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BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 02 Apresentação da Disciplina 3 1. Proteína 5 Aminoácidos 5 Conformação estrutural da proteína 9 Digestão das proteínas 12 Absorção intestinal de aminoácidos, dipeptídeos e tripeptídeos 14 Metabolismo de proteínas – anabolismo e catabolismo 15 2. Carboidrato 19 Glicose 23 Ciclo de Krebs e cadeia transportadora de elétrons Erro! Indicador não definido.5 Cadeia transportadora de elétrons 28 Cálculo do ATP aeróbio 30 Glicogênese e glicogenólise 30 3. Referências Bibliográficas 32 3 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA Objetivo da disciplina Discutir, com base em evidências científicas, sobre a bioquímica e o metabolismo dos macronutrientes. Objetivos específicos Discutir a bioquímica e o metabolismo das proteínas. Discutir a bioquímica e o metabolismo dos carboidratos. Habilidades e competências a serem alcançadas Compreender aspectos relacionados à bioquímica e ao metabolismo dos macronutrientes, especialmente proteínas e carboidratos. Ementa da disciplina A disciplina aborda os principais aspectos acerca da bioquímica e do metabolismo dos macronutrientes, especialmente proteínas e carboidratos. As informações apresentadas são baseadas em evidências científicas bem consolidadas. 04 5 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 1. PROTEÍNA A proteína foi o primeiro nutriente considerado indispensável para o organismo. Assim como os lipídios e os carboidratos, possui átomos de carbono, hidrogênio e oxigênio em sua composição, entretanto, é a única que possui átomos de nitrogênio (16%), enxofre e alguns outros minerais, como fósforo, ferro e cobalto. As proteínas são formadas por combinações de aminoácidos proteinogênicos em diversas proporções, cumprindo funções estruturais, reguladoras, de defesa, de transporte nos fluidos biológicos, entre outras. Diversos fatores podem influenciar a biodisponibilidade de proteínas, como a conformação estrutural, a presença de compostos antinutricionais, o efeito das condições de processamento, a interação com outros nutrientes, entre outros. Logo, na avaliação da qualidade nutricional de proteínas, não se deve considerar apenas sua composição de aminoácidos indispensáveis, mas principalmente a capacidade de utilização destes pelo organismo. Em vista da importância desta temática no contexto da Nutrição, a presente seção abordará aspectos importantes no que concerne à bioquímica e ao metabolismo das proteínas. Aminoácidos 6 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 5. Os aminoácidos representam a unidade estrutural básica das proteínas e são constituídos por um átomo de carbono-α ligado covalentemente a um átomo de hidrogênio, a um grupamento amino (contendo nitrogênio), a um grupamento carboxila e a um grupamento lateral (grupo R), sendo este responsável pela caracterização do aminoácido em relação as diferentes propriedades físico- químicas. Figura: Configuração D e L da alanina em comparação ao gliceraldeído. De acordo com o arranjo tetraédrico dos ligantes do carbono- α, estes quatro grupamentos podem ocupar dois diferentes arranjos espaciais (estereoisomeria). A isomeria óptica dos aminoácidos é especificada pelo sistema D/L (dextrogiro/levogiro), no qual essas moléculas estão alinhadas a configuração absoluta do D- gliceraldeído ou do L-gliceraldeído. Em proteínas, os aminoácidos são exclusivamente estereoisomeros L, enquanto os estereoisomeros D são encontrados apenas em pequenos peptídeos, como na parede celular bacteriana e em peptídeos antibióticos. Os aminoácidos podem ser classificados em diversas categorias, de acordo com suas propriedades físico-químicas e nutricionais. Com base na capacidade de interação das cadeias laterais com a água, os aminoácidos podem apresentar características hidrofóbicas ou hidrofílicas. A polaridade da cadeia lateral do aminoácido, que poderá ser alterada por vários fatores, determinará seu comportamento em solução e sua tendência em reagir com outros componentes presentes tanto nos alimentos quanto no trato gastrintestinal. Do ponto de vista nutricional, os aminoácidos podem ser classificados como indispensáveis, condicionalmente indispensáveis e dispensáveis. Os aminoácidos indispensáveis são aqueles que não são sintetizados pelo organismo humano, devendo ser obtidos por meio da dieta. Por outro lado, os dispensáveis podem ser produzidos endogenamente a partir de substâncias disponíveis para as 7 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 5. células, em uma velocidade proporcional à demanda para atender ao crescimento normal. Os aminoácidos condicionalmente indispensáveis são aqueles que podem ser essenciais ao organismo em determinado estado fisiológico de desenvolvimento ou em uma condição clínica específica. Como exemplo, destaca-se a glutamina, o aminoácido mais abundante do organismo, normalmente considerada dispensável, porém, em determinadas condições patológicas, como na sepse, é considerada como indispensável, tendo em vista que nestes casos a síntese endógena não é capaz de suprir a demanda orgânica. HIDROFÓBICOS HIDROFÍLICOS Apolares com cadeias laterais alifáticas: Alanina, isoleucina, leucina, metionina, prolina e valina. Polares carregados: Ácido aspártico, ácido glutâmico, arginina, histidina e lisina. Apolares com cadeias laterais aromáticas: Fenilalanina, triptofano e tirosina. Polares não carregados: Serina, treonina, asparagina, glutamina, glicina e cisteína. Quadro: Aminoácidos hidrofóbicos e hidrofílicos. Indispensáveis Condicionalmente indispensáveis Dispensáveis Fenilalanina Triptofano Valina Leucina Isoleucina Metionina Treonina Lisina Selenocisteína Glicina Prolina Tirosina Serina Cisteína Cistina Taurina Arginina Histidina Glutamina Alanina Ácido Aspártico Ácido Glutâmico Asparagina Quadro: Classificação nutricional dos aminoácidos. 