ................................................................................308 Universo sonoro atual ...........................................................311 A orquestra, os ritmos da máquina e os ritmos da natureza ...................................315 A música na mídia e no cinema .........................................................................................317 Um novo ambiente acústico ...............................................................................................324 Instrumentos desconhecidos: adufe ................................................................................328 O som e suas características O som Uma aventura sonora para chegar à nossa percepção Você já reparou como estamos imersos em sons proporcionados pela natureza – como os sons dos pássaros, de animais diversos, da chuva, do vento, do trovão, da cachoeira, do mar e tantos outros? Masna cidade também estamos cercados de sons, que se fundem, disputam espaços e compõem, junto com os ruídos, novas estruturas acústicas. Inicialmente, o ser humano buscou contato com seu ambiente pro- curando imitar os sons ouvidos, capturar seus significados, dialogar com esses elementos por meio do canto e dos ritmos percutidos e sonoriza- dos em instrumentos improvisados. Era importante cantar para chamar a chuva ou agradecer a colheita, assim como para organizar as tarefas e atividades. A música associou-se à vida cotidiana, dando amplitude ao pensamento e se impregnando de significados. IE SD E Br as il S. A . 9 10 O som e suas características Olhos de ver, ouvidos de ouvir Diferentemente dos outros órgãos dos sentidos, nossos ouvidos estão expos- tos e vulneráveis: os olhos podem ser fechados quando quisermos, já os ouvidos, não – eles estão sempre abertos. Os olhos focalizam de acordo com a nossa von- tade, mas os ouvidos captam todos os sons em todas as direções. A experiência auditiva está sempre buscando identificar a natureza dos sons e de onde provêm os sons. Localizar é a preocupação básica das partes mais primitivas do cérebro auditivo. Quase toda nossa experiência auditiva se volta para identificar as coisas, a natureza dos sons e de que lugar eles provêm. O estímulo visual é diretamente percebido como, por exemplo, um raio de luz. Na audição, entretanto, os sons vêm de todas as direções, afunilando-se para dentro de um estreito canal do ouvido, todos se aproximando do tímpano pelo mesmo ângulo, argumenta Jourdain (1998). IE SD E Br as il S. A . O som e suas características 11 O som que podemos ouvir O som que podemos ouvir é resultado de uma energia que se propaga em ondas e é proveniente das vibrações de corpos elásticos. Esses sons são gerados por instrumentos que podem vibrar (movimento de vaivém) como, por exemplo, uma corda, uma pele de tambor, uma coluna de ar. As vibrações desses mate- riais são transmitidas por meios elásticos, chamados assim porque se deformam com a passagem da onda sonora. Depois disso, eles se restauram e voltam à sua forma original. Quando um objeto vibra na atmosfera, ele movimenta partículas de ar ao seu redor. O ar leva essas vibrações por meio de ondas sonoras, espalhando-as em todas as direções. As partículas de ar se espalham e vão colidir com outras que estão próximas, empurrando-as, e assim sucessivamente, produzindo a propa- gação sonora. Quando chegam até nós, elas causam variações no ouvido, esti- mulando determinados nervos a transmitirem impulsos elétricos que são inter- pretados pelo cérebro como som. Portanto, os sons são sensações que chegam aos nossos ouvidos por meio de ondas sonoras. Ao contrário, quando ouvimos sons de objetos caindo e quebrando, as vibrações produzem uma mistura confusa de ondas sonoras com alturas indefinidas, expres- sas em um emaranhado, o qual definimos como ruído. No entanto, muitos instru- mentos de percussão – como caixa-clara, pratos, tamborins e outros, que produzem vibrações irregulares – são importantes para a música, afirma Bennett (1987). Ex. 1: som musical Ex. 2: ruído (B EN N ET T, 1 98 7, p .7 ) Ex. 1 Ex. 2 Representamos o som como uma onda, o que significa que ele ocorre no tempo de forma periódica e com certa frequência. O sinal do movimento de im- pulso (partida) e de repouso (queda) passa através da matéria (elástica), modifi- ca-a e registra rapidamente o desenho da onda, ensina-nos Wisnik (1989), como na figura da onda senoidal. 12 O som e suas características Frequência Tempo Amplitude (S ER RA 2 00 2, p . 3 – R ep re se nt aç ão gr áfi ca d a fr eq uê nc ia e a m pl itu de .) Imagem da onda senoidal, que serve para descrever o comporta- mento do som. Uma onda sonora propaga-se através do espaço ou através de outros meios (gasoso, líquido ou sólido) em uma frequên- cia que os sistemas auditivos podem detectar. A forma oscilatória do registro do som sinaliza também a indicação da pausa, revelando que o som está permeado de silêncio, o que lhe permite começar e se prolongar. Mas também há som no silêncio: mesmo longe dos sons externos, em uma cabine à prova de sons, escutaremos no mínimo o som grave da nossa pul- sação sanguínea e o agudo do nosso sistema nervoso, confirma Wisnik (1989). Ondas sonoras Forma de onda produzida por uma flauta: Forma de onda produzida por um xilofone: Xilofone: no início (ataque), a onda possui mais harmônicos, que se devem à batida da baqueta no instrumento. Depois disso, a forma de onda é resultado somente da vibração da madeira. Frequência (altura sonora) é o número de vibrações por segundo. É normal- mente medida em Hertz (Hz). A nota Lá, por exemplo, tem 440 vibrações por segundo. A sua frequência, portanto, é de 440Hz. O som agudo terá maior fre- quência e o mais grave menor frequência. O som e suas características 13 A amplitude, que corresponde ao tamanho das ondas, mede a distância entre os pontos extremos da vibração e está relacionada ao volume que ouvimos. A maior amplitude determina o som mais forte e a menor o som mais fraco. O volume do som é medido em decibéis (db). A onda sonora obedece a um pulso, seguindo o princípio da pulsação. As relações do mundo sonoro com a música apresentam correspondências com os ritmos do nosso pulso sanguíneo, o andar e a respiração. Os andamentos (veloci- dades) sugeridos pelos compositores nas partituras estão associados aos ritmos fisiológicos e psicológicos do caminhar. O termo allegro, por exemplo, indica um caráter animado e um andamento rápido. Andante indica uma velocidade mais moderada, como de quem está caminhando normalmente. Uma execução mais calma, vagarosa, é indicada por Adagio. Johann Sebastian Bach (1685-1750) Suíte n. 2, Baldinerie: Allegro Faixa 1 (CD 1) Edvard Grieg (1843-1907) A Manhã de Peer Gynt: Andante Faixa 2 (CD 1) Sons naturais e sons mecânicos Podemos dividir os sons que ouvimos de acordo com a sua produção, ou seja, aqueles provenientes da natureza, incluindo o ser humano, e aqueles resultan- tes de meios mecânicos. É interessante ressaltar que a humanidade nem sempre ouviu os mesmos sons, pois quando havia um número reduzido de pessoas no planeta o contato com os sons da natureza era predominante e significativo. Com a ampliação do ambiente urbano, houve uma mudança na percepção sonora, levando o indivíduo a conviver e a disputar com um mundo repleto de novos timbres, texturas, intensidades e ruídos, que seriam os sons indesejáveis. 14 O som e suas características Os ruídos, quando muito fortes, podem saturar a capacidade cerebral para as sensações. Para termos um som são necessárias três condições: um corpo que realize um movimento vibratório; � um meio transmissor (habitualmente o ar) que propaga as ondas sonoras; � um sujeito-receptor que através do seu ouvido capta as ondas produzidas � e com o cérebro as interpreta, transformando-as em sensação sonora e significativa – esse sujeito possui fundamental importância, pois na sua ausência não haverá som, só movimento vibratório. Nós não estamos em contato com o som externo, mas sim com os sinais do nosso cérebro, por isso interpretamos a realidade externa. IE SD E Br as il S. A . As ondas sonoras chegando ao ouvido. Estamos imersos em um mundo de som. Portanto, é necessário conhecê-lo na sua composição, como se propaga e quais são suas características e proprie- dades acústicas. As características básicas que distinguem os sons são elementos codificados, implícitos no som e no tempo. Altura � : é a característica que expressamos quando dizemos que um som é mais agudo ou mais grave que o outro. Depende principalmente da fre- quência do movimento vibratório que o origina, as frequências elevadas correspondem aos sons agudos e as baixas (16 a 20 000 ciclos) aos graves. Para termos melodia é preciso movimentar o som em diferentes altitudes (frequências): issoé chamado mudança de altura. O som e suas características 15 Nos sons agudos e leves, as frequências são elevadas e as vibrações rápi- � das. Já nos sons graves, pesados e volumosos, as frequências são baixas e as vibrações lentas. Os sons intermediários são chamados de médios. Exemplos Som grave: trovão � Som agudo: canto de um pássaro � O ser humano só ouve os sons entre 20Hz e 20KHz. A medida Hertz (Hz) refere-se a ciclos por segundo: 20Hz = 20 ciclos por segundo, 20KHz = 20 000 ciclos por segundo. Os sons muito graves e os muito agudos não são captados pelo ouvido humano – que, assim, não percebe todos os sons existentes. Apenas alguns animais – como o cão, o morcego e o golfinho – têm uma percepção sonora superior à do ouvido humano. Duração � : é o tempo gasto pelo som para a sua emissão, sustentação e extinção, resultando em sons longos e curtos, basicamente. Exemplos Som longo: sirene de uma ambulância � Som curto: quicar de uma bola � Intensidade � : refere-se a um som mais forte ou mais fraco e depende da amplitude do movimento vibratório que a origina. É a informação sobre o grau de energia da fonte sonora. O som forte pode ser pensado como uma figura concêntrica, envolvente � como um turbilhão, frequentemente interpretado como se oprimisse o ouvinte. Um som forte também pode ser caracterizado como carregando um grande peso em direção ao centro de gravidade. Um som fraco está constantemente se dissolvendo, esvaecendo como ne- � blina, escapando de si mesmo, do centro. A música também foi gradualmente aumentada de volume ao longo da � história. Até o período do Renascimento, com a música vocal, a percepção era limitada a um ciclo de frequência. Com o uso dos instrumentos musi- 16 O som e suas características cais, houve um aumento expressivo nessa faixa. Mais tarde, os sons eletrô- nicos provocaram uma ampliação extrema de nossa capacidade audível. Exemplos Som forte: liquidificador funcionando � Som fraco: torneira pingando � Timbre � : é a qualidade ou característica que permite diferenciar os sons de igual altura e intensidade, porém de diferentes procedências. Um som sem- pre tem uma frequência de base e é acompanhado de outros sons harmô- nicos, mais fracos e mais agudos, que contribuem para dar a sua “cor”, o seu timbre. Por meio do timbre, reconhecemos quem produz o som. É o timbre que traz a cor da individualidade à música: sem o timbre, tudo � é uniforme, tudo é igual. Ele é resultado da onda senoidal, que possui seu próprio timbre (próximo � a uma flauta-doce sintetizada), representada de forma simples e básica como uma onda. Mas o som real, concreto, é um complexo, um feixe de ondas, com frequências que se sobrepõem, interferindo umas nas outras. Essa complexidade dos sons caracteriza o seu aspecto timbrístico e nos permite identificar a sua procedência. Dessa forma, podemos distinguir que a mesma nota (altura) emitida por um violino é diferente do som de uma flauta transversa. Em música, ritmo e melodia, durações e alturas se apresentam ao mesmo � tempo, um funcionando como portador do outro. Todo som tem uma du- ração e uma altura, por mais indefinido que possa ser. Jacques Offenbach (1819-1880) O Belle Nuit (da ópera Os Contos de Hoffmann) Faixa 3 (CD 1) O som e suas características 17 A ressonância, que permite ao som vibrar dentro de um corpo, emite uma frequência fundamental e um feixe de ondas, subdividida nos sons da série har- mônica. Quando um timbre é rico, ele possui muitos harmônicos, que consti- tuem a série harmônica, que por sua vez é a única escala natural resultante do fenômeno acústico. Tudo o mais é construção artificial em torno dessa série. O exemplo é a vibração da corda de um violão: ao oscilar, essa corda tem o seu timbre definido pela soma da frequência básica com os seus modos harmônicos múltiplos. Um som musical constitui-se do som da nota principal e dos sons secundá- rios que soam juntos, em uma intensidade bem mais fraca e quase imperceptí- vel. O som principal denomina-se som fundamental e os que acompanham são os sons harmônicos. Representação de uma corda vibrando em toda a sua extensão e produzindo determinado som. Ao ser vibrada, simultaneamente, ela se divide em duas, três, quatro, cinco ou mais partes, produzindo sons secundários. A série harmônica é constituída pelos sons que acompanham o som principal (fundamental). Desde a Antiguidade, muitas civilizações perceberam que um corpo em vi- bração produz sons em diferentes frequências. O filósofo e matemático Pitágo- ras (séc. VI a.C.) constatou que ao colocar uma corda em vibração ela não apenas vibra em sua extensão total, mas também forma uma série de nós, que a dividem em seções menores, que vibram em frequências mais altas que a fundamental. Para facilitar a compreensão, mostra-se separadamente, mas em uma corda real, que todos os sons se sobrepõem, gerando um desenho complexo, semelhante à forma de onda do instrumento. 18 O som e suas características As 16 primeiras notas da série harmônica: A nota de número 1 é o som fundamental dessa série e as outras que seguem são seus harmônicos. Imagine um teclado de piano e a nota de número 1 é um Dó na região bem grave. Ela e as notas até o número 7 estão escritas com a clave de Fá, que é própria para o registro de sons graves. A partir da nota de número 8, é utilizada a clave de Sol, indicando que as alturas dos sons harmônicos estão chegando na região média e, em seguida, passando para a região aguda. Envoltória Sonora ou Envelope Sonoro Os harmônicos produzidos a partir da nota fundamental dependem das ca- racterísticas peculiares de cada instrumento e também da forma como são ex- traídos seus sons. Por isso, a forma da onda torna-se irregular. Todas as frequências somadas simultaneamente resultam na forma envoltó- ria da onda produzida, a forma da onda final. Esta está ligada diretamente ao timbre e pode ser manipulada pelos editores. A forma envoltória pode ser di- vidida em quatro regiões diferentes: o ataque, que possui o volume máximo; o decaimento, que é a redução do volume que se segue ao ataque, a sustentação; pois o som se mantém constante; e o relaxamento, quando acontece a redução gradativa do volume até o silêncio total. A seguir, imagens representando o envelope sonoro ou envoltória sonora em três instrumentos: som da tabla, espécie de tambor da Índia; � notas produzidas por uma trompa; � som longo produzido pela flauta. � O som e suas características 19 Tabla Is to ck ph ot o. Trompa Co m st oc k Co m pl et e. 20 O som e suas características Flauta Is to ck ph ot o. Impedância O fenômeno da impedância está relacionado à quantidade de som que passa por determinado obstáculo, podendo ser medido pelo movimento da onda sonora exercida com certa pressão sobre esse objeto. Os obstáculos que são rí- gidos e causam maior reflexão do som no ambiente possuem maior impedância que objetos menos rígidos e menos reflexivos. Por exemplo, um material rígido (madeira, concreto, vidro) vibra muito pouco em resposta à pressão exercida por um som e sua impedância acústica é muito alta. No caso de uma membrana que se flexiona facilmente (instrumentos de pele), sua matéria vibrará em resposta a esse som e sua impedância é muito menor. Resumindo: objetos de alta impe- dância refletem mais o som, enquanto objetos de baixa impedância absorvem mais o som. Tambor: sua pele vibra muito, portanto, sua im- pedância é menor. Is to ck ph ot o. O som e suas características 21 O ruído Uma onda complexa que possui frequências regulares, constantes e estáveis produz um som afinado, com altura definida. A onda com frequências irregula- res, inconstantes, instáveis, produz barulhos e ruídos. Por exemplo, a batida do coração tende à constância, à continuidade do pulso; um espirro ou um trovão tendem à descontinuidade ruidosa. O ruído soa como algo confuso, desordenado. Um som não musical e indesejado,assim como um som muito forte, pode ser chamado de ruído. Observamos que esse termo possibilita também um conceito subjetivo, significando que para uma pessoa o que soa é música; para outra, é ruído. Som e ruído farão parte da matéria-prima da música, e ambos podem ser utilizados pelos compositores em seus trabalhos. Conforme o ambiente, o contexto e a época, o grau de ruído que se ouve ad- quire diferentes interpretações. Os conceitos de dissonância e consonância mu- daram ao longo dos séculos. Assim como a sonoridade de uma banda de rock pode ser exagero para alguns ouvidos, para outros é agradável e envolvente. A precisa afinação de um instrumento de cordas é decisiva na execução de um concerto, enquanto pode ser insignificante quando usado para outros efeitos, como a distorção. Um grito nas brincadeiras das crianças é normal, mas pode ser assustador em uma biblioteca, por exemplo. Como ruído é o som que desorganiza outro som, em arte ele se torna um elemento criativo. A música procura ordenar os ruídos que estão no ambiente, construindo-se com elementos repetitivos, periódicos, regulares e irregulares, em uma representação da sociedade com sua harmonia e seus conflitos. A música pode ser definida como a extração do som ordenado e periódico do ambiente de ruídos. A cultura musical, que busca os sons afinados, faz com que esses sons dialo- guem com o ruído, a instabilidade e a dissonância. Por meio das diversas mode- lagens sonoras, a música se apresenta com sons sucessivos, simultâneos, contí- nuos e descontínuos, com repetições e diferenças. Diversos Autores Improviso n. 1 Faixa 4 (CD 1) 22 O som e suas características Os materiais sonoros – som e ruído – são concebidos e interpretados de acordo com as culturas que os aceitam ou rejeitam no seu desenrolar histórico, podendo sofrer alterações conceituais em determinadas épocas. A música con- temporânea admite todos os materiais sonoros possíveis: o som, ruído, silêncio, pulso e não pulso, argumenta Wisnik (1989). Luiz Carlos Csekö (1945) Canções dos Dias Vãos Seis Faixa 5 (CD 1) Curiosidade Ruído branco: no som do mar podemos ouvir diferentes e inconstantes durações, com alturas (frequências) oscilando entre grave e agudo. Esse tipo de ruído resulta da combinação simultânea de sons de todas as frequências. O termo branco é usado por analogia com a luz branca, que possui, de forma combinada, todas as frequências cromáticas. Co re l I m ag e Ba nk . O som e suas características 23 Silêncio Para os músicos, o silêncio adquire um significado muito especial porque a partir dele acontece a criação musical, que é um momento sensível: com o silên- cio, a criação musical fica protegida do ruído, relembra Wisnik (1989). O valor do silêncio aumenta porque o estamos perdendo à medida que con- vivemos com muitos ruídos urbanos. O compositor Anton Webern (1883-1945) o utilizou em suas obras. John Cage (1912-1992), também compositor, ficou em uma câmara à prova de som (anecoica) e constatou que o silêncio não existe, pois pôde ouvir o som grave da sua circulação e o som agudo do seu sistema nervoso em funcionamento. Para melhorar o nosso ambiente sonoro, é necessário pensarmos em redes- cobrir o silêncio como um elemento positivo para silenciar a mente e ampliar a consciência. O som e o tempo são as matérias-primas da música. O som, por ser um fe- nômeno concreto, permite a lógica da estrutura que rege o discurso musical, e o tempo orienta as dimensões exterior e interior da sua organização. No tempo musical, com suas continuidades e descontinuidades, está a origem da simbo- logia musical. Vamos agora conhecer a fantástica aventura do ouvido humano para desfru- tar do mundo dos sons. O mecanismo da audição: o som chegando ao nosso cérebro O ouvido humano tem capacidade para perceber 400 mil sons diferen- tes, podendo distinguir cada elemento sonoro individualmente mesmo em um conjunto de sons. Esse processo é representado, por meio de aparelhos específicos, em um complexo emaranhado de linhas. Quando realizamos o processo de escuta, em direção ao nosso ouvido há convergência de todas as ondas resultantes de cada evento sonoro isolado, o que resulta em uma sofis- ticada interação de flutuações de pressão. Mesmo que a ciência acústica tenha dificuldade para explicar como isso acontece, o ouvido pode reconhecer indivi- dualmente e localizar a grande maioria dos sons emitidos em um aglomerado de texturas sonoras. 24 O som e suas características Como se dá o processo da audição? O som se propaga produzindo ondas sonoras que se deslocam até atingirem o ouvido. O mecanismo da audição transforma essas ondas em sinais elétricos que são transmitidos através do nervo auditivo até o cérebro, onde essas ondas são interpretadas como mensagem. IE SD E Br as il S. A . O ouvido humano é dividido em três partes anatômicas: ouvido externo; � ouvido médio; � ouvido interno. � IE SD E Br as il S. A . Ouvido externo Ouvido médio Ouvido interno O som e suas características 25 Ouvido externo Consiste em orelha e canal auditivo, que culmina no tímpano ou membrana timpânica. Quando a onda sonora chega ao ouvido, uma parte é transmitida pelo canal auditivo e outra parte é refletida para fora do ouvido. O tímpano vibra a partir da pressão das ondas que chegam e são canalizadas da orelha para uma área bem menor – o canal auditivo. Observando a parte posterior da orelha, iremos verificar um aumento na área responsável pela coleta do som, onde ini- cialmente os sons são percebidos com maior intensidade. Enquanto os sons chegam à orelha, o ouvinte já pode localizar de onde eles procedem, a distância da fonte sonora, se é grave ou agudo. Vale ressaltar que, quanto mais agudo for o som, maior será a dificuldade de determinar a distância. O cérebro é capaz de analisar as diferenças de tempo de acordo com a direção de onde o som partiu e incidiu na orelha. Quando a fonte sonora não estiver diante ou diretamente atrás do ouvinte, os ouvidos cap- tarão sinais diferentes, pois as ondas sonoras resultantes atingirão uma orelha antes da outra (fenômeno denominado disparidade binaural). Esse mecanismo de localização do som é usado pelo cérebro para a construção da imagem sonora espacial. Ouvido interno Tímpano Pavilhão auditivo Meato acústico Ouvido externo IE SD E Br as il S. A . 26 O som e suas características Ouvido médio Externamente, é formado quase que apenas pelo tímpano. Em oposição ao tímpano, há a janela oval e a janela redonda, pequenas aberturas que separam o ouvido médio do interno. O tímpano é ligado à janela oval por uma espécie de alavanca formada por três ossículos – o martelo, a bigorna e o estribo (este último, com apenas três milímetros). Na parte traseira do ouvido médio, há o encontro com a garganta através da Trompa de Eustáquio, que, por suas vias, permite que o ar entre e saia da estrutura fisiológica do ouvido médio. É por meio desse canal que o corpo procura equalizar a variação de pressão no ouvido médio quando nele há a sensação incômoda causada pela pressão ao se descer uma serra ou durante uma decolagem de avião. O ouvido médio faz a ponte entre a captação do som pelo ouvido externo e o processamento cerebral dos dados sonoros, tais como esses dados são comuni- cados ao cérebro pelo ouvido interno. Portanto, o ouvido médio é encarregado de transmitir as vibrações sonoras para a janela oval, na entrada do ouvido in- terno. Isso acontece porque, quando vibram, o tímpano e os ossículos martelo e bigorna fazem o estribo se mover para dentro e para fora da janela oval, como se fosse um pistão. Essa função do ouvido externo, que intervém no mecanismo de captação, permite que 50% dessa energia sonora possam ser transmitidos ao ouvido interno, o que possibilita a percepção da frequência (tom), fundamental para a prática musical. A delicadeza da estrutura do ouvido interno não permite a captação diretade uma onda sonora: ela seria refletida para fora. Quando chega ao tímpano, o som recebe a força da pressão do som multiplicado pela área da membrana timpânica. Essa força é transmitida pelos três ossículos à janela oval, que possui uma área 25 vezes menor do que a área do tímpano, de modo que ali a pressão sonora será elevada pelo fator 25. A pressão sonora é aumentada pelo fator 2 por meio da ação de alavanca dos três ossículos, ao mesmo tempo que reduz a velocidade da janela oval, que acaba recebendo a pressão 50 vezes maior que a exercida sobre o tímpano, enquanto a velocidade de amplitude é reduzida pela metade. O ouvido médio, portanto, faz o papel de amplificador. O som e suas características 27 Tímpano martelo bigorna estribo Ossículos do ouvido médio Tuba auditiva IE SD E Br as il S. A . IE SD E Br as il S. A . Canal que liga o ouvido médio à rinofaringe. Sua função é manter a pressão interna do ouvido. Tuba auditiva 28 O som e suas características Quando ouvimos um som muito forte, um pequeno músculo no ouvido médio puxa o estribo para fora da janela oval, reduzindo o montante de energia transmitida para dentro do ouvido interno, protegendo-o. É o chamado reflexo acústico, assim como também piscamos de maneira instintiva quando recebe- mos nos olhos uma luz muito forte. Essa filtragem sonora se dá para as frequên- cias que se situem abaixo de 1 000Hz, isto é, dos componentes mais graves de um aglomerado sonoro. O tempo do reflexo acústico se dá logo após a chegada de um som forte, mas ele não pode proteger o ouvido interno de impulsos so- noros muito rápidos, como o ruído de um tiro. Ouvido interno É o lugar onde as informações sobre o fenômeno sonoro são convertidas em sinais elétricos e enviadas ao cérebro. É conhecido como labirinto. Possui canais semicirculares que são responsáveis por nosso sentido de balanço e de equilí- brio. Outra parte maior, a cóclea, é responsável por nosso sentido de escuta. IE SD E Br as il S. A . Canais semicirculares Caracol ou cóclea Nervo auditivo Utrículo Sáculo A cóclea é uma espécie de tubo de cerca de 35 milímetros de comprimento, em forma de concha espiralada ascendente, com duas voltas e meia. Seu inte- rior é forrado com milhares de minúsculos fios. O tubo mede dois milímetros O som e suas características 29 de diâmetro e estreita-se gradualmente até sua ponta. Quando o estribo move a cóclea, os pequenos fios são movimentados para frente e para trás. Na base de cada fio existe um neurotransmissor que envia impulsos elétricos pelo nervo auditivo até o cérebro. Entre outras funções, a cóclea é responsável pela capaci- dade do ouvido para perceber diferentes alturas sonoras. Sons de fraca intensi- dade provocam pouca movimentação nos fios da cóclea, e os sons mais fortes os movem com maior intensidade. A cóclea é um aparelho membranoso formado por tubos espiralados. IE SD E Br as il S. A . Órgão de Corti Na cóclea, encontramos a membrana basilar, que é importante na percepção das alturas (grave-agudo). Sua superfície superior possui as células nervosas em forma de cílios, formando o órgão de Corti, que contém cerca de 30 mil fibras nervosas ou células ciliadas, consideradas os “cabos elétricos” que transmitem os sinais ou impulsos elétricos ao cérebro, que por sua vez os processa e os inter- preta. Esses sinais correspondem a algumas linhas e movimentos que produzem imagens acústicas. 30 O som e suas características IE SD E Br as il S. A . Resumindo, a percepção sonora se dá por meio do aparelho auditivo, que é formado de três partes distintas: ouvido externo, ouvido médio e ouvido interno. Esquema da Percepção Sonora Ouvido externo: captura e concentra as ondas sonoras. � Ouvido médio: transmite as ondas sonoras ao nervo auditivo. � Ouvido interno: converte as informações em sinais elétricos e os envia ao � cérebro. Quando entra no ouvido, o sinal acústico é filtrado e elaborado para ser aces- sível ao cérebro, que não sente e não vê, reagindo por sinais. Os órgãos externos que compõem o sistema auditivo devem traduzir para o cérebro as diferentes in- formações. Nessa passagem, há muitas células, conexões e processos químicos que são sensíveis e podem ser destruídos. Nosso cuidado deve ser com a música que decidimos ouvir, pois nesse momento estamos abertos e disponíveis. O som que entra chega ao cérebro estimulando nossos neurônios a perceberem uma escala com grande variedade de sons. São neurônios delicados e qualificados para identificar as mínimas percepções, com muitas cores musicais, produzindo muita emoção e prazer para o ouvinte. Mas também podem danificar a nossa au- dição com o volume exagerado ou a baixa qualidade musical. Assim, se insistir- mos em agredir nossos ouvidos, poderemos destruir as células basais acústicas, ensina-nos Meneghetti (2005). O som e suas características 31 No parque próximo ao Jardim Botânico de Melbourne, Austrália, há um aviso: EM MEMÓRIA DE EDWARD GEORGE HONEY (1855-1922) Jornalista de Melbourne que, quando residia em Londres, foi o primeiro a sugerir a cerimônia de um minuto de silêncio. As aranhas possuem pelos que são responsáveis pela detecção do som. D iig ita l J ui ce . O astrônomo Johannes Kepler acreditava em um sistema perfeito que unia a música à astronomia. Desse modo, ele calculou as alturas para cada um dos planetas: Saturnus Jupiter Mars ferè Terra Venus Mercurius Hic locum habet etiam IE SD E Br as il S. A . Temos a responsabilidade de fazer as melhores escolhas musicais porque a música nos leva a um contato com nosso mundo interior, e essa é uma conversa muito íntima e preciosa. Todos a postos: vamos abrir nossos ouvidos e descobrir o mundo curioso e sensível dos sons. Textos complementares 32 O som e suas características Instrumentos desconhecidos: been Flauta usada por encantadores de serpentes. É feita de casca de coco ou cabaça e dispõe de três tubos. Th e Ill us tr at ed E nc yc lo pe di a of M us ic al In st ru m en ts . Referências BENNETT, Roy. Elementos Básicos da Música. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1987. BERTULANI, C. A. Ondas Sonoras. Disponível em: <www.if.ufrj.br/teaching/fis2/ ondas2/ondas2.html>. Acesso em: 25 jan. 2008. Na notação atual, a grafia seria esta: Saturno Júpiter Marte Terra Vênus Mercúrio Alternativamente IE SD E Br as il S. A . A famosa expressão música das esferas refere-se à doutrina grega que afir- mava a relação harmoniosa entre os planetas ao se moverem com proporção e regularidade. Diante da descoberta sobre a correspondência matemática entre as proporções dos harmônicos em uma corda posta a soar, Pitágoras conjecturou que os dois tipos de movimento eram expressões de uma lei universal perfeita que ligava música e matemática. O som e suas características 33 GUYTON, Arthur C. Fisiologia Humana. 5. ed. Rio de Janeiro: Interamericana, 1981. JOURDAIN, Robert. Música, Cérebro e Êxtase: como a música captura nossa imaginação. Rio de Janeiro: Objetiva, 1998. MED, Bohumil. Teoria da Música. 4. ed. Brasília: Musimed, 1996. MENEGHETTI, Antônio. Manual de Melolística e outras Técnicas Psicocorpó- reas. Recanto Maestro: Ontopsicologia Editrice, 2005. _____. Nova Fronda Virescit: em busca da alma. Recanto Maestro: Ontopsico- logia Editrice, 2006. MENEZES, Flo. A Acústica Musical em Palavras e Sons. Cotia: Ateliê Editorial, 2003. SÁ, Sérgio. Fábrica de Sons: os recursos oferecidos pela tecnologia musical. 4. ed. São Paulo: Editora Globo, 2003. SCHAFER, Raymond Murray. A Afinação do Mundo. São Paulo: Editora Unesp, 2001. _____. O Ouvido Pensante. São Paulo: Editora Unesp, 1991. SERRA, Fábio. Áudio Digital: a tecnologia aplicada à música e ao tratamento de som. Rio de Janeiro: Ciência Moderna, 2002. VILELA, Ana Luisa Miranda. Audição. Disponível em: <www.afh.bio.br/sentidos/ Sentidos3.asp>. Acesso em: 25 jan. 2008. WISNIK, José Miguel. O Some o Sentido: uma outra história das músicas. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. A música e seus elementos básicos A música não é para ser ouvida. É ela que nos ouve. José Miguel Wisnik A música sempre esteve associada às manifestações humanas. Sendo assim, ela sempre foi uma maneira que os homens encontraram para ex- pressar seus sentimentos. O homem das cavernas usava sons para se co- municar, buscando exteriorizar seus pensamentos e emoções. Evolução e desenvolvimento Por meio dos materiais que estavam à sua disposição, o homem podia criar objetos sonoros com ossos, conchas, madeira, sementes. Com a sua evolução, ele procurou agrupar diferentes tipos de sons que tivessem re- lações entre si, formando uma harmonia sonora. Assim o homem pôde perceber o resultado da qualidade sonora, sua função e utilidade. IE SD E Br as il S. A . Podemos considerar a música como uma ideia organizada e possível de ser transmitida aos outros. Surgida há cerca de 50 mil anos com o homem pré-histórico, muitas narrativas contam da sua origem, sendo que, para 35 36 A música e seus elementos básicos alguns, a música começou com os ritmos das danças e sons dos tambores, bati- das de pés no chão, palmas, sons dos colares e braceletes. Essas manifestações serviam para festejar ou estimular uma boa colheita, uma boa caçada, a fertilida- de da terra e dos homens, estabelecer contato com a natureza por meio da imi- tação de seus sons, comunicar-se com os deuses ou seus ancestrais. Associada à dança, a música assumia um caráter ritual, inclusive com funções mágicas. O importante é perceber que os elementos básicos da música já estavam presen- tes na dança, como o som e o ritmo. Eles fazem parte do próprio homem porque os movimentos do coração e a respiração já são elementos rítmicos, assim como o passo. As batidas de mãos e o movimento corporal complementam as sonori- dades naturais. D om ín io p úb lic o. Civilização musical Os instrumentos primitivos eram pouco melodiosos, produzindo sonorida- des mais roucas, barulhentas, ou apenas emitindo ruídos. A pre dominância do ritmo, agindo com grande poder sobre a parte física, proporcionava o movimen- to do coletivo no seu aspecto socializante. Mesmo sendo, inicialmente, um tanto primitivas, essas atividades eram intensas em significado, com envolvimento da família e da tribo. Temos como exemplo o litofone do período neolítico, encontrado no Vietnã e exposto no Musee de l’ Homme, em Paris. Também o rombo, a flauta, o apito de ossos, os tambores e as conchas são objetos sonoros antigos. O canto apareceu mais tarde, talvez quando houve um maior desenvolvimen- to cerebral e os homens puderam organizar a linguagem, buscando produzir os sons das vogais e os ruídos das consoantes. A música e seus elementos básicos 37 Em uma abordagem interessante, Roland de Candé (2001) organiza uma su- cessão hipotética de etapas evolutivas dos fenômenos musicais e as relaciona à evolução da espécie humana. São elas: organização rítmica rudimentar, por batidas com bastões, percussão no � corpo, objetos sacudidos ou entrechocados; imitação dos ritmos ou dos ruídos da natureza, pela boca e pela laringe (o � grito como expressão das sensações e emoções primárias); variações na altura e no timbre da voz quando o homem busca expressar- � -se com intenção e emoção – o homem procura cultivar a voz e se adapta progressivamente, tomando consciência desse recurso (50 mil a 70 mil anos atrás); construção de objetos sonoros com maiores recursos e diferenciados na � expressão artística e na imitação dos ruídos da natureza – após uma lenta adaptação, o homem está apto a falar e a cantar, procurando associar a ex- pressão vocal à expressão instrumental e nesse estágio o homem adquire uma consciência musical (cerca de 40 mil anos atrás); organização sistemática dos fenômenos sonoros, frente às sociedades em � formação – o canto se distingue claramente da linguagem falada e a mú- sica instrumental também se diferencia dos gestos, além disso o homem passa a refletir sobre suas ações, produzindo o nascimento das primeiras civilizações musicais (cerca de 9 000 a.C.). A música passa a ter importân- cia nas funções rítmicas, mágicas, terapêuticas e políticas. A partir desse período, com as ferramentas de pedra polida, foi possível fa- bricar objetos sonoros afinados na altura desejada, permitindo, então, o desen- volvimento de uma civilização musical. O resultado dessa conquista é o apa- recimento dos instrumentos de membranas e cordas e, após, a fabricação de instrumentos de metal (cerca de 5 000 a.C.). De acordo com o progresso dos instrumentos musicais, a música também evoluiu, despertando a criatividade e a imaginação. Com a possibilidade de agrupar a voz ao gesto, o canto aos instrumentos e os sistemas possíveis de transmissão, a música passa a ser utilizada nos rituais e atividades coletivas. A imagem que temos desse período é a de uma gravura rupreste representando um tocador de flauta ou de arco musical, localizada na gruta de Trois Frères, Ariège, França (cerca de 10 000 a.C.). 38 A música e seus elementos básicos O que é música Conceitos Muitos conceitos existem para definir a música. Vamos conhecer alguns: [...] Convenço-me cada vez mais que a música não é, por sua essência, algo que se possa colar a uma forma rigorosa e tradicional. Ela é cores e tempos ritmados [...] Claude Debussy Música é a arte de combinar os sons simultânea e sucessivamente, com ordem, equilíbrio e proporção dentro do tempo. Bottumil Med A música, em sua história, é uma longa conversa entre o som e o ruído. José Miguel Wisnik A música supõe um mínimo de organização e um esforço de adaptação dos corpos sonoros a uma finalidade prática, quando não artística. Roland de Candé Música é a ciência que pode fazer-nos rir, cantar e dançar. Guillaume de Machaut Classificação Vejamos algumas classificações para diferentes tipos de música: Música clássica � – é usada para indicar qualquer música que não pertença às tradições folclóricas ou populares. A expressão relaciona-se principal- mente ao classicismo vienense, entre o século XVIII e início do século XIX, especialmente com os compositores Haydn, Mozart e Beethoven. A música e seus elementos básicos 39 Música das esferas � – para os pitagóricos (partidários de uma doutrina grega antiga), a música representa a harmonia universal, justificando a re- lação harmoniosa entre os planetas pelas proporções entre suas órbitas e sua distância fixa em relação à Terra. Afirmavam eles que seu conheci- mento é necessário para todos poderem elevar-se tanto na sabedoria e na ciência como também na alma, porque ela mantém os sentimentos nobres e justos, garantindo a estabilidade e a prosperidade do Estado, cita Candé (2001). Alguns compositores, como Paul Hindemith (1895-1963), utilizaram-na como um conceito metafórico. Música folclórica � – expressão usada para as tradições musicais que são transmitidas oralmente. Música incidental � – é a música composta para um filme, peça de teatro, programa de rádio ou televisão. Música programática � – é um tipo de música que tem a função de narrar ou descrever objetos ou eventos. Funções Grandes pensadores, desde a Antiguidade, expressaram suas ideias sobre a função da música, observando a sua grande contribuição para o ser humano, por exemplo: Para ser instruído em todas as coisas, é preciso estudar com cuidado a música em seus princípios naturais. Confúcio Mesmo que a presença e a função da música se modifiquem em alguns pe- ríodos da história, o seu desenvolvimento esteve sempre ligado à sociedade, revelando aperfeiçoamento, especialização e, consequentemente, a sua evo- lução. Aconteceram mudanças expressivas nas relações entre os que a produ- ziam, como os compositores, editores e intérpretes, e o ouvinte. Por outro lado, a música, que era uma prática vivenciada por todos originalmente, passa a de- pender de um público com característicaspróprias, exercendo pressão e agindo conforme suas posições políticas, sociais e históricas. Na Grécia, onde aconteciam grandes espetáculos, surgiram as primeiras manifes- tações de um público consciente. Com a chegada do Cristianismo, a música passou 40 A música e seus elementos básicos a ter a função de auxiliar o homem no seu aprimoramento e na salvação da alma, e já não era mais destinada ao povo. Por muitos séculos, a arte mais elaborada perma- neceu nas mãos da Igreja e da elite social e cultural. A música erudita ficou cada vez mais complexa, formando um público educado musicalmente, mas passivo na sua manifestação. A burguesia, a nobreza e a Igreja patrocinam e desfrutam do talento dos grandes músicos, que assim conseguem sair do anonimato. O povo se afasta dessa música por considerá-la muito elaborada, podendo apenas ouvi-la nas igre- jas, produzindo alternativamente outras formas de música com transmissão oral e conforme suas necessidades. Nos séculos XVII e XVIII, com o surgimento dos teatros de ópera e dos concer- tos públicos (para os quais, apesar do nome, os ingressos eram pagos), as pesso- as puderam manifestar-se livremente sobre o que lhes agradava ou não. Significados Os sons organizados, produzidos e ouvidos expressam uma criação musical e o seu sentido está relacionado à compreensão que podemos ter, atribuindo- -lhes significados. A música, como expressão humana, diz respeito a sua função e posição cultural, pois precisamos localizá-la no contexto em que foi criada. O ouvinte é o intérprete que apreciará a música segundo sua sensibilidade, per- cepção sonora e conhecimento adquirido. Nosso interesse pela música provém de uma habilidade complexa que o nosso cérebro pode executar. Quando os sons chegam a nós, podemos classificá- -los de acordo com suas características físicas (acústica), o modo de percebê-los (psicoacústica), a função e o significado (semiótica e semântica) ou, ainda, con- forme suas qualidades emocionais ou afetivas (estética), sugere Schafer (2001). Ao ouvirmos uma canção ou uma peça instrumental, buscamos naturalmente ligar os sons para formar melodias, frases, observar a harmonia, as mudanças de intensidade e os diferentes ritmos que se apresentam. Quando conseguimos decodificar e modelar essas relações, surgem as sensações e os significados que iremos atribuir ao que estamos ouvindo. Representações mentais A arte musical é uma arte que acontece no tempo porque os sons, quando acabam de soar, já estão se extinguindo. Consideramos, então, a música como A música e seus elementos básicos 41 um fenômeno passageiro e em movimento constante, gerando uma expectativa daquilo que está por vir, dando sequência ao que foi ouvido antes. Para que pos- samos dar um significado a uma obra musical, é necessário que haja elementos de repetição ou variação de uma ideia ou então possibilitar a criação de novas relações entre o que está acontecendo agora e o restante da peça. Os sons ouvi- dos, passados alguns minutos, só poderão permanecer na mente do ouvinte por meio de imagens aurais, que são representações mentais dos sons. Essas representações são as possibilidades que temos de evocar, de lembrar os objetos ausentes, tornando-os presentes no pensamento por meio de imagens e, portanto, são as interiorizações daquilo que conhece- mos e de tudo aquilo que podemos criar. Por exemplo, quando ouvimos uma música, formamos imagens sobre os sons, que são imagens apoiadas na audi- ção, chamadas imagens aurais. Essas imagens permitem que um indivíduo me- morize e lembre as músicas conhecidas. O compositor Ludwig van Beethoven (1770-1827) só pôde compor e escrever muitas obras, mesmo estando surdo, unicamente por meio das imagens aurais: os sons continuavam a soar em sua mente. Ao visualizar um quadro, uma escultura ou uma obra arquitetônica, nossos olhos podem apreciá-los por tempo indefinido e retornar quantas vezes quiser- mos para admirá-la. A música, no entanto, é um organismo vivo e seus elemen- tos são de ordem temporal. Enquanto está sendo ouvida, provoca reações fisio- lógicas no organismo e, consequentemente, desperta emoções e ativa a mente. Combinações sonoras Graças às diferenças nas características sonoras (altura, duração, intensidade e timbre) e suas combinações, percebemos as estabilidades e instabilidades har- mônicas, resultado do emprego dos elementos musicais em uma composição e relacionadas aos conceitos de consonância e dissonância. A aplicação no uso das regras harmônicas acompanhou os diferentes períodos da música ocidental. Ideias aceitáveis e válidas foram se modificando e surgiram novas formas de harmonizar. Vamos ouvir duas obras e compará-las entre si quanto a esses aspectos. 