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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO NORTE FLUMINENSE DARCY RIBEIRO – UENF FUNDAÇÃO CECIERJ/CONSÓRCIO CEDERJ CURSO DE GRADUAÇÃO EM PEDAGOGIA – LICENCIATURA PLENA SHIRLENA CAMPOS DE SOUZA AMARAL Professora - Coordenadora GABRIELA DO ROSARIO SILVA Professora -Tutora 2 AULA1 Educação, Diversidade e Direitos Humanos: noções introdutórias Olá, bem-vindos a nossa primeira aula! Queremos convidá-los a adentrar este espaço de estudos onde lhes permitirão a construção de conhecimento de uma área fundamentada nas práticas pedagógicas emancipatórias e holísticas, de suma importância para a formação de vocês, cujas discussões nos meios acadêmico-científicos, têm alcançado bastante discussão nos últimos tempos, em virtude das demandas sociais, na qual a escola é elemento fundamental para a construção e formação da cidadania. Nessa primeira aula, serão apontados alguns conceitos que serão fundamentais para o nosso trabalho ao longo do semestre letivo. Vamos começar?! 3 A educação é a ação exercida pelas gerações adultas sobre as gerações que não se encontram ainda preparadas para a vida social; tem por objeto suscitar e desenvolver na criança certo número de estados físicos, intelectuais e morais reclamados pela sociedade política no seu conjunto e pelo meio especial a que a criança, particularmente, se destina (Durkheim). O trecho acima é uma das maneiras sociológicas de compreender a educação pela ótica do sociólogo francês David Émile Durkheim, também considerado o Pai da Sociologia Moderna. Para Durkheim o termo educação é amplo, repleto de conceitos, sentidos. Brandão (2003) ressalta que depois de Durkheim (que, por sua vez, aprendeu isso com outros cientistas anteriores e, quem sabe? com alguns índios) inúmeros sociólogos, antropólogos, filósofos e educadores começaram a refletir sobre pontos de vista semelhantes. Não é que tivessem a proposta de uma "nova educação", menos abstrata e desancorada do que a "Educação Humanista" que criticavam, mas sim esclarecer cada vez mais como a sociedade e a cultura são e funcionam em sua realidade concreta, em virtude de que a educação existe dentro delas e trabalha sob a determinação de exigências, princípios e controles sociais (BRANDÃO 2003). A educação atua sobre a vida e o crescimento da sociedade em dois sentidos: no desenvolvimento de suas forças produtivas e na ampliação de seus valores culturais. Por outro lado, mostra que o surgimento de tipos de educação e a sua evolução dependem da presença de fatores sociais determinantes e do desenvolvimento deles e de suas transformações. Um pensamento muito corrente atualmente é o de que a educação é um dos principais meios para que haja mudanças sociais ou, pelo menos, é um dos recursos de adaptação das pessoas a um “mundo em mudança”. Conforme afirmação de Brandão, não há uma forma única nem um modelo de educação, à medida que não é apenas na escola que esta é passível de realização, o ensino escolar não é exclusivo e nem o professor profissional seu único representante. A educação existe no imaginário das pessoas e na ideologia dos grupos sociais e o que se espera é a transformação de sujeitos e mundos em alguma coisa melhor. A escola é um espaço privilegiado de construção de conhecimentos e de envolvimento de valores, portanto, deve ter como uma de suas propostas contribuir para a transformação social, no sentido de torná-la menos desigual e mais democrática, contemplando todas as formas de expressão e diversidades. 4 Nos últimos vinte anos, a diversidade e outros temas a ela relacionados têm sido tratados de forma central no debate internacional e nacional, nas discussões sobre o desenvolvimento e na formulação de políticas públicas, especialmente na área da educação. Tal expressão passou a ser cada vez mais frequente nos títulos de programas e ações do governo brasileiro, bem como de suas secretarias e publicações. Podemos considerar que no Brasil, especificamente na década de 1990, teve início o debate brasileiro em torno da educação sobre cultura, centrada principalmente nos temas relativos ao currículo, apesar de a temática estar presente na didática, na formação de professores, nas análises sobre e do cotidiano escolar dentre outros. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), em um primeiro momento, ao trazerem a pluralidade cultural como tema transversal, criaram um território, um lugar para a contenção dos temas postos na educação, a saber, o fracasso escolar, as dificuldades de aprendizagem, as reivindicações sociais por reparação e reconhecimento ficaram circunscritas na cultura e no debate do currículo escolar. A década de 1990 também é considerada uma referência nessa passagem, pois foi marcada por um contexto reivindicatório em que diferentes movimentos sociais denunciaram as práticas discriminatórias presentes na educação e exigiram mudanças, ao mesmo tempo em que foi colocado em pauta o mito da democracia racial. Nessa década, sobrepuseram-se uma visão culturalista explicativa do fracasso escolar e certo reconhecimento das diferentes culturas. Identifica-se nela também a influência de um enredo discursivo no contexto mundial, que se integra de modo sistemático às reflexões dos estudiosos da educação. Uma educação voltada para a incorporação da diversidade cultural no cotidiano pedagógico tem emergido em debates e discussões nacionais e internacionais, buscando questionar pressupostos teóricos e implicações pedagógicas e curriculares de uma educação voltada à valorização da identidade múltipla no âmbito da educação formal. Todos esses fatores contribuíram para que a discussão sobre cultura, diversidade, multiculturalismo e interculturalismo aumentasse consideravelmente, especialmente na educação (RODRIGUES; ABRAMOWICZ, 2013). Mediante o exposto, percebe-se que os conceitos elencados compõem como temáticas caras no campo da educação, especialmente no que se refere ao educar em Direitos Humanos. O Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH), promulgado em dezembro de 2003, e atualizado em 2006, instituiu como meta, o estímulo ao debate 5 e à aplicação dos Direitos Humanos na Educação Básica. Não obstante, pesquisas têm constatado que considerável número de educadores não tem conhecimento do que significa “Educar em Direitos Humanos” (ALTMANN 2001; CANDAU, 2011; AMARAL 2016). Essa questão é de fundamental importância à medida que se insere nos fundamentos para uma cultura de paz e de dignidade da pessoa humana, que perpassa pela necessária consolidação de construções de respeito às diversidades concernentes ao ambiente escolar. Nesse sentido, a escola é um dos ambientes singulares de fomentação e de formação desses valores, ou seja, nos termos do Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos de 2006, o qual ressalta que a escola é o espaço social privilegiado para a definição de uma ação institucional pedagógica e a prática e vivência dos Direitos Humanos (BRASIL, 2007). Denominam-se como Direitos Humanos, os direitos e liberdades básicos de todos os seres humanos. O conceito de direitos humanos está associado também à ideia de liberdade de pensamento, de expressão e de igualdade perante a lei. A Organização das Nações Unidas (ONU) foi a responsável por proclamar a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), por meio da resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, que deve ser respeitada por todas as nações do mundo. O documento que delineia os Direitos Humanos básicos foi esboçada principalmente pelo canadense John Peters Humphrey, contando, também, com a ajuda de várias pessoas de todo o mundo. A Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas afirma que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e emdireitos, dotados de razão e de consciência, e devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. A ONU adotou a Declaração Universal dos Direitos Humanos com o objetivo de evitar guerras, promover a paz mundial e de fortalecer os direitos humanitários. No Art. 1ª da DUDH consta que: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.” O documento tem uma importância mundial, apesar de não obrigar juridicamente que todos os Estados a respeitem. Para a Assembleia Geral da ONU, a 6 Declaração Universal dos Direitos Humanos tem como ideal ser aderida por todos os povos e de todas as nações, com o objetivo de que todos tenham sempre em mente a Declaração, a fim de que se promova o respeito a esses direitos e liberdades. Os ideais que pautam os Direitos Humanos têm suas gêneses no conceito filosófico dos direitos naturais, ou seja, aqueles seriam supostamente atribuídos por Deus. Alguns filósofos, a exemplo de citação, John Locke, o mais importante filósofo a desenvolver esta teoria sustenta a ideia de que não haveria nenhuma diferença entre os direitos humanos e os direitos naturais. Outros, como Jon Searl argumentam ser necessário manter termos separados para eliminar a associação com características normalmente relacionadas com os direitos naturais. Existe um importante debate sobre a origem cultural dos direitos humanos. Geralmente se considera que tenham sua raiz na cultura ocidental moderna, mas existem ao menos duas posturas principais mais. Alguns afirmam que todas as culturas possuem visões de