8 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 5. Antigamente, pensava-se que existiam apenas 20 aminoácidos proteinogênicos, porém, evidências indicaram a existência de outros dois aminoácidos – a selenocisteína (21º aminoácido) e a pirrolisina (22º aminoácido). Não obstante, estudos estão sendo desenvolvidos com o intuito de investigar a possibilidade da existência de mais aminoácidos proteinogênicos. Proteínas são moléculas orgânicas formadas a partir da ligação peptídica entre aminoácidos, sendo sua estrutura constituída de diferentes combinações de aminoácidos proteinogênicos, resultando em moléculas com ampla diversidade funcional. As proteínas podem ser classificadas sob diferentes critérios, como de acordo com a sua função, estrutura e composição: Função As proteínas podem desempenhar diversas funções de acordo com o perfil aminoacídico de sua composição, como hormônios (insulina), enzimas (tripsina), proteínas contráteis (actina e miosina), proteínas estruturais (colágeno), proteínas de reserva nutritiva (caseína), entre outras. Estrutura Dependendo da sua conformação, isto é, sua configuração espacial, as proteínas podem apresentar diferentes níveis de complexidade estrutural, desde a mais simples (primária) até a mais complexa (quaternária). Composição Classificadas a partir do produto de sua hidrólise, podendo ser simples, quando resultam somente em aminoácidos, ou compostas, quando também liberam outros componentesorgânicos ou inorgânicos, designados como grupos prostéticos. Especificamente em relação à biodisponibilidade, a classificação de maior interesse é a que considera a qualidade nutricional da proteína, definida pelo seu conteúdo de aminoácidos indispensáveis. De acordo com essa classificação, as proteínas podem ser: completas, parcialmente incompletas ou totalmente incompletas. Exemplos de proteínas completas são aquelas derivadas de 9 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 5. alimentos de origem animal, como carnes, peixes, aves, leite e ovos, que apresentam todos os aminoácidos indispensáveis em quantidades adequadas ao crescimento e manutenção do organismo. As proteínas parcialmente incompletas são as que fornecem aminoácidos em quantidade suficiente apenas para a manutenção orgânica, como algumas proteínas provenientes de leguminosas, oleaginosas e cereais. As leguminosas são as mais adequadas, contendo de 10 a 30% de proteínas, eventualmente apresentando alguma deficiência em aminoácidos sulfurados, como metionina e cisteína. Os cereais apresentam teor proteico menor que as leguminosas, de 6 a 15% em média, sendo geralmente deficientes em lisina. Apesar da deficiência em aminoácidos indispensáveis específicos, as proteínas vegetais contribuem consideravelmente para a ingestão proteica total da população, uma vez que representam as fontes proteicas de menor custo e, portanto, de maior consumo, sobretudo nos países de menor nível socioeconômico. Além disso, na dieta normal de um indivíduo, vários tipos de alimentos são consumidos simultaneamente, podendo ocorrer um efeito complementar em termos de aminoácidos indispensáveis. Desse modo, o consumo de cereais (arroz, trigo, milho) e leguminosas (feijão, soja, ervilhas) em uma mesma refeição e em proporções balanceadas pode apresentar valor nutricional, do ponto de vista proteico, equivalente àquele apresentado pelas proteínas de origem animal. Por fim, proteínas totalmente incompletas, como a gelatina e a zeína, seriam aquelas que não fornecem aminoácidos indispensáveis em quantidade suficiente nem mesmo para a manutenção do organismo. Conformação estrutural da proteína Embora a composição de aminoácidos indispensáveis seja um indicador da qualidade nutricional de uma proteína, a extensão pela qual o organismo irá utilizá-los dependerá inicialmente do resultado da ação de enzimas proteolíticas na hidrólise da cadeia polipeptídica. Esse processo caracteriza a digestibilidade, que é a proporção de nitrogênio ingerido que será absorvida após a ingestão. A conformação estrutural de uma proteína influencia sua hidrólise pelas proteases. Proteínas nativas são, em geral, hidrolisadas em menor proporção que proteínas parcialmente desnaturadas. As 10 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 5. proteínas podem apresentar quatro níveis de configuração estrutural: Estrutura primária Fonte: http://lamoreabio2.blogspot.com/2014/12/proteinas- estrutura-e-funcoes.html Refere-se à sequência linear na qual os aminoácidos que constituem a cadeia estão unidos por ligações covalentes, conhecidas por ligações peptídicas, sendo que nessa sequência todos os resíduos de aminoácidos apresentam-se na configuração L. Estrutura secundária Fonte: http://lamoreabio2.blogspot.com/2014/12/proteinas- estrutura-e-funcoes.html É o arranjo espacial dos átomos da cadeia polipeptídica no qual dois padrões de repetição são possíveis, isto é, alfa-hélice ou folha pregueada, em geral estabilizada por pontes de hidrogênio. O percentual da cadeia polipeptídica assume, em cada uma dessas estruturas, uma característica específica da proteína. Estrutura terciária 11 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 5. Fonte: http://lamoreabio2.blogspot.com/2014/12/proteinas- estrutura-e-funcoes.html Refere-se ao arranjo espacial da cadeia polipeptídica obtida da interação de regiões com estrutura regular (alfa-hélice ou folha pregueada). Do ponto de vista energético, a formação dessa estrutura envolve a otimização de várias interações (hidrofóbicas, eletrostáticas, van der Waals e pontes de hidrogênio), de forma que a energia livre das moléculas seja a mínima possível. O arranjo geométrico mais importante que acompanha a redução da energia livre, durante a formação da estrutura terciária, é o posicionamento da maioria dos resíduos hidrofóbicos no interior da estrutura proteica, assim como dos resíduos hidrofílicos, especialmente aqueles carregados nas interfaces externas. Estrutura quaternária Fonte: http://lamoreabio2.blogspot.com/2014/12/proteinas- estrutura-e-funcoes.html Trata-se da configuração espacial de proteínas formadas por várias cadeias polipeptídicas iguais ou diferentes. A formação dessas estruturas oligoméricas é o resultado de interações “proteína- proteína” específicas, estabilizadas por pontes de hidrogênio, interações hidrofóbicas e eletrostáticas. A importância da estrutura proteica na biodisponibilidade de aminoácidos para o organismo está relacionada, sobretudo, ao acesso das enzimas digestivas (proteases) à cadeia polipeptídica, uma vez que quanto menor a complexidade estrutural, mais fácil se torna a ação dessas enzimas proteolíticas na clivagem de ligações peptídicas específicas, com consequente liberação de peptídios e aminoácidos para o processo de absorção. 