42 A música e seus elementos básicos Estabilidades harmônicas: Antonio Vivaldi (1678-1741) Concerto para Fagote n. 33 em Dó Menor, Terceiro Movimento: Allegro Faixa 6 (CD 1) Instabilidades harmônicas: Erich Wolfgang Korngold (1897-1957) Quarteto de cordas n. 1 em Lá Maior, op. 16, Finale: Allegreto Amabile Comodo Faixa 7 (CD 1) O desenrolar das notas e ritmos cria movimentos intensos e suas relações não são neutras, mas envolvidas por atrações que polarizam em tensões e sus- pensões como ímãs, em uma busca de organização. Não há duas peças iguais, assim como também as interpretações dependem das habilidades e estilos dos músicos. Ouça com atenção a duas gravações e veja como podem ser originais e interessantes os diferentes arranjos de uma mesma música. Antônio Carlos Jobim (1927-1994) Águas de Março Faixa 8 (CD 1) Antônio Carlos Jobim Águas de Março Faixa 9 (CD 1) Muitas atividades estão envolvidas na arte musical, como a criatividade do compositor, a elaboração e construção dos instrumentos musicais, a dedicação e o estudo dos intérpretes para executar as obras, a formação das orquestras, as salas de concerto, o ouvinte, a impressão de livros e partituras, entre outras tantas. A música e seus elementos básicos 43 A obra musical quando realizada, isto é, posta a soar por meio da emissão vocal ou instrumental, torna-se audível. Por meio de registros gráficos conven- cionais e não convencionais, podemos “ver” ou depreender a sonoridade que a peça musical terá quando executada. Sinais gráficos A partitura registra a composição de forma detalhada, para que possa ser executada por diferentes pessoas, em diferentes períodos da história e em várias partes do mundo. Beethoven – Sonata para piano n. 8 "Patética", em Dó menor, opus 13 (1799). 44 A música e seus elementos básicos Também vamos encontrar partituras com outras configurações e que trazem novas formas de grafar a música. A notação do século XX não é unificada, variando entre os compositores. Estes são alguns exemplos: (M ED , 1 99 6. p . 3 90 a 3 92 ) nota mais aguda possível nota com registro médio Accelerando: Accelerando e ritardando: Ritardando: Improvisar seguindo aproximadamente a trajetória dada. Indica a duração da nota nota mais grave possível linha de som som mais curto possível 0.30 Sinais encontrados (com certa frequência) na música contemporânea A música e seus elementos básicos 45 Continuar tocando o mesmo modelo: crescendo Tocar as notas com a maior velocidade possível decrescendo Pontos sonoros vários tipos de vibrato Rápido crescendo no final do som muitos sons poucos sons (M ED , 1 99 6. p . 3 90 a 3 92 ) 46 A música e seus elementos básicos Muitas peças do século XX utilizam esse tipo de notação, deixando que o intérprete crie, no momento da execução, sons e suas dinâmicas segundo as indicações do compositor. Sergei Prokofiev (1891-1953) Sinfonia Concertante em Mi Menor, op. 125, Segundo Movimento: Allegro Giusto Faixa 10 (CD 1) É importante ressaltar que nem todos usam técnicas radicais. Alguns mantêm seus estilos diferenciados e pessoais e, usando material tradicional, obtêm resul- tados originais. AranIlych Katchaturian (1903-1978) Dança com Sabres (do balé Gayane) Faixa 11 (CD 1) A música também pode ser composta e permanecer na memória das pessoas por um tempo sem que haja registro escrito. Essa é a forma como muitas can- ções são conhecidas e chegam até nós. Os exemplos são as músicas folclóricas, as brincadeiras e os jogos. Elementos básicos da música Ao ouvir uma música, podemos percebê-la como um todo, mas se aguçar- mos o ouvido descobriremos que ela é feita de muitos detalhes que a identifi- cam como única e especial. Do que será feita uma música? A música e seus elementos básicos 47 Quando lemos uma história, buscamos identificar os personagens, seus papéis e como se relacionam. Identificamos a figura principal, que é o centro dos acontecimentos, conduzindo nossa atenção. É importante descobrir suas carac- terísticas, seu estilo e conhecer seu temperamento para entender bem de quem se trata. Percebemos o ambiente no qual acontece, o local e a época. Captamos o clima de alegria ou tensão, medo, tristeza, horror e tantos outros sentimentos. Envolvemo-nos para compreender que intenções o autor está querendo nos passar. Além disso, observamos quais os recursos usados para fazer a história acontecer, como a forma da escrita, estilo, pontuação, detalhes nas narrativas, contrastes nas emoções. Verificamos se as frases são longas, curtas, com per- guntas ou interrompidas, com expectativas para o leitor completar o seu pensa- mento. É importante observar se o criador da história utiliza palavras simples ou mais complexas, se aprecia retornar aos fatos ou detalhes já narrados etc. Enfim, analisamos como um escritor trabalha para que palavras se transformem em uma história, que pode ser muito interessante ou não. Pode ser criativa, trazendo novidades, ou algo semelhante ao que já conhecemos. Esse é um exemplo que pode ser ampliado para muitas outras áreas, e assim podemos fazer o exercício de estar ao mesmo tempo dentro e fora de um livro, de um quadro, uma escul- tura, uma peça teatral, uma dança, uma música etc. Voltando à pergunta anterior (do que será feita uma música?), vamos procu- rar descobrir os diversos elementos que a compõe. Procure ouvir todos os seus detalhes, acompanhando seus movimentos sonoros, os ritmos diferenciados, in- vestigue o que o compositor está querendo dizer com a sua composição, sinta a harmonia e descubra como ele desenvolve as ideias musicais. Tentando simpli- ficar, vamos separar seus elementos básicos: a melodia, o ritmo e a harmonia. É importante ressaltar que todos estão juntos e são interdependentes na música. Melodia: toda melodia tem contorno, desenho, como uma linha. A palavra melodia vem do grego melóidía. Melos significa “sucessão de sons” e odé refere-se a “canto”. Podemos então definir melodia como resultado de uma sucessão de sons isolados, mas consecutivos, mantendo a característica da can- tabilidade, isto é, possibilidade de se cantar a linha melódica. Toda a melodia tem contorno, o desenho, como uma linha que podemos traçar indicando o seu movimento. Além disso, a melodia, em uma extensão maior, apresenta frases, incisos etc., semelhante à estrutura da língua. Vamos analisar uma música muito conhecida no nosso país. 48 A música e seus elementos básicos Brasil, meu Brasil brasileiro Meu mulato inzoneiro Vou cantar-te nos meus versos Ô, Brasil, samba que dá Bamboleio que faz gingar Ô, Brasil, do meu amor Terra de Nosso Senhor Brasil!... Brasil! Pra mim!... Pra mim! Ô, abre a cortina do passado Tira a mãe preta do cerrado Bota o rei congo no congado... Deixa cantar de novo o trovador À merencória a luz da lua Toda canção do meu amor... Quero ver essa dona caminhando Pelos salões arrastando O seu vestido rendado Brasil!... Brasil! Pra mim!... Pra mim! Brasil, terra boa e gostosa Da morena sestrosa De olhar indiscreto Ô, Brasil, verde que dá Para o mundo admirá Ô, Brasil, do meu amor Terra de Nosso Senhor Brasil!... Brasil! Pra mim!... Pra mim! Esse coqueiro que dá coco Oi, onde eu amarro a minha rede Nas noites claras de luar, Brasil... Brasil Ô, oi, estas fontes murmurantes Oi, onde eu mato a minha sede E onde a lua vem brincar Ôi, esse Brasil lindo e trigueiro É o meu Brasil brasileiro Terra de samba e pandeiro, Brasil!... Brasil! Aquarela do Brasil Ary Barroso A melodia faz seus movimentos ondulatórios para narrar a letra da canção. O pesquisador Luiz Tatit transcreveu a melodia de Aquarela do Brasil de um modo diferente, onde cada linha vale um semitom: A música e seus elementos básicos 49 2 3 4 (T AT IT , 2 00 2, p . 9 9) Ary Barroso (1903-1964) Aquarela do Brasil Faixa 12 (CD 1) O compositor pode usar da repetição da melodia, com pequenas alterações, para evitar a monotonia. Também a imitação, quando executada por outro timbre ou em outra altura, produz novidade. Por exemplo, em vez de ser repetida 50 A música e seus elementos básicos pelo mesmo instrumento que a executou, a melodia é tocada por outro, com so- noridade diferente. Ou então sons graves podem ser repetidos em região aguda. Mais ainda: a melodia cantada pode ser tocada, após, por um grupo instrumen- tal ou vice-versa. O esquema da estrutura da melodia na canção pode ser repetitiva ou não repetitiva. O tipo repetitivo está mais frequente nas músicas populares, em que o texto é modificado mantendo a mesma melodia. Essa é a chamada canção com variação estrófica. Por exemplo, na canção “Asa Branca” todas as estrofes do texto usam a mesma melodia. Asa Branca Luiz Gonzaga Humberto Teixeira 1 Quan- do o- lhei a ter- ra ar- den- do, qual fo- guei- ra 2 Que bra- sei- ro que for- na- lha, nem um pé de 3 A- té mes- mo a a- sa bran- ca ba- teu a- sas 4 Ho- je lon- ge mui- tas lé- guas, nu- ma tris- te 5 Quan- do o- ver- de dos teus o- lhos se es- pa- lhar na 1 de São João, eu per- gun- tei, ai, a Deus do céu, ai, 2 plan- ta- ção. Por fal- ta d’á- gua per di meu ga- do, 3 do ser- tão. En- tão eu dis- se a- deus Ro- si- nha 4 so- li- dão, es- pe- ro a chu- va ca- ir- de no- vo, 5 plan- ta- ção, eu te as- se gu- ro, não cho- re não viu, 1 por- que ta- ma- nha ju- di- a- ção? 2 mor- reu de se- de meu a- la- zão. 3 guar- da con- ti- go meu co- ra- ção. 4 pra mim vol- tar — pro meu ser- tão. 5 que eu vol- ta- rei viu, meu co- ra- ção. A música e seus elementos básicos 51 Também podemos observar uma melodia sendo “cantada” pelos instrumen- tos. Vamos ouvir uma mesma música com dois arranjos diferentes. Pixinguinha (1897-1973) e João de Barro (Braguinha) (1907-2006) Carinhoso Faixa 13 (CD 1) Pixinguinha e João de Barro (Braguinha) Carinhoso Faixa 14 (CD 1) Por que algumas melodias são mais eficientes que outras? A música exige tons que tenham altura e duração fixas porque proporcionam os pontos de ancoragem entre os quais o cérebro descobre relações que vão compondo uma estrutura musical. A música deixa de fazer sentido para nosso cérebro quando contém muitos deslizamentos, pois há necessidade de uma or- ganização para ser entendida. Por exemplo, quando as crianças bem pequenas cantam, geralmente não atingem com exatidão as distâncias entre os sons, dis- torcendo (deformando) os intervalos musicais. A partir de três ou quatro anos, elas começam a compreender que a música é construída de degraus e durações precisos, sendo necessário aprender e memorizar esses elementos de forma mais exata. O reconhecimento de tons significa que já encontramos algo experimentado antes e que aprendemos a classificar, isto é, a localizar o que previamente tínha- mos colocado em categorias. A categorização simplifica a memória e também a percepção da música. Ao ouvi-la, mantemo-nos atentos às nossas próprias cate- gorizações de sons, enquanto já os interpretamos. Por exemplo, ao ouvir alguém cantando não ficamos prestando atenção às suas pequenas desafinações como se fosse uma música diferente, mas percebemos a canção como um todo. Com- parativamente, um pássaro com asas grandes ou pequenascontinua classifica- do na espécie “pássaro”. 52 A música e seus elementos básicos Dodecafonismo Dentro do assunto da melodia, também podemos trazer a ideia do que seja um tema na música. Tema é uma ideia que o compositor utiliza de forma inteira ou por meio de partes na construção de um trecho musical. Assim, o músico pode utilizar a repetição e a variação como elementos para o trabalho temático. Quando aparece o tema durante uma peça, já podemos prever a sua sequência musical porque anteriormente já o tínhamos ouvido. Vale ressaltar que uma obra musical não precisa ser necessariamente temá- tica. Esse é o exemplo das composições do século XX com Schoenberg, na sua fase expressionista (1908-1915). Até então, a linha melódica era essencial na música. A partir desse período, alguns compositores modificaram esse conceito, trazendo a noção do pontilhismo. Os sons e intervalos isolados passam a fazer parte de suas obras, estimulando-nos a ouvi-los de forma isolada, sem a neces- sidade de ligá-los entre si. Ocorrem mudanças no uso dos intervalos musicais, com grandes saltos, pausas e colorido instrumental. Esse desaparecimento da continuidade melódica propiciou novidades na construção musical. Alguns dos compositores que utilizaram esse sistema são Arnold Schoenberg, Anton Webern, Karlheinz Stockhausen, Pierre Boulez. O ponto de partida foi o dodecafonismo, que utiliza os 12 sons da escala cro- mática. A música não mais se baseia na escala diatônica, formada por uma suces- são de notas de nomes diferentes, como Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá, Si, separadas por intervalos de tons e semitons. 1 53 72 64 8 dó solmi siré láfá T TS ST TT dó (B EN N ET , 1 98 6, p . 1 5) dó solmi oitava siré láfá T TS S T T T dó Escala diatônica é uma sucessão de tons (T) e semitons (S). A seguir, temos a escala cromática, feita de semitons: A música e seus elementos básicos 53 Dó Si Si Lá# Sib Lá Lá Sol# Láb Sol Sol Fá# Solb Fá Fá Mi Mi Ré# Mib Ré Ré Dó# Réb Dó Dó (A BR A H ÃO , 1 99 7, p . 1 3) O nome dodecafonismo vem do grego dódeka, que significa “doze”. É um sis- tema atonal, significando que não tem um eixo harmônico central. No Brasil, o dodecafonismo chegou nos anos 1940 e permanece até os anos 1950, como um movimento de vanguarda. Anton Webern (1883-1945) Variações Faixa 15 (CD 1) A seguir, temos um exemplo do sistema dodecafônico, no qual o compositor Arnold Schoenberg ordena as 12 notas da escala cromática segundo sua pró- pria escolha. Nessa sequência ele baseará sua composição. Esta série pode estar escrita das seguintes formas: original; retrógrada, lida de trás para frente; em in- versão, de baixo para cima; e inversão retrógrada, que é lida de trás para frente e de baixo para cima. O compositor pode usar esse material para construir os temas, acordes, padrões rítmicos, escolher os timbres instrumentais e compor diferentes texturas. 54 A música e seus elementos básicos [Original] [Retrógrada] [Inversão] [Inversão retrógrada] [Original] [Retrógrada] [Inversão] [Inversão retrógrada] Este é um trecho da peça Variações para Orquestra, Op. 31, de Schoenberg, composta a partir das séries mostradas anteriormente. zart (Vlns.) II´muito tranquilo [inversão] Esta série criada por Alban Berg começa com intervalos de terças e termina por tons inteiros. O trecho ao lado é do Concerto para Violino. tons inteir os tons inteiros Ritmo Derivado do grego rhythmos, significa “aquilo que flui”, “aquilo que se move e tem direção”. Também pode ser definido como encadeamento organizado de durações, dentro de um âmbito acessível à nossa percepção. A noção de ritmo A música e seus elementos básicos 55 surge a partir de descontinuidades – por exemplo, um som que não se altere não nos dará a noção de ritmo. Quando tivermos durações desiguais entre os sons, poderemos perceber um ritmo. A noção de descontinuidades associa-se à ideia de medida e de comparação entre os fragmentos mais longos e mais curtos. O ritmo musical é gerado por dois fatores fundamentais, que são a duração e a intensidade dos sons. A sucessão dos sons permite que possamos organizá- -los por meio de um pulso, como um batimento regular e periódico, identifi- cando, ao mesmo tempo, suas acentuações e contratempos. Nossa percepção envolve, além da comparação, a medida e a noção de ordem. As descontinuida- des precisam estar ordenadas regularmente dentro de uma periodicidade para que possam ser comparáveis, caso contrário provocarão a sensação de confusão, argumenta Kiefer (1969). Também podemos identificar os fluxos binários, ternários e outros mais com- plexos. Para que possamos ter a recorrência desse movimento é preciso um ponto de entrada mais forte, contrastando com outro som de menor intensi- dade, justifica Wisnik (1989). Procure perceber onde está o apoio, o acento, o tempo mais forte nas músicas Baião (ritmo binário – dois tempos) e Romance de Amor (ritmo ternário – três tempos). Luiz Gonzaga (1912-1989) Baião Faixa 16 (CD 1) Antonio Rovira Romance de Amor Faixa 17 (CD 1) A noção de ritmo está em muitas expressões humanas, como na pintura, na arquitetura, na poesia, na fala, na dança etc. No seu sentido mais amplo, o ritmo divide o todo em partes, articulando o percurso. Pode haver ritmos regulares (que sugerem divisões cronológicas de 56 A música e seus elementos básicos acordo com o tempo do relógio, por exemplo) ou irregulares (que espicham ou comprimem o tempo real, dando o tempo virtual ou psicológico). As intensidades fazem as gradações dos crescendos e diminuindos e são im- portantes nas durações que configuram os diferentes ritmos. Vamos ouvir um exemplo no uso contrastante das intensidades fracas e fortes, com crescendos e decrescendos – uma peça de Brahms. Johannes Brahms (1833-1897) Danças Húngaras n. 1 para Orquestra em Sol Menor Faixa 18 (CD 1) A inspiração musical que vem do ritmo A música se inspira em diferentes fontes para criar. As ideias rítmicas podem surgir pela dança, que sugere a repetição de esquemas do movimento rítmico do corpo, despertando-nos para a vontade de nos movimentar ritmicamente. Johann Strauss (1804-1849) Sangue Vienense Faixa 19 (CD 1) Os passos, com seus diferentes andamentos e estados emocionais, serviriam de inspiração para os ritmos de marchas militares, nupciais e fúnebres. Ao ouvir, por exemplo, uma banda militar, sentimos vontade de acompanhar a música com passos correspondentes ao seu ritmo, como soldados em marcha. A música e seus elementos básicos 57 Edward Elgar (1857-1934) Pompa e Circunstância Faixa 20 (CD 1) Giuseppe Verdi (1813-1901) Marcha Triunfal (da ópera Aída) Faixa 21 (CD 1) Felix Mendelssohn (1808-1847) Marcha Nupcial Faixa 22 (CD 1) Os ritmos do pulso, do coração e da respiração, com suas variações emocio- nais, sempre serviram de padrão de referência para a fonte rítmica. Johannes Brahms (1833-1897) Canção de Ninar Faixa 23 (CD 1) Os gestos e expressões corporais, com suas imensas gradações, sugeriram ritmos próprios. Assim são os gestos de expansão, retração, amorosos, de apro- ximação, agressivos, de afirmação, desalento e outros tantos. A natureza sempre foi inspiradora para muitos compositores, que buscaram retratar através dos ritmos o clima, a paisagem, a descrição dos fenômenos. 58 A música e seus elementos básicos Ludwig van Beethoven (1770-1827) Sinfonia n. 6 em Fá Maior, Pastoral: Allegretto Faixa 24 (CD 1) Antonio Vivaldi (1678-1741) Concerto para Flauta e Orquestra em Fá Maior, La Tempesta di Mare: Allegro Faixa 25 (CD 1) Os ritmos artificiais têm uma rigidez quase mecânica, como no Barroco, que parece soar como artificial. Assim também os recursos eletrônicos têm proposto um artificialismo rítmico extremo, podendo fracionar e sobrepor o tempo de forma a afastar-se dos ritmos humanos e da natureza, na visão de Kiefer (1969). Johann Sebastian Bach (1685-1750) Concerto de Brandenburgon. 3, Primeiro Movimento Faixa 26 (CD 1) Harmonia Harmonia se refere aos acordes e às relações entre si. Lembramos que acorde é a emissão, ao mesmo tempo, de três ou mais sons distintos. Por esses motivos, a harmonia está associada à dimensão vertical na música. A música e seus elementos básicos 59 No exemplo a seguir, os acordes são executados com a mão esquerda, no piano. O que para nós é considerado consonância, em algu- mas épocas era considerado dissonância. Os acordes, ao longo da história, têm sido tratados em termos de consonân- cia e dissonância, mas não existe conceituação fixa. Quando surgiu a polifonia, a partir do século IX, a dimensão vertical foi tão valorizada quanto a dimensão horizontal. Ao longo da história, os conceitos se alteraram, e o que para nós é considerado consonância, em algumas épocas atrás, era dissonância. As rela- ções entre os sons e as percepções que deles temos são complexas. Mudanças A partir do século XV, há uma mudança na sensibilidade harmônica e no em- prego de determinados acordes, tornando a harmonia mais doce e consistente. A harmonia gótica é mais oca, com uma sensação de antigravidade; a harmonia renascentista é mais maciça e possui gravidade, argumenta Kiefer (1969). No período da Renascença, o acorde ainda não era conhecido como entidade autônoma, era o simples resultado do soar junto de várias vozes polifônicas. 60 A música e seus elementos básicos Orlando di Lasso (1532-1594) Hodie Completi Sunt Faixa 27 (CD 1) No Barroco, surgem muitas dissonâncias, pois neste momento é criada a música dramática. E isso significa que a música passa a se subordinar ao texto e deve expressar emoções mais intensas, o que produz um tratamento mais livre para as dissonâncias. George Philipp Telemann (1681-1767) Orpheus: Primeiro Ato Faixa 28 (CD 1) A partir de Beethoven surgem certas ousadias no uso dos acordes. No Ro- mantismo, a harmonia se enriquece e surgem elementos que já encaminham a dissolução da harmonia tonal. O trecho que vamos ouvir (de uma sonata de Bethoven) nos traz sonoridades novas para a época, como as asperezas harmô- nicas e incomuns, arrojadas evoluções melódicas e atrevimentos rítmicos. As frases são inesperadas, trazendo contração, interrupção e distensão, causando surpresa na nossa audição. Ludwig van Beethoven (1770-1827) Sonata para Violino e Piano em Lá Maior, op. 47, Kreutzer – Primeiro Movimento: Adágio Sostenuto – Presto Faixa 29 (CD 1) A música e seus elementos básicos 61 As escutas do Século XX A música do século XX traz a liberdade harmônica, denominada atonalismo, permitindo o uso livre dos acordes, que são empregados conforme as necessidades expressivas do compositor. Atonalidade significa a ausência total de tonalidade, fazendo uso das 12 notas de escala cromática, dando impor- tância a todas as notas, sem a força da atração para o centro tônico. Schoenberg formulou, em 1923, um princípio para substituir a tonalidade e a ele denominou sistema dodecafônico ou serialismo. A harmonia deixa de ser fun- cional e não obedece mais às regras tradicionais, permitindo todos os agregados sonoros possíveis. Os discípulos de Schoenberg, Webern e Alan Berg adotaram o serialismo, mas de maneiras diferentes. Os ruídos entram na música e são descobertas as possibilidades de criar es- truturas artísticas baseadas unicamente nesses ruídos ou em sua combinação com sons musicais. A música concreta teve suas primeiras experiências em 1948 em Paris. Ela é composta a partir de uma montagem de ruídos e sons naturais colhidos na rua, nas fábricas, na natureza, e, posteriormente, elaborados em es- túdio. Esses sons eram misturados, superpostos e modificados de muitas manei- ras – por exemplo, alterando a rotação da fita ou tocando-a no sentido inverso. O resultado final é uma montagem de sons armazenados que pode ser tocada sem a presença do “intérprete”. O compositor Pierre Schaeffer trabalhou, nessa época, com gravações de sons acústicos, manipulando-os e modificando-os em playback, construindo peças musicais a partir de séries de ruídos encadeados. Suas primeiras composições foram os Études. Na música eletrônica, a produção ou modificação é feita por meios eletrônicos, isto é, a matéria sonora é sintetizada mediante osciladores eletrônicos – incluin- do os sons registrados por microfones e também aqueles produzidos por gera- dores eletrônicos de sons. O componente básico da produção sonora é o oscila- dor. Portanto, é necessário equipamento eletrônico para que possa ser ouvida. Quase todos os sons, ritmos e ruídos podem ser sintetizados: praticamente não há limites para os geradores eletrônicos, abrindo novas possibilidades no mundo dos sons. As modificações eletrônicas dos sons incluem o ajustamen- to de volume, a filtragem, a adição de vibratos (“ondeamento”), reverberações (“retardamento”, desaparecendo lentamente), ecos. Os sons podem ser mixados juntos, sobrepostos ou divididos em fragmentos. Karlheinz Stockhausen foi um importante compositor da música eletrônica e autor de obras como Kontakte, para sons eletrônicos, piano e percussão. 62 A música e seus elementos básicos Segundo Kiefer (1969, p. 74): [...] tanto na música eletrônica como na concreta, o con- ceito tradicionalde harmonia perde sentido [...]. Durante os anos 1950 e 1960, foram fundados estúdios de música eletrônica nas principais cidades da Europa, dos Estados Unidos e do Japão. Compositores como Luciano Berio, Babbit, Luening e Edgard Varèse agregaram técnicas ele- trônicas em suas obras. Também em execuções ao vivo, compositores utilizaram instrumentos convencionais juntamente com esses recursos, como John Cage em Atlas Eclipticalis (1961-62). Quando foram desenvolvidos programas de computador que facilitavam a síntese digital, a manipulação, a armazenagem de informações e estruturas sobre os sons, as universidades de Princeton e Stanford e instituições de Paris criaram estúdios onde seria possível explorar a síntese computadorizada. O compositor Pierre Boulez produziu uma das obras mais expressivas no uso dos meios ele- trônicos, Répons (1980), em que os sons de uma orquestra são modificados por análise e síntese computadorizada. Música aleatória (do latim alea, “dado”) procura maior liberdade, com um certo grau de imprevisibilidade tanto no processo de composição como na execução da obra. O compositor fornece uma série de símbolos que informam apenas a ideia e o intérprete deverá contribuir livremente com algum improviso. Cage e Stockhausen utilizaram muitos procedimentos aleatórios em suas composi- ções. Como exemplo, na peça Zyklus (Ciclo), de Stockhausen, destinada a um instrumento de percussão, o único instrumentista tem liberdade para começar em qualquer página da partitura, que é espiralada e pode ser lida no sentido anti-horário ou mesmo de cabeça para baixo. Podemos perceber que as manifestações musicais também estão atreladas às percepções e experimentações sonoras que desafiam o ser humano em buscar novidades. Muitas obras que estão à frente de seu tempo produzem sensações estranhas e diferentes ao serem ouvidas e somente com o contato e a familiari- zação poderão ser aceitas ou não pela sociedade. A música e seus elementos básicos 63 Flo Menezes (1962) Colores (Phila: in Praesentia) Faixa 30 (CD 1) Para Wisnik (1989), a força da música está na possibilidade de aproximar as áreas da mente, do corpo, do intelecto e do afetivo, atravessando as redes de- fensivas da consciência e da linguagem cristalizada. O sentido cultural do som o diferencia entre os demais objetos concretos porque, por mais nítido que possa ser, é invisível e impalpável e nos toca com muita precisão. Ronaldo Miranda (1948) Imagens (Segunda parte): Jogos Faixa 31 (CD 1) Matriarcado e melodia O desenvolvimento da música, buscando associar a voz ao gesto, foi ampliado quando, no início do período neolítico (1200 a 4000 a.C.), algumas tribos nôma- des se fixaram em platôs escalonados,criando as primeiras civilizações agrícolas sedentárias, argumenta Candé (2001). A vida em sociedade permitiu o avanço cultural e também o aumento da população. Até então, a organização social era o patriarcado primitivo, e essa nova forma de produção causou uma diferente divisão do trabalho, dando lugar ao matriarcado. 64 A música e seus elementos básicos O autor sugere, então, que o matriarcado estável possa ter contribuído para que a música ampliasse a sua dimensão “melódica”, definindo por muitos milê- nios um caráter mais afetivo e lírico à sua estrutura. Instrumentos desconhecidos: sistro Os ideofones são os instrumentos em que não há separa- ção material entre o gerador de som (caixa de ressonância) e a estrutura. O mesmo objeto executa as duas funções. Esses instrumentos produzem som por causa das vibrações origi- nadas pelo próprio material de que são feitos (madeira, metal ou vidro). Os ideofones são instrumentos percutidos, beliscados, fric- cionados ou soprados. O sistro é um ideofone percutido e seu som é produzido pelas mãos e por baquetas. Ele é constituído de um jogo de sinos em uma armação de ferro forjado. A sua armação per- mite ao sistro ser colocado sobre uma mesa para ser tocado com uma baqueta de ponta metálica. Referências ABRAHÃO, Luz Martins. Música Comunicação. 3. ed. v. 2. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1977. ANDRADE, Mario de. Pequena História da Música. 8. ed. São Paulo: Livraria Martins, 1977. BENNETT, Roy. Uma Breve História da Música. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1986. BEYER, Esther (Org.). Ideias em Educação Musical. Porto Alegre: Mediação, 1999. CANDÉ, Roland de. História Universal da Música. 2. ed. v. 1. São Paulo: Martins Fontes, 2001. A música e seus elementos básicos 65 CURIA, Wilson. Harmonia Moderna e Improvisação. São Paulo: Fermata do Brasil, s/d. JOURDAIN, Robert. Música, Cérebro e Êxtase: como a música captura nossa imaginação. Rio de Janeiro: Objetiva, 1998. KIEFER, Bruno. Elementos da Linguagem Musical. Porto Alegre: Movimento, 1969. LOPES, Luiz Roberto. Sinfonias e Catedrais: representação da história na arte. Porto Alegre: Editora Universidade/ UFRGS, 1995. MED, Bohumil. Teoria da Música. Brasília: Musimed, 1996. MORAES, J. Jota de. O que É Música. São Paulo: Brasiliense, 1983. ROSA, Nereide Schilaro Santa. Flauta Doce: método de ensino para crianças. São Paulo: Scipione, 1999. SADIE, Stanley (Ed.). Dicionário Grove de Música: edição concisa. Rio de Janei- ro: Jorge Zahar Editor, 1994. SCHAFER, Raymond Murray. O Ouvido Pensante. São Paulo: Editora Unesp, 1991. SOLEIL, Jean-Jacques. LELONG, Guy. As Obras-Chave da Música. Lisboa: Perga- minho, 1991. SPENCE, Keith. O Livro da Música. São Paulo: Círculo do Livro, 1979. TATIT, Luiz Augusto de Moraes. O Cancionista: composição de canções no Brasil. 2. ed. São Paulo: Edusp, 2002. TREIN, Paul. A Linguagem Musical. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1986. WISNIK, José Miguel. O Som e o Sentido: uma outra história das músicas. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. Notação musical O som O som é a matéria-prima da música e possui algumas propriedades. Altura A altura nos possibilita distinguir se o som é grave, médio ou agudo. A direcionalidade sonora poderia ser representada como na imagem ao lado. A direção do som agudo é para cima, enquanto a região grave aponta para baixo. A altura média permanece intermediária. Na música, temos movimentos na altura dos sons que poderão se deslocar de um ponto para outro, às vezes em pequenos degraus ou também por meio de grandes saltos. É fundamental pensar no gráfico de uma forma relativa: dependendo de um som inicial (grave ou agudo), podemos pensar que ele também pode se deslocar para outra região. Um movimento sonoro pode tornar esse som ainda mais grave ou talvez o desloque em direção ascendente, para uma região mais aguda, provocando modificações na sua altura. Agudo Grave Médio (F IG U EI RE D O , 1 99 1, p . 3 ) O desenho a seguir é como um passeio dos sons, fazendo movimen- tos para baixo e para cima, interrompendo seu trajeto ou de uma forma continuada em diferentes acrobacias. Ouça esse passeio sonoro feito pelo contrabaixo na música A Vaca no Maracatu (C. Cordeiro), com a execução de Risomá Cordeiro. 67 68 Notação musical (F IG U EI RE D O , 1 99 1, p . 6 ) Cordeiro A Vaca no Maracatu Faixa 32 (CD 1) Duração Relacionaremos agora os movimentos sonoros com a variação da duração dos sons. Observe que cada som gasta um tempo para soar: alguns vão usar um tempo longo, enquanto outros serão rápidos e logo desaparecerão. Vamos ouvir um trecho da Sonata em Dó Maior, KV. 545, n. 16, de Mozart, na interpretação do pianista Ney Fialkow. Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) Sonata em Dó Maior, K. 545, n. 16 Faixa 33 (CD 1) Intensidade Outro aspecto primordial é o volume ou a intensidade do som, que é usado para enfatizar ou colorir uma passagem musical. Ouviremos a cadência para harpa de O Lago dos Cisnes, de Tchaikovsky, executado por Norma Holtzer Rodrigues. Notação musical 69 Piotr Ilitch Tchaikovsky (1840-1893) O Lago dos Cisnes Faixa 34 (CD 1) Timbre Timbre é a qualidade ou o colorido de um som: um clarinete e um oboé emi- tindo a mesma nota estarão produzindo timbres diferentes (SADIE, 1994, p. 947). Essa é uma característica importante porque revela qual é a fonte do som. Nos exemplos musicais apresentados, tivemos contato com diferentes timbres. Na primeira peça, ouvimos a voz grave do contrabaixo; depois vivenciamos o timbre do piano; e, por último, apreciamos a harpa. É importante acrescentar que todas essas características apresentam-se ao mesmo tempo, indicando a altura, a duração, a intensidade e o timbre do som que está sendo ouvido. Elementos gráficos da escrita musical Quando expressos em um papel ou na tela de um computador, os sons pos- sibilitam o seu registro – e a isso denominamos notação musical. No ocidente, os primeiros manuscritos com sistemas de notação musical datam dos séculos VIII e IX. No século X, o abade Odo, da abadia de Cluny, locali- zada na Borgonha, adotou as letras do alfabeto de A até G (H) para simbolizar os sucessivos degraus (graus) da escala musical, assim permitindo o aprendizado da leitura das notas. Cem anos mais tarde surgiram as notas como as conhecemos hoje. Inicial- mente, para registrar as alturas sonoras, foi utilizada uma única linha, que era colorida de vermelho, indicando a nota Fá. Em seguida, surgiu uma segunda, de cor amarela, correspondendo à nota Dó. Outras linhas foram sendo traçadas com a colaboração do monge italiano Guido D’Arezzo e, no final do século XI, surgiu a pauta de quatro linhas. 70 Notação musical A escrita neumática. O epitáfio de Seikilos Os sistemas de notação musical existem há milhares de anos. Os gregos utilizavam um sistema de símbolos e letras representando as notas – esses símbolos e letras eram escritos sobre o texto de uma canção. Um dos exem- plos mais antigos no mundo é o epitáfio de Seikilos, encontrado em uma tumba na Turquia. Há controvérsias: sobre a data dessa canção, pode ter sido em qualquer momento entre 200 a.C. e 100 d.C. O epitáfio de Seikilos. A melodia do epitáfio de Seikilos em notação moderna. A tradução das palavras cantadas no epitáfio de Seikilos Enquanto você viver, brilhe Não sofra nenhum mal A vida é curta E o tempo cobra suas dívidas Notação musical 71 Escrita de monge Os monges medievais já escreviam os sons por volta de 1250 utilizando quatro linhas e os neumas, que eram os sinais de notação usados na Idade Média. Cada neuma pode representar uma ou até quatro notas. Muitos sistemas de neumas surgiram e se desenvolveram em várias regiões e em épocas diferentes, com o objetivo de transpor para o papel os cantos sagrados. No fim do século XII, com o uso da pena de ganso de bico largo, a escrita dos neumas adquiriu a aparência de notação mais quadrada ou em formade losango. A partir do século XIV, a quinta linha passou a fazer parte da pauta musical, configurando a pauta atual, composta de cinco linhas e quatro espaços. Sobre essa pauta serão colocados os sinais necessários para que a música seja decodi- ficada e executada, resultando em uma expressão sonora. É importante lembrar que a escrita musical busca a equivalência visual do som com um registro do som ouvido ou imaginado, transformando-se então em um conjunto de instruções visuais para os intérpretes. Na nossa cultura, as notas musicais são sete: Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá e Si. 72 Notação musical Pauta musical Pauta musical ou pentagrama é o conjunto de cinco linhas horizontais, para- lelas e equidistantes, formando entre si quatro espaços contados de baixo para cima. Serve para escrever a música. Guido D’Arezzo O monge Guido D’Arezzo (955-1050) era regente do coro da catedral de Arezzo, na região da Toscana, na Itália. Ele criou os nomes atuais das notas musicais, reti- rando a primeira sílaba de cada verso (em latim) do texto sagrado cantado pelas crianças do coral para que São João Batista as protegesse da rouquidão: Ut queant laxis Resonare fibris Mira gestorum Famuli tuorum Solve polluti Labii reatum Sancte Joannes Posteriormente, a sílaba ut foi denominada Dó, derivando de dominus (“Senhor”, em latim). A tradução do hino Para que nós, teus servos, Possamos elogiar claramente O milagre e a força dos teus atos, Absolve nossos lábios impuros, São João. Notação musical 73 Correspondendo às notas musicais, são adotadas sete letras do alfabeto. Por volta de 540 d.C., essa outra notação foi introduzida pelo papa Gregório I – também chamado Gregório I, o Grande ou São Gregório Magno – e é utiliza- da em inglês, alemão e grego, entre outros idiomas, para denominar as notas musicais: C (Dó) – D (Ré) – E (Mi) – F (Fá) – G (Sol) – A (Lá) – B ou H (o primeiro é o Si bemol; e o segundo, o Si bequadro ou natural). C D E F G A B C D E F G A B Dó central ou H ou H A escrita das notas musicais As notas são colocadas tanto nas linhas como nos espaços. Quanto mais alta a posição da nota na pauta, mais agudo será o seu som. E quanto mais embaixo estiver na pauta, mais grave será o seu som. Clave No exemplo anterior, vimos que as notas não definem claramente a sua altura. É necessário um sinal colocado no início da pauta, que terá a função de dar nome a uma das notas, fixando a sua altura. Esse sinal é chamado clave (do latim clávis = “chave”) e serve para dar nome às notas musicais. Consequente- mente, as outras notas terão o seu reconhecimento nas outras linhas e espaços. As claves mais usadas são a de Fá e a de Sol. A clave de Dó é a menos usada. 74 Notação musical Clave de Sol Tem o seu ponto de referência na segunda linha da pauta, designando a nota Sol. Em sua origem, no antigo sistema de notação, era representada pela letra G. Era costume colocar, no início da pauta, o sinal que indicava qual nota estaria em determinada linha. Dessa forma, qualquer nota, por meio de sua cifra (A, B, C etc.) podia funcionar como clave, indicando a nota correspondente. Com o passar do tempo, a clave de Sol foi se destacando e passou a ser usada para vozes agudas. A sua escrita era muito ornamentada, evoluindo de um G para o formato atual. A clave de Sol é indicada para grafar as notas médias e agudas, como as do violino, flauta, oboé, trompete, canto e outros. A clave de Sol marca o lugar da nota Sol na segunda linha: Formas antigas da clave de Sol: Tendo a posição da nota Sol, pode-se deduzir os nomes das outras notas: Assim desenha-se a clave de Sol, iniciando na segunda linha da pauta. Sol tornou-se Sol Dó Ré Mi Fá Dó Ré Mi FáLá Si Notação musical 75 Clave de Fá É desenhada a partir da quarta linha da pauta musical. Originalmente, era representada pela letra F, indicando a nota Fá. A clave de Fá marca o lugar da nota Fá na quarta linha: desenho simbólico da clave de Fá Formas antigas da clave de Fá: Os dois pontos após a clave de Fá são os resídios da letra F. Tendo a posição da nota Fá, pode-se deduzir os nomes das outras notas: tornou-se Fá Fá Dó Ré MiLá SiSol Dó RéLá SiSol É indicada para o registro das notas graves, como os sons do violoncelo, do contrabaixo, do fagote, do trombone e outros. Escrevendo-se o mesmo sinal na mesma altura na pauta, mas com mudança na clave, há mudança no nome e no som da nota. Mesma posição Si Ré Aqui temos duas pautas, cada uma com sua clave. Esse sistema de pauta dupla é utilizado para o piano: na notação para esse instrumento, geralmente os sons graves são lidos na clave de Fá, enquanto os médios e agudos são lidos na clave de Sol. À direita, sobre as linhas da pauta, vemos os números de 1 a 5, 76 Notação musical indicando uma contagem que se faz de baixo para cima. A numeração mais à direita, de 1 a 4, assinala os quatro espaços, também lidos de baixo para cima. Nas linhas e nos espaços se escrevem as notas, as pausas e outros elementos da grafia musical. Vamos usar o modelo de um teclado para melhor visualização de como se distribuem as notas musicais ao longo das pautas com o uso das claves de Sol e de Fá. Há dois pentagramas e, entre eles, o Dó central, como se estivesse sobre uma linha que aqui aparece pontilhada. Acima dessa linha pontilhada que, na verdade, não existe, estão as notas escritas na clave de Sol e, abaixo, as notas na clave de Fá. As notas da clave de Sol (a partir do Dó central) iniciam na região média e, neste exemplo, se deslocam para a direita, tornando-se progressivamente mais agudas. As notas da clave de Fá, também a partir do Dó central, aqui, vão descendo paulatinamente para o lado esquerdo, tornando-se cada vez mais graves. Notação musical 77 Ainda no mesmo exemplo, a primeira nota à esquerda é um Dó na região grave; a nota que aparece entre as duas pautas é o Dó central do piano e a última nota é também um Dó, mas na região aguda. Clave de Dó A clave de Dó pode ser escrita na primeira, na segunda, na terceira ou na quarta linha. Seu uso está restrito às partituras para viola, violoncelo, fagote e trombone tenor. Veja, agora, diferentes claves nomeando notas de igual grafia. Linhas suplementares No conjunto de cinco linhas e quatro espaços da pauta, só podem ser gra- fadas nove notas, conforme o exemplo anterior. Assim, para grafar notas mais agudas ou mais graves, são utilizadas linhas suplementares, pequenos segmen- 78 Notação musical tos de linha que dão extensão à pauta. Essas linhas suplementares podem ser superiores ou inferiores, como podemos acompanhar ao lado. Figuras musicais Além da indicação da altura – dada pela posição da nota na pauta (na linha ou no espaço) – também temos na pauta musical a informação sobre o tempo de duração de uma nota em relação a outra (duração relativa). Esse aspecto é indicado pelo formato da nota e serve tanto para representar as figuras de som como as figuras de silêncio, que são as pausas. Para casa figura de nota existe uma pausa correspondente. Partes de uma figura haste colchete cabeça semibreve � mínima � semínima � colcheia � semicolcheia � fusa � semifusa � Notação musical 79 As figuras não indicam uma duração fixa, mas sim uma proporção entre elas. 1 = 2 h = 4 q = 8 e = 16 x etc. Cada figura tem um número de referência, conforme a proporção apresentada. 1 2 4 8 16 32 64 Cada pausa corresponde a uma figura musical. Uma nota de mesma altura, mas expressa em diferentes figuras, com seus respectivos valores proporcionais. As pausas correspondentes, nas suas devidas posições. 1 1/2 1/4 1/8 1/16 1/32 1/64 80 Notação musical Na figura anterior vemos algumas notas de mesma altura, porém expres- sas em diferentes figuras musicais, com seus respectivos valores proporcionais. Vemos ainda as pausas correspondentes nas suas devidas posiçõesquando es- critas na pauta musical. As divisões relativas e quantitativas das figuras musicais: = 2 ; 4 ; 8 ; 16 ; 32 ; 64 1 = 2 ; 4 ; 8 ; 16 ; 32 1 = 2 ; 4 ; 8 ; 16 1 = 2 ; 4 ; 8 1 = 2 ; 4 1 = 2 Mostramos aqui como a semibreve se divide em notas de menor valor: 1 semibreve – 2 mínimas – 4 semínimas – 8 colcheias – 16 semicolcheias – 32 fusas A proporcionalidade da figura de maior duração, a semibreve e as subdivisões em figuras de menor duração. Notação musical 81 Compasso Compasso é uma maneira de dividir um trecho musical em valores tempo- rais e regulares, utilizando as notas e as pausas. Essa divisão é feita por meio de traços verticais, denominados travessões ou barras de compasso. Podemos então acrescentar que o compasso é também o espaço existente entre as duas barras de compasso. Essa forma de dividir a peça auxilia o músico no momento da leitura e da execução. Barra de compasso Compasso Barra dupla de finalização Binário 2 tempos Ternário 3 tempos Quaternário 4 tempos A representação do compasso é feita por meio de uma fórmula ou indica- ção numérica no início da peça musical. Essa indicação do compasso se faz com números fracionários. O numerador (algarismo superior) indica o número de tempos usado pelo compositor e o denominador (algarismo inferior) indica a figura musical que corresponde à unidade, ou seja, a que preenche um tempo no compasso. 