12 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 5. Um dos fatores que alteram a conformação espacial das proteínas a partir de seu estado nativo é o processo conhecido como desnaturação. Nele, a ação de diferentes agentes químicos ou físicos, como temperatura, irradiação, pressão, solventes orgânicos, pH e outros, têm por consequência a ruptura das interações que mantêm as estruturas mais complexas que envolvem as cadeias polipeptídicas. Desse modo, promove o “desenrolamento da molécula” e reduz a configuração original nativa a uma estrutura linear, dependendo do agente desnaturante utilizado e da intensidade do processo de desnaturação. Logo, pode-se afirmar que, em geral, a desnaturação sob condições controladas facilita o acesso das enzimas proteolíticas à cadeia polipeptídica, resultando no aumento de sua digestibilidade e na melhor utilização de seus aminoácidos pelo organismo. Além disso, o tratamento térmico traz efeitos benéficos, incluindo a inativação de toxinas de origem proteica, como a toxina botulínica produzida pelo Clostridium botulinum e a enterotoxina do Staphylococcus aureus, a inativação de enzimas responsáveis por alterações sensoriais negativas, o aumento da vida útil do alimento, entre outros. Digestão das proteínas Fonte: http://www.atletaveg.com.br/proteina-saude- ganho-de-massa-magra/ A digestão das proteínas começa no estômago, com a pepsina secretada no suco gástrico, seguida pela ação das enzimas proteolíticas provenientes do pâncreas e da mucosa do intestino delgado. Essas enzimas não são secretadas na forma ativa, senão como proenzimas ou zimogênios. Posteriormente, pela ação de outros compostos, são ativadas pela perda de uma pequena parte da cadeia 13 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 5. polipeptídica por meio de uma hidrólise parcial. Assim, por exemplo, o ácido clorídrico do estômago desnatura as proteínas e transforma o pepsinogênio em pepsina. Esta enzima inicia a clivagem das proteínas dos alimentos, principalmente as ligações peptídicas que envolvem aminoácidos aromáticos e leucina. As proenzimas pancreáticas são ativadaspela enteroquinase do suco intestinal, que transforma o tripsinogênio em tripsina por meio de hidrólise. Esse processo é continuado por uma ativação em cascata das outras proenzimas pancreáticas pela ação da tripsina. A secreção de enzimas proteolíticas parece ser regulada pela presença de proteína da dieta no intestino delgado. Algumas plantas, como feijão e soja crus, possuem inibidores de tripsina que inibem a tripsina intestinal e estimulam, em consequência, a secreção de mais proteína pelo pâncreas, produzindo alterações metabólicas que resultam até mesmo em redução do crescimento. Esses fatores antinutricionais devem ser inativados termicamente e sua presença deve ser controlada, sobretudo em produtos industrializados. Os eventos que ocorrem no intestino durante a digestão de proteínas estão bem estabelecidos. As enzimas do suco pancreático mostram uma grande especificidade, especialmente nas ligações adjacentes à lisina ou à arginina (tripsina) ou em aminoácidos aromáticos (quimotripsina) e, ainda, nos que contêm aminoácidos alifáticos neutros (elastase). Entre as exopeptidases, ou enzimas que liberam aminoácidos da cadeia polipeptídica, incluem-se as carboxipeptidases, que liberam o aminoácido com a carboxila livre, e as aminopeptidases, que liberam aqueles com os grupos NH2 livres. As aminopeptidases e as dipeptidases são sintetizadas nas microvilosidades da mucosa intestinal e completam a digestão dos peptídeos em aminoácidos. Junto com estes, existe também absorção direta de dipeptídios nas células da mucosa intestinal. Todo esse processo é controlado primeiro pela chegada do alimento ao trato intestinal e pela presença dos diferentes hormônios gastrintestinais responsáveis pela estimulação das secreções do suco gástrico, pancreático e intestinal. Entre esses hormônios, é necessário ressaltar, sobretudo, a gastrina do estômago, a secretina e a colecistoquinina-pancreozimina secretadas pelas células da mucosa 14 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 5. intestinal, ao lado de outros hormônios gastrintestinais locais. Absorção intestinal de aminoácidos, dipeptídeos e tripeptídeos Grande parte da proteína que entra no intestino, de origem dietética ou endógena, é digerida e absorvida na forma de aminoácidos. A absorção intestinal de aminoácidos ocorre por diversos sistemas: (i) transferência passiva por difusão simples, que é o sistema de absorção predominante para aminoácidos hidrofóbicos (como: glicina, alanina, valina, leucina e prolina), sendo dependente do gradiente de concentração; (ii) cotransporte, como o cotransporte com o sódio (Na+), que é um dos sistemas preferenciais para a absorção de aminoácidos na bordadura em escova; (iii) transferência passiva por difusão facilitada, considerado como o principal sistema de transporte dos aminoácidos do enterócito para a circulação sanguínea, entre outros. É válido salientar que a absorção intestinal (transportadores) depende das características de cada aminoácido, sendo, portanto, variável em relação à forma de transporte e à velocidade de absorção. Aminoácidos com características químicas similares podem competir pelos mesmos transportadores, afetando a absorção uns dos outros, por exemplo: o triptofano pode inibir a absorção de histidina, a fenilalanina pode inibir a absorção de triptofano e a leucina pode inibir a absorção de isoleucina. Em contrapartida, alguns aminoácidos, como a glicina, apresentam afinidade por diversos transportadores intestinais, favorecendo sua absorção. Até o início da década de 50, acreditava-se que os aminoácidos eram os únicos produtos da digestão de proteínas, porém, estudos evidenciaram que uma grande proporção de dipeptídeos e tripeptídeos é gerada após a digestão de proteínas. Estes compostos são absorvidos por transportadores intestinais de dipeptídeos e tripeptídeos, como o transportador de oligopeptídeos 1 (PepT-1), de forma mais rápida e eficiente quando comparada a absorção de aminoácidos livres. O PepT-1 está presente na membrana apical dos enterócitos, sendo encontrado em todos os organismos vivos (de bactérias a humanos) e tendo como substratos cerca de 400 dipeptídeos e 8.000 tripeptídeos. Rogero et al. (2004) administraram glutamina livre e o dipeptídeo L-alanil-L-glutamina (forma conjugada dos