82 Notação musical Dó Ré Mi Fá Sol Sol So-ol Um trecho de canção com compasso quaternário: em cada compasso há quatro tempos. Fórmula de compasso 4 4 tempos por compasso 4 indica que a q vale 1 tempo Compasso ternário 3 3 tempos por compasso 4 unidade de tempo = q Compasso ternário, isto é, três tempos por compasso. Observe que a pausa também conta no somatório dos va- lores. Nesse caso, a pausa correspondente à semínima e portanto tem a sua duração, que é de um tempo. Ponto de aumento Observe que a última nota da pauta na peça da página anterior é pontuada. A função do ponto de aumento, colocado à direita da nota, é aumentar a metade do seu valor. A figura rítmica desse compasso é uma mínima, que tem a duração de dois tempos, mas recebendo um ponto ela amplia sua duração, ganha mais um tempo e, nesse caso, preenche todo o compasso com três tempos. Tom e semitom A menor distância entre dois sons conjuntos, na música ocidental, é chamada semitom. Notação musical 83 Observe as teclas do piano. O semitom é a diferença de altura entre duas teclas adjacentes. Ele está entre a tecla branca e a tecla preta imediatamente à sua direita ou à sua esquerda ou entre as duas teclas brancas adjacentes, quando não há uma preta no meio. O intervalo de semitom, no nosso sistema tonal, é a menor distância entre duas notas, de modo que nada pode ser acrescentado entre elas. Esse é um exemplo de um semitom cromático: as notas têm o mesmo nome, isto é, esse semitom é baseado na mesma nota, que é modificada por uma alte- ração (o sustenido) que a eleva um semitom. Nesse caso, trata-se das notas Lá e Lá#. Partindo da primeira nota (Lá) à esquerda e seguindo a continuidade de sua leitura à direita, vemos que a próxima nota (também Lá) é acrescida de um sinal, que eleva o seu som e assim realiza o semitom cromático. E aqui temos um semitom diatônico: ele está entre duas notas de nomes di- ferentes – Mi e Fá. Além de ser um intervalo diatônico, essa distância entre Mi e Fá e entre Si e Dó é considerada semitom natural, formados por notas naturais. Quando o intervalo é de dois semitons (por exemplo, de Sol a Lá ou de Ré a Mi), equivale a um tom. 84 Notação musical Acidentes musicais Na imagem a seguir, podemos observar que as teclas pretas têm os mesmos nomes que os de suas vizinhas brancas, e que cada tecla preta possui dois nomes. Se partirmos da tecla Dó e subirmos à direita para a tecla preta imediata, tere- mos Dó sustenido (Dó#), ou seja, a nota Dó ficou um semitom mais aguda. Mas se estivermos na nota Ré e descermos um semitom, à esquerda, chegaremos em Ré bemol (Ré b) e assim o Ré ficará um semitom mais grave. Os sinais que alteram as notas são chamados acidentes. Dó Ré Mi Fá Sol Lá Si Dó Ré Fá Sol Lá Ré Mi Sol Lá Si -dão. Dentro Nesse trecho de canção encontramos um sustenido (#) na nota Sol. Geralmente o acidente é colocado à esquerda da nota que irá alterar. Vamos conhecer alguns dos acidentes musicais mais usados. Este é o bemol (¿); e sua tarefa é abaixar a nota um semitom. Nesse caso, a nota Mi e depois a nota Si. Notação musical 85 Este é o sustenido (#) e sua função é elevar a nota um semitom. No exemplo, temos alteração da nota Fá e, depois, da nota Dó. Aqui temos o bequadro, que serve para anular o acidente anterior (nesse caso, o #). A nota Fá # volta a sua entoação natural com a indicação do bequadro. [Os parênteses ( ) em qualquer acidente indicam "precaução"] Escala A palavra escala tem origem no latim scala (“escada”) e indica uma série de sons conjuntos, formando entre eles intervalos de tom ou semitom que se suce- dem em movimento ascendente ou descendente. Escala de Dó, isto é, uma escala que começa e termina com a nota Dó. Há dois tipos de escala na base da maioria das músicas mais ouvidas atual- mente: a escala maior e a escala menor. Chamaremos a escala a seguir de Dó maior. Observe onde estão os tons e se- mitons nas imagens. Essa distribuição de intervalos (tons e semitons) caracteriza uma escala maior. As outras escalas maiores também seguirão esse esquema. 86 Notação musical A letra T (que indica a existência de um intervalo de um tom) está situada entre a primeira e a segunda notas, entre a segunda e a terceira, a quarta e a quinta, a quinta e a sexta e, finalmente, entre a sexta e a sétima notas. A letra S (que indica o intervalo de semitom) está entre a terceira e a quarta notas e entre a sétima e a oitava. Qualquer nota pode começar uma escala maior, desde que não altere essa disposição dos tons e semitons. A escala de Dó maior é a única tocada nas teclas brancas do teclado. Para a construção das outras escalas geralmente serão usadas as teclas pretas. Escalas maiores escritas nas claves de Sol, de Fá e de Dó. Observe como são mantidas as posições dos tons e semitons. Dó Maior Fá Maior Mi Maior Notação musical 87 Graus de uma escala As notas que formam a escala recebem um nome técnico de acordo com o local em que estão. Por exemplo, na escala de Dó, a primeira nota (Dó) chama- se tônica e é o grau principal da escala. A quinta nota (Sol) é a dominante, grau mais importante depois da tônica. Na imagem a seguir, estão todos os graus de uma escala. . . A escala de Dó maior começa com uma 3.ª maior (= 1 tom + 1 tom). . . A escala de Dó menor começa com uma 3.ª menor (= 1 tom + 1 semitom). Outra escala também muito presente nas músicas que ouvimos é a escala menor. A diferença mais importante entre uma escala maior e uma escala menor é o abaixamento de um semitom na terceira nota da escala menor. Há dois tipos de escala menor: harmônica e melódica. 88 Notação musical A escala menor harmônica recebe esse nome por ser adequada para a forma- ção de acordes e harmonias. Observe que a terceira e a sexta nota estão abaixa- das (com o uso do bemol). Já a escala menor melódica tem essa denominação porque suas notas são adequadas à construção de melodias. Note que a sexta nota é elevada com o sustenido (#) na ida, mas na volta abaixa-se a sexta e a sétima nota com o em- prego do bemol (b). Outros tipos de escala: os intervalos entre os sons marcam suas característi- cas e as diferenciam entre as demais. Cromática Bachiana Pentatônica Escala de Tons Inteiros (Hexafônica) Notação musical 89 Escala Cigana Escala Octatônica (Simétrica) Intervalos Intervalo é a diferença de altura entre dois sons, mastambém pode ser defi- nido como a distância que separa um som do outro. Intervalo Melódico Ascendente Intervalo Melódico Descendente Intervalo melódico O intervalo melódico é constituído por dois sons emitidos um após o outro. Ele é ascendente quando a primeira nota é mais grave que a segunda e descen- dente quando a primeira nota é mais aguda que a segunda. . . . . . . . . Diversos intervalos formados a partir da nota Dó. O reconhecimento do intervalo se dá pelo número de notas que abrange, desde a sua nota mais grave até a mais aguda. Por exemplo, Dó-Fá é um interva- lo de quarta, pois compreende quatro notas: Dó, Ré, Mi e Fá. Por sua vez, Dó-Lá é um intervalo de sexta, pois aqui temos as notas Dó, Ré, Mi, Fá, Sol e Lá. E assim por diante. 90 Notação musical Vamos ouvir o trecho inicial de uma canção em que podemos observar inter- valos ascendentes no começo da melodia, isto é, seus sons fazem um movimen- to de grave para agudo. Guilherme Arantes Meu Mundo e Nada Mais Faixa 35 (CD 1) Nesse caso, o início é com a nota Lá, subindo para Si bemol e indo até a nota Dó, para depois fazer um salto descendente de quinta e chegar à nota Fá. Logo em seguida, há novamente a sequência dos sons de forma ascendente, entre Fá, Sol e Lá bemol. No segundo compasso, temos as mesmas notas do início da canção, mas há um grande salto intervalar ascendente de sete notas entre o Fá (colcheia) e o Mi (mínima). No terceiro compasso, vamos observar quatro notas em movimento descen- dente (Mi bemol a Si bemol) para em seguida retornarem a um som mais agudo (indo da nota Lá para o Ré). Essa última nota apresenta uma ligadura que produz maior duração no som, assim fechando a primeira frase musical da composição. A segunda ideia inicia com o verso “só sobraram restos...”. Observe que a me- lodia, isto é, a sequência de notas, é a mesma da primeira parte, mas a letra da canção é outra. A terceira parte traz novidades no aspecto melódico. Com as palavras “Eu que tinha tudo...”, a nota Fá é repetida três vezes, garantindo a mesma altura sonora para esse início do compasso. A quarta parte tem seu começo com as frases “Eu queria tanto estar...”, sendo uma repetição musical da terceira parte. Notação musical 91 um Da Da à 92 Notação musical Intervalo harmônico O intervalo harmônico é constituído por sons simultâneos. No exemplo ante- rior, as notas Fá e Dó são tocadas ao mesmo tempo. Acordes Duas, três ou mais notas soando juntas formam um acorde. Chama-se tríade quando ele é composto de uma nota principal (chamada fundamental), mais a terceira e a quinta notas da escala. Os acordes podem ser construídos a partir de qualquer nota da escala. I II III IV V VI VII VIII (= 1) I II III IV V VI VII VIII (= 1) Vejamos um trecho de uma partitura que contém os acordes. A autora desta peça é Verhaalen (1993, p. 30). Notação musical 93 Entre tantos assuntos que envolvem os acordes, vamos enfocar os aspectos con- sonantes e dissonantes, que são elementos fundamentais na harmonia tradicional. Acordes consonantes Dizemos que um acorde é consonante quando suas notas parecem estar con- cordando entre si. A sensação que temos ao ouvi-lo é de repouso, estabilidade e completude entre seus sons. Acordes dissonantes No acorde dissonante, por sua vez, tem-se a percepção de que algumas notas estão em discordância e não se completam, produzindo um clima de movimen- to, instabilidade e tensão. O resultado sonoro nos chega como se esse acorde estivesse incompleto, necessitando de uma complementação. É importante ressaltar que, na verdade, esses conceitos de consonância e dis- sonância são resultados de uma convenção e, portanto, podem variar de acordo com a época, o estilo e a cultura. Vamos ouvir trechos de peças musicais em que predominam esses tipos de acorde para averiguar qual a nossa percepção. Primeiro, um exemplo do uso de acordes consonantes. Diversos Autores Canta Brasil Faixa 36 (CD 1) E agora um exemplo do uso de acordes dissonantes. Heitor Villa-Lobos (1887-1959) Festa no Sertão Faixa 37 (CD 1) 94 Notação musical A escrita da bateria Vamos conhecer a escrita musical para os instrumentos de percussão. Uma partitura válida para os instrumentos de percussão. Clave de percussão. A clave de percussão não determina a altura das linhas e espaços da pauta: sua função é representar os instrumentos de percussão de altura não determi- nada, como um tambor, um prato e outros mais. As notas são posicionadas arbi- trariamente na pauta e indicam apenas alturas relativas. Apenas para os tímpanos, que têm alturas definidas, as partituras são escritas na clave de Fá. Notação musical 95 Página 1 da partitura para bateria da música Pride, da banda U2. 96 Notação musical U2 Pride Faixa 38 (CD 1) Na partitura de Pride, do U2, aparece o sinal chamado ritornello, que indica a repetição do trecho que está entre esses dois sinais. O músico deverá ficar atento para executar conforme a indicação. Andamentos Os sinais de expressão são orientações colocadas pelos compositores nas par- tituras. Compositores italianos foram os primeiros a utilizá-los. Em seguida, eles foram utilizados no mundo todo. Cinética musical ou agógica é parte da música que trata da velocidade de execução de uma composição, à qual chamamos andamento. Alguns andamentos: Allegro � – depressa, animado. Andante � – com passo tranquilo. Vivace � – com vivacidade. Largo � – muito vagaroso. Prestissimo � – o mais depressa possível. Mudanças de andamento: Accelerando � (accel.) – acelerando, aumentando a velocidade. Allargando � – retardando o andamento. Notação musical 97 Rallentando � (rall.) – diminuindo. Più mosso � – mais depressa. Metrônomo Para determinar com exatidão o andamento de uma peça, é utilizado o me- trônomo (do grego metron = “medida” + nomos = “padrão”). A invenção desse aparelho é atribuída ao mecânico austríaco Johann Nepomuk Maelzel, que o pa- tenteou em 1816. Ele produz som ou flashes de luz em um determinado padrão de velocidade. A sua forma pode ser de pirâmide (conforme a imagem abaixo), com um pên- dulo que serve para determinar o andamento, marcando a duração dos tempos de maneira regular. De acordo com a posição do marcador (peso do pêndulo), as batidas podem ser mais rápidas ou mais lentas. O andamento é expresso por números: de 40 a 208 batidas por minuto. Beethoven foi o primeiro compositor a usar o metrônomo. Co m st oc k Co m pl et e. Is to ck ph ot o. O metrônomo eletrônico oferece uma variação maior e mais precisa de velo- cidades, de 35 a 250, números que indicam quantas batidas por minuto (bpm) o aparelho está executando. Basta ajustá-lo conforme a velocidade desejada. Para estabelecer o andamento da peça ou do trecho a ser executado, no início ou no decorrer da partitura há a indicação do metrônomo (M.M., isto é, metrôno- mo de Maelzel) ao lado do andamento, ou também isoladamente. No primeiro exemplo a seguir, a sugestão do compositor é a de que o número de tempos seja de 126 batidas por minuto (como um tique-taque), no outro, a indicação é de 72bpm. 98 Notação musical Termos italianos que indicam os andamentos e suas variações: Andamento bpm Definição Gravissimo menos de 40 Extremamente lento Grave 40 Muito vagarosamente e solene Larghissimo 40-60 Muito largo e severo Largo 40-60 Largo e severo Larghetto 60-66 Mais suave e ligeiro que o largo Lento 60-66 Lento Adagio 66-76 Vagarosamente, de expressão terna e patética Adagietto 66-76 Vagarosamente, pouco mais rápido que adagio Andante 76-108 Velocidade do andar humano, amável e elegan- te Andantino 84-112 Mais ligeiro que o andante, agradável e compas- sado Moderato 108-120 Moderadamente (nem rápido, nem lento) Allegretto 112-120 Nem tão ligeiro como o allegro – também chamado de allegro ma non troppo Allegro 120-168 Ligeiro e alegre Vivace 152-168 Rápidoe vivo Vivacissimo 168-180 Mais rápido e vivo que o vivace – também chamado de molto vivace Presto 168-200 Veloz e animado Prestissimo 200-208 Muito rapidamente, com toda a velocidade e presteza Dinâmicas As indicações de dinâmica determinam o volume ou a intensidade sonora, aparecendo durante todo o desenrolar da peça. Notação musical 99 Alguns exemplos: pianissimo � (¹ e ¸) – muito suave; mezzo piano � (P) – moderamente suave; forte � (f ) – forte; fortissimo � (Ä e ì) – fortíssimo; crescendo � (cresc.) – cada vez mais forte; sforzando � (S ou ) – enfatizando a nota. E há indicações para estilo, caráter e expressão. Alguns exemplos: agitato � – agitado; cantabile � – cantando, de modo expressivo; giocoso � – jocoso; legato � – ligado; scherzando � – brincando; tranquillo � – tranquilo, calmo; tutti � – todos os instrumentos tocando; vivo � – com vivacidade. O trecho inicial de uma peça de Beethoven pode exemplificar as grafias de dinâmica, assinaladas na partitura como sugestões para a execução. 100 Notação musical Sonata ao Luar Sonata quasi una fantasia op. 27, n. 2 L. van Beethoven (1770-1827) Ludwig van Beethoven (1770-1827) Sonata ao Luar Faixa 39 (CD 1) Vamos ver a grafia das dinâmicas em uma peça de Brahms, em um arranjo para piano. Na audição, teremos a mesma peça, mas executada por toda a orquestra. Notação musical 101 Hungarian dance n. 5 Johannes Brahms Arranged by P. Ballatore Nesta peça, ouviremos muitas variações e modificações de andamento, con- trastando vigorosamente (rápido-lento). Também iremos apreciar as diferentes dinâmicas quanto às intensidades – ora suaves, ora fortíssimas – inclusive ob- servando os crescendos e decrescendos sonoros. Fique atento ao estilo agitado, vivo e legato, que se alterna ao longo da peça. Aguce todos os seus sentidos para o final da obra, quando a orquestra faz um radioso tutti, envolvendo todos os instrumentos para encerrar a execução de forma grandiosa e eloquente. Aqui temos um trecho de um arranjo para piano dessa mesma peça. 102 Notação musical Johannes Brahms (1833-1897) Danças Húngaras para Orquestra n. 1 em Sol Menor Faixa 40 (CD 1) Texto complementar George Crumb O compositor estadudinense George Crumb (1929) distingue-se por ex- plorar sons inusitados, solicitando que os instrumentistas executem suas peças de maneira não convencional. Muitas das suas obras estão escritas para instrumentos amplificados eletronicamente e ele também utilizou formas não convencionais em suas partituras, como por exemplo a espiral. Em nosso século, a partitura – além de representar a música – pode assu- mir o aspecto visual do motivo que a instigou. Aqui, o desenho espiralante de uma galáxia. (De Makrokosmos do norte--americano George Crumb, se- gunda metade do século XX) Obra de George Crumb. Notação musical 103 Instrumentos desconhecidos: harmônio Instrumento de teclado com fole utilizado para acompanhar vocais, com som parecido ao do órgão. Tem palhetas duplas, 3/4 de oitavas, 7 botões niquelados de parada de nota, 3 notas extras, duplo fole, afinação de órgão, teclas de piano com molduras de vidro e fechamento com tampa. D om ín io p úb lic o. Referências ABRAHÃO, Luz Martins. Música Comunicação. Ed. do Professor. São Paulo: Na- cional, 1976. v. 2. _____. Música Comunicação. Ed. do Professor. São Paulo: Nacional, 1977. v. 1. ANDAMENTO. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Andamento>. Acesso em: 13 fev. 2008. ARANTES, Guilherme. Meu Mundo e Nada Mais. Partituras facilitadas para tecla- do: Guilherme Arantes. São Paulo: Irmãos Vitale, 1997. (Easy Play). BENNETT, Roy. Elementos Básicos da Música. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1990. 104 Notação musical CANDÉ, Roland de. História Universal da Música. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001. v. 1. CORRÊA, S. R. S. Ouvinte Consciente: arte musical. 7. ed. São Paulo: Editora do Brasil, 1975. CRESCENDO Easy play: método – partituras facilitadas para teclado. São Paulo: Irmãos Vitale, 2000. EPITÁFIO de Seikilos. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Epit%C3% A1fio_de_Seikilos>. Acesso em: 13 fev. 2008. FIGUEIREDO, S. L. F. de; LIMA, M. R. R. de L. Exercícios de Teoria Musical: uma abordagem prática. 2. ed. São Paulo: Artcromo, 1991. FRANCO, A. T. O Abade de Cluny. Disponível em: <www.revistadigital.com.br/ adagio.asp?NumEdicao=179&CodMateria=1256>. Acesso em: 13 fev. 2008. GUIDO D’Arezzo. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Guido_d’Arezzo >. Acesso em: 13 fev. 2008. HENTSCHKE, L. et al. A Orquestra Tintim por Tintim. São Paulo: Moderna, 2005. INICIANDO Easy play: método – partituras facilitadas para teclado. São Paulo: Irmãos Vitale, 1997. INTERVALOS e músicas brasileiras. Disponível em: <www.jazzbossa.com/interva- los/>. Acesso em: 13 fev. 2008. MED, Bohumil. Teoria da Música. 4. ed. Brasília: Musimed, 1996. MORAES, J. J. de. O que É Música. São Paulo: Brasiliense, 1983. MUSIC dictionary: musical symbols. 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Esse é o método Hornbostel-Sachs, que recebe o nome dos seus dois criadores, Erich Moritz von Hornbostel e Curt Sachs. Existe inclusive uma área especializada, chamada organologia, que estuda, descreve, classifica e analisa os instrumentos a partir do material empregado, da forma, da qualidade do som produzido, do timbre e do modo de execução. A orga- nologia também pesquisa a origem, a cultura diferente dos instrumentos, o seu desenvolvimento histórico e suas aplicações musicais. Idiofones O próprio corpo do instrumento vibra para produzir o som. Fazem parte dessa categoria o reco-reco, o chocalho, o caxixi, o ganzá, e, também, os instrumentos com altura definida, como o xilofone, o metalofone, o carri- lhão e glockenspiel. E, ainda, os instrumentos com altura indefinida, como os blocos sonoros, as clavas e os pratos. 107 108 Instrumentos musicais Clavas Também conhecidas como pauzinhos, as clavas compõem um idiofone de ma- deira, usado em muitos lugares do mundo, com nomes, materiais e timbres diver- sos. No Brasil, as clavas eram decoradas pelosíndios com gravação a fogo. Is to ck ph ot o. Caxixi Chocalho composto de cesto de palha com sementes no seu interior. Usa-se especialmente na capoeira, como instrumento complementar ao be rimbau. Is to ck ph ot o. Instrumentos musicais 109 Maracas Idiofone constituído por uma cabaça seca e oca, um coco ou outro material com sementes. É muito usado para acompanhar música de dança na América Latina. Is to ck ph ot o. Perez Prado Seleção Perez Prado Faixa 41 (CD 1) Triângulo Instrumento de metal (aço ou alumínio). Seu som é produzido por meio da percussão do bastão no triângulo, com uma mão, sendo que a outra mão tem a função de segurar o triângulo ou fazer movimentos de abrir ou fechar os dedos para obter modificação no som. Usado especialmente no forró, no xaxado e no xote, também está presente na orquestra e na banda. Is to ck ph ot o. 110 Instrumentos musicais Luiz Gonzaga (1912-1989) Humberto Teixeira (1915-1979) Assum Preto Faixa 42 (CD 1) Agogô Idiofone de metal que acompanha o candomblé, a capoeira e o samba. Os dois cones metálicos, um maior e outro menor, são percutidos com uma baqueta. Ph ot o O bj ec ts . Ganzá Chocalho de metal ou plástico, em forma de cilindro, que contém areia, grãos de cereais ou contas pequenas em seu interior. Ph ot o O bj ec ts . Instrumentos musicais 111 Reco-reco Idiofone de raspagem, de forma muito variada. Pode ser feito de madeira, plástico, metal ou misto. O som é obtido quando se produz o atrito raspando suas saliências com uma vareta de madeira, metal ou plástico. Is to ck ph ot o. Xilofone Instrumento de altura definida, composto de placas de madeira dispostas como o teclado de um piano. Embaixo de cada placa pode haver um tubo de ressonância que amplifica o som. O xilofone é tocado com duas baquetas e, eventualmente, pode estar apoiado sobre um suporte com rodízios. Camille Saint-Saëns (1835-1921) Dança Macabra Faixa 43 (CD 1) Is to ck ph ot o. 112 Instrumentos musicais Glockenspiel O glockenspiel (“toque de sinos”) tem placas de aço de tamanhos graduados, dispostas como um teclado de piano. O músico utiliza baquetas com cabeças de diferentes materiais, conforme o som que deseja extrair. Is to ck ph ot o. Christian Petzold (1677-1733) Minueto em Sol Maior Faixa 44 (CD 1) Carrilhão O carrilhão de orquestra (ou sinos tubulares) é composto de tubos de aço ocos, dispostos em gradação de comprimento para produzir sons de diferentes alturas. O percussionista utiliza uma baqueta de madeira para percutir a extre- midade superior dos tubos. Big-Ben (Canção Tradicio- nal Inglesa) Faixa 45 (CD 1) Instrumentos musicais 113 Membranofones São os instrumentos de percussão que produzem o som por meio da vibra- ção das membranas estendidas. Tamborim Pequeno tambor segurado pelo executante com uma das mãos enquanto com a outra percute o instrumento utilizando uma baqueta. É usado especial- mente no samba. Is to ck ph ot o. Repique Repique ou repinique é um tambor pequeno, com pele em ambos os lados, tocado com uma baqueta em uma das mãos enquanto a outra percute direta- mente sobre a pele. Foi criado pelas escolas de samba para emitir notas agudas, preenchendo os intervalos de tempo. Ph ot o O bj ec ts . 114 Instrumentos musicais Zabumba Tem o formato de uma caixa cilíndrica. Possui duas membranas de pele, a superior é grossa e produz sons graves, ao passo que a outra é fina e emite sons agudos. A zabumba é usada na música nordestina, especialmente no forró, no baião, no xaxado e no xote. Is to ck ph ot o. Caixa A caixa, também conhecida como caixa-clara ou tarol, tem duas membranas: a superior é percutida e a inferior entra em contato com a esteira, que é consti- tuída de arame espiralado ou tripa esticada ao longo dessa membrana inferior. Ao se percutir a membrana superior com baquetas duras, a esteira vibra contra a membrana inferior, produzindo um som claro e enérgico (BENNETT, 1985). Is to ck ph ot o. Instrumentos musicais 115 Bombo É o maior dos tambores e produz o som grave e constante nas baterias, apoiando a formação do ritmo. Na orquestra, pode ser tocado suavemente ou, com efeitos especiais, torna-se eletrizante. Is to ck ph ot o. Surdo Possui grandes dimensões, pele de ambos os lados e som grave. A sua função é marcar o tempo, podendo ser encontrado nas baterias das escolas de samba e em bandas militares. Is to ck ph ot o. 116 Instrumentos musicais Bongô Instrumento de percussão de origem afrocubana, de sonoridade profunda, constituído por dois tambores ligados, tocados entre os joelhos ou apoiados em um suporte para quando o músico tocar em pé. A pele é percutida com as mãos. A variedade de sons pode ser obtida com diferentes formas e locais de percutir o instrumento. O bongô é usado nos ritmos caribenhos, como a rumba, a salsa, o merengue e o bolero. Is to ck ph ot o. Agustín Lara (1900-1970) Solamente una Vez Faixa 46 (CD 1) Aerofones Nesses instrumentos, o som é resultado da vibração do ar pela passagem através das arestas ou palhetas. São os chamados instrumentos de sopro. Entre os instrumentos de sopro, os mais conhecidos na música popular são o trompete, o saxofone e a flauta. Atualmente, eles se fazem notar no jazz e no blues. Trompete Aerofone de metal também conhecido como pistão. Constitui-se de um tubo de metal com um bocal em uma extremidade e uma campânula na outra. O uso de pistões controla o ar que fica dentro do tubo. As notas são produzidas pela pressão dos lábios e pela velocidade com que o ar é assoprado pelo trompetista. Instrumentos musicais 117 Os três pistões possibilitam que ele produza cromaticamente todos os sons dentro de sua extensão. Esse instrumento é utilizado em diversos gêneros musicais, como o jazz, os ritmos latinos (especialmente o mambo e a salsa) e também nas peças clássicas. Louis Armstrong e Miles Davis foram trompetistas famosos. Is to ck ph ot o. Kurt Weil (1900-1950) Bertold Brecht (1898-1956) Mack the Knife Faixa 47 (CD 1) Max C. Freedman e Jimmy de Knight Rock Around the Clock Faixa 48 (CD 1) Saxofone Foi inventado por Adolphe Sax, um clarinetista e construtor de instrumentos, por volta de 1840, na Bélgica. Apesar de ser feito de metal, produz som através de uma palheta simples e um sistema de chaves que abrem e fecham orifícios perfurados ao longo do tubo cônico – detalhes que caracterizam os instrumen- tos de madeira e não os metais. É feito em vários tamanhos e tonalidades, em um total de oito modelos. O sax soprano e o sax sopranino são retos, como se fossem clarinetas de metal. 118 Instrumentos musicais A sonoridade do saxofone é anasalada e por essa qualidade ele não é um membro regular da orquestra. Quando usado em orquestras, geralmente é execu- tado por um clarinetista porque seu dedilhado é muito similar ao da clarineta. Por conta de sua sonoridade ser suave, lírica e ágil, o sax é muito utilizado no jazz. Boquilhas para o sax tenor. Quando executa música clássica, o instrumen- tista utiliza a boquilha da esquerda, enquanto a da direita é mais adequa- da para o jazz ou o pop. Palhetas para o sax alto (à esquerda) e para o sax tenor (à direita). Ph ot o O bj ec ts . Ph ot o O bj ec ts . Ph ot o O bj ec ts . Baden Powell (1937-2000) Vinicius de Moraes (1913-1980) Canto de Ossanha Faixa 49 (CD 1) Sax tenor. Sax alto (contralto). Sax barítono. Is to ck ph ot o. Is to ck ph ot o. Is to ck ph ot o. Is to ck ph ot o. Sax soprano. Instrumentos musicais 119 Flauta transversal Aerofone que não possui palheta. Seus sons são produzidos pelo sopro em um orifício aberto em uma extremidade do tubo, sendo que a outra é fechada. O instrumentista a segura para o lado e ao assoprar provoca a vibração da coluna de ar que está dentro do instrumento, produzindo a nota. As notas mais agudas são claras, frias e penetrantes, enquantoas graves são doces, intensas e suaves. Jean-Pierre Rampal e James Galway são flautistas de destaque internacional. No Brasil, temos Altamiro Carrilho. Is to ck ph ot o. Joaquim Sobreira Praga de Sogra Faixa 50 (CD 1) Flauta doce Mesmo com diferenças de tamanho, todas as flautas doces têm oito orifícios. As maiores têm embocadura de metal. Desde a Pré-História e a Antiguidade a flauta doce é tocada, tanto como ins- trumento de ritual como folclórico. No século XIII, a flauta doce era o mais popu- lar instrumento na Idade Média. Entre os instrumentos utilizados atualmente, é o de data mais remota. Antigamente, era feita de madeira, osso, bambu, e hoje é produzida em plástico. Consiste em um tubo com sete buracos para os demais 120 Instrumentos musicais dedos e um para o polegar. O seu declínio, por volta de 1750, está associado ao surgimento da orquestra clássica, quando os compositores procuravam instru- mentos com mais recursos. Com o objetivo de pesquisar a música antiga, no final do século XIX, os compositores voltaram a se interessar por ela e assim a flauta doce foi reconstruída com o mesmo tratamento dado aos demais instru- mentos. Usada para a musicalização nas escolas a partir de 1920, ressurgiu com composições próprias. Is to ck ph ot o. Tradição Oral Brasileira Cant’as Mangueira / Adeus Surpresa Faixa 51 (CD 1) Há instrumentos de teclado em que o som é gerado pelo movimento do ar, como o acordeão e o órgão, sugerindo novos processos de reprodução sonora e novos timbres. Instrumentos musicais 121 Acordeão Aerofone de palheta dotado de fole e teclas. Possui um diapasão e duas caixas harmônicas de madeira. Foi criado no século XIX. É muito utilizado na França, em Portugal e em outros países da Europa, nas festas populares e em encontros entre amigos. É muito usado também na música brasileira no nordeste. Is to ck ph ot o. Oswaldinho do Acordeon Bom e Bonito Faixa 52 (CD 1) Humberto Gessinger Refrão de Bolero Faixa 53 (CD 1) 122 Instrumentos musicais Órgão Instrumento classificado como aerofone de teclas, pois tem passagem de ar comprimido através de tubos. Is to ck ph ot o. Catulo da Paixão Cearense (1863-1946) Ave Maria Faixa 54 (CD 1) Cordofones Nesses instrumentos, o som é produzido pela vibração de uma ou mais cordas tensionadas. São os denominados instrumentos de corda. Instrumentos musicais 123 Banjo Cordofone dedilhado, com caixa redonda e braço comprido, foi criado por afro-americanos e é típico da música country norte-americana. O número de cordas é variado. Is to ck ph ot o. Is to ck ph ot o. Balalaica Cordofone de corpo triangular achatado, de madeira, com três cordas sim- ples ou duplas dedilhadas. É um instrumento fundamental no folclore russo. Is to ck ph ot o. 124 Instrumentos musicais Henri Vieuxtemps (1820-1881) Variações Faixa 55 (CD 1) Violão Instrumento de cordas pinçadas. Seu corpo é oco e feito de diferentes madei- ras. Seu som tem amplificação natural na sua caixa de ressonância. Os trastes no braço o tornam um instrumento temperado (seu menor intervalo é de um se- mitom, como o piano, a guitarra, entre outros). Existem violões com sete cordas, mas os mais comuns têm seis cordas de náilon ou de aço. No Brasil, existem grandes violonistas como Garoto, Guinga, João Bosco, Pau- linho Nogueira, Toquinho, Baden Powell, Mário da Silva e Yamandú Costa, entre tantos. Is to ck ph ot o. Instrumentos musicais 125 Paulinho Nogueira (1929-2003) Bachianinha n. 1 Faixa 56 (CD 1) Cavaquinho Instrumento de cordas dedilhadas, cujo braço é dividido por dezessete tras- tes. Tem quatro cordas de tripa ou metal. Usado especialmente para a execução do choro, juntamente com o bandolim, a flauta e o violão. D iv ul ga çã o G ia nn in i. Waldir Azevedo (1923-1980) Brasileirinho Faixa 57 (CD 1) Bandolim Surgiu na Itália, no século XVI. Tem forma de pera e costas abauladas. Possui oito cordas, agrupadas em pares e afinadas em uníssono, com o intervalo de quinta. 126 Instrumentos musicais Is to ck ph ot o. Jacob do Bandolim (1918-1969) Assanhado Faixa 58 (CD 1) Instrumentos musicais e seus recursos eletrônicos Processamento do som Para que um som seja processado eletronicamente, há três aspectos que pre- cisam ser levados em conta: a captação, a amplificação e a reprodução. Captação Na captação, busca-se recriar todas as condições do ouvido humano com a maior fidelidade possível ao som original, porque o ouvido humano interpreta imediatamente tudo o que ouve, enquanto o microfone não o faz. A tecnologia põe à disposição diversos modelos de microfone, atendendo a diferentes ne- cessidades dos usuários: alguns são projetados para captar sons mais agudos enquanto outros são mais sensíveis aos graves, há os que captam em longa dis- tância e aqueles adequados aos sons mais próximos. Instrumentos musicais 127 Nos estúdios, os microfones mais sofisticados servem para a tomada de voz. Projetados para captar com nitidez tudo o que soar em um raio de até 1,5 metro à sua volta, eles são chamados de microfones omnidirecionais, ensina-nos Sá (2003). Por isso, as salas de gravação necessitam de tratamento acústico feito com materiais próprios, para que fiquem protegidas dos ruídos externos. Essas salas são construídas visando garantir a circulação do som de forma mais real e fiel, evitando distorções e perdas. Amplificação Na amplificação, os modelos de microfone são desenvolvidos de acordo com a necessidade. No palco, por exemplo, todo o som é enviado a um aparelho capaz de dividir o som em faixas de frequência (graves, médios e agudos), destinando- -as para diferentes amplificadores, afirma Sá (2003). O amplificador, portanto, é um dispositivo que usa sinais elétricos para ampliar os sons. A qualidade de som é avaliada por sua potência e não pelo volume. A divisão do som em esquerda e direita é realizada pelo amplificador estéreo, que visa se- parar e diferenciar as emissões sonoras para cada lado. O resultado desse proces- so corresponde exatamente à captação da fonte sonora em mono ou estéreo. Is to ck ph ot o. Guitarra e caixa amplificadora. 128 Instrumentos musicais Reprodução Na reprodução, estão envolvidos os alto-falantes e há muita variedade em aplicações e modelos. O alto-falante é um componente usado para transformar sinais elétricos em som. Um só aparelho pode conter os três tamanhos, um para cada tipo de frequência, com o objetivo de reproduzir com mais qualidade toda uma faixa de áudio. O tipo woofer é adequado para os sons graves, que são de baixa frequência, mas de alta potência. O modelo mid range é próprio para os sons médios (também usado nos rádios, televisores e caixas acústicas). O tweeter reproduz os sons agudos. Is to ck ph ot o. Processadores do som São os aparelhos que têm a função de realçar as qualidades ou efeitos dos sons. Vamos ver algumas de suas funções. Chorus � : sua função é atrasar o som original, podendo produzir uma sensa- ção de flutuação pelo encontro do som original com a sua réplica. Compressores/expansores � : referem-se ao estabelecimento do volume má- ximo e mínimo no qual o som deve ser expandido. Sá (2003) acrescenta que na guitarra e no contrabaixo o compressor/expansor garante um im- pacto sonoro maior porque bloqueia a parte do ataque da nota que esteja acima do volume nele estabelecido e o resultado é uma nota com som mais forte. Distorcedores � : superamplificam o som antes de ele chegar ao amplificador, podendo controlar o nível de distorção. Instrumentos musicais 129 Equalizadores � : ressaltam ou filtram o brilho e a cor do som, possuindo atu- almente três, cinco ou dez bandas por canal. Isso possibilita ressaltar ou filtrar os instrumentos. Nos shows, as mesas com equalizadores permitem realizar os ajustes dos sons graves e agudos. Flanger � e phaser: são recursos para duplicar o som no tempo de separação do som original ea sua réplica, por meio de um intervalo de tempo, pro- duzindo uma sonoridade difusa e oscilante. Eco � : é o recurso utilizado na reverberação do som. Quando o som é pro- duzido e conduzido pelo ar por meio das ondas sonoras, choca-se com o ambiente físico. Dependendo do local, o reflexo da onda será diferente e também a sua reverberação. Sá (2003) traz o exemplo das gravações nas catedrais, onde os órgãos ficam soando e, no último acorde do final da peça, o som vai se perdendo aos poucos. Assinala o autor que nesse am- biente é alto o grau de reverberação, pois o som percorre e se choca com as paredes, o chão e o teto. Reverberação e delay Quando o efeito de repetição é feito em um volume mais baixo e meio se- gundo depois do original, é chamado de delay. Os recursos de reverberação e delay podem ser trabalhados de várias formas para simular ambientes reais ou imaginários. Reverberadores � : criam diferentes ambientes sonoros, transmitindo, por exemplo, a sensação de se estar em um espaço grande e vazio ou um ambiente pequeno etc. Nesse efeito, o som passa por circuitos e é repro- cessado digitalmente milhares de vezes, simulando o ambiente desejado, informa Sá (2003). Delay � : é conhecido como eco de repetição, podendo duplicar o som origi- nal tantas vezes quantas forem determinadas. André Pretórios, Flávio Lemos Renato Russo e Fê Lemos Música Urbana Faixa 59 (CD 1) 130 Instrumentos musicais Van Halen Jump Faixa 60 (CD 1) Vejamos agora instrumentos acústicos que recebem recursos e tratamentos eletrônicos. Bateria Conjunto de instrumentos de percussão formado por tambores (com diver- sos tamanhos e timbres) e pratos. Esses instrumentos são dispostos de modo a serem tocados por apenas um músico, chamado baterista, que usa baque- tas, vassourinhas ou bilros e até as próprias mãos para percuti-los. Geralmente, a bateria é utilizada para acompanhar o jazz, o rock, o pop e ritmos regionais como a salsa e o samba, entre outros estilos. Na música contemporânea, tornou- -se essencial desde a década de 1920 até o surgimento da bateria eletrônica, que difere da bateria acústica. A bateria é montada sem que haja um padrão exato para os seus elementos, no que pode haver influência do estilo musical e também da preferência pessoal do baterista. Configuração mínima da bateria Tambores Um � bumbo no chão, tocado com pedal; Uma � caixa (chamada tarol); Um par de � tom-tons (ou timbalão), um de tamanho médio, produzindo sons graves, e o outro um pouco menor, emitindo sons agudos; Um � surdo. Instrumentos musicais 131 Pratos Um � chimbal (par de pratos) acionado por um pedal; Um � prato de condução, apoiado em um tripé; Um ou mais � pratos de ataque, em outros suportes e ao lado. Ao conjunto da bateria ainda podem ser acrescidos outros tom-tons, muitos pratos, pandeirolas, gongos, blocos de madeira, canecas, almofadas (pads) ele- trônicas ligadas a samplers ou outros acessórios de percussão. Is to ck ph ot o. Bateria. Bateria eletrônica. D iv ul ga çã o Ya m ah a. Bateria eletrônica Surgiu nos anos 1980, quando alguns fabricantes adicionaram sons pré-grava- dos e também a possibilidade de o instrumento funcionar como sampler, gravando os sons que seriam produzidos quando o instrumento fosse percutido. Ela busca reproduzir a bateria acústica, com sons de qualidade e afinação precisas. Ao longo dos anos, houve a adaptação da bateria convencional ao sistema eletrônico. Os avanços nessa área permitem ao músico utilizar vários timbres, resultantes da sonoridade extraída da percussão na pele da bateria eletrônica, que é sintética, feita com um náilon extremamente resistente. Por baixo dessa pele há sensores, provocando o disparo do “módulo” e, assim, a produção do som da bateria. De- pendendo do local em que a baqueta percute, com que intensidade e em que posição, o timbre muda. Os pratos são de borracha sintética e é possível extrair sons de diferentes maneiras. Caso o músico queira interrompê-los, basta segurá- -los e imediatamente o sensor manda um sinal para o módulo. 132 Instrumentos musicais Uma bateria acústica não é substituída pela eletrônica, que deve preencher as lacunas da tradicional. Com o crescente mercado sonoro e os avanços tec- nológicos, o músico tem possibilidade de incorporar ao seu trabalho os kits de bateria eletrônica. Cordas O instrumento musical tem o seu som produzido no corpo vibratório ou no corpo produtor de som. Quando o executante produz um estímulo no instru- mento, parte dele entra em vibração, produzindo uma onda sonora. Esse estí- mulo pode se dar por meio de palhetas, membranas, cordas, tubos ou no pró- prio corpo do instrumento. Is to ck ph ot o. Is to ck ph ot o. Guitarra semiacústica.Guitarra elétrica. Is to ck ph ot o. Contrabaixo elétrico. Contrabaixo acústico. Ju pi te r I m ag es /D PI Im ag es . A produção e o controle do som também contam com o próprio corpo do instrumento – por exemplo, o corpo do violino, que tensiona as cordas e fun- ciona como caixa de ressonância. Essa, por sua vez, é um local cheio de ar, com Instrumentos musicais 133 diversos formatos, e atua no reforço da intensidade sonora. Muitas vezes, a caixa de ressonância já faz parte do corpo do instrumento, como no tambor, no piano e no violão. Captadores de som Com a revolução da tecnologia musical, os contrabaixos e os violões “eletrifi- cados” (precursores dos atuais baixos e guitarras) recebiam a adaptação de um captador preso à caixa de ressonância sob as cordas. Captador de som é um me- canismo eletrônico que tem a função de captar as vibrações mecânicas produ- zidas por um instrumento musical, como as guitarras, os baixos ou os violinos. Esse captador leva o som dos instrumentos para um amplificador, que o amplia e o reproduz, diminuindo a dependência em relação à madeira ou à forma do instrumento. Assim, os corpos dos instrumentos musicais se tornaram mais finos e mais leves, com botões que graduam o volume dos graves e dos agudos. Nos modelos mais complexos, há interruptores e/ou teclas que acionam e desligam os captadores. Guitarra Apesar da incerteza sobre sua origem, a guitarra pode ter se originado de instrumentos de cordas dedilhadas existentes há cinco mil anos, na Ásia Cen- tral. Outra hipótese é que sua origem esteja no alaúde árabe. Ambas as suposi- ções sugerem que o ingresso desses instrumentos no mundo ocidental tenha se dado pela Península Ibérica, por meio dos romanos (na primeira possibilidade) ou pelas mãos dos muçulmanos (na segunda alternativa). De tais instrumentos teria derivado o violão. Também chamado de guitarra em alguns idiomas, ele surgiu por volta de 1600, na Espanha. Era comum em 1780, na Itália. Mais tarde, cerca de 1930, deu origem à guitarra elétrica, como fruto do trabalho individual de várias pessoas, em vários lugares. O violão tem um som suave, diferente da guitarra como a conhecemos hoje. A transição deu-se quando foram inseridos captadores eletrônicos ao instru- mento, mas isso o fazia vibrar com efeitos negativos para a qualidade sonora. A solução para esse inconveniente foi substituir a caixa de ressonância do violão pelo corpo maciço que caracteriza a guitarra elétrica, e assim chegamos ao ins- trumento que conhecemos hoje. 134 Instrumentos musicais As primeiras guitarras equipadas com processadores capazes de emitir uma gama de novos timbres surgiram em 1983-84, com a expansão do mundo MIDI (musical instrument digital interface, ou “interface digital para instrumentos mu- sicais”). MIDI é uma tecnologia própria para possibilitar a comunicação entre os equipamentos eletrônicos e os instrumentos musicais. A partir dessa tecnologia, a guitarra conquistou uma multiplicidade de novos sons, cuja produção é im- possível apenas com suas cordas, descreve Sá (2003). Guitarra semiacústica Tem caixa de propagação acústica e por isso seu tamanho é um pouco maior que a maciça. Seu som é mais natural e intenso.Sem a adição de efeitos espe- ciais, costuma ser a guitarra escolhida pelos músicos que executam jazz e blues. Guitarra elétrica O som é produzido manualmente pela vibração das cordas, sendo transfor- mado em sinal elétrico por captadores magnéticos. Os sinais elétricos são am- plificados e emitidos pelo alto-falante. Há dois modelos de guitarra elétrica: se- miacústica e maciça. Guitarra maciça Sua constituição é maciça, não possuindo caixa de propagação acústica. Seu som natural é pouco intenso. É a preferida para o uso dos efeitos sonoros, espe- cialmente a distorção. Empregada especialmente para o rock. Contrabaixo acústico Com quase dois metros de altura, é o maior dos cordofones de arco, sendo muito utilizado em orquestras e conjuntos menores. Também conhecido como baixo, ele pode ser tocado com ou sem arco. Sua função primordial é conduzir a harmonia. Entre os seus executantes mais célebres contam-se David Streicher e o jazzista Charles Mingus. Contrabaixo elétrico Com a intenção de modernizar o contrabaixo, buscou-se torná-lo mais leve, mais prático (a forma aproximou-se da guitarra) e para isso ele recebeu capta- Instrumentos musicais 135 dores sob suas quatro cordas. Essa captação, chamada ativa, inclui um sistema de pré-amplificação, reforçando as frequências dos captadores, trazendo mais brilho nos agudos e profundidade nos graves. A diversificação dos gêneros mu- sicais levou o instrumento a se modificar nos modelos com cinco ou seis cordas e o fretless, “baixo sem trastes”. Também os processadores trouxeram-lhe outras características, como os compressores, os chorus e os reverberadores, orienta- -nos Sá (2003). U2 Beautiful Day Faixa 61 (CD 1) Humberto Gessinger Ninguém é Igual a Ninguém Faixa 62 (CD 1) Semelhante à guitarra, porém em tamanho maior e com som mais grave, o contrabaixo ou baixo elétrico adapta-se a muitos estilos, como o melódico e o funk, ou ainda produzindo um som abafado. Quase todos os baixistas tocam com os dedos, mas alguns preferem a palheta. As diferenças entre o contrabaixo acústico e o elétrico resumem-se na dife- rente forma de produzir o som, na redução expressiva do tamanho do instru- mento, na mudança na sua forma e no uso dos recursos eletrônicos. Teclados Na visão de alguns técnicos, o piano é considerado um instrumento misto, ou seja, pode ser um instrumento de corda ou de percussão. A sua história revela que é filho do clavicórdio e neto do cravo. A partir do Romantismo, no século XVIII, o piano foi largamente usado e explorado em suas possibilidades. Clavicórdio Usado desde a Idade Média até o Barroco, tem teclas e cordas percutidas, sendo que os martelos permanecem em contato com a corda. 