aminoácidos glutamina e alanina) para ratos e observaram que, 30 minutos após a 15 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 5. suplementação, a concentração de glutamina no plasma era significativamente maior no grupo suplementado com o dipeptídeo (2.56±0.46 mmol/L) comparado com os animais que receberam glutamina livre (2.03±0.23 mmol/L). Os autores atribuíram estes resultados ao fato de dipeptídeos serem absorvidos de forma mais rápida e eficaz por meio do transportador PepT-1, quando em comparação ao transporte de aminoácidos livres. Metabolismo de proteínas – anabolismo e catabolismo Após a absorção intestinal, os aminoácidos são transportados diretamente ao fígado pelo sistema porta. Esse órgão exerce um papel importante como modulador da concentração de aminoácidos plasmáticos. Cerca de 20% dos aminoácidos que entram no fígado são liberados para a circulação sistêmica, cerca de 50% são transformados em ureia e 6%, em proteínas plasmáticas. Os aminoácidos liberados na circulação sistêmica são depois metabolizados pelos músculos esqueléticos, pelos rins e por outros tecidos O fígado é o órgão regulador do catabolismo de aminoácidos indispensáveis, com exceção dos de cadeia ramificada, que são oxidados principalmente no músculo esquelético. No fígado, parte dos aminoácidos é usada na síntese de proteínas que são secretadas, como albumina e fibrina, e na síntese de proteínas de vida média mais curta, como enzimas, necessárias ao catabolismo dos aminoácidos que ficam na própria célula hepática. O destino do aminoácido em cada tecido varia de acordo com as necessidades fisiológicas daquele tecido, havendo um equilíbrio dinâmico das proteínas tissulares com os aminoácidos ingeridos pela dieta e os aminoácidos circulantes. O corpo de um adulto de 70 kg contém por volta de 10 a 13 kg de proteína, que estão distribuídos nos diferentes tecidos do organismo. Não há reservas de proteínas em humanos, logo, sua perda resulta em alterações da estrutura celular, prejudicando a funcionalidade dos tecidos. A maior parte da proteína do organismo é encontrada no músculo esquelético e em menor parte no pool de proteínas viscerais. Este último compreende tanto as proteínas presentes no soro, quanto as provenientes do fígado, rins, pâncreas e coração. As proteínas do músculo esquelético, denominadas também de proteínas somáticas, e as proteínas das vísceras constituem as proteínas disponíveis do organismo. As outras proteínas componentes do organismo são encontradas no 16 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 5. tecido conectivo intracelular e na estrutura não celular da cartilagem. Há um processo dinâmico contínuo de síntese e catabolismo proteico, específico em cada tecido, denominado como turnover proteico. A vida média de uma proteína corresponde ao tempo que o organismo leva para renovar a metade da quantidade dessa proteína. Certas enzimas intracelulares têm vida média de algumas horas, já a hemoglobina, por exemplo, tem vida média de 120 dias e o colágeno, cerca de 365 dias. A velocidade do turnover proteico depende da função da proteína e do tipo de tecido ou órgão. A taxa média diária de proteína renovada no adulto é da ordem de 3%do total proteico do organismo. Na pele, perdem-se e renovam-se 5 g de proteínas por dia; no sangue, 25 g; no trato intestinal, cerca de 70 g e no tecido muscular, ao redor de 75 g por dia. Para a síntese proteica, é necessário que todos os aminoácidos proteinogênicos estejam disponíveis ao mesmo tempo. Todos os indispensáveis devem estar presentes, enquanto os dispensáveis devem ser fornecidos como tal, ou pelo menos o esqueleto carbônico e grupos amino, derivados de outros aminoácidos, devem estar disponíveis pelo processo de transaminação. A síntese de uma proteína é controlada a nível celular pelo ácido desoxirribonucleico (DNA), o material genético (genes) do núcleo celular. O DNA funciona como molde para a síntese de várias formas de ácido ribonucleico (RNA) que participam da síntese proteica. Com relação ao catabolismo de proteínas e aminoácidos, antes da oxidação do esqueleto carbônico do aminoácido, o grupo amino deve ser separado. Esse processo é realizado pela desaminação oxidativa, com consequente formação do cetoácido, processo que ocorre principalmente no fígado. O esqueleto carbônico é convertido nos mesmos compostos intermediários formados durante o catabolismo da glicose e dos ácidos graxos. Esses compostos podem ser transportados para tecidos periféricos, os quais entram no ciclo de Krebs para produzir adenosina trifosfato (ATP). Podem também ser utilizados para sintetizar glicose a partir de lipídios. Aproximadamente 58% da proteína consumida pode, dessa maneira, ser convertida em glicose. A maioria dos aminoácidos, particularmente a alanina, é glicogênica. 17 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 5. Fonte: https://pratiquefitness.com.br/blog/voce-sabe- o-que-e-anabolismo-e-catabolismo/ O grupo amino, gerado pelo processo de desaminação, é liberado como amônia, a qual é transportada ao fígado, onde será convertida em ureia e dessa forma será eliminada pela urina. Pelo fato de a amônia ser altamente tóxica, é transportada em combinação com ácido glutâmico, formando a glutamina. Os hormônios participam tanto do mecanismo de síntese como da degradação proteica. O hormônio de crescimento estimula a síntese proteica, aumentando assim a concentração de proteína nos tecidos. No período de intenso crescimento em crianças, o hormônio de crescimento é regulado pela somatomedina C ou insulin-like growth factor-1 (IGF-1) sintetizada por vários órgãos, especialmente pelo fígado. A insulina também estimula a síntese proteica, acelerando o transporte de aminoácidos através da membrana celular. A diminuição da produção de insulina resulta em redução da síntese proteica. A testosterona é outro hormônio que estimula a síntese proteica durante o período de crescimento. Os glicocorticoides estimulam a degradação proteica muscular, fornecendo substrato para a gliconeogênese e para a cetogênese. A tiroxina afeta indiretamente o metabolismo proteico, aumentando sua velocidade em todas as células e, consequentemente, a velocidade das reações anabólicas e catabólicas das proteínas. Em doses fisiológicas e com adequada ingestão energética e de aminoácidos, a tiroxina aumenta a síntese proteica. No entanto, em situações de deficiência energética ou em elevadas doses (não fisiológicas), a tiroxina tem efeito contrário, ou seja, catabólico no metabolismo proteico. 