136 Instrumentos musicais Cravo Instrumento de teclas beliscadas, surgido por volta de 1300, teve seu auge nos séculos XVII e XVIII. Tradição Oral Escocesa Duas Gigas Faixa 63 (CD 1) Piano de cauda Cordofone de teclado com maior capacidade sonora que o piano vertical. No século XIX, a armação de ferro fundido contribuiu para aumentar a tensão das cordas, produzindo-se um som mais cheio. Quando o martelo bate na corda, imediatamente se afasta, deixando a corda vibrar. Paul McCartney e John Lennon Hey Jude Faixa 64 (CD 1) Is to ck ph ot o. Instrumentos musicais 137 Piano digital Eletrofone de tecla que imita sons de piano acústico. Suas palhetas de metal percutem pequenas placas de aço sobre um captador. Possui várias opções de timbres, ritmos e efeitos. Is to ck ph ot o. Teclado eletrônico Instrumento com tecnologia totalmente eletrônica, pode reproduzir, com re- lativa perfeição, os timbres dos diferentes instrumentos, acrescentando diversos efeitos e uma gama de ritmos. Is to ck ph ot o. A revolução tecnológica A mais popular das artes é capaz de reunir milhares de pessoas em torno de uma mesma canção e por isso a música abraça diferentes estilos, gêneros e épocas. Atualmente, compor e executar uma música utilizando diversos recur- sos tecnológicos nos permite acessar um universo sonoro amplo, possibilitando expansão e expressão da criatividade. 138 Instrumentos musicais A revolução tecnológica nos sistemas de gravação e digitalização da informa- ção, iniciada na década de 1980, provocou mudanças importantes nas formas de trabalhar com a música. O surgimento do sampler, do sequenciador e do sin- tetizador possibilitou ao músico atuar ao mesmo tempo nas funções de compo- sição, processamento e execução. Trabalhando no estúdio, o compositor pode ouvir o resultado imediato do seu trabalho sem depender dos intérpretes. Na- turalmente, o estúdio digital não foi uma assimilação fácil para os profissionais da música: habituado com o trabalho acústico dos instrumentistas, o composi- tor necessitava reunir os músicos para que executassem a partitura e assim ele podia ouvir e avaliar a sonoridade da sua obra. A peça central do estúdio digital é o teclado eletrônico, o que significa a apli- cação da moderna tecnologia para fins musicais. Sampler � é o equipamento que possibilita gravar um som, editá-lo e arma- zená-lo para ser reproduzido em qualquer altura por meio de um teclado ou sequenciador. Sendo um instrumento que manipula os sons, ele pode criar novas e complexas melodias ou efeitos à medida que produz varia- ções a partir da altura, da duração, da intensidade e do timbre. É usado em vários estilos, como o hip-hop, a dance music e a música experimental. Sequenciador � é o aparelho que armazena informações musicais transfor- madas em sinais. Por sua vez, esses sinais controlam os sintetizadores, determinando que realizem tarefas como executar uma nota com um timbre escolhido, em uma duração precisa e com o volume desejado. A facilidade e a praticidade do seu uso permitem a manipulação das no- tas caso seja necessário apagar, trocar, alterar sua duração e modificar seu timbre. Quando há erros, eles são corrigidos pela substituição de um ou mais sons. S � intetizador, criado em 1955, é o aparelho que pode sintetizar o som, pos- sibilitando um imenso controle sobre os timbres. Por exemplo, uma mes- ma partitura pode ser interpretada por sons de flauta, piano, clarinete, ins- trumentos de percussão. O sintetizador também gera sons artificialmente, por meio de diversas técnicas, com a possibilidade de deformar e modelar o som em busca de uma nova música. Instrumentos musicais 139 Em 1982, com o estabelecimento da linguagem MIDI, o uso dos sequenciado- res tornou-se comum. O MIDI reúne a informática e a música, permitindo que os instrumentos eletrônicos, os sequenciadores e os computadores comuniquem- -se entre si por meio das informações musicais traduzidas em valores numéricos, orienta-nos Gohn (2003). A linguagem MIDI permite manipular, combinar, criar e executar sons. A música é transformada em informação com o uso do tecla- do, o que permite ao músico o controle da sonoridade – intensidade, altura da nota, volume, timbre e outros efeitos. Pelo aspecto prático, os teclados foram os primeiros a usar a linguagem MIDI. Depois, vieram os sequenciadores, podendo registrar com muitos detalhes a execução e a interpretação. Um exemplo prático do computador na música refere-se à utilização de softwares de notação que transformam em escrita musical as peças executadas em um instrumento eletrô- nico conectado ao computador, segundo Gohn (2003). Assim, a revolução tecnológica permite-nos ingressar em um universo sonoro complexo, com permanentes inovações e infinitas possibilidades. Texto complementar O universo e a música Conta-se que os nomes dos dias da semana estão relacionados com os planetas na ordem em que aparecem na astrologia tradicional, informa Wisnik (1989). A sua distribuição obedeceria aos intervalos musicais de quintas descendentes. N A SA . Lu na r a nd P la ne ta ry In st itu te . Lu na r a nd P la ne ta ry In st itu te . N A SA . N A SA . N A SA . N A SA . ré sol dó fá si (ou si bemol) milá segunda terça quarta quinta sexta sábado domingo Lua Marte Mercúrio Júpiter Vênus Saturno Sol 140 Instrumentos musicais Instrumentos desconhecidos: tiorba Espécie de alaúde baixo, é um cordofone que surgiu na Idade Média e gozou, durante os séculos XVI a XVIII, de grande popularidade na Europa. IE SD E Br as il S. A . Referências BARROS, Jevandro. Música e Tecnologia. 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São Paulo: Scipi- one, s/d. MARCHAND, Pierre. A Música dos Instrumentos: das flautas de osso da pré- -história às guitarras elétricas. São Paulo: Melhoramentos, 1994. RATTON, Miguel. Instrumentos Musicais e Tecnologia Digital. Disponível em: <www.music-center.com.br/tecnodig.htm>. Acesso em: 6 fev. 2008. SÁ, Sérgio. Fábrica de Sons: os recursos oferecidos pela tecnologia musical. 4. ed. São Paulo: Globo, 2003. SPENCE, Keith. O Livro da Música. São Paulo: Círculo do Livro, 1979. WISNIK, José Miguel. O Som e o Sentido: uma outra história das músicas. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. A orquestra e seus instrumentos Os sons que nos cercam Você já deve ter ouvido os sons de muitas orquestras em filmes, comer- ciais, na internet, em locais públicos ou nos games que você joga. Muitas músicas se tornam conhecidas e preferidas porque passam a fazer parte do nosso cotidiano. Diversos tipos estão entre elas, como forró, baião, rock, pagode, samba, música eletrônica, música folclórica, bossa nova, música erudita (também chamada música clássica) e tantas outras. Instrumentistas, bandas, quartetos, trios, duos e orquestras podem executar diversos gêneros musicais. Vemos combinações de flauta com violão, violino com violoncelo, violão com sax, violão e vozes, percussão e sopro, piano e bateria etc. As formas de arranjar uma música são infinitas e demonstram como elas podem se tornar interessantes e criativas. Muitas trilhas sonoras de desenhos animados, filmes e de publicidade são executadas por orquestras. Observe como elas dão emoção às ima- gens que vemos. Experimente baixar o som e compare. A orquestra, por ter muitos instrumentos, pode fazer sons fantásticos, explorando todos os “climas” com muitíssimos detalhes. Vamos conhecê-la. A orquestra A palavra orquestra vem do grego, orkhestra, e significa “lugar para dançar”. A sua origem está ligada aos espetáculos que eram encenados ao ar livre, na Grécia, durante o século V a.C. Esses locais se chamavam anfite- atros e possuíam um espaço semicircular em frente ao palco, onde o coro cantava e dançava. Ali também ficavam os instrumentistas. No início do Barroco (séc. XVII), foi criada a ópera em Florença e a pa- lavra orquestra foi usada para indicar o lugar do conjunto instrumental nos bastidores. No primeiro teatro público de Veneza, os músicos ficaram entre o palco e a plateia e a partir daí esse termo foi utilizado para descre- 143 144 A orquestra e seus instrumentos ver o local destinado aos instrumentistas. Mais tarde, passou a significar o grupo de músicos e, depois, o conjunto de instrumentos utilizados por esses músicos. Ju pi te r I m ag es /D PI Im ag es . Antigo teatro greco-romano. IE SD E Br as il S. A . IE SD E Br as il S. A . Atualmente, o grande conjunto que forma a orquestra obedece a uma estru- tura organizada e equilibrada, composta por quatro grupos instrumentais: cordas; � madeiras; � metais; � percussão. � A distribuição dos instrumentos da orquestra no palco obedece a um esque- ma. Há uma razão prática que visa agrupar os instrumentos que compartilham características comuns, colocando-os lado a lado ou um atrás do outro. Uma es- trutura de degraus progressivos organiza o posicionamento dos grupos com o objetivo de equilibrar os vários sons e timbres. A orquestra e seus instrumentos 145 Cordas Percussão Metais Madeiras Regente Escalonamento do palco com os naipes da orquestra. IE SD E Br as il S. A . Sinfônica e filarmônica Às vezes, a orquestra recebe a denominação de sinfônica, significando que ela tem uma grande formação instrumental com possibilidade de executar sin- fonias e outras obras de gênero semelhante. Também pode ser chamada de fi- larmônica (“amigos da harmonia”, “amigos da música”), com o mesmo repertório e a mesma composição da orquestra sinfônica. A diferença entre os dois tipos de orquestra está basicamente na forma da sua manutenção: a filarmônica é manti- da pela iniciativa privada ou por uma sociedade de amigos, enquanto a sinfônica é ligada a uma instituição de caráter público. Pe dr o Sá nc he z. Orquestra filarmônica de Jalisco. 146 A orquestra e seus instrumentos Formação mais comum da orquestra sinfônica Outros instrumentos de percussão Tímpanos Trompas Piano Harpas Segundos violinos Clarinetes Flautas Oboés MaestroPrimeiros violinos Violoncelos Co nt ra ba ix os Violas Fagotes Trompetes Trombones Tuba Esquema de orquestra sinfônica. (H EN TS CH E et a l. 20 05 , p . 1 1) Orquestra de câmara A orquestra de câmara tem um número reduzido de componentes e se apre- senta em salas de concerto. Também é chamada de conjunto de câmara. A música de câmara (o que quer dizer, literalmente, “música de sala”) surgiu para ser tocada nos salões das casas reais e aristocráticas. A orquestra de câmara pode ser formada tendo entre dois e nove instrumen- tistas, chamados de duo, trio, quarteto etc. Existem ainda orquestras formadas por um só tipo de instrumento, como as orquestras de sopro ou de cordas. O número de músicos O tamanho da orquestra pode variar, dependendo da peça musical e das in- dicações colocadas pelo compositor para o seu uso. Com o passar do tempo, houve mudanças e aperfeiçoamento nos instrumentos, tornando mais fácil e ágil a execução. Nesse contexto, alguns grupos ganharam instrumentos e maior número de notas. Outros foram criados e incorporados à orquestra, trazendo novas cores timbrísticas. No século XX, incluíram-se muitos instrumentos de per- cussão, alguns de origem oriental, exóticos, especialmente usados por composi- tores como Claude Debussy, Igor Stravinsky e Bela Bartók. A orquestra e seus instrumentos 147 Vale destacar que as classificações dadas às orquestras não são rígidas. Muitas vezes, elas criam a sua própria denominação. O exemplo que temos é o da Fi- larmônica de Câmara da Alemanha, com aproximadamente 40 integrantes, que esteve no Brasil em 2007. Afinação da orquestra Quando você estiver em um local para assistir a uma apresentação de orquestra, irá observar o que acontece antes do início da audição. Um violinista fará um som e todos os músicos procurarão repeti-lo em seus instrumentos, para que cheguem à mesma nota que foi soada. Esse personagem é o spalla e é ele que comanda a afina- ção da orquestra. Seu lugar é bem na frente, à esquerda e próximo ao maestro. A palavra spalla é italiana e significa “ombro”, que é o lugar no corpo onde se apoia o violino. Chamado de primeiro violino da orquestra, o spalla é um instrumen- tista destacado e tem diversasfunções, como informar as orientações do maestro para o grupo, tocar trechos de destaque como solista e estar preparado para reger, substituindo o maestro. A sequência da afinação acontece assim: o spalla pede ao músico do oboé (ins- trumento de sopro com timbre penetrante) que toque a nota Lá. Em seguida, ele passa este Lá para os primeiros violinos e, então, para toda a orquestra. Do mur- múrio sonoro e dissonante dos instrumentos, a orquestra unifica-se em uma só fre- quência, uma fantástica harmonia. Agora ela está pronta para receber o maestro e executar uma composição. Nos ensaios, a orquestra demora mais tempo para afinar porque os instrumentos não estão prontos. Para uma apresentação, já há uma afina- ção prévia e, junto ao público, é feita a conferência das notas e se dá uma abertura solene ao concerto. A afinação do oboé A afinação da orquestra é feita pelo oboé por conta de uma tradição surgida no século XVII, quando esse instrumento estava presente em quase todas as or- questras e repertórios (diferentemente dos outros instrumentos de sopro). Outra razão é que seu timbre, seu volume e seu posicionamento na orquestra fazem com que ele seja ouvido por todos os músicos. Um terceiro motivo para que o oboé seja eleito o “diapasão” da orquestra refere-se à sua palheta, que, uma vez afinada, dificilmente é modificada, garan- tindo a precisão da frequência de 442Hz. 148 A orquestra e seus instrumentos Diapasão Esse objeto chama-se diapasão. É metálico, em forma de forquilha e serve para afinar os instrumentos ou as vozes por meio da vibração de um som musical de determinada altura. Foi inventado pelo trompetista John Shore. Essa forquilha é afinada na frequência mais usual da nota Lá, que é de 440Hz. Ao serem percutidas contra uma superfície, suas duas extremidades vibram, produzindo a nota que será utilizada para afinar o instrumento musical. Is to ck ph ot o. Afinação da Orquestra Faixa 65 (CD 1) Formação da orquestra sinfônica A orquestra sinfônica atual tem a sua formação segundo o modelo típico do século XIX: 32 violinos; � 12 violas; � 12 violoncelos; � 8 contrabaixos; � 4 flautas; � 4 oboés; � 4 clarinetes; � 4 fagotes; � A orquestra e seus instrumentos 149 8 trompas; � 4 trompetes; � 3 trombones; � 1 tuba; � percussão variada. � Naipe das cordas Atribui-se ao filósofo e matemático grego Pitágoras (século VI a.C.) a descober- ta de que a altura do som produzido por uma corda ao vibrar varia de acordo com o seu comprimento. Essa propriedade é utilizada nos instrumentos de corda. A sonoridade macia da viola da Idade Média foi su- perada pelo brilhantismo do violino no século XVII. A rabeca, usada para acompanhar danças, também na Idade Média, foi um dos pri- meiros instrumentos de arco e antecessor do violino. IE SD E Br as il S. A . Nas orquestras, o naipe das cordas é formado de primeiros violinos, segun- dos violinos, violas, violoncelos, contrabaixos e harpa. As cordas são consideradas o alicerce da orquestra ou sua espinha dorsal porque contribuem com mais da metade do total dos instrumentos e têm parti- cipação muito ativa na maioria das peças musicais. Sua presença é muito visível: elas estão colocadas na frente e dispostas ao longo da plataforma. A divisão dos violinos em primeiros violinos e segundos violinos ocorre apesar de eles serem o mesmo instrumento: a diferença não está nos instrumentos, mas na música que eles tocam – os primeiros violinos tocam as notas mais agudas. 150 A orquestra e seus instrumentos A orquestra completa possui, geralmente, 16 primeiros violinos, 14 segundos violinos, 12 violas, 10 violoncelos e 8 contrabaixos. Percussão Metais Madeiras Regente Harpas Primeiros violinos Segundos violinos Violas Contrabaixos Violoncelos (B EN N ET T, 1 98 5, p . 1 5) Os instrumentos desse naipe, com exceção da harpa, podem ser tocados com arco. As cordas também podem ser dedilhadas, o que é chamado de pizzicato (“be- liscado”). As quatro cordas desses instrumentos são feitas de tripa de carneiro, metal ou náilon, sendo esticadas sobre uma caixa oca, de madeira. Elas são elevadas pelo cavalete para não tocarem na parte principal do corpo do instrumento e poderem vibrar. É aplicado um verniz especial para conservar a madeira e aperfeiçoar o som. Felix Mendelssohn (1809-1847) Concerto para Violino e Orquestra em Mi Menor, op. 64, Terceiro Movimento: Allegro Molto Vivace Faixa 66 (CD 1) A orquestra e seus instrumentos 151 Violino Todas as suas cordas são do mesmo comprimento, mas variam de espessura e tensão, produzindo notas de alturas diferentes. A afinação é feita por meio das cravelhas: quanto mais tensa a corda, mais agudo será o seu som. O instrumento é colocado entre o ombro e o lado esquerdo do queixo. O arco utilizado é uma vareta de madeira com mais de 200 fios de crina de cavalo rete- sados. Antes de tocar, o músico passa resina nas cordas para que haja maior ade- rência. Quando o violinista quer encurtar a corda, ele a pressiona, apertando-a ou dedilhando-a contra o braço do instrumento. Como não há marcas mostran- do onde colocar os dedos, ele toca comprimindo as cordas em pontos diferen- tes, orientado pelo ouvido. vareta talão aberturas acústicas em forma de f f queixeira crina cavalete estandarte ponta voluta cravelhas braço Sol Ré Lá Mi cordas 152 A orquestra e seus instrumentos Viola É um pouco maior que o violino e suas cordas são mais compridas, mais gros- sas e soam uma quinta abaixo (Dó, Sol, Ré, Lá). Tem um timbre mais escuro e menos brilhante que o do violino. Ju pi te r I m ag es /D PI Im ag es . Johann Sebastian Bach (1685-1750) Concerto de Brandenburgo n. 6 em Si Bemol Maior, BWV 1051, Terceiro Movimento: Allegro Faixa 67 (CD 1) A orquestra e seus instrumentos 153 Violoncelo Também conhecido por cello, o violoncelo é sustentado por cima do ombro esquerdo do executante e é preso pelos joelhos. É apoiado no chão por um es- pigão de metal ajustado. As suas cordas são afinadas em quintas, uma oitava abaixo da viola (Dó, Sol, Ré, Lá). Por ter cordas mais longas e grossas, possui um som cheio e penetrante. Assim como fazem os violinos, sua função na orquestra é segurar a linha melódica principal. É muito eficaz em pizzicatos. Ju pi te r I m ag es /D PI Im ag es . Johannes Brahms (1833-1897) Sonata para Piano e Violoncelo, n. 2, em Fá Maior, op. 99 Faixa 68 (CD 1) 154 A orquestra e seus instrumentos Contrabaixo É um instrumento muito maior que o violoncelo. Suas cordas são mais longas e mais grossas. Para tocá-lo, o músico tem que ficar em pé ou sentado em um banco alto, pois sua altura é de cerca de dois metros. Sua afinação é em quar- tas (Mi, Lá, Ré, Sol). Também é chamado de baixo. Sua sonoridade é um tanto áspera, seca, mas, tocado em pizzicato, torna-se redonda e cheia, com riqueza e profundidade. Ju pi te r I m ag es /D PI Im ag es . Ludwig van Beethoven (1770-1827) Sinfonia n. 9 em Ré Menor, Pó 125 Coral: Primeira Parte do Quarto Movimento Faixa 69 (CD 1) A orquestra e seus instrumentos 155 Harpa É um dos instrumentos mais antigos. Tem 47 cordas e sete pedais (um para cada nota), que servem para ajustar o comprimento das cordas e produzir notas diferentes (mais graves ou mais agudas). É colocada contra o ombro e suas cordas são dedilhadas. O harpista precisa afinar suas cordas com cuidado e isso demanda muito tempo. As cordas mais agudas são de náilon, as graves são feitas de tripa. Outras, ainda mais graves, são enroladas com fio metálico. O instrumentista pode fazer acordes (notas dedilhadas simultaneamente) ou tocar as cordas uma após a outra (como arpejo). Pode também executar a melodia ao mesmo tempo que faz o acompanhamento ou somente a melodia, deslizando os dedos rapidamente, informa-nos Bennett (1985). IE SD E Br as il S. A . Naipe das madeiras Apesar do nome, esses instrumentos não são todosfeitos de madeira: as flau- tas, os flautins e os saxofones são fabricados em metal. Ainda assim, mais da metade é feito de madeira, e por isso a denominação. As variações de seus sons vão do registro agudo do flautim até o grave do contrafagote. Os instrumentos agrupados nesse naipe têm como características usarem pa- lheta e um sistema de chaves para produzirem sons. Quando o instrumentista sopra, ele faz vibrar uma palheta ou, no caso da flauta e do flautim, o sopro pe- 156 A orquestra e seus instrumentos netra no instrumento através de um orifício. A coluna de ar é posta em vibração dentro de um tubo oco, e o comprimento dessa coluna determinará a altura da nota. Portanto, como argumenta Bennett (1985), quanto mais curta a coluna de ar, mais aguda será a nota; � quanto mais longa a coluna de ar, mais grave será a nota. � Podemos comparar e fazer relações com os sons dos instrumentos de cordas: quanto mais curtas as suas cordas, mais agudo seu som. A mesma proporção vale para os instrumentos de cordas mais longas e os seus sons mais graves. Nos instrumentos de sopro, há diversos orifícios no seu tubo, com chaves, molas e alavancas que controlam a saída do ar. Ao fechar todos os orifícios, o instrumento produzirá a sua nota mais grave. Quando o instrumentista abre o orifício mais baixo, deixando escapar o ar, o comprimento da coluna de ar em vibração torna-se menor, e ao se encurtar essa coluna de ar produz-se uma nota mais aguda, ensina-nos Bennett (1985, p. 32), exemplificando: A o comprimento da coluna de ar em vibração o comprimento da coluna de ar em vibração torna-se menor, portanto, a nota será mais aguda B Os sons do conjunto das madeiras não se fundem tanto quanto o naipe das cordas, pois são mais distintos e contrastantes. À medida que, muitas vezes, exe- cutam solos, as madeiras têm um plano mais elevado e central na orquestra. Flauta A flauta é o único instrumento da família das madeiras que o instrumentista segura lateralmente e não de frente, como os demais. Originalmente era cons- truída em madeira, por isso ainda faz parte dessa família. Hoje é feita de metal. Como não possui palheta, a flauta tem a produção de seus sons pelo sopro no orifício do tubo, que tem uma das extremidades fechada. Um efeito muito conhecido é o frulato, produzido quando o instrumentista articula o fonema r enquanto sopra. Os sons mais graves são suaves, intensos e doces, enquanto os agudos são mais penetrantes. A orquestra e seus instrumentos 157 Antonio Vivaldi (1678-1741) Il Cardellino, RV. 428 em Ré Maior, Início do Primeiro Movimento Faixa 71 (CD 1) Ju pi te r I m ag es /D PI Im ag es . Flautim O flautim tem a metade do comprimento da flauta. Também é chamado de piccolo (“pequeno” em italiano). Seu dedilhado é o mesmo da flauta e toca-se da mesma maneira, mas soa uma oitava acima. É o menor dos instrumentos, muito embora seu som seja penetrante e brilhante, podendo também expressar humor. Co m st oc k Co m pl et e. 158 A orquestra e seus instrumentos Oboé O oboé teve sua origem, provavelmente, na corte francesa, em torno de 1655. O instrumento tem uma palheta dupla, de modo que o instrumentista deve manter o sopro contínuo para pôr em vibração uma palheta contra a outra. Dessa forma, faz vibrar a coluna de ar que está dentro do oboé, produzindo as notas musicais. Seus sons densos e ricos são anasalados. A extensão de suas notas é menor que a de outros instrumentos, mas produz uma grande variedade de timbres. No trecho que vamos ouvir, há um diálogo da flauta com o oboé. A melodia feita pela flauta é repetida pelo oboé, porém em uma região mais grave. Ju pi te r I m ag es /D PI Im ag es . Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) Concerto para Oboé e Orquestra, em Dó Maior, K. 314, Fragmento Externo, Ter- ceiro Movimento: Rondó Allegretto Faixa 72 (CD 1) A orquestra e seus instrumentos 159 Corne inglês É na verdade um oboé de maior comprimento, um oboé contralto. A boqui- lha ou bocal em que a palheta se encaixa é inclinada, formando um ângulo para melhor encaixe nos lábios. Tem palheta dupla como o oboé. A sua campânula tem um formato de pera e as bordas convergem para um círculo pequeno que reduz sua abertura. Um timbre suave e melancólico faz do corne inglês um ins- trumento próprio para executar melodias suaves e delicadas. Ju pi te r I m ag es /D PI Im ag es . Instrumentos transpositores Muitos instrumentos da orquestra apresentam uma característica diferente dos demais: as notas escritas soam diferentes da altura das notas tocadas. São chamados instrumentos transpositores. Temos como exemplo o contrabaixo, que tem suas notas escritas uma oitava acima das notas tocadas (sons reais), assim como a partitura para o flautim é escrita uma oitava abaixo da sonoridade em que soa o instrumento. Nesses exemplos, o objetivo é apenas facilitar a escrita, evitando incluir muitas linhas suplementares na pauta musical, que tem um espaço limitado para grafar os sons. No caso do corne inglês, a transposição é de uma quinta: para facilitar a lei- tura do músico, a partitura está escrita cinco notas acima dos sons reais do ins- trumento, exatamente como se estivessem escritas para o oboé. Ao ser tocado o corne inglês, serão dedilhadas as mesmas notas do oboé, mas seu som será ouvido cinco notas abaixo. Vamos acompanhar o exemplo: 160 A orquestra e seus instrumentos Oboé: Corne inglês escrito: ... soa, entretanto: Oboé e corne inglês tocando o mesmo trecho musical. Clarinete Também chamado de clarineta, foi inventado em torno de 1690, por Johann Denner, em Nürenberg, na Alemanha. Possui um formato cilíndrico e o nome dado ao instrumento refere-se às notas agudas, que lembram o brilho dos sons do trompete agudo (clarino). No clarinete, é usada uma palheta simples, feita de cana especial e desbasta- da até tornar-se delgada e flexível. Colocada na abertura da boquilha, que tem a forma de cunha, a palheta é mantida por uma braçadeira e parafusos reguláveis. Quando o clarinetista toca, a palheta entra em contato com o lábio inferior e a boca se fecha para evitar o escapamento de ar. O ar soprado passa entre a bo- quilha e a palheta, causando a vibração desta, que, por sua vez, põe em vibração a coluna de ar que está dentro do instrumento, produzindo assim uma nota. O instrumento padrão possui sete orifícios e 17 chaves. Esse instrumento tem quatro registros: grave, médio, agudo e superagudo, podendo percorrer grande extensão de notas. Seu som é aveludado, penetrante e encorpado na região média. Na região grave, as notas são chamadas de chalumeau e possuem uma ex- pressão dramática. A orquestra e seus instrumentos 161 No registro agudo, a sonoridade é brilhante e estridente. Sendo fabricados com uma ampla variedade de tamanhos e tonalidades, atu- almente os clarinetes mais comuns são os afinados em Si bemol e Lá. O clarinetista pode obter importantes recursos de interpretação ao utilizar as diferentes dinâmicas, como as mudanças nas intensidades sonoras, passando de um andamento lento para outro mais rápido com muita facilidade. Também pode ser muito ágil, fazendo saltos de grandes intervalos entre as notas. Ph ot o O bj ec ts . Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) Concerto para Clarinete e Orquestra em Lá Maior K. 622 Terceiro Movimento: Rondó Faixa 73 (CD 1) Clarinete baixo O clarinete baixo é duas vezes maior que o clarinete normal. É também co- nhecido como clarone. A parte superior é curvada para trás para facilitar a execu- ção do instrumentista. Também possui boquilha com palheta simples. O instru- mento abre-se em uma campânula metálica na parte inferior, voltada para cima. As notas são escritas uma oitava acima dos sons reais. Possui uma sonoridade profunda, suave e ressoante. 162 A orquestra e seus instrumentos Saxofone Foi inventado por Adolphe Sax, clarinetista belga e construtor de instrumen- tos, por volta de 1840. O saxofoneé feito de metal, mas é classificado entre as madeiras. Produz seus sons por meio de uma palheta simples e um sistema de chaves que abrem e fecham orifícios perfurados no seu tubo cônico. O saxofone possui um dedilhado similar ao do clarinete e, por isso, quando usado na orquestra, é tocado por um clarinetista. É visto entre os instrumentos de madeira e não entre os metais, provavelmente pelo seu parentesco com a clarineta. No total, são oito tipos de saxofone, com diferentes tamanhos e afina- ções. Na orquestra, são usados o sax contralto e o tenor, ambos semelhantes ao clarinete baixo. Is to ck ph ot o. B. Adams, M. Kamen e R. Lange Everything I Do Faixa 74 (CD 1) A orquestra e seus instrumentos 163 Fagote A palavra fagote, em italiano ou alemão, significa “feixe de varas”. É um instrumento com tubo cônico e, de tão longo (cerca de 2,5 metros), é dobrado sobre si mesmo, inicialmente para baixo, depois para cima. Possui pa- lheta dupla, mas ela é mais curta e mais larga que a do oboé, encaixando-se no bocal curvo feito de metal. A escrita para o fagote é na clave de Fá, ou na clave de Dó, para as notas mais agudas. Não é um instrumento transpositor. Na orquestra, é um dos instru- mentos mais úteis, podendo tocar solos, mas frequentemente executa a linha do baixo para os sopros ou também reforça os violoncelos. O seu timbre pode ter um caráter cômico com vitalidade ou soar com seriedade e melancolia. Ju pi te r I m ag es /D PI Im ag es . (1756-1791) Concerto para Fagote e Orquestra em Si Bemol Maior, K. 191, Terceiro Movimento: Rondó Faixa 75 (CD 1) Contrafagote É um instrumento pesado, duas vezes mais comprido que o fagote, e soa uma oitava abaixo deste. Toca as notas mais graves da família dos sopros. Usa uma palhe- ta dupla. Por ter dimensões muito grandes seu tubo é dobrado em quatro. A sua par- titura é escrita uma oitava acima dos sons reais. Graças ao seu som profundo e seco, é escolhido para representar personagens como feras ou monstros nas composições. 164 A orquestra e seus instrumentos IE SD E Br as il S. A . Naipe dos metais Uma escultura do século I mostra (aci- ma) trompetes cur- vos e retos, usados pelos romanos nos seus desfiles. O Iur, (abaixo), um instru- mento lúgubre da Idade do Bronze, originário da Escandinávia. Era uti- lizado provavelmente em rituais e cerimônias. O serpentão (abaixo), conforme o seu nome indica, assemelha-se ao corpo enroscado de uma serpente. A trompa de caça euro- peia (acima) tinha um tubo enrolado e pos- suía um som claro, que se projetava ao longe. Os seus vários toques sobrevivem ainda hoje nas coutadas de caça. O costume medieval de acompanhar o render das sentinelas com o toque da trompa ainda hoje pode ser ouvido, todas as noites, pelo trompista de Rijon, em Yorkshire, Inglaterra. IE SD E Br as il S. A . Nas orquestras dos nossos dias, os metais ficam assim distribuídos: 4 trompas; � 3 trompetes (e ocasionalmente cornetas de pistões); � 3 trombones (2 tenores, 1 baixo ou tenor-baixo); � 1 tuba. � A orquestra e seus instrumentos 165 Mas esse total de 11 instrumentos pode ser aumentado. Os metais têm seus sons produzidos pelo sopro do músico. Atualmente, são fabricados a partir de uma liga de metais, com um bocal em forma de taça em uma extremidade e um pavilhão na outra. Seus tubos possuem diferentes extensões, conforme cada instrumento, podendo ser enrolados ou dobrados para facilitar a execução. Ao soprar no bocal, a coluna de ar vibra no tubo em uma determinada frequência e, à medida que os lábios são comprimidos, a nota fica mais aguda. Ao relaxar os lábios, essa coluna vibrará menos, produzindo sons mais graves. Há três elementos que caracterizam o timbre de um instrumento de metal: tipo de bocal utilizado; � diâmetro interno do tubo e da abertura da campânula, definindo caracte- � rísticas sonoras mais brilhantes ou mais suaves; comprimento do tubo, determinando as alturas que o instrumento po- � derá executar – um tubo maior produzirá notas mais graves, e um tubo menor notas mais agudas. Ao assoprar no tubo, o músico produzirá uma sequência de notas conhecidas como a série harmônica. A sua nota mais grave dependerá do comprimento do tubo e, a partir dela, ele poderá executar uma série de sons, desde que aumente gradualmente a tensão dos seus lábios. As últimas notas agudas são difíceis de tocar. Veja o exemplo: A limitação de notas disponíveis foi resolvida com a invenção do sistema de válvulas, por volta de 1815, pelo engenheiro alemão Stoetzel. Esse sistema funciona como se houvesse um jogo de voltas permanentes encaixado no ins- trumento, podendo ser selecionadas para entrar em funcionamento pelo toque de um dedo. Cada uma das três válvulas adiciona um novo segmento de tubo ao tubo original do instrumento, aumentando o seu comprimento. As válvulas podem ser usadas individualmente ou em combinação, emitindo, dessa forma, 166 A orquestra e seus instrumentos as sete notas fundamentais e suas respectivas séries harmônicas, ensina-nos Bennett (1985). Madeira e metal A diferença principal entre os instrumentos do naipe da madeira para o naipe de metal não é o material com que são construídos, mas a forma de produzirem seus sons. Os instrumentos da família das madeiras têm orifícios ao longo do compri- mento de seu tubo e seus sons são produzidos pela vibração das palhetas. No caso da flauta ou do flautim, o sopro do flautista é dividido pela borda do orifício da embocadura. Nos instrumentos da família dos metais, o som é produzido pela vibração dos lábios do instrumentista, em diferentes gradações de tensão e em contato com um bocal metálico. Trompa Em diversas línguas, a palavra que indica esse instrumento é a mesma que de- signa chifre. Esse é um dos instrumentos mais antigos, sendo feito com o chifre de um animal. Muitos povos já a conheciam, como os egípcios, os hebreus, os gregos e os romanos. O ancestral da trompa atual é a tuba de caça, que consistia em um tubo comprido, enrolado, terminando em uma campânula aberta. Essa trompa era transportada com seu tubo em volta do ombro de quem iria tocá-la. Sua finalidade era chamar a atenção, dando toques e sinais durante a caçada. Instrumentos da família das trompas têm sido encontrados por arqueólogos. Os judeus ainda usam o shofar, que é um chifre de carneiro. Esse instrumento é oco, sendo soprado por um orifício. É usado em ocasiões solenes, como para anunciar o Yom Kippur ou o Rosh Hashana (ano-novo judaico). A trompa é muito utilizadada nas orquestras. Diversos compositores a inclu- íram em suas sinfonias, com o objetivo de criar uma atmosfera de romance e mistério. O seu timbre é rico em harmônicos, assemelhando-se à voz humana. Atualmente, esse instrumento consiste em um tubo metálico de 3,7 metros de comprimento, ligeiramente cônico, enrolado várias vezes sobre si mesmo, com três ou quatro chaves no seu tubo. A orquestra e seus instrumentos 167 O trompista usa a mão esquerda para acionar as válvulas e, com a mão direita dentro do pavilhão (ou campânula), ajuda a controlar o fluxo de ar dentro do ins- trumento. A função das válvulas é modificar o caminho do ar no tubo, alterando a nota emitida. A trompa é considerada um dos instrumentos mais difíceis de tocar porque requer do músico uma ótima percepção auditiva (ouvido afinado), saber solfejar (entoar as notas musicais) com precisão e uma eficiente coordenação motora para controlar os músculos da mão direita e a própria respiração. Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) Romanza do Concerto para Trompa, K. 447, n. 3 Faixa 76 (CD 1) Trompete O trompete é o mais antigo entre os instrumentos de metal. Há relatos de que foram descobertos dois trompetes no túmulo do faraó egípcio Tutankha- mon, aberto em 1923. Durante a Idade Média, os trompetes eram utilizados nas cerimônias e atividades militares. Após 1600, o trompete foi incorporado à or- questra, mas antesdisso já era utilizado nas óperas e em músicas sacras para expressar alegria e triunfo. É o mais estridente e brilhante dos instrumentos da orquestra, especialmente quando usado com os tímpanos. Atualmente, o sistema de válvulas do trompete ampliou sua extensão e agilidade. O comprimento do seu tubo é de 1,37 metros. No Brasil, esse instrumento também é conhecido como pistão. O trompete mais utilizado na orquestra é afinado em Si bemol e suas notas são escritas um tom acima do som real. Trompetes menores, com outras afinações, são usados quando há requisição do registro agudo e são chamados clarino. 168 A orquestra e seus instrumentos Ph ot o O bj ec ts . Surdinas As surdinas utilizadas servem para abafar o som, modifi- car o timbre ou produzir efeitos especiais. Elas são colocadas na saída da campânula ou dentro dela. IE SD E Br as il S. A . Johann Nepomuk Hummel (1778-1835) Concerto para Trompete e Orquestra em Mi Bemol Maior, Terceiro Movimento Faixa 77 (CD 1) A orquestra e seus instrumentos 169 Corneta de pistões Esse instrumento tem a forma mais quadrada que o trompete. O diâmetro in- terno é cônico e o bocal afunilado. A corneta de pistões foi inventada na França, em torno de 1825. Seu timbre é menos brilhante que o do trompete e menos suave que o da trompa. O comprimento do seu tubo e a extensão de suas notas são os mesmos do trompete em Si bemol. É um instrumento usado somente em algumas composições. Ph ot o O bj ec ts . Trombone Na verdade, o trombone é um trompete mais alongado, dobrado, com um bocal em forma de taça, apresentando um som mais profundo. Na época medie- val, era chamado de sacabucha (“puxa-empurra”). O comprimento de seu tubo, com a vara, é de 2,75 metros: no lugar das válvulas, que possibilitam executar maior número de notas, o trombone aumenta ou diminui o comprimento do seu tubo por meio de uma vara deslizante. Essa extensão tem a forma de um U e desliza com suavidade e facilidade. A mão esquerda segura o bocal nos lábios, e com a mão direita o instrumentista pode ajustar a vara facilmente. Ph ot o O bj ec ts . 170 A orquestra e seus instrumentos Há sete posições para a vara baseadas nas notas fundamentais. Quando o trombonista modifica a tensão nos lábios, seleciona as notas. O trombone exe- cuta diferentes expressões, como solene, nobre, ou inflamado e agressivo, mas também pode ter um estilo leve. O uso da surdina acontece da mesma forma e com o mesmo objetivo que no trompete. Na orquestra, pode haver três trombo- nes, com diferentes afinações. Tuba É o instrumento mais jovem do naipe dos metais, pois foi inventado em torno de 1820. Existem diversos tamanhos e alturas de tuba, com três a cinco válvulas. Na orquestra, são usadas a tuba tenor em Si bemol e a tuba baixo em Fá. O timbre redondo, cheio e rico, é resultado de seu tubo amplo e cônico, com o bocal em forma de taça. O comprimento de seu tubo é de 3,65 metros. A tuba reforça a linha do baixo, estabelecendo peso aos metais. Também pode empregar o uso da surdina, que, nesse caso, é um grande cone, geralmen- te de papelão, com mais de 60 centímetros de altura. Ju pi te r I m ag es /D PI Im ag es . Marco Antônio Lopes Divertimento Faixa 79 (CD 1) A orquestra e seus instrumentos 171 Naipe da percussão Os instrumentos de percussão precisam ser agitados ou percutidos para soar. Muitos deles situam-se entre os mais antigos e acompanharam a história da hu- manidade, desde suas manifestações espontâneas na busca de comunicar-se com a natureza até as danças e rituais de comemoração e de guerra. Os tam- bores, nas sociedades primitivas, eram vistos com veneração. Os tímpanos (ou timbales) sempre estiveram ligados à realeza e, por exemplo, somente à Cavala- ria de Guarda Inglesa era permitido tocar um par de tambores. A partir do final do século XVII, os compositores começaram a utilizá-los em suas obras e assim esses instrumentos se tornaram membros definitivos das orquestras. Nelas, a seção dos instrumentos de percussão é a mais recentemente inserida. E esses instrumentos podem ser divididos em dois grupos: com altura definida e com altura indefinida. Altura definida Nesse primeiro grupo, estão os instrumentos de percussão que podem ser afinados, ou seja, aqueles que podem tocar notas com altura definida: tímpanos, glockenspiel, xilofone, celesta, vibrafone e carrilhão. Tímpano É o único tambor da orquestra que pode ser afinado com exatidão. Consiste em um recipiente côncavo de cobre, com cerca de 75 centímetros de diâmetro, sobre o qual é esticada uma membrana de couro de bezerro ou um plástico. Ela é dobrada sobre o arco que circunda as bordas. A tensão dessa membrana é dada pelos parafusos que estão em torno e podem ser apertados. Quando se au- menta a tensão da pele, obtêm-se notas mais agudas e, ao se diminuir a tensão, notas mais graves. Atualmente, o tímpano é afinado por pedal, assim a tensão da pele é mais rapidamente regulada, como também a obtenção das notas. Nas peças musicais de nossos dias, consta a altura da nota que deverá ser mudada ao se percutir o tímpano. 172 A orquestra e seus instrumentos Is to ck ph ot o. Marco Antônio Lopes Divertimento Faixa 79 (CD 1) Glockenspiel (ou metalofone) Esse instrumento tem 30 placas de aço, graduadas conforme o tamanho e dispostas como em um teclado. O músico usa baquetas leves – com cabeça de borracha, madeira ou metal, segundo o efeito desejado. O seu timbre é claro e prateado. Em alemão, seu nome significa “toque de sinos”. IE SD E Br as il S. A . A orquestra e seus instrumentos 173 Tiago Lopes Trecho Adaptado de Minueto em Sol Maior de Christian Petzold Faixa 81 (CD 1) Xilofone O xilofone (palavra grega significando “sons da madeira”) apareceu nas or- questras no século XIX. Suas placas são de madeira dura. Possui, embaixo das placas, caixas acústicas que são tubos de ressonância. Suas placas são confeccio- nadas cuidadosamente, passando por um processo de secagem e afinação. Ge- ralmente, a madeira utilizada é o jacarandá. No Brasil, também é utilizado o ipê. No primeiro plano, as placas correspondem às teclas brancas do piano (notas naturais). No segundo plano, um pouco mais elevadas, estão as que equivalem às teclas pretas (notas alteradas). O xilofone se apoia em um suporte com rodí- zios. As placas são percutidas com baquetas. Tiago Lopes Improviso sobre Dança Macabra, de Camille Saint-Saëns Faixa 82 (CD 1) IE SD E Br as il S. A . 174 A orquestra e seus instrumentos Is to ck ph ot o. O balafom, instrumento precursor do xilofone, é originário da África do Sul e utiliza cabaças como ressonadores. Celesta Inventada por Auguste Mustel, em Paris, em 1886, é semelhante ao glo- ckenspiel, com teclado acoplado. As teclas, quando pressionadas, movimentam os martelos, que golpeiam as placas metálicas no interior da caixa harmônica. Cada placa tem uma caixa acústica, resultando em uma sonoridade delicada que lembra os sinos. D iv ul ga çã o. Y am ah a In st ru m en to s. A orquestra e seus instrumentos 175 Vibrafone É um instrumento similar ao glockenspiel. O músico percute baquetas nas placas de aço do vibrafone. Sob cada placa há um ressoador, afinado na mesma nota da placa. Há na parte superior, dentro de cada tubo, um ventilador acio- nado por motor elétrico, tornando seu timbre doce e rico. Quando o motor é desligado, os tubos ficam abertos e o vibrafone apresenta um som semelhante ao de um sino. O instrumentista pode usar de duas a seis baquetas revestidas de lã ou de feltro, podendo tocar tanto a melodia quanto o acorde (conjunto de três ou mais notas executadas ao mesmo tempo). IE SD E Br as il S. A . Carrilhão de orquestra O carrilhão usado na orquestra é constituído de 18 tubos de diferentes com- primentos, produzindo diferentes alturas sonoras. Os tubos são percutidos perto da extremidade superior, com baqueta de madeira. Os sons do carrilhãoprodu- zem efeitos solenes, dramáticos e coloridos, que lembram os sinos de igreja. IE SD E Br as il S. A . 