18 19 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 2. CARBOIDRATOS Os carboidratos, também denominados de hidratos de carbono ou glicídios, são as moléculas orgânicas mais abundantemente encontradas na natureza, sendo que quase todos os organismos vivos são capazes de sintetizar e metabolizar este nutriente. Os carboidratos são formados a partir de átomos de carbono, oxigênio e hidrogênio, e são considerados como a maior fonte energética presente na dieta humana, contribuindo com metade ou mais do valor energético total dietético. Cerca de metade do carboidrato dietético é correspondente aos polissacarídeos, tais como: amido, dextrina e celulose, presentes em grãos cereais e vegetais. A outra metade do carboidrato fornecido por meio da dieta corresponde a açúcares mais simples, como os monossacarídeos (glicose, frutose e galactose) e os dissacarídeos (sacarose, maltose e lactose). A classificação dos carboidratos se dá através do seu tamanho e complexidade, sendo que, do mais simples ao mais complexo, estes nutrientes são classificados em: 20 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO monossacarídeos, oligossacarídeos e polissacarídeos. No concerne a sua função, os carboidratos são as fontes mais rápidas de energia, sendo a glicose a fonte de energia primária para o cérebro e hemácias. Em virtude do seu papel importante no fornecimento energético, há reserva deste nutriente em animais (glicogênio no músculo e fígado) e vegetais (amido). Não obstante, as fibras alimentares, que são carboidratos não digeríveis, apresentam as mais diversas funções, como retardo no esvaziamento gástrico (favorecendo a saciedade), fermentação pela microbiota intestinal (gerando ácidos graxos de cadeia curta, os quais desempenham funções biológicas importantes), retardo e/ou redução na absorção de açúcares e gorduras, melhora na constipação intestinal, permitindo que as fezes sejam mais macias e que a defecação seja mais regular, entre outros. Considerando o importante papel dos carboidratos na alimentação e na nutrição humana, a presente seção objetiva abordar aspectos acerca da bioquímica e do metabolismo destes nutrientes. Origem, síntese e classificação Os carboidratos são moléculas à base de carbono, ricas em hidroxilas (OH), sintetizadas, nos vegetais, por meio do processo de fotossíntese, onde a clorofila catalisa a biossíntese de carboidratos (glicose), ao passo que, nos animais, a síntese de carboidratos depende das fontes alimentares (de origem vegetal e animal). Conforme mencionado na introdução, os carboidratos são classificados de acordo com o seu tamanho e complexidade. Os açúcares são carboidratos simples de sabor doce, compreendendo monossacarídeos, dissacarídeos e polióis. Os monossacarídeos são carboidratos simples (glicose, frutose e galactose), utilizados como fonte de energia ao organismo, bem como são componentes estruturais dos seres vivos, considerando que o DNA contempla o açúcar simples desoxirribose em sua estrutura. Na estrutura do monossacarídeo pode haver de 3 a 7 carbonos, com 2 ou mais grupos de hidroxila. Os monossacarídeos podem se ligar e formar as mais diversas estruturas oligossacarídeas. A glicose ou dextrose é o monossacarídeo mais comum nos alimentos, sendo encontrada no mel e nas frutas, por exemplo. É um monossacarídeo de seis carbonos 21 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO (hexose) e cinco hidroxilas. A glicose é um açúcar redutor que pode reagir com outras moléculas, sendo um exemplo desta situação a hemoglobina glicada. A frutose ou levulose é encontrada nas frutas, no mel e no xarope de milho, sendo convertida, no interior celular, em derivados de glicose. A galactose, quando combinada com a glicose, forma a lactose (açúcar presente em produtos lácteos), sendo que, no organismo, a galactose é transformada em glicose e armazenada como glicogênio nos músculos e no fígado. Os dissacarídeos são constituídos por dois açúcares, sendo os mais frequentemente encontrados na dieta a sacarose (glicose + frutose), a lactose (glicose + galactose) e a maltose (glicose + glicose). A sacarose, popularmentedenominada de “açúcar de mesa”, é produzida a partir da cana-de- açúcar ou da beterraba, podendo ser encontrada em frutas, vegetais e mel. A lactose, que é o açúcar do leite, é encontrada no leite e em derivados, e é considerada como o dissacarídeo com o menor poder edulcorante. Finalmente, a maltose é o dissacarídeo menos abundante, estando presente nos grãos germinados de cevada e trigo e nos produtos intermediários formados durante a quebra do amido. Os polióis, com destaque para: sorbitol, manitol, lactitol, xilitol, eritritol, isomalte e maltitol, são os açúcares de álcoois, estando presentes naturalmente em algumas frutas e sendo produzidos industrialmente usando a aldose redutase para converter o grupo aldeído da molécula de glicose em álcool. Os polióis são resultantes da hidrogenação catalítica do grupo redutor de um sacarídeo específico de fácil acesso. Salienta-se que a principal aplicação dos polióis em alimentos é em confeitos isentos de açúcar, sendo que o sorbitol pode ser utilizado como um substituto da sacarose na dieta de pacientes diabéticos. No que concerne aos oligossacarídeos, estes são compostos por monossacarídeos unidos por ligações glicosídicas, como a maltose, a rafinose, a estaquiose, os fruto e galacto- oligossacarídeos (FOS e GOS, respectivamente), a polidextrose e a inulina. Muitos destes oligossacarídeos são considerados como prebióticos, pois são seletivamente fermentados pela microbiota, produzindo importantes efeitos de saúde ao hospedeiro. Referente aos polissacarídeos, estes são polímeros constituídos por monossacarídeos, em especial a 22 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO glicose, contendo de centenas a milhares de unidade de glicose. Os polissacarídeos mais comuns são: amido (origem vegetal), glicogênio (origem animal), pectina, celulose e gomas. O amido pode ser classificado de acordo com a sua digestibilidade em: amido rapidamente digerido, amido lentamente digerido e amido resistente, sendo que, ao passo que os amidos de rápida e lenta digestão sofrem ação das