176 A orquestra e seus instrumentos Carrilhão Existe também um outro carrilhão, formado por um teclado e um conjunto de sinos de variados tamanhos controlados por esse teclado. Normalmente en- contrado em torres de igreja e conventos, carrilhões desse tipo são os maiores instrumentos do mundo. Cada nota é produzida por um sino. Em média, os carrilhões têm 47 sinos, os maiores chegam a possuir 77 sinos. O carrilhonista fica em uma cabine, por baixo do carrilhão, e pressiona as teclas. Essas teclas acionam as alavancas e os fios que se ligam diretamente aos badalos dos sinos. O músico pode executar com maior ou menor intensidade os sons, conforme a força que emprega. Os sinos maiores possuem pedais para as notas graves e podem ser tocados juntamente com as teclas manuais. Tiago Lopes Big-Ben (Canção Tradicional Inglesa) Faixa 83 (CD 1) Uma das torres de carrilhões do Convento de Mafra, na Bélgica. Ela é composta de 57 sinos, pesando cerca de 10 toneladas, sendo que o con- junto todo tem mais de 200 toneladas. Co re l I m ag e Ba nk . A orquestra e seus instrumentos 177 Altura indefinida No segundo tipo dos instrumentos de percussão estão aqueles que não podem ser afinados, isto é, não possuem altura definida, apenas podendo tocar ritmos. Nesse grupo, estão o bombo, a caixa-clara, a caixa tenor, os pratos, o tri- ângulo, o pandeiro, as castanholas, os blocos de madeira, o tantã (ou gongo), o chicote, os guizos e as maracas. Bombo (bumbo) É o maior tambor da orquestra e tem som grave e seco, podendo apresentar uma ou duas membranas. Os parafusos servem para regular e obter a melhor ressonância, porque ele não produz nota de altura definida. Quando tocado su- avemente, é apenas sentido, mas quando soa vigorosamente tem um efeito im- ponente. A sua baqueta tem uma cabeça ampla e recoberta. O bombo pode pro- duzir sons isolados ou rufar usando as baquetas de tímpano. Também podem ser obtidos efeitos especiais com o uso de baquetas duras, com vassourinhas de metal ou com um feixe de varetas. Ph ot o O bj ec ts . Tiago Lopes Improviso Faixa 84 (CD 1) 178 A orquestra e seus instrumentos Caixa-clara (caixa ou tarola) Esse é um tambor que descende de um tamboril medieval, adotado e di- fundido pelos regimentos de infantaria. Atualmente, nas cerimônias militares, é colocado a tiracolo, do lado direito do instrumentista, que assim pode tocar e marchar. A caixa-clara tem membranas na parte superior e na parte inferior. A mem- brana superior é percutida e a inferior entra em contato com a esteira, que é constituída de arame espiralado ou tripa esticada. Ao percutir a membrana superior, geralmente com baquetas duras, a esteira vibra com a membrana inferior, o que resultará em som enérgico, chocalhante e claro. Seu diâmetro é de 38 centímetros. Um dos toques característicos da caixa-clara é o rufo ou rulo, que é conse- guido com toques rápidos e alternados com cada baqueta. Também é possível obter outros efeitos sonoros tocando com vassourinhas de metal ou percutindo a baqueta no aro. A caixa tenor é uma caixa-clara sem esteira e com som mais grave. Ph ot o O bj ec ts . Ph ot o O bj ec ts . Ruperto Chapí (1851-1909) O Tambor dos Granadeiros Faixa 85 (CD 1) Pratos A orquestra e seus instrumentos 179 Os antigos gregos e romanos usavam os pratos (címbalos) nos seus rituais religiosos. Com um diâmetro de 46 centímetros, os pratos são feitos de uma liga de metal. Em número de dois, pode-se obter sons batendo-se um contra o outro, vibrando-os ou ainda encostando-os no corpo para abafar as vibrações. Pode-se ainda agitá-los para produzir um rufo, resultando em uma sensação sonora de crescendo orquestral. Quando o prato for suspenso, ele poderá ser percutido com diferentes ba- quetas e varas de metal. Is to ck ph ot o. Triângulo Como instrumento solista, o triângulo se apresentou pela primeira vez em 1850, no Primeiro Concerto para Piano de Franz Lizst. O triângulo é feito de barra de aço delgada, cilíndrica, de ferro ou de alumí- nio. É dobrado no formato triangular, com uma extremidade aberta. Seu som é obtido por percussão, por meio de um bastão ou vara de metal. Tiago Lopes Improviso Faixa 87 (CD 1) 180 A orquestra e seus instrumentos D ig ita l J ui ce . Pandeiro É um pequeno tambor com pele em uma das faces e pares de pequenos discos de metal no seu aro. Sua origem é árabe. No início, era apenas um aro de madeira, com pequenas aberturas – as soalhas – e se tocava com batidas de mão para marcar o tempo ou acompanhar a dança, principalmente entre os ciganos. Foi muito utilizado na Itália e na Espanha. No Brasil, surgiu com o choro, em 1870 aproximadamente. Inicialmente, foram produzidos de forma simples, sem apuro técnico. Hoje, alguns fabricantes utilizam pele de cabra para que sejam obtidos sons graves como do surdo e platinelas de metais nobres para alcançar um som brilhante e preciso. Os pandeiros mais utilizados têm diâmetro de 10 polegadas, mas também existem os de 10,5 a 12 polegadas. Conforme o tamanho do aro, o número de platinelas varia de 5 a 10 pares. A sonoridade do pandeiro é obtida quando ele é agitado, ou batido com as pontas dos dedos, punho, costas das mãos ou contra o joelho. Também pode ser percutido com baquetas. Ph ot o O bj ec ts . A orquestra e seus instrumentos 181 Tiago Lopes Improviso Faixa 88 (CD 1) Castanholas A castanhola foi uma criação dos fenícios, há mais de três milênios, sendo introduzida nos demais países do Mediterrâneo por meio do comércio maríti- mo. Depois disso, a sua difusão se deu a partir da Espanha. Seu nome deriva do seu formato, que lembra uma castanha. O instrumento original é feito de dois pedaços de madeira de castanheira em forma de prato fundo. São perfurados e unidos por uma corda fina, que é enrolada no polegar e no indicador e assim são percutidos um contra o outro. O seu som é oco e seco. As castanholas da orquestra são diferentes: os pratos de madeira estão presos em uma vareta para facilitar a execução do instrumentista, que agita a vareta ou o cabo ou bate os pratos contra a outra mão ou contra o joelho. É usada para dar um ambiente espanhol a uma peça musical. Ph ot o O bj ec ts . Ph ot o O bj ec ts . Ph ot o O bj ec ts . 182 A orquestra e seus instrumentos Blocos de madeira Os blocos de madeira são percutidos com baquetas de tambor ou xilofone. São retangulares e possuem uma ranhura lateral por quase toda a sua largura, o que os transforma em caixas acústicas. Os blocos de madeira são também chamados de blocos sonoros, sendo que também há blocos sonoros tubulares. Assim, em verdade os formatos podem variar: em forma de caixa, tubulares, esféricos ou ovoides. As características comuns a esses instrumentos são os blocos serem sempre ocos e possuírem um rasgo ou furo para permitir a vibração de suas paredes. Portanto, além de produ- zirem o som, também funcionam como sua própria caixa de ressonância. Tantã ou gongo O tantã é um gongo com um metro de diâmetro. Originário da China, possui a borda dobrada para dentro, o que impede a vibração das extremidades. Quando tocado de forma suave, a sua sonoridade é misteriosa; quando percutido com mais intensidade, produz efeitos dramáticos. A baqueta utilizada é coberta com flanela, mas o músico também pode utilizar-se de outras baquetas para a busca de efeitos especiais. Ph ot o O bj ec ts . Piano O piano (no início chamado de fortepiano) surgiu por volta de 1698, inventa- do pelo italiano Bartolomeo Cristofori, que era encarregado dos instrumentos dos Médici, em Florença. Naquela época, o instrumento já possuía os primeiros A orquestra e seus instrumentos 183 elementos do piano moderno: martelos que batiam nas cordas, em vez das pa- lhetas do cravo, um sistema que permitia a repetição da nota eabafadores. Foi um instrumento que teve um papel fundamental na vida musical profissional e doméstica a partir da segunda metade do século XVIII. Uma das razões para isso foi a possibilidade de fazer soar dez ou mais notas de uma só vez e, dessa forma, possibilitar a execução de praticamente qualquer peça da música ocidental. Outra grande contribuição é o fato de ser possível tocar esse instrumento tanto de modo piano (suave) como forte – razão do seu nome –, conforme o toque do músico, ampliando suas possibilidades expressivas. O piano de cauda moderno possui algumas cordas a mais para a região grave; uma maciça estrutura de metal que sustenta a tensão das cordas (cerca de 16 400kg); tábua de harmonia, debaixo das cordas, para intensificar os sons; a caixa harmônica; as 88 teclas; os martelos e os pedais. O pedal da direita é chamado de pedal de sustentação e levanta os abafadores das cordas, acrescentando du- ração e ressonância aos sons (mesmo que as mãos não estejam mais nas teclas). O pedal da esquerda, da surdina, reduz o volume. Alguns pianos têm um pedal central, chamado de tonal, que serve para o músico manter a sustentação de um grupo selecionado de notas enquanto continua a abafar as restantes. O piano de armário (vertical) tem as suas cordas e a armação em um plano vertical, assim impedindo os martelos de se beneficiarem da força da gravidade. Também possui 88 teclas, que são feitas de madeira, sendo as pretas de ébano e as brancas revestidas de marfim ou plástico. Ju pi te r I m ag es /D PI Im ag es . Is to ck ph ot o. 184 A orquestra e seus instrumentos Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) Concerto para Piano e Orquestra n. 20 em Ré Menor, K. 466, Terceiro Movimento Faixa 89 (CD 1) Estes são os mecanismos de ação de cada tecla tanto no piano de armário quanto no piano de cauda. Piano de armário. IE SD E Br as il S. A . Piano de cauda. IE SD E Br as il S. A . A partitura Você deve estar imaginando como tantos instrumentos podem tocar juntos, ao mesmo tempo. Ou então poderá pensar como o maestro comanda as entra- das dos músicos e encerra a apresentação de maneira tão precisa. O segredo está na partitura, que é a música escrita, com todos os detalhes que devem ser observados para que a peça musical possa ser realizada conforme deseja o seu compositor. Nela estão as notas da música a serem tocadas, as pausas (silêncios), os sinais que indicam se os sons devem ser fortes ou fracos, a velocidade da exe- cução e tantos outros detalhes. O maestro rege a orquestra pela partitura com- pleta, que indica a parte de cada instrumento e em que momento deverá tocar. Vamos analisar a primeira página da partitura para orquestra da obra Capri- cho espanhol, do compositor russo Nikolai Rimsky-Korsakov (1844-1908). Obser- ve que os nomes dos instrumentos estão em italiano, o que é habitual na lingua- A orquestra e seus instrumentos 185 gem da música. Eles estão colocados na partitura conforme os quatro naipes da orquestra, que são as madeiras, os metais, a percussão e as cordas. Veja as divisões em linhas que descem de cima abaixo e passam por todas as partes dos instrumentos. São os compassos que dividem a partitura em durações pro- porcionais. Também vemos o sinal de expressão vivo e strepitoso (“animado e barulhento”) e outros indicando a intensidade com que deverá ser executado o trecho, como ff (fortíssimo). 186 A orquestra e seus instrumentos Opus Você verá a abreviação Op. junto ao nome de muitas obras musicais, indican- do a posição daquela peça na produção do compositor. Essa é a abreviação do termo latino opus, que significa “obra”. Movimento Ao lado do nome da obra musical, às vezes temos também a palavra movi- mento e um número, que significa as partes da composição. Esse procedimento é um costume vindo da tradição italiana e serve para indicar a velocidade e o caráter da música, com os termos andante, allegro, vivace, presto (“rapidíssimo”) e outros. O compositor pode ainda definir os andamentos acrescentando, como sugestão para a execução da peça, as expressões assai (“bastante”), ma non troppo (“mas nem tanto”) e muitas outras. D ig ita l J ui ce . O maestro O maestro, regente ou condutor tem a função de dar coesão a um grupo instrumental ou vocal, de forma que todos sigam o tempo, a dinâmica e o anda- mento indicado na partitura. É ele quem define a interpretação da obra musical, marcando o ritmo com a mão direita, e as entradas dos instrumentos e a expres- sividade com a mão esquerda. A figura do maestro surgiu no romantismo musical (1810-1910), quando a orquestra ou o coral tornaram-se de grandes proporções. Antes, os grupos eram pequenos e não havia a necessidade de um regente. A orquestra e seus instrumentos 187 Stradivarius Antônio Stradivarius (1664-1737) foi o mais famoso fabricante (luthier) de violinos. Fez em torno de 1 200 unidades. Cada instrumento recebia uma etiqueta especial. Stradivarius é a mais famosa marca de instrumentos de cordas do mundo. Atualmente, os violinos Stradivarius valem uma fortuna. O mais famoso violino tem o nome de Messias, de 1716, é possuidor do som mais puro, com mais de cem sons inaudíveis ao ouvido humano, e está no Ashmolean Museum, de Oxford. Esse violino nunca foi tocado e não possui valor comercial. Seu verniz ainda está intacto. Antônio Stradivarius trabalhando na constru- ção de um violino. D om ín io p úb lic o. Ludwig van Beethoven (1770-1827) 3.ª Sinfonia em Mi Maior, op. 55, Heroica, Primeiro Movimento: Allegro con Brio Faixa 90 (CD 1) Texto complementar 188 A orquestra e seus instrumentos Instrumentos musicais: serpentão Th e Ill us tr at ed E nc yc lo pe di a of M us ic al In st ru m en ts . Datado do século XVI, o serpentão é um instrumento de sopro, da família dos metais. Possui um bocal e seis orifícios para os dedos. Seu corpo longilíneo e serpenteado lhe dá o nome. Referências BENNETT, Roy. Instrumentos da Orquestra. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985. _____. Como Ler uma Partitura. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. BERTULANI, C. A. 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No século IV, o papa Silvestre fundou em Roma a primeira escola para a formação do canto religioso. O desenvolvimento da música esteve, por muitos séculos, ligado à Igreja, independentemente das canções profanas dos séculos XII, XIII e XIV. Já no final do século XVI, surgiu a ópera como uma nova forma musical, reunindo cantores, bailarinos e declamadores, acompanhados por diver- sos instrumentos musicais. A ópera foi recebida com grande entusiasmo pelo público, estimulando o seu desenvolvimento rapidamente e, com isso, a necessidade do aperfeiçoamento vocal para os cantores. Surgiram assim as grandes escolas de canto, sendo a maior em Roma, com suas téc- nicas diferenciadas. Na fala, geralmente são usados cinco tons, também podendo chegar a oito tons na voz de um declamador ou um ator. Um grande cantor conse- gue emitir, geralmente, de 16 a 24 tons. Por isso, a exigência da voz com o nascimento da ópera. Na época, nem todos os cantores possuíam o ma- terial vocal adequado. Surgiu então a técnica vocal, apoiada no que se conhece sobre o funcionamento do aparelho fonador. A ciência da voz foi um desafio para a medicina, que pesquisou o funcionamento do aparelho fonador, sua anatomia e suas deficiências. 191 192 Vozes que cantam O espelho do doutor Não se sabia exatamente como a voz é produzida até 1854, quando o profes- sor de canto Manoel Garcia introduziu profundamente na sua garganta um es- pelho de dentista. Colocou-se contra o sol e observou com um segundo espelho o interior da laringe. Foi provado assim que falamos e cantamos com as cordas (ou pregas) vocais. Quando o ser humano nasce ele aprende a falar e a cantar porque tem uma necessidade de comunicação. Sabe-se que o corpo humano não tem, na sua anatomia, constituição própria e adequada ao processo fonatório. Considera-se que a produção da voz é resul- tado de uma aprendizagem cultural realizada pelos recursos do próprio corpo. Primitivamente, a laringe destinava-se somente à respiração. Diante da neces- sidade da intercomunicação da espécie humana, ela passou a desempenhar o papel de órgão fonador. Portanto, é uma adaptação de um órgão primitivo a outra função, sugere Kahle (1966). Alguns órgãos do sistema digestivo – lábios, dentes, língua, palato duro (céu da boca) e faringe – têm, além de suas funções biológicas relacionadas ao processo alimentar, participação nas funções fonatórias. Podemos exemplificar relacionando esses órgãos à produção vocal, nos aspectos da articulação dos sons e projeção da voz, enquanto a faringe também contribui como caixa de ressonância. Espelho. IE SD E Br as il S. A . Cordas vocais fechadas. IE SD E Br as il S. A . Cordas vocais abertas com fenda glótica. IE SD E Br as il S. A . Vozes que cantam 193 Fôlego Podemos observar adaptações também com relação ao aparelho respirató- rio. As cavidades nasais têm a função biológica de filtrar, aquecer e umidificar o ar: suas funções fonatórias produzem vibração e armotização do som, produ- zindo ressonância nasal. A faringe, a laringe e a traqueia são vias de passagem do ar e entre suas funções fonatórias está a ampliação dos sons como caixa de ressonância (faringe), vibrador através das cordas vocais (laringe) e suporte para vibração das cordas vocais (traqueia). Os pulmões, que biologicamente promo- vem trocas gasosas e são responsáveis pela respiração vital, funcionam como fole reservatório de ar para a vibração das cordas vocais. A musculatura que de- sencadeia o processo respiratório participa na função fonatória como produtor da pressão na saída do ar. IE SD E Br as il S. A . faringe cordas vocais traqueia pulmão diafragma diafragma in sp ira çã o ex pi ra çã o 194 Vozes que cantam Respiração Há três tipos de respiração: respiração clavicular; � respiração toráxica; � respiração diafragmática ou abdominal-intercostal. � Fisiologicamente, a respiração é um fenômeno vital espontâneo, podendo ser observada de forma natural entre os animais e as crianças pequenas. Essa é a chamada respiração diafragmática, com o movimento do diafragma e dos músculos intercostais de forma espontânea e automática, enchendo de ar os pulmões. É importante saber que a cavidade abdominal e a cavidade toráxica são sepa- radas pelo diafragma, que é um músculo transversal em forma de cúpula. Expiração Traqueia Pulmão Diafragma IE SD E Br as il S. A . Inspiração IE SD E Br as il S. A . Foles O processo da respiração diafragmática acontece quando inspiramos: o dia- fragma abaixa-se e a cavidade toráxica aumenta. Nesse momento, as duas “asas” dos pulmões reagem como dois foles, dilatando-se e se enchendo de ar. A ex- Vozes que cantam 195 piração é o movimento de expulsão do ar pela pressão do diafragma, que está retornando à sua posição de repouso: os pulmões contraem-se e expelem o ar. Esse movimento de inspiração e expiração faz parte do sistema nervoso vege- tativo e ocorre independente da nossa vontade. Podemos assim constatar que o corpo humano, além do pulso cardíaco, tem um pulso respiratório: o diafrag- ma está permanentemente realizando essa pulsão contínua de bombeamento do ar para dentro do corpo. Quando se canta, a vontade interfere nesse pulso respiratório. Expiração Músculos internos puxam as costelas para baixo e para dentro Músculos ex- ternos movem as costelas para cima e para fora Inspiração IE SD E Br as il S. A . Movimentos respiratórios Ao realizar o processo respiratório de inspiração e expiração e, consequen- temente, o movimento de subida e descida do diafragma, toda a caixa toráxica reage junto com suas 12 vértebras, 12 pares de costela (superiores e inferiores), o esterno e os grandes grupos musculares: intercostais, abdominais, dorsais e peitorais. Nas duas primeiras imagens, vemos o movimento de expirar de forma com- pleta e a inspiração abdominal intercostal (diafragmática). A boa respiração vocal necessita que o pulmão possa fazer corretamente o seu movimento de forma 196 Vozes que cantam tridimensional. Para tanto, a respiração natural deve começar de baixo para cima no corpo, de modo a realizar primeiramente a expansão abdominal e intercostal, pelo abaixamento do diafragma, e depois a expansão anteroposterior do tórax. Na última imagem, temos um outro tipo de inspiração (clavicular), que causa tensão e desgaste postural. Expiração completa. IE SD E Br as il S. A . Inspiração abdominal intercostal. IE SD E Br as il S. A . Inspiração clavicular, prejudicial. IE SD E Br as il S. A . Questão respiratória Na respiração fisiológica, completa e profunda, a inspiração é mais longa e a expiração mais curta. Na respiração do canto, acontece o contrário: inspira-se pouco e a expiração é lenta, economizando-se ar ao máximo, pois todo o ar deve ser transformado em som. A grande questão respiratória para os cantores não está na falta de ar, mas na sua utilização errada, ou seja, na expiração. Os exercícios respiratórios devem ser Vozes que cantam 197 conscientes. Na inspiração correta, para não haver descontrole de pressão, o ar deve entrar nos pulmões por causa da: elasticidade na região do diafragma; � abertura da glote e das vias aéreas superiores; � postura correta. � Na expiração, o controle e a utilização do ar são decisivos para haver a pressão necessária para a produção e a projeção do som, que é controlada pelo movi- mento do diafragma, subindo e empurrando o ar para fora. A respiração vocal irá trabalhar esse retorno espontâneo, que precisará ser dominado e controlado. úvula faringe epiglote hioide cart. tireoide cordas vocais cart. cri- coide traqueia v e s t í b u l o da laringe epiglote prega vestibular (falsas cordas vocais) e s p a ç o infraglótico cordas vocais cart. cricoide A – Corte sagitalB – Frontal IE SD E Br as il S. A . A produção da voz A voz humana é resultado dos ruídos e dos sons musicais que, produzidos no interior da laringe pelas vibrações das cordas ou pregas vocais, são ampliados e timbrados nas cavidades de ressonância. Fazem parte desse esquema a gargan- ta, a boca e o nariz. Esses órgãos funcionam como ressonadores, ampliando e enriquecendo a sonoridade. Possuímos dois pares de cordas vocais: na posição superior, as falsas; na posição inferior, as verdadeiras, com as quais cantamos ou falamos. Os bordos internos das cordas formam a fenda glótica, que é o espaço por onde passa o ar. 198 Vozes que cantam Quando inspiramos, o ar entra para os nossos pulmões, que se enchem. Na expiração (quando o ar é expelido), as pregas vocais cartilaginosas, situadas no interior da laringe, abrem-se e vibram com a passagem do ar. Quando os sons são agudos, as cordas vocais se aproximam e se esticam; nos sons mais graves, elas se afrouxam. Quando queremos falar ou cantar, as cordas se aproximam e mudam o tama- nho da fenda glótica, que terá sua espessura conforme a altura e a intensidade do som a ser emitido. Em um som grave, as cordas (pregas) vocais ficam mais grossas, mais compridas e menos tensas, pois a fenda glótica estará mais aberta. Quando o som for mais agudo, as pregas vocais ficam mais finas, mais curtas e mais tensas, de modo que, consequentemente, a fenda glótica se apresentará mais estreita. IE SD E Br as il S. A . Cordas encostadas: produ- ção de som. Cordas afastadas: silêncio. Cordas entreabertas: sussurro. As cordas vocais. Vozes masculinas e femininas A altura natural da voz decorre da sua frequência, que por sua vez é, em grande parte, resultado do comprimento das cordas vocais. Os homens, por terem as suas mais longas, têm a voz mais grave que as mulheres e as crianças. A frequência da voz masculina, no canto, varia de 80 a 500 vibrações por segun- do, enquanto a frequência da voz feminina vai de 200 a 1 400 vibrações, ou até mais. Vozes que cantam 199 Frequência da voz humana A mais baixa frequência que pode dar audibilidade a um tom é mais ou menos a de 20 vibrações por segundo, enquanto a mais alta se encontra entre 10 000 e 20 000 vibrações. A frequência comum de um piano é de 40 a 4 000, ao passo que a voz feminina pode variar de 80 a 1 400 vibrações por segundo. No que se refere ao tamanho e à tensão das cordas vocais, podemos estabe- lecer comparações entre elas e a construção dos instrumentos musicais. Quanto maior for o instrumento, mais longas, mais espessas e menos tensas serão suas cordas, resultando em sons mais graves. Os instrumentos que produzem sons agudos têm suas cordas mais curtas, mais tensas e mais finas. O processo mental da fonação está ligado ao sistema nervoso da seguinte forma: a produção de voz começa no cérebro, por meio de uma ideia; em se- guida, são acionados os neurônios, responsáveis por transformar essa ideia em sinais; e finalmente os nervos motores do aparelho fonador se encarregam de emitir os sons. É importante ressaltar que a fonação é aprendida e não inata, e que ela representa um esforço adicional para o aparelho fonador, que o apro- veita de forma funcional para produzir a linguagem. A respiração precisa ser “re- aprendida” para ser adequadamente utilizada no canto ou na fala. Ao nascer, respiramos de maneira correta e, à medida que crescemos, vamos nos afastando do nosso modo natural e ficamos mais tensos. Assim, nossa respiração fica mais curta, acelerada, e se aprisiona entre as costelas superiores e a clavícula, alteran- do os batimentos cardíacos e o equilíbrio do sistema nervoso. De outro lado, os exercícios respiratórios podem ajudar em uma reestruturação fisiológica e psi- cológica frente à vida. Cordas vocais masculinas Cordas vocais femininas IE SD E Br as il S. A . 200 Vozes que cantam Na verdade, é o cérebro que realiza o processo de fonação, refletindo o conteúdo psíquico e emocional da pessoa em uma expressão sonora da sua personalidade. Ponto focal de ressonância Sinus frontal Olhos Passagem nasal Pronúncia Tórax Expandir como banda elástica O músculo diafragma é forçado contra a parede do corpo até o fim da frase. Músculos pélvicos são contraídos para dentro e erguidos para cima. Músculos traseiros ou músculos glúteos. Esses músculos são contraídos e erguidos para cima. Músculo diafragma Pulmão Laringe (órgão vocal) Traqueia Sinus esfenoide IE SD E Br as il S. A . Apoio Na expiração, deve haver economia na saída do ar. O indivíduo necessita conscientizar-se da utilização dos músculos da região glútea, dos abdominais pélvicos e do períneo para apoiar e ajudar na sustentação do diafragma e nos músculos intercostais, no momento da expiração. Aparelho fonador Podemos dividir o aparelho fonador em cinco partes. Vozes que cantam 201 Pulmões, músculos e diafragma – têm a função de produzir a coluna de ar � que pressiona a laringe, produzindo som nas cordas vocais. Laringe – responsável pela produção do som fundamental, o som básico. � Lábios, língua, palato mole, palato duro (céu da boca) e mandíbula – ser- � vem para articular e dar sentido ao som, transformando-o em oral e na- sal. Ouvido – sensor que capta, seleciona, localiza e conduz o som. � Cérebro – tem a tarefa de coordenar, analisar, registrar, arquivar e interpre- � tar o som. Outros aspectos ligados ao canto Postura A boa postura está associada à conscientização do próprio corpo, que deve ser mantido em posição natural, com elasticidade, equilíbrio e autocontrole. A postura correta permite o máximo rendimento, tornando o corpo leve, flexível e disponível para cantar. A respiração está intimamente relacionada às noções de expiração e inspiração, quando o corpo põe-se em prontidão para depois fazer o movimento de esforço e relaxamento. Outro aspecto relevante é a noção da localização do peso do corpo, que deve estar bem posicionado para garantir a estabilidade. Para o cantor, o corpo é um meio de expressão e, portanto, é im- portante assumir e marcar sua própria presença com determinação. Articulação Existem muitos métodos para o estudo e o desenvolvimento de uma articula- ção mais eficiente. A articulação vocal inclui os elementos da fonética, ou seja, a dicção. A articulação constitui-se em um conjunto de movimentos realizados nas partes móveis das cavidades de ressonância do rosto, transformando os ruídos e os sons produzidos em palavras e, consequentemente, na linguagem. Partici- pam dessa tarefa os dentes, a língua, os lábios e os demais músculos faciais. 202 Vozes que cantam As consoantes só possuem significado junto às vogais, delineando-as. A con- soante é emitida na mesma altura da vogal que a segue, tendo que enfrentar obstáculos na passagem do ar. As vogais, por sua vez, são sons formados pela vibração das cordas vocais – sons que sofrem modificações de acordo com a cavidade bucal e a possibilidade do uso das cavidades de ressonância. Outro fator decisivo é a interpretação emocional de um texto, o que, além das questões articulatórias, busca produzir muitas variações de timbres. Quando o texto é alegre e leve, a articulação determina fonemas mais claros e brilhantes; no caso de um texto triste ou terno, o timbre vocal é mais escuro. Gilberto Gil Sítio do Pica-Pau Amarelo Faixa 1 (CD 2) Análise: música alegre, texto leve, sonoridades brilhantes, uso do instrumen- to (flauta) com som mais agudo dialogando com o canto, expressando um clima de brincadeira enfatizado pela percussão. João de Aquino e Paulo César Pinheiro Viagem Faixa 2 (CD 2) Análise: canção mais introspectiva, falando de tristeza. O andamento, por- tanto, é lento. O violoncelo surge fazendo um contracanto com a voz do solis- ta, realçando uma certa nostalgia à qual o texto se refere. Na segunda parte, o clima se modifica um pouco, trazendo violinos, com seus sons mais agudos, para sublinhar umacerta esperança de que fala a letra da canção. Mas conclui com acompanhamento dos sons graves, marcando o estilo da composição. Vozes que cantam 203 Ressonância Para que haja ressonância, é necessário que uma fonte sonora seja posta em vibração, ocorrendo então transferência de energia para outro sistema com a mesma frequência. Esse reforço se dá sobre o som fundamental e seus harmô- nicos, desencadeando sua vibração e reforçando a onda original. Na voz, as ca- vidades de ressonância produzem modificações junto às vibrações da laringe transmitidas pela coluna de ar, pelos ossos e os músculos. Essas alterações são resultado da anatomia das cavidades de ressonância e do uso da voz, alterando o som original produzido pelas cordas vocais. São consideradas cavidades de ressonância mais bem caracterizadas as cavidades toráxica, bucal e nasal. Tipos de ressonância Projeção da voz. Voz na máscara. Ressonâncias viciadas. de peito na garganta ou gutural na boca ou bucal no nariz ou nasal de cabeça IE SD E Br as il S. A . Algumas imagens colaboram nessas percepções, como a “voz de máscara”, em que a vibração é sentida mais na maçã do rosto e na testa, como se fosse uma máscara em volta dos olhos. Outra imagem que auxilia na projeção da voz adequadamente é a de que o som nasce na bacia, ganha força na cintura e, após passar pelos palatos, projeta- -se para fora dos olhos, orienta-nos Coelho (1994). O importante é que o indivíduo pesquise os espaços e meios de ressonância vocal que ocorrem no caminho do som dentro do próprio corpo. 204 Vozes que cantam Dicas para melhorar a emissão vocal Orientações de Coelho (1994), Oiticica (1992) e Kahle (1996) A abertura da boca deverá sempre ser no sentido vertical (e nunca no sentido � horizontal-lateral), para afastar os maxilares superior e inferior e assim descon- trair e relaxar os músculos mastigadores. A língua deverá ser mantida a maior parte do tempo baixa e plana, encostada � nos dentes inferiores, evitando que se retraia. Para aumentar o espaço bucal, deve-se levantar o palato. � Manter a posição de bocejo para alargar a faringe. � Sorrir com os olhos para levantar as maçãs do rosto e assim criar uma fisiono- � mia aberta e comunicativa. Abrir as narinas e inspirar como se estivesse tomando água pelo nariz. � Relaxar a faringe, deixando-a baixa. � Não fixar ou levantar os olhos ao cantar porque isso produz contração na � nuca. Inspirar sem que se ouça qualquer ruído (“inspirar com as orelhas”, sugere Oi- � ticica). O timbre de cada voz é uma característica individual e deve ser descoberto. � Da cintura para cima, o corpo deve estar descontraído e livre. Da cintura para � baixo, manter contraídos os músculos glúteos, abdominais e pélvicos, e tam- bém o períneo. É importante que cada cantor identifique todo o seu corpo como um instru- � mento musical. Na respiração fisiológica, completa e profunda, a inspiração é mais longa e a � expiração mais curta. Na respiração do canto, acontece o contrário: inspira-se pouco e expira-se lentamente, economizando ao máximo a saída de ar. As inspirações profundas serão praticadas somente nos exercícios respirató- � rios. Vozes que cantam 205 Na inspiração correta, jamais levantar os ombros: deve-se deixar que o ar � entre nos pulmões pela movimentação natural e elástica da região dia- fragmática. Na expiração, o objetivo é adquirir o domínio desse mecanis- mo, tendo consciência e controle no uso da saída do ar, aprendendo a transformar todo o ar em som pela pressão e projeção do movimento do diafragma. Vozes humanas e suas classificações O canto é considerado a mais íntima e pessoal das expressões musicais. Cada pessoa possui a sua própria “impressão vocal”, assim como temos a nossa impressão digital. Uma simples emissão de som nos identifica com particulari- dades únicas. O cantor treinado desenvolve, além dos aspectos técnicos, uma personalidade vocal que amplia seus recursos expressivos, podendo dar vida aos personagens que interpreta ou realçando o texto de uma canção. O cantor solista desenvolve uma carreira em que enfrenta desafios ao aceitar diferentes personagens, no caso das óperas e árias, ou também quando é convidado a in- terpretar canções com temáticas e estilos diversos. Assim como as tendências de cada época mudam, os conceitos também se alteram, as vozes dos cantores e seus estilos ganham preferência ou caem em desuso por desejo de novas formas e estilos musicais. As vozes humanas podem ser classificadas, assim como os instrumentos musicais, pelo seu registro – graves, médias e agudas. O espaço do alcance em que uma voz pode cantar, correspondendo à extensão do som mais grave até o som mais agudo, é chamado tessitura vocal. Cada tipo de voz tem a sua própria tessitura. O quadro na próxima página traz uma classificação dos tipos de vozes huma- nas no canto, mostrando as respectivas regiões do teclado para facilitar nossa compreensão. Observe a indicação do Dó central, que é a região média do ins- trumento e, consequentemente, produz a sonoridade de altura média. A partir desse ponto, são indicadas as vozes com suas tessituras aproximadas, isto é, indi- cam-se com um traçado, a partir da esquerda, a nota mais grave e a mais aguda que cada voz pode produzir. 206 Vozes que cantam Extensão das vozes e dos instrumentos baixo barítono tenor contratenor contralto mezzosoprano soprano Dó central Vozes Cordas contrabaixo violoncelo viola harpa violino Dó central contrafagote fagote clarinete baixo clarinete corne inglês oboé flauta flautim Dó central Madeiras Vozes que cantam 207 Metais tuba trombone baixo trombone tenor trompa trompete/corneta Dó central Dó central 8va { As classificações dadas às vozes servem para descrever a extensão e o timbre dos diferentes tipos de voz no canto. Muitas vezes, as vozes educadas ultrapas- sam esses limites. Vozes femininas: soprano; � mezzosoprano; � contralto. � Vozes masculinas: contratenor; � tenor; � barítono; � baixo. � 208 Vozes que cantam mezzosopranosoprano alto ou contralto Vozes femininas contratenor tenor barítono baixo Vozes masculinas Observe que para cada voz está indicada a nota mais grave e a seguir a nota mais aguda, no exemplo anterior, que um cantor ou uma cantora pode alcançar. Essa extensão é a tessitura vocal. Entre as vozes masculinas há o uso da clave de Fá, assinalando que estas são vozes mais graves que as femininas, que utilizam clave do Sol para indicar a extensão. Femininas Soprano Meio-soprano Contralto aguda média grave Masculinas Tenor Barítono Baixo aguda média grave (A BR A H ÃO , 1 97 7, p . 3 9) Vozes que cantam 209 Na sua extensão, a voz masculina de contratenor corresponde à feminina de contralto. Vozes femininas Soprano É a mais aguda das vozes. A voz feminina era pouco usada na música erudita até o início do século XVI porque era considerado impróprio que uma dama can- tasse, ou mesmo que um cavalheiro fizesse música na presença de damas. Com o desenvolvimento da ópera, os sopranos passaram a despontar a partir de 1608, com a obra Arianna, de Monteverdi. No início do século XVIII, eles mos- travam muita agilidade e beleza para ornamentar uma ária (canção independen- te ou que é parte de uma obra maior). A partir de Mozart (1756-1791), os compositores passaram a considerar os di- ferentes tipos de soprano, com referência ao timbre e às características da voz. Já no século XIX, os teatros com maiores dimensões requeriam vozes bastan- te potentes, especialmente para os papéis a serem cantados com muita drama- ticidade, e ainda concorrendo com a sonoridade da orquestra, como nas obras de Wagner (1813-1883). Com Verdi (1813-1901), além das óperas dramáticas, foram solicitados sopra- nos líricos para cantar floreado. Os sopranos costumam se sentir muito à vonta- de em determinados repertórios e isso reflete a tendência da especialização. Maria Callas(1923-1977) Uma das mais famosas e importantes cantoras líricas soprano do século XX. Nascida em Nova York, mas com ascendência grega, seu nome civil era Maria Anna Cecília Sofia Kalogeropoulou. Estudou canto no Conservatório de Atenas. Apresentou-se em grandes casas de espetáculo dedicadas à opera, como La Scala. Com uma voz de grande alcance e de raros dotes interpretativos, encan- tou o mundo com papéis versáteis em diversas óperas. 210 Vozes que cantam Maria Callas. Br un o To ss i. Rü dg er W öl k. Teatro La Scala, em Milão, Itália, uma das mais famo- sas casas de ópera do mundo, inaugurada em 1778. Giuseppe Verdi (1813-1901) Macbeth Solista: Maria Callas (soprano) e Orquestra Sinfônica de Dallas Faixa 3 (CD 2) Renée Fleming Soprano americana de grandes dotes interpretativos e versatilidade estilísti- ca que conquista o público. Estudou na Juilliard Schooll e tem titulação também por outros renomados centros musicais. Vencedora de grandes prêmios e con- cursos internacionais de canto. Apresenta-se nas salas mais prestigiosas do mundo, com grandes e importantes maestros e orquestras. André Previn Um Bonde Chamado Desejo Solista: Renée Fleming (soprano) e Metropolitan Opera Orchestra Faixa 4 (CD 2) Vozes que cantam 211 George Gershwin (1898-1937) Summertime Solista: Nuccia Focile (soprano) Faixa 5 (CD 2) Mezzosoprano (meio-soprano) Voz feminina intermediária entre o soprano e o contralto. Geralmente o mez- zosoprano apresenta um timbre mais encorpado que o soprano e tem uma ex- tensão maior na região central-grave. Cecilia Bartoli Mezzosoprano de voz que, com impressionante flexibilidade, cobre grande extensão dos meios-sopranos e sopranos. Possui muita musicalidade e é uma in- térprete com forte presença nos palcos. Já atuou no Metropolitan de Nova York; na Royal Opera House e no Covent Garden, de Londres; no Scala, de Milão; na Ópera da Baviera, de Munique; no Festival de Salzburgo e na Ópera de Zurique. Além da fantástica venda de seus discos, recebeu numerosos prêmios e títulos de destaque. Cecilia Bartoli. Su pe rv is io n Fr an ce . 212 Vozes que cantam Gioacchino Rossini (1792-1868) La Danza James Levine (Piano) e Cecilia Bartoli (mezzosoprano) Faixa 6 (CD 2) Covent Garden de Londres. D iv ul ga çã o. Contralto É a voz feminina mais grave, sendo considerada de qualidade rica e quente, motivo pelo qual inicialmente foi usada para papéis trágicos, de vilã, mulheres mais velhas ou feiticeiras. No século XIX, o contralto foi aproveitado para atuar como prima donna (“primeira-dama”, ex- pressão usada para a cantora principal), especialmente pelo compositor italiano Rossini, no personagem de Rosina, na ópera O Barbeiro de Sevilha. Agnes Baltsa, mezzosoprano. Po st F in an ce . Vozes que cantam 213 Georges Bizet (1838-1875) Carmen Solista: Agnes Baltsa (mezzosoprano) e Metropolitan Opera Orchestra Faixa 7 (CD 2) Vozes masculinas Tenor Do latim tenere (“segurar”), provavelmente significando, na sua origem, uma parte que segurava uma estrutura musical e, por meio de muitas derivações, também passou a nomear a voz masculina aguda. Durante o século XVI e parte do XVII, o tenor era a voz solista mais importante, sendo usada na canção popu- lar e também na música sacra. No início do século XIX, houve o desenvolvimento da voz de tenor do tipo mais possante, o tenor dramático, com as óperas de Ros- sini, Bellini e Donizetti. O tenor lírico foi mantido na ópera francesa. Agustín Lara (1900-1970) Granada Solista: José Carreras (tenor), Orchestra del Maggio Fiorentino e Orchestra del Teatro di Roma Faixa 8 (CD 2) Caruso foi um tenor muito famoso e popular no início do século XX, estabe- lecendo um padrão para os tenores que foi mantido especialmente por Luciano Pavarotti e Plácido Domingo. 214 Vozes que cantam Giacomo Puccini (1858-1924) E Lucevan le Stelle Solista: Plácido Domingo (tenor), Orchestra del Maggio Fiorentino e Orchestra del Teatro dell’Opera di Roma Faixa 9 (CD 2) Luciano Pavarotti. D iv ul ga çã o Lu ci an o Pa va ro tt i. Vozes que cantam 215 Ernesto De Curtis (1875-1937) Torna Surriento Solista: Luciano Pavarotti (tenor), Orchestra del Maggio Fiorentino e Orchestra del Teatro dell´Opera di Roma Faixa 10 (CD 2) Barítono Voz masculina de registro médio. O termo barítono vem do grego e significa “som profundo”. No final do século XV, a palavra foi usada pela primeira vez, mas seu sentido moderno só surgiu a partir do século XVII. Nas óperas de Mozart, especialmente, a voz de barítono tornou-se importante. Verdi também a utilizou para muitos papéis de herói, oprimido e vilão, assim como Bizet e Wagner, para citar alguns compositores. Georges Bizet (1838-1875) Carmen Solista: Samuel Ramey (barítono) e Metropolitan Opera Orchestra Faixa 11 (CD 2) Baixo A palavra baixo vem do latim bassus (“baixo, espesso”) e apareceu pela pri- meira vez na música em 1450. Nas primeiras óperas, o baixo era usado para re- presentar deuses ou figuras misteriosas e mais tarde também foi aproveitado para representar vilões e figuras detentoras de autoridade, como reis. 216 Vozes que cantam Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) O Isis und Osiris (da Ópera A Flauta Mágica) Solista: Luiz Henrique Molz (baixo) e Orquestra da PUCRS Faixa 12 (CD 2) Contratenor O contratenor possui sonoridade forte e límpida. Durante os séculos XVII e XVIII, foi muito apreciado na Inglaterra e desde o século XX vem sendo nova- mente apreciado. Johann Sebastian Bach (1685-1750) Widerstehe doch der Sünde Solista: Andreas Scholl (contratenor) e Orchestre du Collegium Vocale Faixa 13 (CD 2) Duo: tenor e soprano Charles Gounod (1818-1893) Ah! Ne Fuis pás Encore (Segundo Ato da Ópera Romeu e Julieta) Solistas: Roberto Alagna (tenor), Angela Gheorghiu (soprano) e Orquestra e Coro do Capitole de Toulouse Faixa 14 (CD 2) Vozes que cantam 217 Roberto Alagna. Si m on F ow le r. Angela Gheorghiu. Sa sh a G us ov . Trio: três tenores Luciano Pavarotti. D iv ul ga çã o. Plácido Domingo. D iv ul ga çã o. José Carreras. W es er E m s H al le . Giacomo Puccini (1858-1924) Nessum Dorma Solistas: Luciano Pavarotti, Plácido Domingo, José Carreras (tenores), Orchestra del Maggio Fioren- tino e Orchestra del Teatro dell’Opera di Roma Faixa 16 (CD 2) 218 Vozes que cantam Pixinguinha (1897-1973) Carinhoso Faixa 17 (CD 2) Vozes em outros gêneros musicais Jazz Diana Krall (1964), cantora e pianista de jazz nascida no Canadá, começou a tocar piano aos quatro anos de idade. Na juventude, fez parte de um pequeno grupo de jazz. Aos 15 anos começou a se apresentar em restaurantes e, aos 17, ganhou uma bolsa de estudos. Em 1990, foi para Nova York e finalmente alcan- çou o sucesso. Em 2007, lançou The Very Best of Diana Krall, com CD e DVD, reu- nindo seus maiores sucessos. Diana Krall. Ja m e O ´M ar a. Vozes que cantam 219 Diana Krall Stop this World Faixa 18 (CD 2) Música popular brasileira D ai go O liv a. Caetano Veloso. Caetano Veloso Desde que o Samba é Samba Solista: Caetano Veloso Faixa 19 (CD 2) Vinicius de Moraes e Baden Powell Berimbau Faixa 20 (CD 2) 220 Vozes que cantam Vitor Ramil. D iv ul ga çã o. Vitor Ramil Estrela Faixa 21 (CD 2) Zé Renato, Cláudio Nucci e Juca Filho Toada Faixa 22 (CD 2) D iv ul ga çã o. Chico Buarque. Vozes que cantam 221 Chico Buarque de Hollanda Roda Viva Faixa 23 (CD 2) Milton Nascimento. D iv ul ga çã o. Milton Nascimento Festa Faixa 24 (CD 2) Texto complementar Família Bach Johann Sebastian (1685-1750) é o mais famoso membro da incrível famí- lia Bach, cujos componentes viveram e trabalharam na Alemanha Central, principalmente na Turíngia, nos séculos XVI ao XVIII. Os Bach representam a mais notável e constante concentração de talento musical jamais registrada em uma únicafamília. Alguns foram violinistas e músicos municipais, outros foram organistas e músicos da corte. Acredita-se que mais de 70 membros 222 Vozes que cantam da família Bach tenham garantido seu sustento com a música, orienta-nos Sadie (1994). Tudo iniciou com Veit Bach, no século XVI, que era músico amador. Johann Sebastian Bach, o mais conhecido de todos, é o número 24 na genealogia familiar. Teve 20 filhos, muitos dos quais também foram compositores de projeção. Johann Sebastian Bach. D om ín io p úb lic o. Vozes que cantam 223 Instrumentos desconhecidos: koto Cordofone japonês de 13 cordas dedilhadas e caixa na horizontal, com cerca de 1,8 metros. Originário do qin chinês, foi introduzido no Japão por músicos chineses e coreanos no século VII. IE SD E Br as il S. A . Referências A FALA. Disponível em: <http://br.geocities.com/saladefisica5/leituras/fala. htm>. Acesso em: 7 fev. 2008. ABRAHÃO, L. M. Música Comunicação. São Paulo: Nacional, 1977. v. 1. AN SLOW-MOTION animation of the vocal folds vibrating during speech. 