alfa-amilases salivar e pancreática, o amido resistente é toda a fração de amido que não é digerido pelas enzimas do trato gastrointestinal. Destaca-se que o amido resistente é considerado como fibra alimentar, em virtude da possibilidade de ser fermentado pela microbiota intestinal. Digestão, absorção, transporte e armazenamento A utilização celular é restrita aos monossacarídeos, logo, os dissacarídeos e os polissacarídeos precisam ser digeridos até as suas unidades básicas, isto é, hidrolisados até tornarem-se monossacarídeos. A digestão dos polissacarídeos se inicia na boca por meio da ação da alfa-amilase salivar, sendo que, na boca e no estômago, não ocorre nenhum tipo de digestão de monossacarídeos e oligossacarídeos pequenos. Destaca-se que a atividade da alfa-amilase salivar continua no estômago até que o pH baixo inative esta enzima. A continuidade do trabalho da alfa-amilase salivar é efetuada no intestino delgado pela ação da alfa- amilase pancreática, a qual é secretada no duodeno. A atividade da alfa-amilase pancreática é elevada pelo aumento do pH promovido pelo bicarbonato. Nos seres humanos, a digestão dos dissacarídeos se dá quase que inteiramente no duodeno. Além da alfa-amilase pancreática, a atividade das dissacaridases, que ocorre nas microvilosidades, também tem um papel importante na digestão destes carboidratos. As principais dissacaridases são: lactase, sacarase, maltase e isomaltase. Finalmente, os monossacarídeos e pequenas quantidades de dissacarídeos são absorvidos pelos enterócitos. No que tange à absorção dos carboidratos, quase todos os monossacarídeos são absorvidos antes do jejuno. A glicose e a galactose são absorvidas por meio de transporte ativo (exige ATP), dependente de sódio, sendo que estes dois monossacarídeos compartilham o transportador de 23 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO sódio-glicose do tipo 1 (SGLT1). Já a frutose é absorvida por meio de um transporte passivo de difusão facilitada com auxilio do GLUT5, que se localiza na borda em escova dos enterócitos. Quando dentro do enterócito, a glicose pode ser transportada para a circulação por meio de outro transportador, o GLUT2 (independente de sódio), que, além de ser expresso no intestino delgado, é também expresso no fígado, nos rins e nas células betapancreáticas. A frutose e a galactose também podem ser transportadas para a circulação sanguínea pelo GLUT2. Salienta-se que a absorção da frutose ocorre mais lentamente quando comparada com a absorção de glicose e galactose, porém, ocorre mais rapidamente do que a absorção de açúcares de álcoois, como sorbitol e xilitol. Na circulação portal, os monossacarídeos são conduzidos ao fígado, sendo este o principal órgão envolvido no metabolismo de frutose e galactose, atuando de forma a converter estes monossacarídeos em derivados de glicose, sendo utilizados como fontes de energia ou armazenados na forma de glicogênio, dependendo da demanda do fígado. Após passar pelo fígado, a glicose é transportada via corrente sanguínea para os mais diversos órgãos, como músculos esqueléticos e tecido adiposo, sendo que, nestes tecidos, o transporte intracelular de glicose depende de insulina. Nos músculos esqueléticos e no tecido adiposo, a sinalização da insulina com o seu receptor (IR) desencadeia uma cascata de ativação enzimática e eventos biomoleculares que promovem a translocação do GLUT4 para a superfície, facilitando a absorção da glicose. Glicolise Fonte: https://www.meulaboratorio.com/informativos/dieta- para-pre-diabetes-alimentos-permitidos-e- proibidos/20180612-091716-t859 Dentro da célula, a glicose pode ser direcionada para a glicólise a fim de gerar energia (ATP), sendo que, nesta via, cada molécula de glicose produz um ganho líquido de 2 moléculas de ATP e duas moléculas de piruvato ou de lactato. Estas reações, que ocorrem entre a glicose e a formação de piruvato, podem ser 24 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO categorizadas em duas fases diferentes – uma fase de investimento de energia e uma fase de geração de energia. As primeiras cinco reações constituem a fase de investimento de energia, em que ocorre a utilização do ATP armazenado. Neste momento, logo no início da via, dois ATP são necessários, tendo em vista que é preciso adicionar grupos fosfato à glicose e à frutose- 6-fosfato. Salienta-se que, quando a glicólise começa utilizando o glicogênio como substrato (e não a glicose), há necessidade de adicionar apenas um ATP. As últimas cinco reações constituem a fase de geração de energia. Fonte: https://emais.estadao.com.br/blogs/comida- de-verdade/wp- content/uploads/sites/313/2017/03/doces.jpg Glicólise é composta por diversas etapas. A primeira etapa consiste na fosforilação da molécula de glicose por meio do ATP, gerando glicose-6-fosfato, que é convertida a frutose-6-fosfato. Esta é fosforilada pelo ATP, produzindo frutose-1,6- bifosfato (com seis carbonos), a qual é dividida em duas moléculas de gliceraldeído-3-fosfato, cada uma com três carbonos. Até esta etapa, as reações são pertencentes a fase de investimento de energia, visto que dois ATP foram necessários para fosforilar moléculas. As próximas etapas pertencem a fase de geração de energia. As moléculas de gliceraldeído-3-fosfato são oxidadas, produzindo NADH e duas moléculas de 1,3- bifosfoglicerato de alta energia. Neste momento, ocorre a remoção de dois grupos fosfato energizados porduas moléculas de ADP, o que produz duas moléculas de ATP (repondo os ATP utilizados na fase de investimento) e duas moléculas de 3-fosfoglicerato, as quais são oxidadas por remoção de água, produzindo duas moléculas de fosfoenolpiruvato de alta energia. Novamente, a remoção de 2 grupos fosfato energizados por duas moléculas de ADP gera 2 moléculas de ATP (lucro). O piruvato é o produto final da glicólise, sendo que, quando há oxigênio disponível, o piruvato entra na mitocôndria onde será utilizado em outras reações bioenergéticas. Logo, o lucro líquido da glicólise é igual a dois ATP com uso de glicose como substrato e três ATP com uso de glicogênio como substrato. 25 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO Os hidrogênios (com seus elétrons) removidos nas vias bioenergéticas são transportados por duas principais moléculas transportadoras – NAD+ e FAD. Estas moléculas transportam os hidrogênios para serem utilizados na geração de ATP que ocorre na mitocôndria, por meio de processos aeróbios. Ressalta-se que quando estas moléculas aceitam hidrogênios, elas são convertidas às suas formas reduzidas – NADH e FADH. Para que a forma reduzida retorne a forma oxidada e continue o transporte (permitindo a continuidade da glicólise), o piruvato pode aceitar hidrogênios, formando lactato e oxidando as formas que antes estavam reduzidas (NADH vira NAD+). A enzima que catalisa a conversão de piruvato a lactato é a lactato desidrogenase (LDH). Por isso, os produtos da glicólise podem ser duas moléculas de piruvato ou duas moléculas de lactato. Finalmente, a glicólise pode ser considerada uma via anaeróbia, pois não há envolvimento direto de oxigênio. No entanto, quando na presença de oxigênio na mitocôndria, o piruvato, gerado pela glicólise, pode participar da produção aeróbia de ATP. Logo, além de ser uma via anaeróbia capaz de produzir ATP, a glicólise pode ser considerada como a primeira etapa da degradação aeróbia de carboidratos. Ciclo de Krebs e cadeia transportadora de elétrons O ciclo de Krebs, também denominado de ciclo do ácido cítrico, tem como função principal completar a oxidação (remoção de hidrogênio) de carboidratos, lipídios e proteínas, usando as moléculas transportadoras de hidrogênio (energia) NAD+ e FAD. Os hidrogênios (em razão de seus elétrons) possuem a energia em potencial presente nos alimentos, sendo que essa energia pode ser utilizada no ciclo de Krebs a fim de ressintetizar o ATP, por meio da união de ADP e Pi. Neste ciclo, não há a utilização direta do oxigênio, sendo este (O2) utilizado somente como o último aceptor de hidrogênio no fim da cadeia transportadora de elétrons (também chamada de cadeia respiratória). A produção aeróbia de ATP é denominada de fosforilação oxidativa, sendo este um processo que contempla três estágios: 1- geração de acetil-CoA, uma molécula central com dois carbonos, 2- oxidação da acetil-CoA no ciclo de Krebs e 3- processo de fosforilação oxidativa, ou seja, de formação do 26 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO ATP, na cadeia transportadora de elétrons. Figura: Glicólise. Adaptado de Powers e Howley (2014). Figura: Ciclo de Krebs. Adaptado de Powers e Howley (2014). 27 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO Tal como a glicólise, o ciclo de Krebs também contempla diversas etapas. Primeiramente, é requerida a entrada de duas moléculas de acetil-CoA (formada a partir da quebra de macronutrientes – carboidratos, lipídios e proteínas) no ciclo de Krebs. O piruvato, contendo três carbonos, é quebrado para formar acetil-CoA, com dois carbonos, sendo o carbono remanescente liberado na forma de CO2. Posteriormente, a acetil-CoA se combina com o oxaloacetato (quatro carbonos), formando citrato (seis carbonos). Em seguida, inicia-se uma série de reações bioquímicas para regenerar o oxaloacetato e duas moléculas de CO2, momento em que a via recomeça. Considerando que cada molécula de glicose que entra na glicólise gera duas moléculas de piruvato, que, por sua vez, gera duas moléculas de acetil-CoA, cada molécula de glicose promove duas rodadas no ciclo de Krebs – cuja principal função é remover hidrogênios e a energia associada a eles. A cada rodada do ciclo de Krebs, três moléculas de NADH e uma molécula de FADH são formadas, sendo que, para cada par de elétrons que passa pela cadeia transportadora de elétrons (do NADH ao oxigênio), há energia suficiente para a formação de 2,5 ATP, enquanto para cada molécula de FADH, é disponibilizada energia para formação de 1,5 ATP. Logo, referente à produção de ATP, o NADH é mais rico em energia do que o FADH. O ciclo de Krebs promove, também, a formação de trifosfato de guanosina (GTP) – um composto de alta energia, que transfere fosfato ao ADP a fim de ressintetizar ATP. Este processo contribui apenas com uma pequena quantidade da energia convertida no ciclo de Krebs, já que a maior parte do rendimento de energia neste ciclo é captada pela cadeia transportadora de elétrons. Os carboidratos fornecem piruvato para iniciar o ciclo de Krebs, enquanto os ácidos graxos podem passar por uma série de reações, processo denominado de betaoxidação, para formar acetil- CoA. Quanto as proteínas, alguns aminoácidos podem ser convertidos em glicose ou piruvato, outros em acetil-CoA, e outros, ainda, em intermediários do ciclo de Krebs. Em suma, o ciclo de Krebs é responsável por completar a oxidação de carboidratos, lipídios e proteínas, bem como por produzir CO2 e elétrons a serem destinados a cadeia transportadora de elétrons. Como este processo ocorre na mitocôndria, as enzimas envolvidas 28 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO nas reações do ciclo de Krebs estão localizadas dentro das mitocôndrias. Cadeia transportadora de elétrons Na cadeia transportadora de elétrons, também denominada de “cadeia respiratória” ou “cadeia de citocromo”, a energia disponível nas moléculas de NADH e FADH é usada para refosforilar o ADP em ATP. Os elétrons provenientes dos átomos de hidrogênio, presentes nas moléculas de NADH e FADH, passam por diversos transportadores de elétrons, os quais são denominados de citocromos. No momento da passagem dos elétrons pela cadeia respiratória, ocorre a liberação de energia suficiente para formar ATP em três sítios. Figura: Cadeia transportadora de elétrons. Adaptado de Powers e Howley, (2014) Os hidrogênios (e seus elétrons) chegam na mitocôndria por intermédio das moléculas transportadoras de hidrogênio, como NADH e FADH. Pares de elétrons provenientes de NADH e FADH passam, sucessivamente, por diversos compostos que sofrem reações de oxidação-redução, com consequente liberação de energia suficiente para produzir ATP em três sítios distintos situados ao longo da via. Salienta-se que cada molécula de NADH fornece energia para sintetizar 2,5 ATP, enquanto cada molécula de FADH possui energia para formar 1,5 ATP. No final da cadeia respiratória, o oxigênio aceita os elétrons que passam adiante e se associa ao hidrogênio, formando 29 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO água (H2O). Na ausência de oxigênio disponível, a fosforilação oxidativa é impossibilitada, sendo que, nestes casos, a formação de ATP celular deve ocorrer por vias anaeróbias. O mecanismo que explica a formação de ATP pela cadeia