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Obser- ve que dentro de uma mesma categoria, como árvores, flores ou frutas, há muita variedade de elementos. Diferentes combinações enriquecem e especificam uma espécie. Assim também podemos pensar na música quando o composi- tor tem diante de si muitos timbres, sons instrumentais e vocais. Uma composição reúne um conjunto de elementos sonoros, tornando-se única, mesmo que faça parte de uma categoria estrutural maior. Cada categoria agrupa obras musicais que compartilham elementos seme- lhantes, sendo, assim, organizadas por gêneros. Alguns desses gêneros são definidos por região geográfica, como a música brasileira, indiana ou argentina. Outra maneira de agrupar as composições é considerar a ordem cronológica dos períodos da história ocidental, como renas- cença, barroco, clássico etc. Ou então os modos de composição, como concerto, ópera, sinfonia etc. Outras categorias referem-se aos estilos, como rock, pop-rock, rap, reggae, jazz, valsa, samba, tango, música eletrô- nica, new age etc. Algumas peças musicais não se encaixam em nenhu- ma divisão, caracterizando-se por conterem elementos diversos, criando a sua própria distinção. Riquezas são diferentes Observando e ouvindo todo esse incrível e surpreendente universo sonoro, podemos considerar que as divisões – sejam elas por gêneros, es- tilos e formas musicais – são categorizações para organizar a imensa pro- dução musical do ser humano em todas as épocas e lugares. Os elemen- tos sonoros são recursos à disposição do compositor, que tem a função de dar corpo e alma a um conjunto de ritmos, melodias, timbres e harmo- nias, construindo assim a sua obra. Uma dica é ficar livre dos preconceitos e se pôr à disposição para ouvir a música com sentimento e prazer, mas 227 228 Gêneros, formas e estilos musicais também com inteligência. A percepção sonora busca descobrir como o com- positor realiza a sua obra, como coloca suas ideias e as desenvolve, sobretudo como usa a sua criatividade, inovando e contribuindo para a evolução da arte musical. Vamos conhecer (ou recordar) algumas maneiras de os compositores darem forma à sua matéria-prima: o som. Inicialmente, faremos uma breve análise de algumas formas musicais da música ocidental. Formas musicais Forma musical é a maneira de os compositores arranjarem e ordenarem suas ideias musicais, resultando na elaboração, modelagem e estrutura da composi- ção. A obra musical não nasce no vazio, pois cada uma tem o seu projeto, o seu fundamento sonoro e um sistema de construção. É importante conhecer a estrutura de uma obra musical para descobrir suas raízes e as intenções do músico ao desenvolver suas ideias. São diversas as pos- sibilidades de tornar uma criação interessante, curiosa, bela, arrojada ou inova- dora. Devemos lembrar que o processo de compor envolve o descobrimento de novas combinações sonoras que se mesclam com ritmos e harmonias na tenta- tiva de superar o que já se conhece. Além dos elementos da estrutura musical, como a melodia, o ritmo e a harmonia, é necessário pensar em como dar ex- pressão aos ideais musicais. Não basta ter lindas melodias, ritmos interessantes e harmonias corretas: é decisivo que haja uma consistência de toda a obra, uma reunião orgânica e equilibrada das partes isoladas, determinada pela forma. Descartáveis e imortais Quando as composições são simples e de fácil compreensão, pode-se per- ceber a sua forma rapidamente. São peças musicais que chegam ao agrado do público ouvinte por conterem alguns elementos que chamam a atenção e agra- dam. Porém, muitas dessas músicas não permanecem, caindo no esquecimento. Gêneros, formas e estilos musicais 229 As obras que possuem valor artístico permanecem por muito tempo pela força expressiva dos seus elementos como uma unidade determinada pela forma musical. Essas peças são consideradas imortais, pois são ouvidas há muitos séculos. Repetição e contraste Repetição e contraste são os elementos básicos usados para dar forma à composição. A repetição de ideias é necessária para encadear a música, para dar unidade à composição. Os contrastes resultam da combinação de sons ou da oposição de diferentes padrões sonoros. São infinitas as possibilidades de o compositor contrastar um momento musical com outro. Alguns exemplos de contraste Ritmo: um desenho regular e pouco marcado por oposição a outro entre- � cortado e muito acentuado. Altura: sons graves contrastam com agudos. � Andamento: lento/rápido. � Dinâmica: forte/fraco. � Caráter: alegre/triste; ligeiro/solene. � Harmonia: consonante/dissonante. � Timbre: agudos e brilhantes em oposição a sóbrios e profundos. � Silêncio: em oposição ao som. � Vamos ficar atentos para conferir como os compositores se utilizam desses e de muitos outros recursos sonoros em suas composições. 230 Gêneros, formas e estilos musicais Observe o exemplo desses recursos em uma canção.Rogério Flausino e Wilson Sideral Fácil Faixa 25 (CD 2) Algumas formas musicais: abertura Composição orquestral que serve de introdução a uma obra lírica, a ópera, por exemplo, é como um breve resumo da história que se desenvolve diante dos olhos dos que a assistem. Assim, vamos ouvir na abertura da ópera Carmen, os vários contrastes que o compositor traz nesse trecho. O músico tem, entre outros objetivos, o de apre- sentar aos ouvintes um breve resumo do que virá a acontecer no desenrolar do drama. A história terá momentos alegres, de euforia, mas também contará pas- sagens tristes e melancólicas. Ouviremos tudo isso no primeiro contato musical porque o compositor usará dos diversos recursos para criar interesse, enfatizan- do e realçando seus personagens e o enredo. Observe os grandes contrastes de ritmos, os movimentos nas alturas sonoras, o andamento variável, assim como os sons fortes e fracos. Iremos perceber, pelos timbres dos instrumentos, os mo- mentos alegres e também aqueles mais nostálgicos e até trágicos. Quando assis- tir a uma apresentação, fique atento aos gestos do regente, que tem a tarefa de orientar para que a orquestra seja o mais expressiva possível. Georges Bizet (1838-1875) Abertura da Ópera Carmen Faixa 26 (CD 2) Gêneros, formas e estilos musicais 231 A seguir, ouviremos a abertura da ópera O Barbeiro de Sevilha, de Rossini. Conta-se que Rossini compôs em menos de 15 dias essa peça, que foi apresenta- da pela primeira vez em 20 de fevereiro de 1816, no Teatro Argentina, em Roma, onde o compositor dirigia a orquestra. Observe o estilo de esplendor e o fantás- tico final, concluído com um crescendo que faz maciça utilização dos metais. Gioacchino Antonio Rossini nasceu em Pesaro, norte da Itália, em 1792. Com- pondo tragédias e comédias com fluência e talento, revelava-se melhor no lado humorístico da vida. Um dos seus biógrafos fala da “grande gargalhada que Ros- sini trouxe à música”. Ele fez uma carreira de muito sucesso na Itália e depois em Paris. Apesar de ter sido vaiado na estreia de O Barbeiro de Sevilha, essa ópera se transformou em um grande triunfo e continua sendo até hoje. Gioacchino Rossini (1792-1868) Abertura: O Barbeiro de Sevilha Faixa 27 (CD 2) Concerto para solista O termo concerto deriva do verbo latino concertare, que significa “rivalizar” e também “conversar”. Como forma musical, o concerto é uma composição ins- trumental em que há um diálogo, mesmo de oposição, entre um ou vários ins- trumentos e o conjunto da orquestra. Na forma clássica, iniciada com Wolfgang Amadeus Mozart, o concerto divide-se em três andamentos: um primeiro anda- mento rápido (allegro); um segundo andamento lento (andante ou adágio) e um terceiro andamento rápido (allegro). Aproximadamente de 1770 a 1785, o con- certo se impôs quase que só por intermédio do violino, que foi o instrumento so- lista mais utilizado. Mas nessa época já haviam sido usados outros instrumentos solistas para dialogar com a orquestra, como o violoncelo, o trompete, a flauta, o fagote, o trompete, a trompa, o oboé. Mozart explora muito os recursos dramáticos do piano e seus concertos para esse instrumento são considerados por muitos como modelos perfeitos. Seus concertos para violino e orquestra e os concertos para instrumentos de sopro (de difícil domínio técnico) são obras destacadas. 232 Gêneros, formas e estilos musicais Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) Concerto para Clarinete e Orquestra em Lá Maior, K. 622, Segundo Movimento: Adágio Faixa 28 (CD 2) Como nenhum outro na sua época, Mozart vale-se dos recursos tímbricos do clarinete. Nesse movimento (adágio) do seu Concerto para Clarinete e Orquestra há uma grande amplidão melódica, com melancolia e serenidade. Essa obra foi uma encomenda do seu amigo e clarinetista Anton Stadler, sendo composta em 1791. É um de seus últimos trabalhos – Mozart morreu logo após. Com Ludwig van Beethoven, o gênero concerto chegou ao seu apogeu, es- pecialmente no Concerto para Piano em mi bemol maior, op. 73, Imperador, de 1811. Ludwig van Beethoven (1770-1827) Concerto para Piano n. 5, O Imperador, op. 73, Primeiro Movimento: Allegro Faixa 29 (CD 2) O concerto Imperador A tonalidade em mi bemol maior é muito utilizada por Beethoven quando quer exprimir a ideia de grandeza ou sugerir a ideia de poder. O concerto Impe- rador foi composto quando a Áustria e a França estavam em guerra e Viena havia sido atacada e bombardeada pelos exércitos de Napoleão. Beethoven havia de- dicado essa obra ao arquiduque Rodolfo, seu aluno e protetor, que deixou a ca- pital austríaca com a corte imperial. Sentindo-se desolado, pois havia escrito um Gêneros, formas e estilos musicais 233 “canto de triunfo para o combate”, o compositor só concluiu o concerto depois da partida das tropas francesas e da assinatura da paz, em 1809. O Imperador foi apresentado pela primeira vez em audição pública em Lei- pzig, em 28 de novembro de 1811, agradando muito ao público, embora a crítica tenha considerado sua extensão “um pouco exagerada”. Surgiram concertos para violoncelo compostos por Schumann, Saint-Saëns, Brahms e Dvorak no século XIX, o século do concerto para piano e orquestra, consagrando o papel do solista virtuoso e enfatizando a interpretação subjeti- va com os compositores Schumann, Chopin, Liszt, Brahms, Tchaikovsky, Grieg, Weber, Mendelssohn e Saint-Saëns. No século XX os concertos inovaram na sua forma com Ravel, Bartók, Rach- maninov, Stravinsky, Prokofiev, Poulenc, Jolivet, Alban Berg, Webern, Elliot Carter, Pierre Boulez, Henri Dutilleux e György Ligeti. Ludwig van Beethoven (1770-1827) Concerto para Piano n. 5, O Imperador, op. 73, Primeiro Movimento: Allegro Faixa 29 (CD 2) O Concerto para Piano e Orquestra n.º 1, de Piotr Ilitch Tchaikovsky, foi dedi- cado ao pianista e maestro russo Nicolai Rubinstein, que considerou essa obra impossível de ser tocada. Depois dessa recusa, já com outro intérprete, a sua primeira apresentação foi em Boston, em 1875. Dança A música de dança é utilizada pelos compositores, tornando-se peça de con- certo, inspirada em ritmos de danças. Algumas danças como a pavana (dança da corte), a courante, o minuete e a 234 Gêneros, formas e estilos musicais bourée foram utilizadas por compositores como Lully e Bach. A valsa, derivada de danças camponesas alemãs e austríacas, surgiu no século XVIII e somente no século XIX, em Viena (Áustria), essa dança de três tempos teve seu sucesso com Johann Strauss I e seu filho Johann Strauss II. Outros nume- rosos compositores a utilizaram, como Schubert, Weber, Chopin. A valsa talvez seja o único estilo que conseguiu se adaptar a uma escrita complexa mantendo seu caráter dançante. Por esse motivo, muitos compositores puderam incluí-la em obras diferentes umas das outras como em sinfonias, bailados ou óperas. Também como peça refinada, sem outras pretensões, foi utilizada por Liszt, Ravel ou Schoenberg. Formas dançantes A polonaise (dança da corte) foi inspiração para compositores como Tele- mann e Bach. A mazurca (dança popular), também de origem polonesa, serviu ao compositor Chopin para as suas mazurcas, dando-lhes colorido especial. Entretanto, a polca de origem tcheca manteve apenas sua condição de música de divertimento. Principalmente nas Américas, pela grande convergência étnica, os séculos XIX e XX favoreceram o ressurgimento das formas dançantes, como o ragtime, o fox-trot, o charleston, o boogie-woogie e, especialmente na América Latina, o tango, o samba etc. Johann Strauss II (1825-1899) Danúbio Azul Faixa 31 (CD 2) No belo Danúbio Azul é a composição mais famosa de Johann Strauss II (1825- 1899). Estreou em 15 de fevereiro de 1867, em um baile de carnaval, no salão de uma piscina pública. Originalmente, essa obra tem o nome No belo Danúbio Azul, mas no Brasil costuma-se chamá-la Danúbio Azul. Na prática, é o hino da Áustria. Seis meses depois de sua estreia,foi apresentada em Paris nas festividades de Exposição Universal, triunfando. Gêneros, formas e estilos musicais 235 Essa famosa peça tem o símbolo do gosto pelo luxo e pela festa. A partir de 1825, esse estilo de música para dançar teve uma excelente aceitação em Viena e rapidamente se espalhou por toda a Europa. Johann Strauss II Trischt Trascht Polka, op. 214 Faixa 32 (CD 2) Bolero, uma composição de Ravel, é a música francesa mais tocada no mundo. Foi encomendada pela dançarina Ida Rubinstein e estreou na Ópera de Paris em 1928, com grande sucesso. A obra repete 17 vezes um grande tema único, sem o desenvolver. O tema é introduzido pela flauta acompanhada por tambor e pizzi- cati (cordas beliscadas). A cada repetição ingressa um novo instrumento, como o clarinete, após o fagote, outro clarinete, o oboé etc. O tambor se mantém em um ritmo constante. A única dinâmica apresentada é um progressivo crescendo or- questral. À medida que os instrumentos vão ingressando, a intensidade sonora aumenta, provocando um belíssimo carrossel de timbres e no final conclui com um monumental volume sonoro. O argumento do Bolero para orquestra (1929): a ação acontece em uma es- talagem espanhola. Uma cigana, em pé em uma grande mesa, inicia um passo de dança e aos poucos entusiasma-se pelo ritmo da música. Quatro homens se aproximam da mesa progressivamente, rodeiam a cigana e também se deixam contagiar pelo envolvente ritmo da peça. A seguir, podemos verificar o tema (ideia principal) do Bolero. Tema do Bolero (início). 236 Gêneros, formas e estilos musicais Joseph-Maurice Ravel (1875-1937) Bolero Faixa 33 (CD 2) Poema sinfônico O poema sinfônico é uma composição para orquestra, determinada por uma ideia ou um motivo extramusical descritivo ou poético. É a chamada música programática, que busca descrever com sons um sentimento, uma paisagem, um personagem ou outros temas. Essa música “conta uma história” ou procura meios para estimular imagens na mente do ouvinte. Como forma musical, o poema sinfônico se desenvolveu principalmente na segunda metade do século XIX. É uma obra escrita para a orquestra em um só movimento, mas geralmente é mais longa e de forma mais livre. Franz Liszt (1811-1886) foi o primeiro a compor uma série de poemas sinfônicos que são verdadeiras pinturas românticas, como se fossem quadros mostrando as paisa- gens de diversos lugares. Por exemplo, escreveu Hamlet (baseado na peça de Shakeaspeare) e Orfeu (baseado na lenda grega). Várias obras, desde o Renas- cimento, já tinham caráter descritivo, mas durante o período romântico houve intenção de associar a música à pintura e à literatura. Como exemplo, vamos ouvir uma peça do compositor tcheco Antonín Dvořák, que foi um violista talentoso. Nessa obra, podemos observar as influências da música folclórica. Antonín Dvořák (1841-1904) Dança Eslava n. 2 Faixa 34 (CD 2) Gêneros, formas e estilos musicais 237 A próxima peça é do compositor russo Modest Mussorgsky, e nos traz audá- cias na orquestração. Sua intenção foi descrever musicalmente uma assembleia noturna de feiticeiras, enquadrando em um único andamento os quatro episó- dios que a compõem: reunião das feiticeiras, cortejo do diabo, missa negra e assembleia noturna das feiticeiras presidida pelo diabo. Esse ambiente satânico foi alcançado porque Mussorgsky deu um tratamento diferenciado à orquestra. Observe os recursos sonoros utilizados, os quais nos transportam para aquele ambiente. Modest Mussorgsky (1881-1938) Uma Noite no Monte Calvo Faixa 35 (CD 2) Sonata Sonata é uma peça quase sempre instrumental, geralmente em vários mo- vimentos, para um solista ou um grupo. A sonata surgiu no século XVI, e seu nome deriva da palavra sonare (“soar”), em oposição à cantata, do italiano can- tare (“cantar”). Os movimentos da sonata têm a sequência de lento-rápido-lento, podendo haver um quarto movimento. Entre os compositores do século XX, já há o rompimento com o modelo da sonata tradicional. Ludwig van Beethoven (1770-1827) Sonata para Violino em Fá Maior, op. 24, Primavera, Quarto Movimento: Rondó, Allegro ma non Troppo Faixa 36 (CD 2) 238 Gêneros, formas e estilos musicais Sinfonia O termo sinfonia significa “reunião de sons”. A maioria das sinfonias apresenta quatro movimentos, que diferem um do outro pelo andamento e pelo caráter e estão constituídos conforme abaixo. Primeiro movimento: composto por três seções principais – � exposição, em que o compositor apresenta suas ideias principais, chamadas temas; desenvolvimento, em que o material apresentado na seção anterior é ex- plorado em diversas possibilidades musicais; recapitulação, em que o compositor procura repetir de maneira diferente as ideias apresentadas na exposição e, então, ouve-se novamente o tema inicial e, em seguida, a coda, que concluirá o movimento. Segundo movimento: tem andamento lento, de estilo mais cantável. � Terceiro movimento: apresenta um andamento de dança (minueto) em � Mozart e Haydn. Beethoven substitui o minueto por um brilhante scherzo (brincadeira). Movimento final: andamento rápido e de caráter ligeiro, fechando a obra. � Movimento O termo movimento é aplicado a qualquer parte de uma obra musical su- ficientemente completa em si mesma para ser encarada como uma entidade, ensina-nos Sadie (1994). A próxima audição é o primeiro movimento da Sinfonia n. 6 de Beethoven, a Pastoral. Ludwig van Beethoven (1770-1827) Sinfonia n. 6 em Fá Maior, op. 68, Pastoral: Allegro ma non Troppo Faixa 37 (CD 2) Gêneros, formas e estilos musicais 239 Com essa obra, Beethoven quis evocar um conjunto de atmosferas do mundo da natureza, com muitos temas, manifestando tranquila beleza. A sinfonia evoca os sentimentos de estarmos em meio ao campo, com riacho, árvores e pássaros em uma total comunhão. Essa é uma música ilustrativa. Os instrumentos são uti- lizados para efeitos imitativos, como o canto dos pássaros. O caráter da peça é muito calmo, com exceção do quarto andamento (“A Tempestade”), mas encerra com um tranquilo finale. Beethoven estreou a Pastoral juntamente com a Sinfo- nia n. 5 em 1808, expondo assim os contrastes entre as duas obras. Gêneros e estilos populares Samba O samba é uma dança afro-brasileira e uma forma de música popular. Origi- nalmente, a palavra significava as danças de roda trazidas de Angola e do Congo para a América do Sul. No século XIX, o samba sofreu um processo de urbani- zação gradual, adquirindo traços característicos como a marcação binária (dois tempos) e um ritmo fortemente sincopado (deslocamento do acento). O primei- ro samba conhecido – Pelo Telefone, de Donga (Ernesto dos Santos) – surgiu no Rio de Janeiro, por volta de 1920. Outros grandes compositores se seguiram, como Noel Rosa, Ari Barroso, Lamartine Babo, João de Barro e Ataulfo Alves. Há muitas variações do samba, como o samba de breque, o samba de partido alto, o samba-canção, o samba-choro e o samba-enredo (utilizado nos desfiles das escolas de samba). O estilo do compositor carioca Jorge Ben Jor, nascido em 1942, inclui o samba, o rock, o pop, o maracatu, a bossa nova, o rap e o samba-rock, com letras que in- cluem humor e sátira. Sua música inclui elementos de influência norte-america- na, como o jazz, o soul e o funk. Ben Jor utilizou o violão com uma batida rítmica diferente que ele batizou de sacudin sacuden. Seu suingue também é resultado de influências africanas que vieram da sua mãe, nascida na Etiópia. As letras de suas canções falam de assuntos variados – entre eles, o futebol e a escola de samba, como vamos ouvir. 240 Gêneros, formas e estilos musicais Jorge Ben Jor (1942) Lá Vem Salgueiro Faixa 38 (CD 2) Choro Choro, também chamado de chorinho, é um gênero instrumental que teve seu início por volta de 1870. Os conjuntos que o executam são os chamados regionais e os músicos, compositores e instrumentistas são os chorões. O choro tem um ritmo agitado e alegre, sendoconsiderado a primeira música popular urbana do Brasil. Zequinha de Abreu O músico, compositor e instrumentista José Gomes de Abreu, o Zequinha de Abreu, foi um dos maiores compositores de choros. Vamos ouvir Tico-tico no Fubá, peça apresentada pela primeira vez em 1917. Ela conquistou grande po- pularidade e foi incluída em cinco filmes estadunidenses pela divulgação e gra- vação da cantora brasileira Carmem Miranda. Zequinha de Abreu. D om ín io p úb lic o. Gêneros, formas e estilos musicais 241 Zequinha de Abreu (1880-1935) Tico-tico no Fubá Faixa 39 (CD 2) Pixinguinha O próximo choro abordado foi feito para o saxofone de Pixinguinha e a flauta de Benedito Lacerda brincarem de gato e canário, sendo gravado pela dupla em 1949. Pixinguinha (Alfredo da Rocha Viana) compôs algumas peças sobre os bichos, explorando sons onomatopaicos nas melodias, recurso também utilizado pelos compositores e instrumentistas do período de formação da música popular bra- sileira urbana. Pixinguinha. In st itu to M or ei ra S al le s. Pixinguinha (1897-1973) e Benedito Lacerda (1903-1958) O Gato e o Canário Faixa 40 (CD 2) 242 Gêneros, formas e estilos musicais Bossa nova A bossa nova é um movimento da música popular brasileira surgido no final da década de 1950 e início de 1960, tornando-se um gênero musical brasileiro conhecido em todo o mundo. Elis Regina. U ni ve rs o O nl in e. D iv ul ga çã o. Antônio Carlos Jobim (1927-1994) Águas de Março Faixa 41 (CD 2) Baião O ritmo nordestino do baião se transformou em um gênero de música popu- lar urbana a partir de meados da década de 1940, especialmente pelo trabalho de Luiz Gonzaga e de Humberto Teixeira. Nascido provavelmente dos violeiros da zona rural do Nordeste, estruturou-se como música de dança apresentando um ritmo denominado balanceio. O novo tipo de canção popular brasileira ex- plodiu em 1946, em um mercado saturado de boleros e sambas-canções, como uma redescoberta da vitalidade rítmica. Gêneros, formas e estilos musicais 243 Luiz Gonzaga do Nascimento (1912-1989), conhecido como o Rei do Baião, nasceu em Exu, Pernambuco. Luiz Gonzaga (1912-1989) e Humberto Teixeira (1915-1979) Baião Faixa 42 (CD 2) Rock´n roll Rock’n roll ou rock and roll é um gênero musical que surgiu e se definiu no sul dos Estados Unidos, durante a década de 1950, espalhando-se rapidamente pelo mundo. A sua evolução permitiu que a partir dele surgissem muitos estilos musicais diferentes sob o nome geral de rock (“balanço”). O rock nasceu da mistura de três gêneros americanos – blues, country e jazz – e apareceu pela primeira vez em 1951, agradando muito o público. O sucesso se deu por ser uma música voltada para a juventude, incluindo batidas empol- gantes, o estímulo à dança e o efeito de suas letras. Com a melodia sendo feita pela guitarra elétrica, a chegada do rock interrompeu a moda das baladas suaves e sentimentais, que eram populares nos anos 1940 e 1950. O rock surgiu desti- nado a adolescentes ou sobre adolescentes, com letras que abordavam temas comuns da adolescência: escola, carros, férias e amor. 244 Gêneros, formas e estilos musicais Samuel Rosa e Chico Amaral Vou Deixar Faixa 43 (CD 2) Essa é a banda Skank. Sua origem é Belo Horizonte e nasceu em 1991. Seus integrantes são Samuel, Haroldo, Henrique e Lelo. Rap A palavra rap vem do inglês rhythm and poetry, “ritmo e poesia”, uma expres- são da cultura hip-hop. Os antecedentes do rap provêm de diversas formas de música popular, incluindo a narração de histórias, como o blues falado e passa- gens faladas na música gospel. Sua origem está associada à Jamaica, por volta dos anos 1960, quando um som era colocado nas ruas dos guetos para animar os bailes que serviam de fundo para as pessoas discursarem sobre questões sociais e políticas. No início, o rap era um estilo de dança surgido no final dos anos 1970, entre adolescentes negros e hispânicos nas regiões próximas a Nova York. Transfor- mou-se em seguida no núcleo musical de um fenômeno cultural mais amplo, o hip-hop: roupas, atitude, linguagem, modo de andar. Uma característica mar- cante no rap é o uso do sampling, recurso que consiste em combinar trechos instrumentais ou vocais de outras músicas, além de outras fontes sonoras, a eles sobrepondo a fala: com essa reutilização, os rappers fazem suas colagens. Gêneros, formas e estilos musicais 245 Gabriel, o Pensador Até Quando? Faixa 44 (CD 2) Até quando Não adianta olhar pro céu, com muita fé e pouca luta. Levanta aí que você tem muito protesto pra fazer e muita greve, você pode, você deve, pode crer. Não adianta olhar pro chão, virar a cara pra não ver. Se liga aí que te botaram numa cruz e Só porque Jesus sofreu não quer dizer que você tenha que sofrer. Até quando você vai ficar usando rédea? Rindo da própria tragédia? Até quando você vai ficar usando rédea? (Pobre, rico, ou classe média). Até quando você vai levar cascudo mudo? Muda, muda essa postura. Até quando você vai ficando mudo? Muda que o medo é um modo de fazer censura. Até quando você vai levando? (Porrada! Porrada!) Até quando vai ficar sem fazer nada? Até quando você vai levando? (Porrada! Porrada!) 246 Gêneros, formas e estilos musicais Até quando vai ser saco de pancada? Você tenta ser feliz, não vê que é deprimente, seu filho sem escola, seu velho tá sem dente. Cê tenta ser contente e não vê que é revoltante, você tá sem emprego e a sua filha tá gestante. Você se faz de surdo, não vê que é absurdo, você que é inocente foi preso em flagrante! É tudo flagrante! É tudo flagrante! Até quando você vai levando? (Porrada! Porrada!) Até quando vai ficar sem fazer nada? Até quando você vai levando? (Porrada! Porrada!) Até quando vai ser saco de pancada? A polícia matou o estudante, falou que era bandido, chamou de traficante. A justiça prendeu o pé-rapado Soltou o deputado e absolveu os PMs de Vigário Até quando você vai levando? (Porrada! Porrada!) Até quando vai ficar sem fazer nada? Até quando você vai levando? (Porrada! Porrada!) Até quando vai ser saco de pancada? Gêneros, formas e estilos musicais 247 A polícia só existe pra manter você na lei, lei do silêncio, lei do mais fraco: ou aceita ser um saco de pancada ou vai pro saco. A programação existe pra manter você na frente, na frente da TV, que é pra te entreter, que é pra você não ver que o programado é você. Acordo, não tenho trabalho, procuro trabalho, quero trabalhar. O cara me pede o diploma, não tenho diploma, não pude estudar. E querem que eu seja educado, que eu ande arrumado, que eu saiba falar. Aquilo que o mundo me pede não é o que o mundo me dá. Consigo um emprego, começa o emprego, me mato de tanto ralar. Acordo bem cedo, não tenho sossego nem tempo pra raciocinar. Não peço arrego, mas onde que eu chego se eu fico no mesmo lugar? Brinquedo que o filho me pede, não tenho dinheiro pra dar. Escola, esmola! Favela, cadeia! Sem terra, enterra! Sem renda, se renda! Não! Não!! Até quando você vai levando? (Porrada! Porrada!) Até quando vai ficar sem fazer nada? Até quando você vai levando? (Porrada! Porrada!) Até quando vai ser saco de pancada? Muda, que quando a gente muda o mundo muda com a gente. 248 Gêneros, formas e estilos musicais A gente muda o mundo na mudança da mente. E quando a mente muda a gente anda pra frente. E quando a gente manda ninguém manda na gente. Na mudança de atitude não há mal que não se mude nem doença sem cura. Na mudança de postura a gente fica mais seguro, na mudança do presente a gente molda o futuro! Até quando você vai ficar levando porrada, até quando vai ficar sem fazer nada? Até quando você vai ficar de saco de pancada? Até quando você vai levando? Texto complementar No mundo da lua Os extraterrestres também podem ouvir a música de Beethoven, pois a nave espacial Voyager 2, quando foi lançada aoespaço em 1977, incluiu uma gravação da Sinfonia n. 5 como um exemplo do que os seres humanos são capazes de produzir. A Sinfonia n. 5, de Beethoven, foi composta entre 1805 e 1808, estreada em 1808 e publicada em 1809. O seu tema principal é muito simples, mas permite inúmeras possibili- dades de expansão. Ele aparece quase todo o tempo no primeiro movimen- to, allegro con brio. Gêneros, formas e estilos musicais 249 Ludwig van Beethoven (1770-1827) Sinfonia n. 5 em Dó Menor, op. 67, Primeiro Movimento: Allegro con Brio Faixa 45 (CD 2) Instrumentos desconhecidos: charango Cordofone dedilhado tipicamente sul-americano, o charango tem origem na guitarra espanhola. É um pequeno instrumento da família do alaúde, com aproximadamente 66 centímetros de comprimento, tradicionalmente feito com a carapaça de um tatu. IE SD E Br as il S. A . Referências BENNETT, Roy. Elementos Básicos da Música. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990. CATEGORIA: formas musicais. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/ Categoria:Formas_musicais>. Acesso em: 7 fev. 2008. FORMAS e termos musicais. Disponível em: <www.malhanga.com/musica/ Formas%20e%20Termos%20musicais.html>. Acesso em: 7 fev. 2008. 250 Gêneros, formas e estilos musicais FORMAS musicais. Disponível em: <www.edukbr.com.br/artemanhas/formasmu- sicais.asp>. Acesso em: 7 fev. 2008. HISTÓRIA do rock. Disponível em: <www.suapesquisa.com/rock/>. Acesso em: 7 fev. 2008. LOCKWOOD, Lewis. Beethoven: a música e a vida. 2. ed. São Paulo: Códex, 2005. MARIZ, Vasco. A Canção Popular Brasileira. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 2002. ORIGENS do rock. Disponível em: <www.portaldorock.com.br/origensrock.htm>. Acesso em: 7 fev. 2008. SADIE, Stanley (ed.). Dicionário Grove de Música: edição concisa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1994. SALLES, Filipe. Formas Musicais. Disponível em: <www.mnemocine.com.br/ filipe/forma.htm>. Acesso em: 7 fev. 2008. SIQUEIRA, José. Formas Musicais. Disponível em: <http://br.geocities.com/leon- ardoabviana/formas_musicais.htm>. Acesso em: 7 fev. 2008. SOLEIL, Jean Jacques; LELONG, Guy. As Obras-Chave da Música. Lisboa: Per- gaminho, 1991. SPENCE, Keith. O Livro da Música. São Paulo: Círculo do Livro, 1979. TINHORÃO, José Ramos. Pequena História da Música Popular: da modinha à canção de protesto. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1975. TREIN, Paul. A Linguagem Musical. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1986. VENEZIA, Mike. Ludwig van Beethoven. São Paulo: Moderna, 1999. VOYAGER. Disponível em: <www.on.br/glossario/alfabeto/v/voyager.html>. Acesso em: 7 fev. 2008. A música ocidental e sua história Dentro da cronologia, além do tempo Muitos autores buscam organizar o desenvolvimento da música de forma sistemática. Para tanto, é necessário um mergulho profundo na his- tória, procurando evidenciar as primeiras e significativas manifestações que resultam em inovações importantes. Mas essa divisão não deve ser considerada de forma rígida, porque, muitas vezes, algumas características de um período manifestam-se em obras de outras fases. Alguns compositores antecipam ideias e estilos, rompem com estruturas formais, provocam novas tendências e assim ca- racterizam um outro estilo, que será aceito ou rejeitado. Por outro lado, a permanência de determinadas obras ao longo do tempo evidencia a sua autonomia e a densidade dos seus aspectos uni- versais. Isso porque uma verdadeira obra de arte ultrapassa a matéria da qual é feita. A criação musical é fruto de um indivíduo, e também expressa, com suas características, um momento específico da sociedade. Até Ludwig van Beethoven e a maioria dos compositores estava a serviço de alguma instituição, como a Igreja, ou de um patrocinador (uma pessoa da corte ou alguém com posses), trabalhando sob encomenda. O artista (além dos músicos, também os pintores e escultores) deveria submeter-se às solici- tações do seu empregador. Muitas obras de arte evidenciam esse propó- sito, enquanto outras vão além, expressam algo que é novo e provocam mudanças nos conceitos e nas técnicas artísticas. Conheceremos agora alguns compositores que ousaram desafiar padrões estabelecidos e trou- xeram mais criatividade e beleza ao mundo. Vamos iniciar nosso passeio pela música ocidental, trazendo algumas imagens das artes visuais para relacioná-las às épocas e, assim, contextu- alizar as obras musicais. 253 254 A música ocidental e sua história Idade Média (500-1450) Período Românico O estilo arquitetônico dessa época expressava clausura social, econômica, religiosa, política e artística. As igrejas românicas eram horizontais, espaçosas, porém fechadas, compactas, pouco iluminadas, pesadas e assustadoras. Ra fa el Ji m én ez . Igreja de São Martinho Frómista. A arte não era feita para ser apreciada: era objeto de culto, com o propósito de ensinar e estimular a fé, compelindo o indivíduo à religiosidade. Nessa obra do pintor Cimabue (1240-1302), observamos a herança bizantina no decorativis- mo, no frontalismo e na ausência de profundidade. Nesse contexto, o canto gregoriano era a música litúrgica da Igreja Católica Romana, tendo sido organizado pelo papa Gregório Magno, tor- nando-se um gênero musical. Caracteriza-se por uma melodia linear e plana cantada em uníssono, por um grupo de pessoas que cantam em uma altura idêntica. A isso se chama cantochão. O canto gregoriano não tem acompanha- mento, é melismático (várias notas entoam uma única sílaba), seu ritmo é irregular, obedecendo à tônica das palavras em latim, com pequenos mo- tivos melódicos. Sem possibilidade de mudar e se Beijo de Judas, de Cimabue (1304). Igreja de São Francisco de Assis. D om ín io p úb lic o. A música ocidental e sua história 255 transformar, conforme a severidade da Igreja, esse canto é repetitivo, monotôni- co e seu propósito é ser humilde e anônimo. Não foi feito para ser escutado, pois ao ser cantado ele provoca o estado de religiosidade, deixando os sentimentos serem expressos pelo sentido das palavras. Dessa forma, a música não corria o risco de permitir expansões “nocivas” à imaginação. A melodia gregoriana é es- sencialmente monódica, isto é, há uma só voz e é entoada só por homens. O monge Guido d’Arezzo foi um grande teórico da música e pedagogo. Escre- veu o tratado Micrologus, considerado o primeiro tratado completo sobre a prática musical, onde desenvolveu o sistema de notação das alturas sonoras sendo este um dos manuais mais lidos e copiados na Idade Média. Ele sistematizou a escrita musical e nomeou os sons usando sílabas: ut (depois dó), ré, mi, fá, sol, lá e si. Kyrie XI, A (Canto Gregoriano) Faixa 1 (CD 3) Entre os vários sentidos da palavra gótico, vamos trabalhar com um muito específico: aquele que designa o estilo artístico que predominou na Europa no final da Idade Média. Esse estilo teve início no século XII, na França, especial- mente com a arquitetura das catedrais, ampliando-se para outras áreas e se estendendo até o início do século XVI. Com seus aspectos sociais, políticos e religiosos, além dos seus valores estéticos e filosóficos, o período Gótico é uma resposta à austeridade do estilo românico. E, mais que isso, ele foi uma revolução artística, pois o espaço ficou mais dinâmico no aspecto longitudinal e vertical com os templos recebendo mais luz. Com esses acréscimos, o gótico substituiu o deus distante e inflexível do ro- mânico por um deus mais vivo, próximo e capaz de suscitar mais amor do que temor. A igreja se iluminou e se coloriu com os vitrais que ilustram temas sacros, mas também cenas da vida cotidiana. Assim, o gótico é uma arte emocionada, infiltrando progressivamente o elemento humanista nas formas pintadas e es- culpidas, tornando as fisionomias mais humanas. Nesse contexto, as artes tiveram papel importante para embelezar as cidades. E surgiram os humanistas, intelectuais que estudavam os clássicos, assim como a universidade tornou-se um espaço de debate, estimulandoo racionalismo. Nesse sensível momento de transição, um artista italiano foi muito importan- 256 A música ocidental e sua história te: Giotto di Bondone (1266-1336). Os pintores medievais usavam a superfície e Giotto utilizou a perspectiva intuitivamente, já que só no século XV foram for- muladas as leis científicas para trabalhá-la. Giotto marcou a passagem da arte de superfície para a profundidade, representando as coisas humanas e usando a perspectiva para valorizar o mundo. Ainda pertencendo à Idade Média, musicalmente o Período Gótico foi de muitas inovações, com o surgimento da polifonia, o que equivalia aos ornamen- tos nas igrejas em estilo ogival (ogiva: figura formada por dois arcos iguais que se cortam superiormente; arco nas abóbadas góticas). Em 1320, o teórico e compositor Philippe Vitry escreveu o tratado da ars nova (“arte nova”), lançando os fundamentos do estilo musical polifônico produzido no século XIV, na França e na Itália, com novos modos de composição, em oposi- ção à ars antiqua (“arte antiga”). O sistema de notação impulsionou a música polifônica, sendo que a varieda- de decorativa e o gosto pela imaginação do gótico foram equivalentes à riqueza e à variedade que a polifonia trouxe à música. Nos séculos XIII e XIV a música ainda era essencialmente vocal, assim como ocorria com a música das épocas precedentes. A arte instrumental autônoma só vai ocorrer em meados do século XV, e ainda assim sem o esplendor e a importância da arte vocal. Josquin des Prés, o compositor que vamos ouvir, viveu de 1450 a 1521 e foi cantor da catedral de Milão. É considerado o maior músico do seu tempo e era o compositor preferido de Martinho Lutero, que, com a Reforma, introduziu a ideia do canto como um ato de devoção coletiva, justificando que a comunidade também deveria cantar temas populares, pois não seria justo deixar ao demônio “o monopólio das mais belas melodias”. Josquin des Prés (1450-1521) Praeter Rerum Seriem Faixa 2 (CD 3) A música ocidental e sua história 257 Renascimento (XIV a XVI) O termo renascimento refere-se ao objetivo, por parte dos intelectuais e ar- tistas, de repudiar a Idade Média e restaurar os ideais filosóficos e artísticos da Antiguidade Clássica. Assim, o Renascimento foi um movimento em busca de uma nova postura e valorização das capacidades do homem. Pensadores exigi- ram a introdução dos estudos humanos (poesia, filosofia, história e outros) nas universidades, ainda dominadas pela religião, fazendo com que esse período fosse voltado às letras, às ciências e às artes, inspirando-se nos autores gregos e romanos. A corrente renascentista nasceu em Florença, Itália, e foi marcada pela descoberta do homem como centro e medida de todas as coisas. Essa visão nova trouxe grandes modificações nas artes, marcando um novo estilo. A pintura renascentista se distingue pelo equilíbrio, pela proporção e pela har- monia. Em A Primavera, de Sandro Botticelli, a composição obedece ao princípio da pirâmide, sugerindo estabilidade. Nosso olhar é direcionado para o centro da imagem, onde ocorre a cena mais importante. As características que se destacam nesse quadro são a sublime transparência, a clareza, a calma e a tranquilidade. A Primavera, de Botticelli (1487). Florença – Itália. Galeria Degliuffizi. D om ín io p úb lic o. Na sua tela Mona Lisa, também conhecida como A Gioconda, Leonardo da Vinci (1452-1519) proporciona um clima em que a luz dá a sensação de mistério, enigma, calma e tranquilidade, valendo-se do fundo sfumatto, do uso delicado e estudado do gesto, sugerindo o indefinível e desafiando a compreensão do espectador. 258 A música ocidental e sua história Mona Lisa, de Leonardo da Vinci (1507). Museu do Louvre – Paris. D om ín io p úb lic o. Na escultura Pietà (1499), de Michelangelo Buonarroti (1475-1564), a dureza do mármore é convertida na leveza das dobras do manto da figura. Pietà, de Michelangelo (1499). Basílica de S. Pedro – Vaticano. D om ín io p úb lic o. Música renascentista A época renascentista estende-se aproximadamente de 1430 até o final do século XVI. Nesse período, a música transformou-se em um laço entre o povo e a religião, criando uma familiaridade que favorecia a aproximação com a fé. No contexto da Reforma Protestante, Martinho Lutero estimulou o canto do coral a quatro vozes, valorizando a riqueza da polifonia horizontal. Melodias populares foram adaptadas aos corais sacros. Lutero assegurava que toda a comunidade deveria cantar, incentivando o aprendizado da leitura. A música ocidental e sua história 259 Principais características da música renascentista: Transição do modalismo (modos) para a tonalidade (tons), ampliando as � possibilidades expressivas da música, que até então servia a fins litúrgi- cos. Com o Renascimento, ela ganhou a possibilidade de variar, modular e estender-se (modular: movimento na música tonal que permite passar de uma tonalidade à outra. Por exemplo: a música está se desenvolvendo em Dó maior e, num determinado momento, passa para Lá menor). A tonali- dade foi a aplicação do racionalismo na linguagem musical, permitindo a compreensão do universo sonoro, feito de melodia, ritmo e harmonia. Houve a descoberta da harmonia (fusão de sons e não união), a ruptura com o espírito religioso e a retomada do espírito profano. A música torna-se mundana e cortesã, refletindo um brilhante momento da � polifonia vocal (a ciência da instrumentação só surgiria no século XVIII). A po- lifonia (união de melodias e não fusão, execução simultânea de duas ou mais melodias que se combinam entre si) é uma marcante característica desse pe- ríodo. A polifonia católica passou das igrejas para os salões da aristocracia. Surgimento do madrigal, que é resultado de uma estreita união da música � com a palavra, simbolizando o requinte da vida palaciana. Os madrigais falavam de amor, religião e assuntos do cotidiano, enquanto os motetos eram obras vocais e polifônicas sacras, assim como as missas. O músico Orlandus Lassus, ou Orlandi di Lasso, era flamengo, isto é, natu- ral de Flandres, uma região que se localiza parte na França, parte na Holanda e parte na Bélgica. Lassus escreveu mais de duas mil obras em quase todos os gêneros, incluindo missas, motetos, madrigais, salmos e hinos, sempre muito ad- mirado por sua elegância, beleza e perfeição técnica. E ele produziu justamente no século XVI, que foi um tempo de canções e de um espírito novo, marcado pela música profana. Vamos ouvir agora o moteto Osculetur me, de Orlando di Lasso, escrito para quatro vozes (soprano, contralto, tenor e baixo) em harmonioso equilíbrio. É um canto a capella, isto é, uma obra só para vozes, sem acompanhamento instrumental. Orlando di Lasso (1532-1594) Motet Osculetur Me Faixa 3 (CD 3) 260 A música ocidental e sua história Todavia, no período renascentista os instrumentos também fizeram-se pre- sentes, como o alaúde, um dos principais instrumentos de corda dessa época. Constituído por uma caixa abaulada e um braço comprido com a cabeça curva- da para trás, o alaúde chegou à Europa levado pelos mouros. Caravaggio, Michelangelo. Tocadora de Alaúde. Museu Emitage – São Petersburgo. D om ín io p úb lic o. Barroco (1600-1750) No Barroco, a pintura concentrou-se nos retratos, nas paisagens e no interior das casas, traduzindo dramaticidade, suntuosidade, movimento, teatralidade, oposição das figuras, contraste de luz e sombra, o gosto pelo claro-escuro. As formas se movem e se contorcem. São articuladas cenas múltiplas, pormeno- res excessivos e exuberantes, constituindo uma verdadeira polifonia visual. A luz não parece natural, mas projetada para guiar o olhar do observador até o acon- tecimento principal da obra. A obra Lição de Anatomia foi realizada por Rembrandt (1606-1669) atenden- do a uma encomenda: ele deveria pintar um retrato do grupo do famoso cirur- gião doutor Tulp e de sete outros médicos, seus alunos. Como o preçodo quadro era dividido por todos, cada personagem deveria ser retratado com igual impor- tância. O autor reuniu as figuras em um bloco piramidal, debaixo de um grande arco interior, contrapondo o grupo dos jovens médicos ao mestre (à direita) e à figura rígida do cadáver (ressaltada em uma diagonal oposta). O magistral dessa pintura é o contraste entre o branco das golas plissadas e engomadas e os pretos e marrons nos trajes dos médicos. Tudo com muita fluidez. A música ocidental e sua história 261 Lição de Anatomia do dr. Tulp, de Rembrandt van Rijn (1606- -1669). Museu de Mauratshuis – Haia. D om ín io p úb lic o. Teto da Igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto, Minas Gerais, pintura de Manoel da Costa Ataíde. D om ín io p úb lic o. Barroco brasileiro No Brasil, o estilo Barroco desenvolveu-se durante o século XVII, perduran- do ainda no início do século XIX, e é claramente associado à religião católica. 262 A música ocidental e sua história O mestre Manoel da Costa Ataíde (1762-1837) foi pintor, dourador, encarnador, entalhador e professor. Pintou várias igrejas de Minas Gerais com estilo particu- lar e bem brasileiro. Pela dificuldade de importar tintas, os artistas faziam suas próprias misturas e cores com pigmentos e solventes naturais de nosso país. Usavam, entre outros materiais, terra queimada, leite e óleo de baleia, clara de ovo, extrato de plantas e flores. Por isso, toda essa beleza e colorido das pinturas mineiras do período Barroco são únicos no mundo. Aleijadinho Outro mestre do nosso Barroco foi Antônio Francisco Lisboa (1730-1814), o Aleijadinho. Nasceu em Vila Rica, filho de uma escrava com um mestre de obras português. As características de suas esculturas são os olhos espaçados, o nariz reto e alongado, os lábios entreabertos, o pescoço alongado em forma de V. Aleijadinho. D om ín io p úb lic o. Cristo Carregando a Cruz – detalhe, (1796) escultura de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. D om ín io p úb lic o. Música barroca No período Barroco surgiram vários estilos, com crescente diversidade instru- mental e a formação de orquestras. Além disso, surgiu a figura do solista, assim como o conceito de melodia acompanhada. A música ocidental e sua história 263 As ênfases musicais estavam nos contrastes de textura, andamento, volume sonoro e colorido, de modo decorado e alegre. Os adornos e arabescos, o frase- ado ornamentado e imitativo lembram o decorativismo das artes plásticas do Barroco. Em sua maioria, os compositores não produziam para se expressar e sim para cumprir deveres junto ao patronato eclesiástico ou aristocrático. Formas musicais do Barroco Vocal Ópera: canto, orquestra, texto dramático, ação, figurino, cenário. � Oratório: assunto religioso, solistas, coro, orquestra, sem encenação. � Instrumental Suíte: sequência de danças contrastantes. � Sonata: peça musical para solista. Compuseram especialmente sonatas do � tipo trio (para três instrumentos). A sonata no Barroco era uma peça para um ou dois instrumentos, dividida em várias partes ou movimentos, em- bora houvesse também sonatas monotemáticas, em um só movimento, como a de Domenico Scarlatti. Prelúdio: peça que antecede uma obra maior ou um grupo de peças. � Fuga: composição em que várias melodias se entrelaçam. � Concerto: um instrumento solista contrasta com a orquestra. É uma obra � musical onde um instrumento solista (ou um grupo instrumental) contras- ta com o conjunto orquestral. O gênero musical denominado concerto tem na sua estrutura movimentos onde há alternância de partes rápidas e lentas, de forma padronizada e sequencial. Abertura ou � ouverture: peça que abre uma ópera ou outra obra. 264 A música ocidental e sua história Cantata: peça musical para ser cantada. Gênero musical dedicado à obra � vocal. Foi o gênero mais importante do Barroco, posteriormente aplicado em muitas obras sacras e seculares. O termo cantata surge em oposição à sonata, que era uma peça exclusiva para execução instrumental. Tocata: peça para instrumentos de teclado, em uma demonstração de vir- � tuosismo. Antonio Vivaldi (1678-1741) Il Cardellino, RV. 428 em Ré Maior, Concerto para Flauta e Orquestra, Terceiro Movimento: Allegro Faixa 4 (CD 3) O nome mais importante entre os músicos do Barroco italiano é Antonio Vival- di (1678-1741), o padre que percorreu a Europa apresentando suas obras como compositor, regente, instrumentista e empresário de si mesmo. Em sua obra – na ternura e na vivacidade das melodias, no colorido sonoro, na exuberância rítmica – transparece uma relação otimista com a vida. Vivaldi foi um músico de vanguarda que testou timbres, ritmos e instrumentos, além de ter escrito os primeiros concertos para flauta transversal. Johann Sebastian Bach (1685-1750) Cantata BWV 147, Jesus Alegria dos Homens Faixa 5 (CD 3) Já no Barroco alemão temos Johann Sebastian Bach (1685-1750), filho de uma família numerosa, com longa e rica tradição musical. O mais conhecido dos Bach ex- plorou todas as possibilidades e recursos sonoros da música para órgão. Suas obras A música ocidental e sua história 265 incluem os Concertos de Brandemburgo, O Cravo bem Temperado, Passacaglia, fugas, concertos, paixões e missas. Nas comunidades luteranas, foi abundante sua produ- ção sacra com as cantatas, que permitiam inventividade musical no culto. Outro compositor alemão do período é Georg Friedrich Haendel (1685-1759), que criou oratórios (o oratório é um drama bíblico sem o recurso da encena- ção), óperas, paixões, cantatas, suítes para orquestra, concertos e peças para cravo. Ele colocou toda a força expressiva na música, causando sentimentos arrebatadores, revelando as características barrocas do colorido intenso, com o objetivo de causar lo stupore (o estupor, a surpresa, o grande espanto) e a busca arrojada dos espaços infinitos. Johann Sebastian Bach (1685-1750). D om ín io p úb lic o. Georg Friedrich Haendel (1685-1759). D om ín io p úb lic o. Georg Friedrich Haendel (1685-1759) Aleluia, de O Messias (oratório) Faixa 6 (CD 3) O instrumento que se difundiu no Barroco, principalmente nas cortes, foi o cravo, que possui teclado e cordas pinçadas. 266 A música ocidental e sua história IE SD E Br as il S. A . Classicismo (1750-1828) O Juramento dos Horácios, óleo sobre tela de Jacques-Louis David, é uma obra temática inspirada na história da Roma Antiga. É a encarnação artístico- -ideológica da Revolução Francesa. David mostra os três irmãos Horácios juran- do morrer pela pátria. O estilo é simples, austero, despojado, rigorosamente ra- cionalista e acadêmico. O termo clássico identifica uma pessoa refinada, erudita, mas também tem o significado de algo perene. Na história da música, Classicismo é o período que sucede o Barroco, e predominou até as mortes de Ludwig van Beethoven (1770- 1827) e Franz Schubert (1797-1828), quando foi sucedido pelo Romantismo, que já começara na literatura e na pintura, ensina-nos Lopez (1995). O Juramento dos Horácios (1785), de Jacques-Louis David. Museu do Louvre – Paris. D om ín io p úb lic o. A música ocidental e sua história 267 No Classicismo, o discurso musical apresenta nitidez, tornando-se mais per- ceptível. Em vez de densas e tensas tramas polifônicas, com seus complexos en- trelaçamentos, o Classicismo preferiu melodias mais curtas, com acompanha- mento variado, propensas ao desenvolvimento. O trajeto da melodia ficou mais limpo, desimpedido, desembaraçado dos excessivos rebuscamentos, ornamen- tos e rendilhados do Barroco. E utilizou crescendos e decrescendos, buscando reforçar a linha melódica principal, que avulta com elegância, clareza, graça e transparência. Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) foi a perfeição do Classicismo, cor- rente em que se podia dizer o máximo respeitando os códigos do bom-tom. Ele exprimiu melancolia, doçura, dramaticidade, alegria, tristeza, jocosidade, liris-mo, paixão com equilíbrio, transparência, perfeição harmônica e arquitetônica. Foi precoce nas suas composições e aparições públicas, encantando pela eufo- ria, a musicalidade e a espontaneidade ao compor. Mozart compôs um réquiem (composição sobre o texto da missa pela alma dos mortos), missas, sinfonias, concertos, serenatas, peças para piano e óperas. Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) Sinfonia n. 40 em Sol Menor, K. 550, Primeiro Movimento: Molto Allegro Faixa 7 (CD 3) Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791). Ludwig van Beethoven (1770- -1827). D om ín io p úb lic o. D om ín io p úb lic o. 268 A música ocidental e sua história Ludwig van Beethoven (1770-1827) foi um compositor intermediário entre o Classicismo e o Romantismo. Chegou ao apogeu aos 30 anos de idade. Demons- trou individualidade e independência nas composições e transgrediu regras clássicas, inovando com autenticidade e imaginação. Para ele, a música era a re- velação de uma verdade superior e o músico deveria ser o profeta de um novo tempo. Ludwig van Beethoven (1770-1827) Sinfonia n. 9, em Ré Menor, op. 125 Coral Faixa 8 (CD 3) Nessa sinfonia, Beethoven inova ao introduzir a voz humana no quarto mo- vimento. A partir de um poema de Friedrich Schiller intitulado “Ode à alegria”, Beethoven fez uma nova versão, que utilizou no trecho final da sua sinfonia, com coro e orquestra. Também conhecido como “Hino à alegria”, esse é um poema com melodia estimulante e otimista, exaltando o sentido de fraternidade, liber- dade e humanidade (ou igualdade) – que eram os ideais de Revolução France- sa. Beethoven quis exprimir a alegria da união dos homens na realização desse ideal. Quando foi apresentada pela primeira vez, em 1824, Beethoven não pode regê-la porque já estava completamente surdo. Romantismo (1810-1910) O Romantismo foi um movimento artístico que se desenvolveu primeiramen- te na Alemanha, depois se expandiu para outros países. O Romantismo surgiu revelando novas ideias na literatura e na pintura. Os pintores românticos usavam profundos efeitos de luz e sombra para revelar traços pessoais acerca do tema. A música ocidental e sua história 269 A Entrada dos Cruzados em Constantinopla (1840), de Eugène Delacroix (1798-1830). D om ín io p úb lic o. Somente mais tarde, depois de ser corrente em outras áreas da arte, a de- nominação romantismo passou a ser adotada pelos músicos, assim designando um novo estilo de composição. Dessa maneira, com os românticos a música se transforma na arte de expressar os sentimentos por meio dos sons. As emoções subjetivas fazem parte dos temas sentimentais, amorosos e patrióticos. Aspec- tos clássicos como o equilíbrio e a moderação já não são importantes. As formas musicais tornaram-se mais extensas e descontraídas. Os intérpretes virtuosos – os instrumentistas que possuíam um altíssimo grau de conhecimento e domínio técnico – eram exaltados. Era o caso dos pianistas Frédéric Chopin e Franz Liszt, bem como do violinista Niccolò Paganini. Características do período Romântico: romanesco, imaginoso, misterioso e fantástico. � Música: a fantasia e a imaginação são mais importantes que aspectos clás- � sicos (equilíbrio, moderação e bom gosto). Artista: herói espiritual. � Exaltação do intérprete. � Formas descontraídas e extensas, com dissolução dos contornos. � Busca da identidade nacional (folclore). � 270 A música ocidental e sua história O polonês Frédéric Chopin (1810-1849) compôs essencialmente para o piano, sendo original na exploração de seus recursos, destacando-se também por seu estilo de tocar, fazendo com que as harmonias se fundissem e se dissolvessem umas nas outras. Frédéric Chopin (1810-1849). D om ín io p úb lic o. Frédéric Chopin (1810-1849) Estudo op. 10, n. 3, Tristesse Faixa 9 (CD 3) Felix significa “feliz” e Felix Mendelssohn (1809-1847) pareceu fazer jus ao seu nome. Mendelssohn demonstrava equilíbrio pessoal, falava várias línguas, escre- via poesia, desenhava, tocava piano, regia e compunha. E resgatou uma obra de Bach, A Paixão Segundo São Mateus, 70 anos depois de esquecida. Felix Mendelssohn (1809-1847). D om ín io p úb lic o. Felix Mendelssohn (1809-1847) Concerto para Violino e Orquestra em Mi Menor op. 64, Terceiro Movimento Faixa 10 (CD 3) Modernismo O período denominado Modernismo engloba um conjunto de movimentos culturais, escolas e estilos que permearam a arte da primeira metade do século XX. Esses movimentos apresentam algumas características em comum, mas também diferem entre si, às vezes de forma antagônica. O objetivo central dessa A música ocidental e sua história 271 nova postura foi criar uma nova cultura, deixando as formas tradicionais de lado, seja na literatura, na escultura, na pintura, na arquitetura ou na música. Impressionismo Em vez de um objeto material, os artistas impressionistas descrevem as emo- ções geradas pelo fenômeno descrito, como os reflexos coloridos produzidos pela luminosidade nas várias horas do dia. Há a intenção de registrar os momen- tos fugidios, impressionistas e instáveis por meio de observação e transcrição exata dos efeitos de cor que o fenômeno natural produz a cada vez. A pintura impressionista compõe-se de inúmeras pequenas manchas de cor, em forma de vírgulas ou traçados levemente pincelados. Em vez de misturadas na palheta, as cores puras são justapostas na tela a fim de que, ao serem vistas a uma certa distância, fundam-se na percepção do espectador, em um processo óptico-sensorial direto. O tema dos impressionistas é a luminosidade atmosférica, a qual refere-se às diferentes aparências que os objetos adquirem com o passar das diferentes horas do dia: ele pode estar mais iluminado quando o sol estiver incidindo sobre ele ou ter sombras ou partes mais escurecidas sob outro ângulo, modificando assim sua aparência. Os artistas procuram captar de modo objetivo, registran- do o impacto sensorial imediato. Nas imagens não há contornos nem superfí- cies definidas ou qualquer outra corporeidade da matéria: tudo é decomposto em cor, orienta-nos Ostrower (2004). Expressionismo Há intensificação emocional: o artista busca exaltar as formas estruturais selecionando deta- lhes que considera essenciais do seu ponto de vista, deformando (muito) sua aparência natural. Pre- valecem os contrastes e tensões pela forte inquietação que emana da obra. A atitude interior do artista passa a ser mais subjetiva. Impressão, Nascer do Sol (1873), do francês Claude Monet (1840-1926), o mais célebre entre os pintores impressionistas. D om ín io p úb lic o. 272 A música ocidental e sua história O pintor russo Wassily Kandinsky (1866-1944) foi o introdutor da abstração no campo das artes visuais. Com a ideia de que a obra de arte não precisa se resumir à imitação da natureza, Kandinsky afirmava que “enquanto a arte não dispensar o objeto, ela será meramente descritiva”. No seu quadro Riscas Pretas, podemos observar o movimento geral da composição rit- mado em círculos, ovais, triângulos, riscas, pintas, ascendentes, descendentes e rotativos. As cores vivas provocam sensações e emoções aliadas às formas, criando uma harmonia que age sobre todo o corpo humano. O pintor russo Wassily Kandinsky (1866-1944) foi o introdutor da abstração no campo das artes visuais. Com a ideia de que a obra de arte não pre- cisa se resumir à imitação da natureza, Kandinsky afirmava que “enquanto a arte não dispensar o objeto, ela será meramente descritiva”. No seu quadro Riscas Pretas, podemos observar o movi- mento geral da composição ritmado em círculos, ovais, triângulos, riscas, pintas, ascendentes, des- cendentes e rotativos. As cores vivas provocam sensações e emoções aliadas às formas, crian- do uma harmonia que age sobre todo o corpo humano. O pintor brasileiro Candido Portinari (1903-1962) mostrou interesse pelas questões sociais. Na sua obra, ele retrata retirantes nordestinos e os trabalhado-res rurais utilizando tons que expressam a força da terra. Colheita do Café (1925), Candido Portinari. D om ín io p úb lic o. A Música, do pintor, desenhista e escultor francês Henri Matisse (1869-1954). D om ín io p úb lic o. Riscas Pretas (1913), de Kan- dinski: um jogo dissolvido de sonoridades de cores fugazes e de sinais gráficos contrastantes. D om ín io p úb lic o. A música ocidental e sua história 273 Tarsila do Amaral (1890-1973) pintou Abaporu para presentear o escritor Oswald de Andrade, que era seu marido. Em tupi-guarani, a palavra abaporu sig- nifica “o homem que come” e com essa peça foi inaugurado o Movimento Antro- pofágico nas artes plásticas. Tarsila foi a pintora mais representativa da primeira fase do movimento modernista brasileiro. Abaporu (1928), de Tarsila do Amaral. D om ín io p úb lic o. Música moderna A música moderna segue as tendências que surgiram depois do Roman- tismo, como o Impressionismo, o Expressionismo, o Dodecafonismo etc. O Modernismo musical valorizou a inovação e a criatividade, com os compo- sitores Igor Stravinsky, Maurice Ravel, Arnold Schoenberg, Claude Debussy, George Gershwin, Heitor Villa-Lobos, Dimitri Shostakovitch e Manuel de Falla. Como compositor impressionista, o francês Claude Debussy (1862-1918) sugere em vez de descrever. Sua técnica é o encadeamento de acordes, explo- rando várias tonalidades. Debussy também utilizou o modo frígido e a escala de tons inteiros para criar harmonia flutuante e textura velada em algumas de suas obras. Ele mudou as regras da composição, liberando-as. E trouxe uma nova fluência rítmica e tímbrica. 274 A música ocidental e sua história Claude Debussy (1862-1918) Prélude à L’après-Midi d’un Faune Faixa 11 (CD 3) Claude Debussy (1862-1918). D om ín io p úb lic o. O americano George Gershwin nasceu no bairro do Brooklyn, em Nova York. Em 1924, compôs Rhapsody in Blue, tentando conjugar as linguagens do jazz e do romantismo de Liszt, e fez muito sucesso. Algumas de suas composições destacaram-se nas vozes de Ella Fitzgerald e Louis Armstrong, entre outros. Sua obra foi usada no cinema. George Gershwin (1898-1937) Rhapsody in Blue Faixa 12 (CD 3) George Gershwin (1898-1937). D om ín io p úb lic o. O alemão Carl Orff (1895-1982) foi um dos compositores mais destacados do século XX. Deu grande contribuição à pedagogia musical infantil ao criar o Método de Ensino Musical Orff, baseado na percussão. Criou um centro de edu- cação musical para crianças e leigos, usando a melodia e o ritmo associados à palavra. Entre suas composições destaca-se a cantata Carmina Burana, formada de cantos profanos para vozes e orquestra, explorando o ostinato (repetição de um padrão melódico, rítmico ou harmônico por muitas vezes sucessivas), a pulsação e a direta expressão vocal da emoção. A música ocidental e sua história 275 D om ín io p úb lic o. Carl Orff (1895-1982). George Gershwin (1898-1937) Rhapsody in Blue Faixa 12 (CD 3) Já o brasileiro Heitor Villa-Lobos (1887-1959) buscou o que seria a linguagem de nosso país na música, retratando sons da natureza e incluindo elementos folclóricos. D iv ul ga çã o. Heitor Villa-Lobos regendo. Heitor Villa-Lobos (1887-1959) A Dança do Índio Branco Faixa 14 (CD 3) O compositor, pianista, maestro e arranjador brasileiro Radamés Gnatalli (1906-1988) participou intensamente da música brasileira, das rodas de choro até os festivais da canção. Foi também arranjador em emissoras de rádio e de televisão. 276 A música ocidental e sua história Radamés Gnatalli (1906-1988) Dança Brasileira Faixa 15 (CD 3) D iv ul ga çã o. Radamés regendo. Abre-te (FONTERRADA apud SHAFER, 1991) Abre-te! Abre-te, ouvido, para os sons do mundo, abre-te, ouvido, para os sons existentes, desaparecidos, imaginados, pensados, sonhados, fruídos! Abre-te para os sons originais, da criação do mundo, do início de todas as eras... Para os sons rituais, para os sons míticos, místicos, mágicos. Encan- tados... Para os sons de hoje e de amanhã. Para os sons da terra, do ar, da água... Para os sons cósmicos, microcósmicos, macrocósmicos... Mas abre- te também para os sons de aqui e de agora, para os sons do cotidiano, da cidade, do campo, das máquinas, dos animais, do corpo, da voz... Abre-te, ouvido, para os sons da vida... Texto complementar Villa-Lobos introduziu o canto orfeônico (coral) nas escolas de Ensino Médio de todo o país. O projeto consistia em concertos ao ar livre com a participação de milhares de alunos. Estes eram preparados por seus professores para canta- rem um determinado programa que culminava no grande encontro num es- tádio. No estádio de São Januário, no Rio de Janeiro, contando com a presença do presidente Getúlio Vargas, concentraram-se 40 mil vozes. A música ocidental e sua história 277 Heitor Villa-Lobos. Concentração orfeônica no estádio de São Januário, do Club de Regatas Vasco da Gama, no Rio de Janeiro. Heitor Villa-Lobos regendo as crianças. D om ín io p úb lic o. D om ín io p úb lic o. D om ín io p úb lic o. Instrumentos desconhecidos: cítara Instrumento clássico indiano com 18 cordas, usado para acompanhamentos vocais. IE SD E Br as il S. A . Referências ALGRAVE, Beatriz. O Romantismo na Música. Disponível em: <www.beatrix.pro. br/musica/romantismo.htm>. Acesso em: 7 fev. 2008. 278 A música ocidental e sua história ANDRADE, Mário de. Pequena História da Música. 8. ed. São Paulo: Martins Edi- tora Livraria, 1977. GUGGENHEIM Museum. Disponível em: <www.guggenheim.org/new_york_ index.shtml>. Acesso em: 7 fev. 2008. HISTÓRIA da arte abstrata. Disponível em: <www.sergiosakall.com.br/historia_ arte/historia_arteabstrata.htm>. JUSTUS, Liana; MIRANDA, Clarice. Formação de Plateia em Música: cultura mu- sical para todos. São Paulo: Arx, 2004. LOCKWOOD, Lewis. Beethoven: a música e a vida. 2. ed. São Paulo: Códex, 2005. LOPEZ, Luiz Roberto. Sinfonias e Catedrais: representação da história na arte. Porto Alegre: UFRGS, 1995. LUDWIG van Beethoven. Disponível em: <www.malhanga.com/musica/ Ludwig%20Van%20Beethoven.html>. Acesso em: 7 fev. 2008. MODERNISMO. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Modernismo>. Acesso em: 7 fev. 2008. OSTROWER, Fayga. Universos da Arte. 24. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. RENASCIMENTO. Disponível em: <www.historiadaarte.com.br/renascimento. html>. Acesso em: 7 fev. 2008. SHAFER, Murray. O Ouvido Pensante. São Paulo: Unesp, 1991. SINFONIA n.º 9 (Beethoven). Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Sinfo- nia_n%C2%BA_9_%28Beethoven%29>. Acesso em: 7 fev. 2008. SOM e tom. Disponível em: <www.edukbr.com.br/artemanhas/sometom.asp>. Acesso em: 7 fev. 2008. SOUZA, Loly Amaro de. Heitor Villa-Lobos. São Paulo: Moderna, 2001. A música brasileira Vida brasileira Sabe-se, por meio de relatos de época, que os índios, antes da chegada dos portugueses ao Brasil, faziam música ritual, música para festas e para chorar os mortos. Mas os portugueses trouxeram outro tipo de música. Assim, desde o início da vida colonial brasileira, fazia-se música nos princi- pais núcleos da colônia, pois os jesuítas a consideravam elemento funda- mental da educação religiosa. Além do canto, à maneira europeia, os índios também foram ensina- dos a tocar alguns instrumentos, como órgão, trombeta, violino, fagote e outros. Catequizados e europeizados, os indígenas se apresentavam nas festas das igrejas e representavam os autos religiosos com suas cantorias, informa-nos Andrade (1977). No século XVI, o Brasil colônia recebeu os povos africanos escravizados, que faziam música com características marcantes. No fim do século XVII, em Pernambuco (Olinda), Rio de Janeiro, Bahia e Paraíba, surgiu o ensino musical segundo os costumes europeus, com predomínio da música religiosa. Durante o século XVIII, com o ciclo do ouro em Minas Gerais, despontam compositores da música barroca mi- neira. Música comcaracterísticas europeias e com o colorido brasileiro. Em meados do século XVIII, os jesuítas do Rio de Janeiro, na fazenda Santa Cruz, ensinavam o canto e a execução de instrumentos, conquis- tando excelentes resultados e surpreendendo D. João VI e muitos músicos profissionais. A partir desse momento, aconteceram grandes progressos no campo musical, especialmente com a vinda de Marcos Portugal, o maior composi- tor português de então, e Sigismund Neukomm, músico austríaco. Óperas e missas foram interpretadas, acentuando ainda mais o caráter europeu da cena artística do Rio de Janeiro. 281 282 A música brasileira Nesse ambiente propício da corte de D. João VI, surgiu a figura do padre José Maurício Nunes Garcia (1767-1830), considerado o primeiro nome de destaque na música brasileira. Educado nas tradições de Santa Cruz, ele foi um estudio- so de Bach, Haydn e Mozart. Muitas de suas composições foram perdidas, mas uma delas, o Réquiem, foi conservada e é considerada a obra-prima da música religiosa brasileira. O padre José Maurício compôs música dramática, orquestral, instrumental e sacra, além de modinhas. Muitas de suas obras estão no Acervo do Cabido Metropolitano do Rio de Janeiro. Padre José Maurício Nunes Garcia. D om ín io p úb lic o. Entre os ilustres alunos do Padre José Maurício, estiveram Francisco Manuel da Silva, autor da música do Hino Nacional Brasileiro, e o príncipe herdeiro D. Pedro I, autor da música do Hino da Independência. Francisco Manuel da Silva, maestro, compositor, instrumentista e professor. D om ín io p úb lic o. A música brasileira 283 Francisco Manuel da Silva (1795-1865) Joaquim Osório Duque Estrada (1870-1927) Hino Nacional Brasileiro Faixa 16 (CD 3) A música no Segundo Império Em 1841, Francisco Manuel da Silva fundou o Conservatório de Música no Rio de Janeiro (hoje Escola Nacional de Música). Em 1857, D. Pedro II instalou a Academia Imperial de Música e Ópera Nacio- nal. Essa academia foi muito importante porque apresentou óperas estrangeiras e numerosa produção brasileira. O Segundo Império (1840-1889) foi um perío- do de muito brilho na vida musical. Companhias italianas trouxeram célebres cantores e instrumentistas, alguns dos quais permaneceram no país. Foram fun- dadas escolas de piano e sociedades instrumentais. Carlos Mesquita organizou concertos populares no Rio de Janeiro, imprimindo um caráter socializador. Com a instalação da República (1889), perdeu-se o interesse pela música estrangeira e o público se afas- tou dos grandes espetáculos. Em um esforço de executar a música brasilei- ra, foram criadas as sociedades sinfô- nicas do Rio de Janeiro e, em especial, a Sociedade de Concertos Sinfônicos (1921) e o Departamento Municipal de Cultura (1935). Alguns composi- tores, como Antônio Carlos Gomes, Alexandre Levi, Alberto Nepomuceno, Francisco Manuel da Silva e Henrique Osvaldo, demonstraram essa preocu- pação nacionalista. D. Pedro I foi um hábil e entusiasta musicista. D om ín io p úb lic o. 284 A música brasileira D. Pedro I (1798-1834) Evaristo Ferreira da Veiga (1779-1837) Hino da Independência Faixa 17 (CD 3) Antônio Carlos Gomes (1836-1896) nasceu em Campinas, São Paulo, e está entre os grandes melodistas do século XIX. Ele iniciou seu contato com a música na banda organizada por seu pai e aos 15 anos de idade começou a compor. Aos 23, apresentava concertos e lecionava canto e piano. D. Pedro II, que era amigo e protetor dos artistas, encaminhou-o para estudar com Francisco Manuel da Silva. Carlos Gomes sempre se mostrou determinado na busca de seus objetivos e essa característica lhe rendeu o patrocínio do governo imperial para realizar seus estudos na Itália. Lá, ele compôs a ópera II Guarany (O Guarani), que foi extraída do romance de José de Alencar e o tornou famoso, sendo apresentada em toda a Europa e na América do Norte. A estreia dessa ópera foi no Teatro Scala, de Milão, com grande sucesso. No Brasil, ela foi apresentada pela primeira vez no aniversário de D. Pedro II, em 2 de dezembro de 1870. A abertura de O Guarani é executada diariamente no programa radiofônico A Voz do Brasil. A ária que vamos ouvir faz parte dessa obra. É um dueto entre os personagens Cecília e Peri, em que podemos apreciar a força dramática e a beleza da melodia. Antônio Carlos Gomes. D om ín io p úb lic o. A música brasileira 285 Carlos Gomes (1836-1896) Senzo una Forza Indomita, de O Guarani Faixa 18 (CD 3) Chiquinha Gonzaga (1847-1935) foi a primeira grande compositora popular do Brasil. Ela começou a estudar piano muito cedo e sua vida foi toda dedicada à música: atuava como professora durante o dia e à noite integrava um grupo de choro como pianista, tocando em bailes. Escrevia música para os escravos negros venderem nas ruas, de porta em porta. Fez sucesso com a peça Atraente, que lhe rendeu um bom dinheiro. Desde sempre, enfrentou preconceitos por ser mulher, mas nunca desani- mou até que o sucesso veio com a opereta A Corte na Roça (1885), inclusive com o apoio de Carlos Gomes. Compôs Ó Abre Alas (1889) para o cordão carnavalesco Rosa de Ouro, que teve grande repercussão. Ainda hoje é ouvida no carnaval. Chiquinha Gonzaga. D om ín io p úb lic o. Ernesto Nazareth (1863-1934) foi um pianista e compositor que fez essencialmen- te música com alma brasileira. Tocou nas lojas de música e no famoso Cine Odeon, na época do cinema mudo, chamando a atenção por suas músicas originais. Seus estudos se concentraram muito na obra de Chopin, executando muito o mestre. São quase todas para piano as mais de duzentas peças compostas por Ernesto Nazareth e algumas trazem títulos com tom humorístico, como Cruz Perigo!, Gentes: o Imposto Pegou? e Bicicleta Club. 286 A música brasileira Produziu também numerosos tangos, valsas e polcas, dando ênfase aos ritmos excepcionais da música brasileira. Suas danças são repletas de indica- ções expressivas, como “murmurando”, “dolcíssimo”, “gracioso” e “gingando com brilho”. Na peça da audição a seguir, ouviremos o piano sendo executado na região aguda do instrumento, procurando imitar o som do cavaquinho. Ernesto Nazareth. D om ín io p úb lic o. Ernesto Nazareth (1863-1934) Apanhei-te Cavaquinho Faixa 20 (CD 3) Nacionalismo musical Alguns compositores trabalharam em uma ligação intensa do espírito na- cionalista, valorizando o que é nacional com o espírito popular, encontrado nas ruas, nas esquinas, nos quintais, nas matas. Entre esses compositores estão Villa-Lobos, Francisco Mignone, Lorenzo Fernandez, Camargo Guarnieri, Luciano Gallet. Esses músicos usaram o material “folclórico” (rural) nas suas composições e esse é o elemento que os une. A música brasileira 287 Heitor Villa-Lobos. D iv ul ga çã o. Heitor Villa-Lobos (1887-1959) foi um apaixonado pela natureza do Brasil. Ele viajou por quase todas as regiões do país recolhendo os sons e ruídos da floresta e os colocou nas suas composições. Observem-se os títulos de algumas de suas obras: Canções Típicas Brasileiras, Serestas, Uirapuru, Mandú-carará, Amazonas e outras tantas. Desde cedo, a música fazia parte de sua vida. Seu pai tocava violoncelo com um grupo de amigos, de maneira que o pequeno Heitor teve acesso aos mestres da música. Apreciador de Bach, mais tarde escreveu uma grande obra intitulada Bachianas, em homenagem ao grande compositor alemão. Aos 6 anos de idade, aprendeu a tocar violoncelo. Aos 11, aprendeu o clarine- te, também com o pai, que era seu grande companheiro nos concertos e óperas. Aos 16 anos, começou a frequentar os grupos de chorões e sambistas do Rio de Janeiro, ampliando assim sua formação musical. Preparado para ser médico e violoncelista, tocava violão nas noites musicais. Aos 18 anos, fez a primeira de suas muitas viagens pelo Brasil, conhecendo os rios, as florestas, os pássaros e as paisagens. Nas cidades do interior, conheceu tocadores de viola sertaneja, osrepentistas, as danças que lembravam as tradi- ções dos negros, o aboio dos vaqueiros e as cantigas dos índios, discorre Souza (2001). Trinta anos depois, publicou um livro chamado Guia Prático, com músicas que conheceu em suas andanças, reunindo grande parte da música folclórica brasileira. Villa-Lobos inspirava-se no ambiente sonoro ao seu redor – canções infantis e canções indígenas, por exemplo – e utilizava-o nas suas obras. Assim, também adotou instrumentos tipicamente brasileiros em suas músicas, como o reco-reco e a cuíca, entre outros, introduzindo-os na percussão orquestral, o que foi uma grande revolução. 288 A música brasileira Trenzinho Caipira procura imitar o movimento de uma locomotiva com os instrumentos da orquestra. Mais tarde recebeu como letra um trecho do Poema Sujo, de Ferreira Gullar. Trenzinho Caipira Heitor Villa-Lobos Ferreira Gullar Lá vai o trem com o menino Lá vai a vida a rodar Lá vai ciranda e destino Cidade e noite a girar Lá vai o trem sem destino Pro dia novo encontrar Correndo vai pela terra Vai pela serra, vai pelo mar Cantando pela serra ao luar Correndo entre as estrelas a voar Luar, no ar, no ar, no ar Heitor Villa-Lobos (1887-1959) Trenzinho Caipira Faixa 21 (CD 3) A música brasileira 289 Música popular O povo brasileiro surge da miscigenação de portugueses, africanos, amerín- dios e, em menor escala, dos espanhóis, franceses e holandeses. Foi justamente essa mistura que deu ao país uma fisionomia muito especial e resultou na influ- ência da musicalidade que, desde o século XVI, uniu essas influências europeias, indígenas e africanas, incluindo os batuques e rituais afro e os cantos de culto católico. Daí surge a música popular brasileira cantada e tocada por pessoas comuns, a qual era transmitida de modo oral, de geração para geração. Pouco a pouco foi se desprendendo de suas funções puramente comunitárias, religiosas ou se- culares para se transformar em um produto cultural, hoje admirado em todo o mundo. A música popular brasileira fortaleceu-se com a urbanização, a estruturação dos grandes centros, principalmente no século XIX. Mudanças na vida brasilei- ra – tais como a libertação dos escravos, a queda do Império e a instalação da República – contribuiram para que houvesse ascensão de uma cultura popular, predominantemente afro-brasileira. No início do século XX, surgiram os gêneros mais difundidos da música brasi- leira: o choro e o samba. A primeira gravadora de discos foi instalada em 1902. Em 1920, com a chega- da do rádio, do cinema falado e da gravação elétrica, houve aprimoramentos na produção, consolidando a música popular. Os gêneros musicais do Brasil A modinha e o lundu são os gêneros mais antigos de música popular urbana surgidos e produzidos no Brasil. Modinha Canção em andamento de moderado a lento, pouco ritmada, com letras amorosas, surgida no final do século XVIII. Uma de suas características mais im- portantes é a melodia elaborada. 290 A música brasileira Quem Sabe Carlos Gomes Tão longe de mim distante Onde irá, onde irá teu pensamento Tão longe de mim distante Onde irá, onde irá teu pensamento Quisera saber agora, Quisera saber agora, Se esqueceste, se esqueceste Se esqueceste o juramento. Quem sabe se és constante Se ainda é meu teu pensamento Minh’alma toda devora Dá a saudade, dá a saudade agro tormento Tão longe de mim distante Onde irá, onde irá teu pensamento Quisera saber agora Se esqueceste, se esqueceste o juramento. Carlos Gomes (1836-1896) Quem Sabe Faixa 22 (CD 3) A música brasileira 291 Lundu Canção e dança surgida na mesma época da modinha, com forte presença dos elementos rítmicos afro-brasileiros, provenientes dos escravos negros. As letras das canções são alegres, leves e críticas. Maxixe É a primeira grande contribuição das camadas populares do Rio de Janeiro à música do Brasil. Surgido como dança, o maxixe recebeu uma série de influên- cias de culturas distintas. Era apreciada por ricos e pobres, talvez por ser executa- do pelos mesmos músicos que animavam tanto os forrobodós populares quanto os bailes dos salões da nobreza. Tradicional Peixe Vivo Faixa 23 (CD 3) Tango brasileiro Fusão de gêneros musicais como a habanera cubana, a polca e o lundu bra- sileiro. O compositor e pianista Ernesto Nazareth foi o seu maior divulgador. Os tangos brasileiros escritos para piano eram peças para serem apreciadas nas salas de espera dos cinemas, nos salões da aristocracia, nos teatros e nas salas de concerto. Ernesto Nazareth (1863-1934) Brejeiro Faixa 24 (CD 3) 292 A música brasileira Choro Derivado de uma fusão da polca, do tango e da habanera, inicialmente de- signava um ambiente musical, um encontro de instrumentistas que tinham uma maneira própria de tocar. Nesses encontros, em uma roda, esses músicos toca- vam lundus, polcas, valsas, mazurcas e modinhas. No final do século XIX, surgiu um novo gênero musical, o choro. A sua característica natural é ser instrumental, pois está fundado no trio de flauta, cavaquinho e violão, depois ingressando o violão e um violão de sete cordas (com a corda grave para executar a “baixaria”). O bandolim tornou-se o principal solista do regional de choro. Mais tarde outros instrumentos foram acrescidos ao núcleo inicial. Assim, o grupo de choro pode contar com clarinete, saxofone, violino, trompete, trombone, piano, acordeão e contrabaixo a arco na base do conjunto, o chamado rabecão. Há alguns choros em forma de canção, como o Carinhoso, de Pixinguinha. Marcha Pode ter compasso binário (dois tempos) ou quaternário (quatro tempos). Há muitos tipos de marcha, como a marcha nupcial, a marcha fúnebre, a marcha- -rancho e a marcha militar, entre outras. Tradicional Marcha Soldado Faixa 25 (CD 3) Marcha-rancho Surgiu em 1930, com compositores interessados em divulgar e ampliar o espírito musical dos desfiles de ranchos cariocas, que saiam à rua cantando as marchas das festas folclóricas de dezembro. A mais antiga dessas marchas é a Jardineira (“Oh, jardineira, por que estás tão triste...”). A música brasileira 293 Vinicius de Moraes (1913-1980) Toquinho (1946) Aulas de Piano Faixa 26 (CD 3) Samba Originou-se dos ritmos africanos. Inicialmente era uma dança de roda dos habitantes do morro. Sua denominação origina-se de semba, de um dialeto afri- cano, que significa umbigada, devido à forma como era dançado. Este termo passou a designar, no final do século XVIII, os bailes e festas populares no Brasil. Como gênero musical, o samba aparece nas primeiras décadas do século XX. Com o passar do tempo, ele se ramificou em samba-canção (andamento mode- rado e lento com influência do bolero), bossa nova (acentuação no tempo fraco, estilo de cantar baixinho, mesmo valor para a voz e para o violão), partido alto (mais próximo das origens afro-brasileiras), samba-exaltação (exalta as riquezas e as belezas naturais do Brasil), samba-enredo (especialmente para o desfile de uma escola de samba, é escolhido por concurso), samba de gafieira (música para se dançar) e samba de breque (descreve a vida do malandro carioca). Ary Barroso Um dos maiores compositores brasileiros, Ary Barroso (1903-1964) projetou no exterior o samba e a marchinha brasileiros, abrindo espaço para a bossa nova. Foi o criador do samba-exaltação, com a composição Aquarela do Brasil. Ary Barroso. A rq ui vo P es so al /D iv ul ga çã o. 294 A música brasileira Ary Barroso (1903-1964) Isto Aqui o Que É? Faixa 27 (CD 3) Paulo César Pinheiro Antes dos 15 anos de idade, o poeta e compositor carioca Paulo César Pinhei- ro (1949) já havia escrito a letra de Viagem. Aos 19 anos, ele venceu a Bienal do Samba com Lapinha e aos 22 foi descoberto por Tom Jobim. Paulo César escre- veu mais de 1 300 letras, sendo parceiro de talentosos músicos como Pixingui- nha, Lenine, Eduardo Gudin e outros. Eduardo Gudin. D iv ul ga çã o w w w .e du ar do gu di n.co m .b r. Paulo César Pinheiro. Jo rn al d o Co m m er ci o. Eduardo Gudin e Paulo César Pinheiro E lá se Vão meus Anéis Faixa 28 (CD 3) Frevo Juntamente com o maxixe carioca, o frevo nordestino está entre as mais ori- ginais criações dos mestiços urbanos. O frevo surgiu da interação entre música e A música brasileira 295 dança, integrando as bandas de rua desde o início de 1880. O passo característico do frevo, conforme alguns estudiosos, está relacionado à presença de capoeiristas nos desfiles de bandas militares, criando complicadas coreografias para demons- trar sua agilidade. Os capoeiras do Recife transformaram seu gingado em dança, improvisando versos de desafio ao grupo rival, orienta-nos Tinhorão (1975). Os versos cantados ao som da música das bandas militares contribuiram para o sur- gimento das marchas de frevo. Com o passar do tempo, as fanfarras foram postas a serviço dos grupos de trabalhadores urbanos para fazerem a música de rua, e o espírito de criação espontânea estendeu-se dos dançarinos para os músicos, que romperam com o repertório marcial. O ritmo produzia uma ginga inspirada nos movimentos do corpo dos dançarinos concentrados no passo. A palavra frevo veio mais tarde, dois ou três anos após o surgimento desse novo jeito de dançar. Pa- recendo significar os saltos da multidão, que, vista de longe, tinha o aspecto de uma superfície líquida fervendo, a palavra ferver adota a pronúncia frever, usada na linguagem popular pernambucana, argumenta Tinhorão (1975). Atrás das bandas de clubes de frevo, alguns grupos seguiam a música apenas evoluindo sob a forma de cordões e, atendendo a essa necessidade de um ritmo mais acessível, surgiram os frevos de ritmo marchado com partes cantadas. Tradicional A Barata Faixa 29 (CD 3) Baião É uma música do Nordeste brasileiro, com ritmo característico. A dança do baião (arrasta-pé) talvez tenha parentesco com as danças indígenas. O sertanejo dança com as mãos atrás das costas e uma perna na frente da outra. Tradicional Trem de Ferro Faixa 30 (CD 3) 296 A música brasileira Ph ot o O bj ec ts . Sanfona, instrumento típico do baião. Maracatu Manifestação característica da música folclórica afro-brasileira de Pernambu- co. É formada por grande grupo de percussão que acompanha um cortejo real. Surgiu em meados do século XVIII e revela um conjunto de influências das cultu- ras indígena, africana e europeia. Alemão e Zezo Maracatu Crioulo Faixa 31 (CD 3) Maracatu – Recife. N iv al do A lm ei da F ilh o. A música brasileira 297 Toada Apresenta caráter melancólico e arrastado, refletindo várias regiões do Brasil. Seus textos são curtos, amorosos, líricos ou cômicos, possuindo estrofe e refrão. Catulo da Paixão Cearense (1863-1946) João Pernambuco (1883-1947) Luar do Sertão Faixa 32 (CD 3) Luar do Sertão Catulo da Paixão Cearense João Pernambuco Não há, ó gente, oh não Luar como este do sertão... Oh que saudade do luar da minha terra Lá na serra branquejando folhas secas pelo chão Esse luar cá da cidade tão escuro Não tem aquela saudade do luar lá do sertão Se a lua nasce por detrás da verde mata Mais parece um sol de prata prateando a solidão A gente pega na viola que ponteia E a canção é a lua cheia a nos nascer no coração Não há, ó gente, oh não Luar como este do sertão... 