transportadora de elétrons é denominado de “hipótese quimiostática”, que indica que, conforme os elétrons são transportados ao longo dos citocromos, a energia liberadabombeia os hidrogênios (liberados por NADH e FADH) de dentro para fora da mitocôndria através da membrana mitocondrial interna, resultando no acúmulo de íons hidrogênio entre as membranas interna e externa da mitocôndria. Este acúmulo de hidrogênio é uma fonte de energia em potencial, sendo utilizada para recombinar ADP e Pi, ressintetizando o ATP. Três bombas movem os íons hidrogênio da matriz mitocondrial para o espaço intermembrana, sendo que a primeira (usando NADH) move quatro íons hidrogênio para dentro do espaço intermembrana a cada dois elétrons movidos ao longo da cadeia respiratória. Tal como a primeira, a segunda bomba transporta quatro íons hidrogênio para dentro do espaço intermembrana, enquanto a terceira bomba move apenas dois íons hidrogênio para o espaço intermembrana. Ao final deste processo, há mais íons hidrogênio no espaço intermembrana do que na matriz, o que cria um impulso que resulta na difusão de hidrogênio de volta para a matriz por meio de canais de hidrogênio especializados, denominados de unidades respiratórias. Conforme os íons hidrogênio passam por estes canais, eles ativam a enzima ATPase e, por consequência, ocorre a formação de ATP por meio da fosforilação do ADP. O oxigênio é importante nos processos ocorridos na cadeia transportadora de elétrons, pois os elementos da cadeia passam por uma série de reações de oxidação- redução. Logo, o oxigênio mantém o último citocromo em estado oxidado (e não reduzido), permitindo que este aceite mais elétrons, dando continuidade a fosforilação oxidativa. Na etapa final da cadeia, o oxigênio também é utilizado para aceitar dois elétrons (provenientes de NADH e FADH) – processo que torna o oxigênio reduzido – e se ligar a dois íons hidrogênio, formando água (H2O). Cálculo do ATP aeróbio 30 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO Na glicólise, são gerados 2 ou 3 ATP (a partir da glicose 2 ATP e a partir do glicogênio 3 ATP), bem como dois NADH (são gerados 2,5 ATP por molécula de NADH). Na conversão de piruvato a acetil-CoA, são produzidos 2 NADH. No ciclo de Krebs, são produzidos dois GTP (equivalente do ATP), bem como seis NADH e dois FADH (são gerados 1,5 ATP por molécula de FADH). Desse modo, o rendimento total da degradação aeróbia da glicose é de 32 ATP, enquanto o rendimento a partir da quebra de glicogênio é de 33 ATP. PROCESSO METABÓLICO PRODUTOS DE ALTA ENERGIA ATP A PARTIR FOSFORILAÇÃO OXIDATIVA SUBTOTAL DE ATP Glicólise 2 ATP - 2 (total, se anaeróbio) 2 NADH 5 7 (se aeróbio) Piruvato em acetil- CoA 2 NADH 5 12 Ciclo de Krebs 2 GTP - 14 6 NADH 15 29 2 FADH 3 32 Total: 32 ATP Quadro: Cálculo da produção de ATP aeróbio a partir da quebra de uma molécula de glicose. Fonte: Powers e Howley, (2014). Glicogênese e glicogenólise A glicogênese é a formação de glicogênio nos músculos e no fígado a partir do estímulo da insulina. O glicogênio é composto por milhares de moléculas de glicose unidas por ligações glicosídicas, sendo estocado em grânulos citoplasmáticos em conjunto com a maioria das enzimas requeridas para a sua síntese e degradação. A primeira reação da glicogênese é a transformação de glicose-6-fosfato em glicose-1- fosfato pela enzima fosfoglicomutase. Posteriormente, ocorre a ligação da glicose-1-fosfato com uridina trifosfato (UTP), catalisada pela enzima UTP-glicose- pirofosfatase, e produzindo UDP- glicose e pirofosfato (PPi). A UDP- glicose é adicionada à cadeia de algum glicogênio preexistente, 31 BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO sendo essa reação catalisada pela enzima glicogênio sintetase, a qual é ativada pela enzima fosfoproteína fosfatase A, que, por sua vez, é ativada pela insulina. A glicogênio sintetase também é ativada pela própria glicose-6-fosfato. A glicogenólise é a quebra do glicogênio com a consequente liberação de glicose, que normalmente ocorre quando há redução da glicemia (principalmente no que concerne ao glicogênio hepático). A glicogenólise do glicogênio muscular tem a principal função de fornecer substrato energético para ser utilizado pelo próprio músculo, por exemplo, quando na presença de exercício físico. Via das pentoses A via ou rota das pentoses, também chamada de desvio da hexose-monofosfato ou via do 6- fosfogliconato, é uma via alternativa do metabolismo da glicose, que ocorre no citosol. Apesar de não consumir e nem gerar ATP, esta via desempenha algumas funções, como: produzir NADPH para a biossíntese de ácidos graxos e esteroides, e para atuar como um redutor bioquímico; produzir ribose-5-fosfato para a biossíntese de nucleotídeos e ácidos nucleicos; produzir eritrose-4-fosfato, o qual se combina com o fosfoenolpiruvato (PEP) na reação inicial que sintetiza compostos fenólicos; e, finalmente, produzir intermediários do ciclo de Krebs. BIOQUÍMICA E METABOLISMO DE MACRONUTRIENTES APLICADOS À NUTRIÇÃO 10. 32 3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA Mahan, L.K.; Escott-Stump, S.; Raymond, J.L. Krause Alimentos, Nutrição e Dietoterapia. 13ª Ed. Elsevier. 2012. Cozzolino, SMF; Cominetti, C. Bases bioquímicas e fisiológicas da nutrição, nas diferentes fases da vida, na saúde e na doença. Ed. Manole, 1ª edição, 2013. Cozzolino, SMF. Biodisponibilidade de nutrientes. 5ª Ed. Manole. 2016. Cukier, C.; Cukier, V. Macro e micronutrientes em nutrição clínica. Ed. Manole, 1ª edição, 2020. Rogero MM, Tirapegui J, Pedrosa RG, De Oliveira Pires IS, De Castro IA. Plasma and tissue glutamine response to acute and chronic supplementation with L-glutamine and L-alanyl- L-glutamine in rats. Nutr Res. 2004;24(4):261–70. Silva, R.J.; Cukier, V. Carboidratos. Em: Cukier, C.; Cukier, V. Macro e micronutrientes em nutrição clínica. Ed. Manole, 1ª edição, 2020. Powers, S.K.; Howley, E.T. Fisiologia do exercício – teoria e aplicação ao condicionamento e ao desempenho. 8ª Ed. São Paulo: Manole. 2014. Mahan, L.K.; Escott-Stump, S.; Raymond, J.L. Krause Alimentos, Nutrição e Dietoterapia. 13ª Ed. Elsevier. 2012. Cozzolino, SMF; Cominetti, C. Bases bioquímicas e fisiológicas da nutrição, nas diferentes fases da vida, na saúde e na doença. Ed. Manole, 1ª edição, 2013. Cozzolino, SMF. 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