298 A música brasileira Valsa Seu compasso é ternário (três tempos), com acentuação no primeiro tempo. No século XIX, foi muito popular principalmente nos salões da Áustria. Invadiu o mundo ocidental como uma dança de salão de pares enlaçados. Vários compo- sitores incluiram a valsa entre suas obras. Vinicius de Moraes (1913-1980) A Casa Faixa 33 (CD 3) Polca Originária da Boêmia (região da República Tcheca), surgiu no século XIX. Seu compasso é binário (dois tempos), com um andamento vivo. Tradicional Seu Pintor Faixa 34 (CD 3) A música brasileira 299 Bossa nova Quando surgiu, no fim da década de 1950, não era um gênero musical, mas uma maneira de cantar e de tocar. A classe média branca das cidades grandes, influenciada pelo jazz americano, iniciou um movimento contra a ditadura dos ritmos tradicionais, marcando um afastamento entre esse novo samba e suas fontes populares. A bossa nova propõe uma descontinuidade entre o acento rít- mico da melodia e do acompanhamento, provocando o desencontro dos acen- tos. Além disso, tem melodia, harmonia e ritmo complexos e elaborados. É apre- ciado em todo o mundo pelo seu charme e sofisticação. Cl au di o Lo bo s. Tom Jobim. Vinicius de Moraes. D iv ul ga çã o. Antônio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes Samba do Avião/ Samba de Uma Nota Só e Garota de Ipanema Faixa 35 (CD 3) 300 A música brasileira Forró Envolve um conjunto de diferentes gêneros musicais provenientes do Nor- deste brasileiro: baião, coco, rojão, quadrilha, xaxado e xote. A dança mescla o arrastar de pés dos índios, os ritmos portugueses e holandeses, o balançar dos quadris dos africanos e ainda as danças europeias. O forró é popular especial- mente nas cidades de Juazeiro do Norte (CE), Caruaru (PE), Mossoró (RN) e Cam- pina Grande (PB), onde é símbolo da Festa de São João. O termo forró também é usado para nomear as grandes festas que duram toda a noite nas capitais de Fortaleza (CE), João Pessoa (PB), Aracaju (SE), Natal (RN) e Recife (PE). O instrumentista, cantor e compositor Dominguinhos – José Domingos de Morais. Vi ct or S oa re s/ A Br . Dominguinhos Naturalmente Faixa 36 (CD 3) A música brasileira 301 Reggae Reggae é um termo abrangente que designa diversas formas de música po- pular jamaicana, como o ska (mistura de música folclórica nativa com o jazz, ritmos caribenhos e africanos e o ritmo de blues de Nova Orleans), e o rocksteady (ritmos lentos), que já são conhecidos desde 1960, orienta-nos Shuker (1999). No final da década de 1960, esses estilos de música popular jamaicana passaram a ser conhecidos como reggae. Bob Marley popularizou esse gênero em 1970. O reggae está fortemente associado ao movimento social de culto religioso cha- mado rastafári, caracterizando-se, entre outras pecularidades, pela aparência (o cabelo e as roupas). D iv ul ga çã o w w w .c id ad en eg ra .c om .b r. Proveniente da Baixada Fluminense, o grupo Ci- dade Negra faz um som com influência das músicas jamaicana e brasileira. G et ty Im ag es . Bob Marley. Canção de protesto Foi uma das formas de reagir à americanização da música popular brasileira e às crises políticas e sociais do Brasil durante o regime militar (1964-1985). A música, por ter sua divulgação no rádio e na televisão, é um dos mais eficientes meios de manifestar agrado e desagrado frente a essas questões. Chico Buarque de Hollanda foi um representante dessa corrente, e sua primeira obra com esse enfoque foi Pedro Pedreiro. O sucesso maior de Chico ainda jovem aconteceu em 1966, com A Banda, no 2.º Festival da Música Popular Brasileira da TV Record, que dividiu o primeiro lugar com outra canção. A Banda repercutiu muito no Brasil todo e no exterior pela mensagem de fraternidade, por sua melodia simples e por seu ritmo fácil, o que resultou em muitas regravações. 302 A música brasileira Chico Buarque de Hollanda. Fe rn an da S te ffe n. Axé-music O axé surgiu em Salvador, Bahia, na segunda metade da década de 1980. Caracteriza-se pelo uso intenso da percussão, com instrumen- tos como repique, timbal (tambor) e surdos. É uma espécie de música afro-pop com ritmos vigorosos e contagiantes, baseada na herança musical afro- -brasileira. Sem muita ideologia ou revolta social, o axé tem encontrado acei- tação, inclusive no exterior. Entre seus representantes no Brasil estão o grupo Olodum, de percussão e timbaleiros, o compositor Carlinhos Brown e as canto- ras Ivete Sangalo e Daniela Mercury. J. Fr ei ta s/ A Br . Daniela Mercury. A música brasileira 303 Canções praieiras O compositor DorivalCaymmi se dedicou quase que exclusivamente a trans- formar em música a inspiração emocional e poética que ele recebeu do mar da Bahia. Assim, ele retrata os aspectos alegres, trágicos, monótonos e sensuais em canções executadas com seu violão e sua voz de timbre grave e aveludado. Veja alguns títulos de suas obras com essa temática: Coqueiro de Itapoã, É Doce Morrer no Mar, O Mar, O Vento, Pescaria (Canoeiro), Suíte dos Pescadores. Dorival Caymmi. D iv ul ga çã o D or iv al C ay m m i. Alguns astros de nossa música atual Renato Borghetti Tendo se iniciado na música aos 10 anos de idade, o gaúcho Renato Borghet- ti (Porto Alegre, 1963) surgiu no cenário artístico em 1984, com o álbum Gaita Ponto. Este vendeu mais de 100 mil cópias, valendo a Renato a conquista do primeiro disco de ouro da música instrumental brasileira. Borghettinho pode ser ouvido tanto em um teatro tocando com uma orquestra sinfônica como em uma festa rural no interior do país, pois ele mescla folclore e modernidade em suas composições. Seu instrumento é uma gaita ponto feita especialmente para ele por uma fábrica italiana. Já gravou com grandes músicos brasileiros e faz cons- tantes apresentações em países como França, Itália, Áustria e Alemanha. 304 A música brasileira D iv ul ga çã o w w w .re na to bo rg he tt i. co m .b r. Renato Borghetti. Renato Borghetti Sétima do Pontal Faixa 37 (CD 3) Djavan Foi sozinho que o adolescente alagoano Djavan (Maceió, 1949) aprendeu a tocar violão. Aos 18 anos de idade, ele formou um conjunto que tocava em bailes, clubes, praias e igrejas de Maceió. Em 1978, fez sucesso com a música Álibi, gravada por Maria Bethânia. Suas canções são consideradas coloridas, com construções metafóricas, mescladas de diversos gêneros musicais, como samba, funk, música de viola, baladas e ritmos africanos. D iv ul ga çã o w w w .d ja va n. co m .b r. Djavan. A música brasileira 305 Maria Rita Filha da cantora Elis Regina e do compositor e pianista César Camargo Ma- riano, Maria Rita (São Paulo, 1977) estudou por oito anos nos Estados Unidos e retornou em 2001. Com o apoio do seu padrinho Milton Nascimento e de Chico Pinheiro, ela iniciou sua carreira de cantora. A partir daí ganhou vários prêmios como revelação do ano, melhor disco de MPB e melhor canção brasileira. Ph ot o Ri o N ew s. Maria Rita. Lenine e Bráulio Tavares Lavadeira do Rio Faixa 39 (CD 3) Chico César O cantor, compositor, escritor e jornalista paraibano Chico César (Catolé do Rocha, 1964) formou-se em Comunicação Social pela Universidade Federal da Paraíba. Aos 21 anos de idade, foi para São Paulo, trabalhando como jornalista e revisor de textos. Integrou o grupo Jaguaribe Carne. Aperfeiçoou os estudos de violão, conquistou o público e hoje tem uma carreira internacional. 306 A música brasileira D iv ul ga çã o w w w .a ge nc ia pr od u- to ra .c om .b r. Chico César. Dilermando Reis Doutor Sabe Tudo Faixa 40 (CD 3) Yamandu Costa O gaúcho Yamandu Costa (Passo Fundo, 1980) aprendeu violão com seu pai aos 7 anos de idade e aos 11 iniciou o conhecimento da leitura musical. Aos 16 anos, foi convidado para abrir o show do prestigiado violonista brasileiro Baden Powell (1937-2000) em Porto Alegre. Aos 21, recebeu o reconhecimento da crí- tica ao conquistar um prêmio na categoria instrumental. Yamandu passeia por diversos estilos, como choro, bossa nova, milonga, tango, samba e chamamé no seu violão de sete cordas. Já recebeu diversos prêmios em festivais. Sua disco- grafia revela um intenso e sólido trabalho de compositor e intérprete com ex- pressiva diversidade musical. Yamandu Costa. M ar co A ur él io . A música brasileira 307 Texto complementar Hermeto Pascoal O compositor, arranjador e multinstrumentista alagoano Hermeto Pasco- al (Lagoa da Canoa, 1936) toca instrumentos como acordeão, flauta, piano, saxofone, trompete, bombardino, escaleta e outros mais. Desde criança já manifestava seu fascínio pelos sons da natureza e seu primeiro instrumento foi um pífano feito de um cano de mamona de jerimum (abóbora), que usava para tocar para os passarinhos. Ele também faz música com os objetos mais inusitados, como chaleiras, bacias, garrafas, brinquedos, máquina de costura, além do piano, instrumentos de sopro e percussão. Para Hermeto, a música pode ser extraída de qualquer coisa, inclusive do próprio corpo, argumenta Nestrovski (2002). Cada apresentação de Hermeto Pascoal é um aconteci- mento inusitado e inesquecível, já que para ele a criação musical não tem limites. Há muito tempo Hermeto vem vencendo barreiras conceituais e en- riquecendo a música brasileira e mundial. Convidado para os principais festi- vais de jazz do mundo, ele é consagrado e respeitado internacionalmente. D iv ul ga çã o. D iv ul ga çã o. Calendário do Som é um trabalho em que Hermeto Pascoal reúne 366 composições que escreveu no período de um ano (23 jun. 1996 – 22 jun. 1997): “Eu queria, humildemente, homenagear através da música todos os aniversariantes do mundo”, diz o autor. Hermeto decidiu, ao completar 60 308 A música brasileira anos de idade, passar um ano compondo uma música por dia. Reunidas em um livro estão as 366 partituras, as anotações e desenhos do autor relaciona- das para cada uma das composições. “O que eu quis mostrar é que compor não tem dificuldade”, afirmou ele. A obra é acompanhada de uma breve bio- grafia do autor escrita pelo jornalista e pesquisador Sérgio Cabral. O lança- mento foi realizado em novembro de 2005. Vamos ouvir uma composição de Hermeto, com sua própria interpreta- ção (observe o seu estilo jazzístico). Hermeto Pascoal Bebê Faixa 41 (CD 3) Instrumentos desconhecidos: senza Senza é uma família de instrumentos feitos de uma cabaça e lâminas de metal. Aparece em vários tamanhos. Frequentemente é tocado em conjunto. Esse tipo de idiofone está espalhado por toda a África. Is to ck ph ot o. A música brasileira 309 Referências ACERVO Musical do Cabido Metropolitano do Rio de Janeiro. Disponível em: <www. acmerj.com.br/>. Acesso em: 8 fev. 2008. ANDRADE, Mário de. Pequena História da Música. 8. ed. São Paulo: Martins, 1977. AXÉ-MUSIC. Disponível em: <http://br.geocities.com/vinicrashbr/artes/musica/axe. htm>. Acesso em: 8 fev. 2008. CLIQUE MUSIC. Disponível em: <www.cliquemusic.uol.com.br/br/home/home. asp>. Acesso em: 8 fev. 2008. CORDOFONES. Disponível em: <www.terrabrasileira.net/folclore/manifesto/corda. html>. Acesso em: 8 fev. 2008. JEANDOT, Nicole. Explorando o Universo da Música. 2. ed. São Paulo: Scipione, s/d. JOSÉ MAURÍCIO Nunes Garcia. Disponível em: <www.geocities.com/nunes_garcia/ JM_Port.htm>. Acesso em: 8 fev. 2008. KIEFER, Bruno. História da Música Brasileira: dos primórdios ao início do século XX. Porto Alegre: Movimento, 1976. MARIZ, Vasco. A Canção Popular Brasileira. 6. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 2002. MONTENEGRO, Júlia Hummes (Org.). Um Subsídio para a Ação do Professor. Cader- nos Pedagógicos, n. 1, Fundarte, 2004. Encarte. NESTROVSKI, Arthur (Org.). Música Popular Brasileira Hoje. São Paulo: Publifolha, 2002. RAÍZES DA TRADIÇÃO. Disponível em: <http://raizesdatradicao.uol.com.br/sons. php?menu=4104&page_id=5>. Acesso em: 8 fev. 2008. SHUKER, Roy. Vocabulário de Música Pop. São Paulo: Hedra, 1999. SOUZA, Loly Amaro de. Heitor Villa-Lobos. São Paulo: Moderna, 2001. SQUEFF, Enio; WISNIK, José Miguel. O Nacional e o Popular na Cultura Brasileira: música. São Paulo: Brasiliense, 1982. TINHORÃO, José Ramos. Pequena História da Música Popular: da modinha à canção de protesto. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1975. Universo sonoro atual Espaço sonoro cotidiano Estamos em um universo repleto de sons, alguns ritmados, outros não. Observe que sempre tentamos organizar e determinar padrões porque o ritmo, por seu próprio conceito, é a divisão do tempo em partes. É preciso então que o processo perceptivo se encarreguede reunir elementos com alguma semelhança, diferenciando-os de outros com aspectos diversos. O nosso próprio corpo é um universo de ritmos contínuos, como o ritmo da batida do coração, que pode variar de um tempo lento até a ace- leração em uma corrida ou um estado febril. No ser humano, a pulsação normal é de 60 a 80 batidas por minuto, o que sempre influenciou forte- mente o tempo da música. Antes da invenção do metrônomo, os tempos da música eram determinados pela pulsação humana. Isso diferenciava o caráter melancólico ou agitado de uma peça, indicado por sua aproxima- ção ou afastamento em relação a esse referencial, informa Schafer (2001). Na Ode à alegria, da Nona Sinfonia de Beethoven, chama a atenção pois o próprio compositor indicou que ela deve ser executada no tempo de 80 pulsos por minuto, embora alguns regentes façam algumas variações no seu andamento. Fôlego A respiração também é um ritmo contínuo que varia no seu tempo de acordo com o estado de repouso ou de exercício do indivíduo. A sensa- ção de bem-estar que as pessoas experimentam na praia está relacionada ao padrão respiratório de relaxamento conforme o ritmo das ondas. Este, mesmo não sendo regular, produz o ciclo médio correspondente ao ciclo respiratório do ser humano. Muitas vezes, o trabalho manual tem o seu gesto ritmado pelo padrão respiratório, visando criar sincronia e funcio- nalidade ao movimento. 311 312 Universo sonoro atual E há um outro ritmo biológico que é fundamental para o indivíduo conviver no ambiente acústico: é o poder de resolução dos receptores sensoriais, argumen- ta Schafer (2001). Esse poder se relaciona com a capacidade de fundir imagens e sons separados, dando a impressão de um fluxo contínuo que, no ser humano, oscila entre 16 e 20 ciclos por segundo. O autor acrescenta que nos filmes de cinema são empregados 24 quadros por segundo para evitar a oscilação. A per- cepção auditiva se dá por meio de uma vibração rítmica rápida, que assume gra- dualmente uma altura identificável em torno de 20 ciclos por segundo. À medida que a espécie humana modifica o meio em que vive, ela altera seus próprios ritmos cotidianos. Os parâmetros audíveis do coração, da respiração, dos movimentos corporais e das ações conservadoras do sistema nervoso são os guias que devem orientar e ordenar a percepção de todos os outros ritmos gerados pelo meio ambiente. Mudanças na percepção O processo de fazer música é resultado da realidade em que estamos inseri- dos, mas também é permeado de sons e ritmos de diferentes épocas e culturas pelos quais somos, consciente ou inconscientemente, influenciados. Na sua di- visão mais ampla, a música poderia ser dividida em duas espécies: absoluta e programática. A música absoluta refere-se à criação de formas musicais desvinculadas � do ambiente externo, como por exemplo a sonata, o quarteto, a sinfonia. Neste caso, os compositores modelam paisagens sonoras ideais, da men- te, as quais precisam de audição concentrada, ambiente adequado e silen- cioso. Na música programática, o propósito é imitar o ambiente, descrevê-lo. � Os espaços para concertos recebem a música absoluta e também as obras descritivas, transformando os cenários em janelas abertas para o campo, pos- sibilitando que o ouvinte seja transportado para um mundo ideal, argumenta Schafer (2001). As descrições da natureza aparecem em compositores como Vi- valdi, Haendel, Haydn, Beethoven e Debussy, nas suas paisagens habitadas por pássaros, animais e pessoas do campo. Os elementos descritivos são tão ricos em pormenores como algumas pinturas que observam a paisagem a distância. Universo sonoro atual 313 Antonio Vivaldi (1678-1741) Il Cardellino, Primeiro Movimento: Allegro Faixa 42 (CD 3) Comentário O concerto Il Gardellino refere-se ao pintassilgo, que é um pássaro canoro. Fique atento à sonoridade e à agilidade do canto do passarinho imitado pela flauta. Quando Vivaldi compôs esta obra, em 1716, dirigia a orquestra de crian- ças e jovens da Ospedale della Pietá, um asilo para crianças abandonadas em Veneza, o qual tinha grande prestígio. As alunas recebiam formação musical ele- vada e por isso o compositor escreveu alguns concertos para as solistas desen- volverem sua técnica de alto nível. Johann Sebastian Bach (1685-1750) Toccata e Fuga em Ré Menor, BWV 565 Faixa 43 (CD 3) Comentário A palavra toccata (do italiano toccare, “tocar”) é uma forma musical sem es- trutura precisa à qual pertencem peças para instrumentos de teclado, com in- tenção de ressaltar a agilidade técnica do intérprete. Bach compôs sete toccatas destinadas ao cravo e outras para o órgão. Esta famosa toccata sofreu muitas transcrições para piano, aumentando muito a sua popularidade. A obra foi com- posta por volta de 1708, em Weimar, onde Bach ocupou o lugar de organista em uma igreja até 1717. É considerada uma composição brilhante, poderosa, efer- vescente, dotada de evidência musical imediata ao alcance de todos. 314 Universo sonoro atual Narrativa No período do Romantismo, a cor introduzida é também revelação da per- sonalidade ou do estado de espírito do compositor. Além disso, são também “contadas histórias” por meio da música que, muitas vezes, nem precisam de um texto para serem compreendidas. O espaço real é transformado em uma bata- lha, um jardim ou ainda uma floresta, criando o espaço metafórico passível de mudanças ao longo dos períodos. Os recursos instrumentais empregados, espe- cialmente com a flauta e a trompa, procuram sugerir o amor da vida ao ar livre, a liberdade, os belos jardins – enfim, a paisagem sonora pastoril. Vamos ouvir uma obra musical que tem a clara intenção de narrar um am- biente com seus diferentes personagens, caracterizando-os no seu jeito de ser e de agir. O pianista e regente inglês Ketèlbey foi um compositor popular de peças or- questrais leves. Acompanhe a audição com a partitura. Toda a narrativa sonora é indicada pelo compositor, observando as características dos personagens e das situações em um mercado da Pérsia. Albert Ketèlbey (1875-1959) Num Mercado Persa Faixa 44 (CD 3) Em um mercado persa Síntese - Os condutores de camelo se aproximam do mercado. Ouvem-se os gritos dos mendigos pedindo esmola. Chega a linda princesa, carrega- da por seus criados (a sua entrada é acompanhada por um lânguido tema tocado primeiramente pela clarineta e o violoncelo, sendo repetido em se- guida por toda a orquestra). A princesa se detém para observar os malaba- ristas e os encantadores de serpentes. O califa passa, então, pelo mercado e interrompe os divertimentos. Ouvem-se mais uma vez os mendigos, a prin- cesa e os condutores de camelos se fazem ouvir suavemente a distância e a praça do mercado se torna deserta. Universo sonoro atual 315 A orquestra, os ritmos da máquina e os ritmos da natureza À medida que seu tamanho vai aumentando e sua intensidade se amplia, a orquestra, como um grande grupo sonoro, reflete as mais espessas densidades da vida urbana. O desenvolvimento instrumental possibilitou a utilização do co- nhecimento científico na produção do aumento do volume sonoro. Também o piano substituiu o cravo, que já não era suficiente para ser ouvido nos novos grupos instrumentais. Beethoven foi quem aproveitou pela primeira vez esses avanços técnicos. No século XIX, a orquestra atingiu um significativo tamanho. Foi no início do século XX que se passou a integrar à música, além dos sons, também os ruídos. Assim, nesta época, a orquestra se expandiu ainda mais com a inclusão de vários instrumentos de percussão, que são produtores de ruído com grande vitalidade rítmica. 316 Universo sonoro atual A música pastoril e os noturnos, revelando os ambientes campestres, foram substituídos pelos sons de máquinas e do dia a dia. Compositores incluíram ruídos da cidade em suas obras, como os produzidos pelo bonde sobre os tri- lhos, a estridência das serras mecânicas, o estalido dos chicotes, as vozes da mul- tidão, osrumores da estação de ferro, as tipografias, as instalações industriais e outras sonoridades da atmosfera moderna. A denominada música máquina reflete esse pensamento em títulos como Pacific 231 (1924), de Honneger; Balé mecânico (1926), de Antheil, com o emprego de algumas hélices de avião; Dança do Aço (1929), de Prokofiev; Fundição de Ferro (1929), de Mossolov. Poetas e pin- tores também foram nessa direção, justificando que as máquinas agora faziam parte da vida e a arte deveria lidar com esse novo conteúdo. A nossa paisagem sonora passou a ser composta de sons musicais e não mu- sicais. Alguns compositores, percebendo a devastação da paisagem sonora na- tural, criaram obras com foco na natureza – como, por exemplo, A Sinfonia do Universo, de Charles Ives, que foi planejada para ser executada ao ar livre, em montanhas e vales. Outro compositor ecológico é Oliver Messiaen, que exalta o homem e a natureza como elementos supremos da vida. Sua Sinfonia Turangalila é repleta de pássaros em uma floresta respirante. Na obra de Respighi, Pinheiros de Roma, a gravação do canto dos pássaros foi acoplada a uma orquestra sinfôni- ca, em 1924. Villa-Lobos também incluiu pássaros nas suas obras, como o canto do sabiá na fuga da Bachianas Brasileiras n. 9 e outros cantos no Choro n. 10. Desta maneira, a música moderna absorveu influências dos sons ambien- tais, como os ruídos de máquinas, engrenagens, aviões etc., bem como os da natureza. O compositor se deixa contagiar pelos ritmos e sonoridades que ouve constantemente, transpondo esses efeitos para a música. Também os ruídos das locomotivas nos trilhos e seus apitos tiveram forte influência no desenvolvimen- to do jazz, sugere Schafer (2001). Graves Na música popular atual, a preferência recai por instrumentos de som mais grave. Na opinião de Schafer (2001), as pessoas mais jovens preferem os efeitos do baixo e ajustam seus aparelhos de som para enfatizá-los. O autor chama a atenção para o fato de que as ondas mais longas dos sons de baixa frequência têm maior poder de penetração e conseguem transpor os obstáculos que estão à volta, preenchendo o espaço mais completamente. A sensação de estar imerso nesses sons ocorre porque a localização da fonte é mais difícil, pois se tratam de Universo sonoro atual 317 sons de baixa frequência. A música que enfatiza esses sons é mais escura em qualidade e menos direcionada no espaço: esses sons ocasionam mistura e difu- são e não clareza e foco, o que era importante em épocas anteriores. Dinho Ouro Preto (1964) Bozo Barreti (1956) Fogo Faixa 45 (CD 3) A música na mídia e no cinema Música e imagem De modo quase instintivo e natural, o ser humano associa sons a imagens e vice-versa. Já a tragédia grega utilizava, no desenrolar de sua narrativa, o acom- panhamento de um coro cantado e falado. Por ser uma arte maleável e flexível, a música pode se adaptar, assumir o sen- tido que se lhe quiser conferir, amoldando-se às diversas situações. As muitas maneiras de empregá-la são determinadas pelo valor e o resultado estético que se queira alcançar em cada produção. Por isso, ela é considerada um recurso valioso e expressivo à disposição do diretor cinematográfico. Sob esse ângulo, a música como recurso do cinema – além das possibilidades sonoras tradicionais – utiliza os ruídos e o silêncio, podendo ser este último um elemento de grande expressividade. Algumas manifestações, como por exemplo a música e o cinema, desenro- lam-se e se dissolvem no tempo. Esse aspecto de dissolução exige que o indiví- duo apreenda o seu significado enquanto a percepção está sendo construída. Como a cognição e a emoção estão intimamente ligadas, os recursos musicais como os timbres, as texturas, as dinâmicas, as formas, a expressividade, os an- damentos e outros são utilizados de maneira transversal para dar sentido mais 318 Universo sonoro atual amplo e expressivo ao filme. A ressonância da música na imagem, ou também da imagem na música, produz uma experiência estética no espectador/ouvinte, possibilitando uma transformação na sua percepção. O filme, feito de forma fragmentária, precisa ser montado para que o discurso cinematográfico tenha ordem. As diversas câmeras buscam narrar aspectos da subjetividade e da objetividade dos personagens e nos conduzem por épocas, lugares, fatos e sentimentos. Estamos expostos a uma alta manipulação, assegu- ra Almeida (1994). O poder de persuasão dos meios de comunicação, que se valem de imagens e sons, é que entre eles e os espectadores não se estabelece diálogo algum, não há possibilidade de divergência nem de interferência. Somente é possível uma reflexão, uma discussão após a exibição, sem a presença da outra parte, orienta- -nos Almeida (1994). O tempo que decorre em cada filme torna-se presente e atual, transformando os recursos técnicos do cinema em significantes sentidos que se entrelaçam e compõem a percepção real e verdadeira para o espectador. O filme é sempre uma aparição, pois estamos no escuro e nossos sentidos estão quase apagados ou esquecidos. Diante da luz na tela, surgem imagens, perso- nagens, objetos, lugares, épocas que nossos olhos irão captar como “outros”, di- versos de nós. Cinema mudo No cinema mudo, a música era necessária para ilustrar a ação e para abafar o som do projetor. Era costume ser executada por um pianista encarregado de criar ou enfatizar os climas narrativos da imagem. O músico improvisava sobre um repertório próprio conforme as cenas decorriam na tela. Em salas maiores, podiam-se encontrar pequenas orquestras tocando com partituras originais para o filme ou fragmentos dos clássicos. Essas orquestras excursionavam junta- mente com o filme. Em 1927, com a introdução do cinema falado, a música para o cinema passou a ser gravada na própria película, mas ainda demorou algum tempo para que esse recurso fosse plenamente aproveitado. A partir de 1940, a música no cinema foi reconhecida como forma especiali- zada e muitos compositores passaram a dedicar seu talento a ela. Universo sonoro atual 319 Charles Chaplin – Tempos Modernos. D om ín io p úb lic o. Chaplin Charles Chaplin foi o primeiro cineasta a se preocupar com a música certa para a ação corrente, compondo partituras para acompanhar seus filmes. Em 1936, ele dirigiu e interpretou Tempos Modernos, no qual utilizou a música para realçar as imagens, dando ritmo e clima próprios à história. Ele também compôs temas que se tornaram consagrados na literatura musical. Observe as diferentes situações vividas pelo personagem principal e como os recursos sonoros nos transportam com facilidade, permitindo que façamos parte da história: passa- mos de um ritmo frenético e agitado na fábrica para um momento de nostalgia e solidão, para em seguida nos depararmos com uma situação de perigo ou ter- nura, de forma alternada. Música incidental A música composta para uma produção dramática, filme, propaganda, pro- grama de rádio ou televisão, ou que é usada nesses meios, chama-se música in- cidental, orienta-nos Sadie (1994). No drama grego antigo, a música acompanhava os momentos significativos, as entradas e saídas dos personagens, assim como imitava efeitos da vida real e acentuava o simbolismo. Shakespeare ampliou o uso da música nas peças teatrais na Inglaterra e essa tradição cresceu repercutindo também nas comédias-balé de Molière e Lully. 320 Universo sonoro atual No século XVIII, Goethe e Schiller escreveram peças que previam músicas in- cidentais, sendo Beethoven e Weber dois dos compositores que as criaram. Schubert, Mendelssohn (para Sonho de uma Noite de Verão, de Shakespeare), Tchaikovsky e Prokofiev são compositores que, entre outros, deram contribuição notável à música incidental no século XIX. No século XX, foram mais visíveis as colaborações entre escritores e composi- tores, como a música de Stravinsky para a História do Soldado, de Ramuz. A partir dos anos 1930, os compositores encontraram um novo campopara a música incidental no cinema, no rádio, na televisão e no teatro. Ka pe ta n N ik ol io s. Vangelis. El Greco première. Vangelis O músico grego Evángelos Odysséas Papathanassíu, conhecido como Van- gelis (1943), compõe nos estilos neoclássico, progressivo, música eletrônica e música ambiente. Entre suas diversas composições mais conhecidas estão o tema vencedor do Oscar de 1981, para o filme Carruagens de Fogo; a trilha sonora do clássico Blade Runner; o tema da Copa do Mundo de 2002; e a trilha de 1492: A Conquista do Paraíso. Este é um filme biográfico de Cristóvão Colombo e sua música-tema é Conquest of Paradise. Nesta trilha, Vangelis utilizou uma com- binação de orquestra eletrônica, melodias folclóricas, coro vocal e influências renascentistas. Trilhas sonoras As trilhas sonoras, também chamadas de bandas sonoras, são um conjunto de peças musicais usadas em um filme comercial ou cinematográfico, ou também em uma peça teatral. Os compositores podem decidir por uma criação original Universo sonoro atual 321 para um determinado filme ou então incluir obras já existentes. O papel essen- cial da música cinematográfica é sugerir, acentuar e dar significado às imagens, ou então despertar a atenção do espectador para algum aspecto inusitado ou oculto do que ocorre na tela. A música terá a sua função de acordo com a concepção artística do filme: se o filme é pura diversão, a música terá um tratamento diferente daquele que busca outras pretensões. Na visão de Sá, [...] drama, comédia, ação, suspense ou ficção científica, criar música e sonoplastia para cinema é estabelecer o ritmo emocional por meio do qual o espectador irá compartilhar, com os autores, as situações da trama. Movido pela música, o público criará vínculos mais profundos com os sentimentos dos personagens e poderá até atravessar seus olhares e gestos, chegando a trocar de lugar com eles na tão necessária empatia. (SÁ, 2003, p. 108-109) A música pode funcionar como elemento unificador psicoemocional, aparecen- do em momentos-chave, envolvendo e ligando sutilmente o filme todo no mesmo tom psicológico ou emotivo. Em Morte em Veneza, Luchino Visconti utilizou o Ada- gietto da Quinta Sinfonia de Mahler. Alfred Hitchcock deu papel de importância à música no filme O Homem que Sabia Demais e com isso valorizou a película. D iv ul ga çã o D is ne y. O Rei Leão. Cinema de animação A história da música dos desenhos animados está ligada ao nome de Carl Stalling, que trabalhou por vinte anos nos estúdios de animação Warner Bross. Stalling buscou aproximar a música da animação visual, produzindo uma fusão entre melodia, estilo e forma, ligando intensamente som e imagem. O filme Fantasia, de Walt Disney, revela a capacidade significante da música: a ação dos personagens animados do desenho está subordinada à narrativa da música. 322 Universo sonoro atual Um dos recursos usados para associar música à imagem é o leitmotiv, que relaciona uma célula musical (motivo, tema ou frase) a um personagem. Temos alguns exemplos dessa aplicação nos desenhos infantis como O Rei Leão, com a música de Hans Zimmer: diferentes temas musicais caracterizam as figuras cen- trais da história. Pedro e o Lobo Assista à versão em desenho animado feita a partir de Pedro e o Lobo (1936), poema sinfônico de Sergei Prokofiev. Essa história é contada por meio da música com o objetivo pedagógico de mostrar às crianças e aos jovens as sonoridades dos diversos instrumentos. Os personagens são assim representados: pássaro – flauta; � pato – oboé; � gato – clarinete; � avô – fagote; � lobo – três trompas; � caçadores – tímpano e bombo; � Pedro – instrumentos de corda. � O compositor russo Sergei Prokofiev (1891-1953) escreveu a história de Pedro e o Lobo para ser narrada e orquestrada. Trata-se de um conto musical em que cada personagem é representado pelo som de um instrumento, que executa determinado tema e assim permite o reconhecimento dos vários sons de uma orquestra. A história acontece na floresta, onde Pedro vive com seu avô, que o alerta sobre o perigoso lobo. Mas Pedro resolve capturá-lo e conta com a ajuda de seus três amigos: o pássaro, o gato e o pato. Depois de muitas dificuldades, eles prendem o lobo, que é transportado pelos caçadores. Outros instrumentos também participam da execução da obra: triângulos, castanholas, pratos, tambor, trombone e trompete. Universo sonoro atual 323 Música especializada Nos filmes de espionagem, a música se tornou quase inseparável da própria produção cinematográfica, assim como nos filmes de James Bond, o Agente 007, com a criação de John Barry. A música pode ter um caráter eminentemente especializado, indicando a na- tureza de sua função, evocando e caracterizando determinada região, país etc. Também pode caracterizar um período cronológico determinado, como música de época. Alguns filmes conseguem divulgar amplamente peças compostas anterior- mente, mas desconhecidas do público. Neste caso temos, por exemplo, o filme 2001: Uma Odisseia no Espaço, que popularizou o poema sinfônico Assim Falou Zaratustra, de Richard Strauss (1864-1949), composto em 1896, baseado no livro homônimo do filósofo Friedrich Nietzsche. Nos filmes de faroeste, isto é, nos westerns, Ennio Morricone levou o som do ambiente para a orquestra. No filme Três Homens em Conflito ou O Bom, o Mau e o Feio (Il Buono, il Brutto, il Cattivo, de 1966), ele utiliza as notas Lá e Ré em semicol- cheias sucessivas, traduzindo o som do coiote por meio de um clarinete. A força do ambiente hostil é reconstituída pelos sons fortes do coro. Alguns autores de Trilhas Sonoras: Prokofiev – � Alexandre Nevski; Pedro e o Lobo; Vangelis – � Blade Runner; 1492; John Williams – � Harry Potter; Jurassic Park; Caçadores da Arca Perdida; Con- tatos Imediatos do Terceiro Grau; Guerra nas Estrelas; Tubarão; Superman; Poltergeist; Et, o Extraterrestre; Hans Zimmer – � Rei Leão; James Horner – � Titanic; Richard Strauss – � 2001: Uma Odisseia no Espaço (foi utilizado o seu poema sinfônico Assim Falou Zaratustra). 324 Universo sonoro atual Um novo ambiente acústico Mozart – � Elvira Madigan (foi utilizado o seu Concerto n. 20 para piano); Elton John – � Caminho para Eldorado; Trevor Jones – � Dança com Lobos; Excalibur; Danny Elfman – � Homem-Aranha; Simpsons; Carl Stalling – � Tom e Jerry; Pernalonga; Aventuras com Papa-léguas; Quincy Jones – � A Cor Púrpura. Qual é a relação entre os homens e os sons de seu ambiente e o que acon- tece quando os sons se modificam? Sonoplastia Os sons utilizados nas cenas, e que podem ser independentes destas, com- põem a sonoplastia, que visa explorar os recursos expressivos do som. A música, o silêncio e os ruídos têm grande poder de sensibilização e atuam sobre a per- cepção do ouvinte/espectador, despertando e intensificando sentimentos liga- dos à alegria, à melancolia, à tensão, ao suspense, à ação, à beleza, ao heroísmo etc. A sonoplastia é utilizada em comerciais de televisão, rádio, cinema, em peças teatrais e em filmes. O compositor trabalha na trilha a partir do roteiro, observando quais as inten- ções do diretor do projeto, para qual finalidade se destina e como será veiculado (rádio, cinema, televisão, DVD etc.). Depois disso é feita a decupagem, que visa determinar o tempo exato do que deve ser trilhado, determina como a música fará seus crescendos, que emoções deverá provocar e que aspectos assumirá. Não somos nós os compositores e executantes encarregados de dar forma e beleza ao nosso mundo? Estamos vivendo em um ambiente em que a paisagem sonora está mudando por causa dos avanços tecnológicos e das novas maneiras de viver. Isso influi na qualidade e na intensidade dos sons, sejam eles novos ou velhos. Essa interfe- Universo sonoro atual 325 rência acontece de forma indiscriminada e imperialista causando o que deno- minamos poluição sonora. Em consequência desse fenômeno, que é de ordem mundial,estamos sofrendo alterações, isto é, perdas significativas na nossa audi- ção, um dos sentidos básicos do conhecimento. Podemos, inclusive, estar cami- nhando para uma surdez universal caso não revertamos esse quadro, afirmam os especialistas. Schafer (2001) afirma que, em várias partes do mundo, estão sendo feitas muitas pesquisas nas áreas de acústica, psicoacústica, otologia (ramo da medicina que estuda a anatomia, a fisiologia e a patologia do ouvido), práticas e procedimentos internacionais de controle do ruído, engenharia de registros sonoros (música eletroacústica e eletrônica), percepção de padrões auditivos e análise estrutural da linguagem e da música. A pergunta que os estudiosos fazem é: Qual é a relação entre os homens e os sons de seu ambiente e o que acontece quando os sons se modificam? Acústica ambiental A acústica ambiental é uma abordagem positiva, que visa despertar para a responsabilidade de preservar, encorajar e multiplicar os sons com os quais que- remos conviver. Quando soubermos defini-los, os sons desagradáveis e destru- tivos serão claramente apontados e teremos formas de eliminá-los. A campanha de limpeza sonora deve ser iniciada já, para que tenhamos não os ouvidos amor- tecidos e sim o que Schafer (2001) denomina clariaudiência. O estudo da paisagem sonora envolve a ciência, a sociedade e as artes. Por meio da acústica e da psicoacústica, conhecemos as propriedades físicas do som e sabemos como ele é interpretado pelo cérebro humano. A vida em sociedade nos mostra como o homem se comporta com os sons e como esses afetam e modificam o seu comportamento. As artes, em especial a música, demonstram de que modo o homem cria paisagens sonoras, expressando o seu pensamento e o seu sentir, afirma Schafer (2001). Diante desse conjunto de dados interculturais, deveremos questionar, jun- tamente com Schafer (2001), se “Não somos nós os compositores e executantes encarregados de dar forma e beleza ao nosso mundo?”. Em busca de uma ecologia sonora A paisagem sonora atual não é um resultado acidental da sociedade: ela é feita deliberadamente por seus construtores e nela encontramos aspectos belos 326 Universo sonoro atual e também desagradáveis. O aumento da população não é necessariamente a causa do excesso de ruídos que perturbam a todos, mas sim o resultado de uma sociedade ocidental, que trocou os ouvidos pelos olhos – assegura-nos Schafer (2001), que ainda faz referência aos bares tradicionais e às cidades do Oriente Médio, onde um grande número de pessoas conduz silenciosamente seus negó- cios sem se perturbarem mutuamente. O esforço deve envolver a todos para que possamos reaprender como os sons podem ser reorganizados de modo que possam ser ouvidos, como se fossem parte de uma grande orquestração. É importante que haja respeito pelo ouvido e pela voz, conhecimento dos ritmos e tempos da paisagem sonora natural, compreensão e busca de um equilíbrio nessa paisagem, sugere Schafer (2001). O equilíbrio e a harmonia devem ser buscados entre o som e o não som, entre os sons tecnológicos e os sons humanos, entre sons artificiais e sons naturais e entre sons de baixa, média ou alta frequência. Uma das funções da música é abrir novos modos de percepção, visando ao engajamento da sociedade na obra de preservação e reconstrução sonora do ambiente. Entre as sugestões está a de determinar os marcos sonoros de des- taque de uma comunidade e lutar por sua preservação. Claro que se fará isso se houver bons motivos para tanto, assinala Schafer (2001). Esses marcos fazem parte da memória das pessoas do lugar e não devem ser apagados – como por exemplo os sinos das igrejas, os relógios nas praças, os apitos, buzinas e outros elementos, que devem ser escolhidos pelos próprios habitantes como os sons significativos e fundamentais em suas vidas. Esses sons necessitam de proteção porque são lembranças sonoras e não devem ser destruídos por interesses ex- ternos ao próprio local. Algumas grandes cidades já utilizam um sinal sonoro para passagem do pedestre no trânsito, mas que ainda está distante de ser agradável e eficiente: poderiam ser planejados pequenos trechos musicais que pudessem cobrir sua função de forma estética. Os sons não precisam ser monótonos, pois podem ser fortes e divertidos. Água e ar Os sons que quiséssemos ouvir poderiam ser planejados com elementos na- turais como a água, que, à medida que escorre por diferentes materiais (como madeiras, bambus, metais, pedras cortadas, conchas e suas ampliações), ou por Universo sonoro atual 327 uma roda-d’água, produz diferentes sonoridades e andamentos, transforman- do-se em um “concerto de água”, sugere Schafer (2001). O vento também produz efeitos sonoros naturais provenientes, por exemplo, de carrilhões de vento feitos de vidro, conchas, bambu ou madeira. Esses carri- lhões podem ser colocados em jardins como atração sônica. Outros materiais naturais podem constituir instrumentos para serem tocados pelo público e po- deriam ficar nos jardins e parques para que a comunidade pudesse se reunir e tocar em conjunto. Devemos ser os guardiões da ecologia sonora encontrando reforços de sons naturais e também buscando o silêncio: precisamos de períodos de quietude para recobrar a tranquilidade mental e espiritual. Nas cidades, os espaços onde as pessoas podem ficar em silêncio estão dentro das igrejas e das bibliotecas, talvez das suas casas. Ou então esses espaços estão no campo. Na sua origem, os dias santos e os domingos eram para meditação e quietude, mas hoje se tor- naram dias de diversão. A reconquista do silêncio nos permite vê-lo como um estado positivo e feliz em si mesmo, como um pano de fundo para as nossas ações: esse é o silêncio da plenitude e da perfeição. “Silenciar o barulho da mente: tal é a primeira tarefa – depois tudo o mais virá a seu tempo.” Schafer Texto complementar O canto dos pássaros Quando canta, o pássaro se expressa ou manifesta um sentimento espe- cífico de alguma forma. Um experiente ornitólogo (estudioso de aves) re- conhece o canto de um pássaro de determinada espécie mesmo sem vê-lo – por exemplo, um pássaro oculto em uma floresta. As aves canoras – isto é, as aves que cantam harmoniosamente – possuem um linguajar próprio e são estudadas nos laboratórios de bioacústica. Nesses laboratórios que investi- gam produções sonoras, especialmente dos animais, os pesquisadores exa- minam cuidadosamente as vozes dos pássaros para melhor compreenderem o fenômeno da vocalização. 328 Universo sonoro atual Assim, sabemos que as aves conseguem a maravilhosa façanha de emitir 45 notas por segundo e algumas chegam a prolongar seu canto por sete mi- nutos. Isso é possível porque elas respiram enquanto cantam, o que resulta no ritmo de sua melodia. Alguns pássaros produzem música “instrumental” pelo estalar de seus bicos ou o chocar de suas penas. O pássaro canoro tem no seu código genético as instruções que lhe possi- bilitam emitir manifestações sonoras básicas, como gritos ou pios. Mas, para aprender a cantar, ele necessita de um estímulo social que se dá por parte de indivíduos adultos da mesma espécie: sem esses indivíduos, os pássaros jovens não aprendem os cantos. Pesquisadores afirmam que um pássaro jovem necessita de cerca de cem dias para dominar a vocalização caracterís- tica de sua espécie. E esse aprendizado também se dá em relação ao entorno, ao ambiente em que vive a ave. Estudiosos da Universidade de Leiden, na Holanda, desco- briram que as aves canoras modificam sua forma de cantar quando habitam as cidades. Em comparação com os espécimes que vivem na floresta, as aves citadinas cantam temas mais curtos, mais acelerados, e o fazem em uma fre- quência mais alta e aguda. Citadinos ou não, os pássaros canoros mais admirados atualmente no Brasil são o curió ou avinhado, o bicudo, o trinca-ferro, o coleira ou papa- -capim e o canário-da-terra. Instrumentos desconhecidos: adufe Instrumento de percussão demembrana dupla, o adufe é um raro pan- deiro de formato quadrangular resultado da influência árabe. Um quadra- do em madeira é coberto dos dois lados por peles de carneiro ou cabra e no seu interior são colocados objetos que produzem som ao serem mo- vimentados. Em Portugal, o adufe é tradicional em Monsanto e na Beira Baixa, onde é tocado exclusivamente por mulheres. Na região de Trás-os- -Montes, o adufe tem a designação de pandeiro. É utilizado também no Brasil, certamente por influência dos portugueses. Para ser tocado, ele é segurado com as duas mãos, com um dos cantos virados para cima. As mãos tocam uma das peles enquanto sustentam o instrumento. Universo sonoro atual 329 IE SD E Br as il S. A . Referências ALMEIDA. Milton José de. Imagem e Sons: a nova cultura oral. São Paulo: Cortez, 1994. GIORGETTI, Mauro. Da Natureza e Possíveis Funções da Música no Cinema. Disponível em: <www.mnemocine.com.br/cinema/somtextos/trilhasonora. htm>. Acesso em: 8 fev. 2008. JOHANN Sebastian Bach. Disponível em: <www.oliver.psc.br/compositores/ bach.htm>. Acesso em: 8 fev. 2008. SÁ, Sérgio. 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Anotações Katia Renner MusicalCulturaCulturaMusical C ul tu ra M usi cal Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-85-387-2890-0 Cultura Musical_indd.indd 1 12/4/2012 14:46:55 Página em branco Página em branco