dignidade, uma forma de direitos humanos, e fazem referência a proclamações como a Carta de Mandén, de 1222, declaração fundacional do Império de Mali. Não obstante, nem em japonês nem em sânscrito clássico, por exemplo, existiu o termo "direito" até que foram produzidos contatos junto à cultura ocidental, já que as culturas orientais colocaram tradicionalmente um peso nos deveres. Existe também, quem considere que o Ocidente não criou a ideia nem o conceito dos direitos humanos, ainda que tenha encontrado uma maneira concreta de sistematizá-los, através de uma discussão progressiva e com base no projeto de uma filosofia dos direitos humanos. As teorias que defendem o universalismo dos direitos humanos se contrapõem ao relativismo cultural, que afirma a validez de todos os sistemas culturais e a impossibilidade de qualquer valorização absoluta desde um marco externo, que, neste caso, seriam os direitos humanos universais. Entre essas duas posturas extremas situam- se uma gama de posições intermediárias. Muitas declarações de direitos humanos emitidas por organizações internacionais regionais põem um acento maior ou menor no aspecto cultural e dão mais importância a determinados direitos de acordo com sua trajetória histórica. Dentre estas, destacam-se: ✓ A Organização da Unidade Africana que proclamou em 1981 a Carta Africana de Direitos Humanos e de Povos, que reconhecia princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e adicionava outros que tradicionalmente se tinham negado na África, como o direito de livre 7 determinação ou o dever dos Estados de eliminar todas as formas de exploração econômica estrangeira; ✓ Em 6 de novembro de 1992, os Estados africanos acordaram a Declaração de Túnez, afirmando que não poderia prescrever um modelo determinado a nível universal, já que não podem se desvincular as realidades históricas e culturais de cada nação e as tradições, normas e valores de cada povo; e ✓ Em uma linha similar se pronunciam a Declaração de Bangkok, emitida por países asiáticos em 23 de abril de 1993, e de Cairo, firmada pela Organização da Conferência Islâmica em 5 de agosto de 1990. Durante o século XX nos Estados Unidos, o movimento a favor dos Direitos Humanos defendia a igualdade entre todas as pessoas. Na sociedade americana daquela época, havia uma forte discriminação contra os negros, que muitas vezes não desfrutavam dos plenos direitos fundamentais. Consonante Garcia (2012), nos Estados Unidos, a escravidão foi abolida em 1865 em todo o território americano, não obstante esta ainda implicou em diversas penalidades para a população ex-escrava e seus descendentes, em virtude de não permitir que estes pudessem se inserir socialmente, desfrutando dos seus direito de forma plena e desenvolvendo-se por completo na sociedade americana. Pelo contrário, estes foram extremamente prejudicados pela segregação a qual lhes impuseram, com um sistema educacional inferior ao ofertado aos demais segmentos populacionais, especialmente a população branca, não lhes permitindo viajar nos mesmos vagões e frequentar as mesmas escolas que os brancos. Não podendo também, haver a participação de negros em júri popular, testemunhar, votar, ocupar cargos públicos, serem servidos em lanchonetes, serem proprietários, obterem licenciamento para trabalhar em determinadas profissões, frequentar parques, praias e hospitais, beber água nos mesmos bebedouros, hospedar-se nos mesmos hotéis ou dirigir nas mesmas estradas, sentarem-se na mesma sala de espera ou morarem nos mesmos quarteirões habitados por brancos. Era proibido também, o casamento entre negros e brancos. O que implicou na formação de duas sociedades. Um importante defensor dos movimentos a favor dos Direitos Humanos foi Martin Luther King Jr., um dos maiores porta-vozes dos direitos civis de todos os tempos, e o discurso “I Have a Dream” (“Eu tenho um sonho”) é um dos mais conhecidos e citados 8 no âmbito da luta contra o racismo e discriminação. Mesmo depois da sua morte, a sua influência se mantém até os dias atuais. Referências ALTMANN, Helena. Orientação sexual nos parâmetros curriculares nacionais. Rev. Estud. Fem., Florianópolis, v. 9, n. 2, p. 575-585, 2001. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104026X2001000200014&ln g=pt&nrm=iso. Acesso em: 27 de outubro 2017. AMARAL, Shirlena Campos de Souza. Direitos Humanos, Reconhecimento e Respeito às Diferenças na Escola: o Direito de Ser. In: PROEX/ UENF. Projeto de Extensão Universitária, 2016, p.1- 22. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O Que é Educação. 43.ed. São Paulo: Brasiliense, 2003. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Pluralidade Cultural. Brasília: MEC, 1997. BRASIL. Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos / Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. – Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Ministério da Educação, Ministério da Justiça, UNESCO, 2007. CANDAU, Vera Maria. Direitos humanos, educação e interculturalidade: as tensões entre igualdade e diferença. Currículo sem Fronteiras, v.11, n.2, pp.240-255, Jul/Dez 2011. Disponível: http://www.curriculosemfronteiras.org/vol11iss2articles/candau.pdf. Acesso em: Outubro de 2017. http://www.curriculosemfronteiras.org/vol11iss2articles/candau.pdf 9 Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Documents/UDHR_Translations/por.pdf. Acesso em: Janeiro de 2018. GARCIA, Poliana Pereira. Ações afirmativas e princípio da igualdade. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3160, 25 fev. 2012. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/21152>. Acesso em: 14 nov. 2016. RODRIGUES, Tatiane Cosentino; ABRAMOWICZ, Anete. O debate contemporâneo sobre a diversidade e a diferença nas políticas e pesquisas em educação. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517- 97022013000100002. Acesso em: Janeiro de 2017. Material para Leitura: ABRAMOWICZ, Anete; RODRIGUES, Tatiane Cosentino; CRUZ, Ana Cristina Juvenal da. A diferença e a diversidade na educação. Disponível em: http://www.contemporanea.ufscar.br/index.php/contemporanea/article/download/38/20.Acesso em: Janeiro de 2018. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Documents/UDHR_Translations/por.pdf. Acesso em: Janeiro de 2018. http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Documents/UDHR_Translations/por.pdf https://jus.com.br/artigos/21152/analise-das-acoes-afirmativas-a-luz-do-principio-da-igualdade https://jus.com.br/revista/edicoes/2012 https://jus.com.br/revista/edicoes/2012/2/25 https://jus.com.br/revista/edicoes/2012/2/25 https://jus.com.br/revista/edicoes/2012/2 https://jus.com.br/revista/edicoes/2012 http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022013000100002 http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022013000100002 http://www.contemporanea.ufscar.br/index.php/contemporanea/article/download/38/20 http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Documents/UDHR_Translations/por.pdf 10 AULA 2 Políticas Públicas Nacionais e Internacionais para a Diversidade Sejam todos muito bem-vindos e bem-vindas a nossa segunda aula! Na primeira aula, foram apresentadas algumas noções introdutórias sobre o tema Educação, Diversidade e Direitos Humanos. A fim de compreendermos melhor como esses conceitos estão relacionados, é importante a compreensão do contexto no qual estes tiveram seu surgimento. No caso aqui em questão, a Diversidade Cultural, é de suma importância à reflexão sobre o seu contexto político e o seu campo de atuação, a saber, sociocultural, sexual, de gênero, das pessoas com deficiências, das populações em estado de vulnerabilidade social, dentre outros. 11 Há quase duas décadas, a relação entre desigualdades e diversidade tem alcançado um lugar de maior destaque no debate contemporâneo. No que concerne à diversidade, Abramowicz, Rodrigues e Cruz (2011) cogitam que a discussão, com enfoque na variedade de culturas que marca a sociedade atualmente, em que esta é concretizada em oposição ao modelo de Estado-nação moderno, liberal e ocidental se faz presente em grande parte dos países do mundo. As autoras sinalizam para o fato, de que o debate sobre a diversidade se diferencia no âmbito nacional e internacional e em consonância com o período no qual a mesma surgiu, cujas causas principais que geraram ou determinaram a sua discussão foram pautados nos grupos especificados, e nos aspectos inerentes destes, a saber, identidades culturais, espaciais e territoriais, discriminação, imigração, gênero, sexualidade, raça, etnia, religião, língua, espaços/territórios, dentre outros os quais consistiram como os principais fatores e temáticas que desencadearam um processo de mobilização e discussão sobre a diversidade, elencando os vários contextos nos quais esses fatores estão inter-relacionados. A diversidade pode ser compreendida como uma construção histórica, social, cultural e política das diferenças, portanto, realiza-se em meio às relações de poder e ao crescimento das desigualdades e da crise econômica que se acentua no contexto nacional e internacional. São inegáveis, nesse debate, os efeitos que a desigualdade socioeconômica exerce sobre toda a sociedade, em especial, sobre os grupos sociais considerados diversos, especificamente as minorias sociais. Portanto, a análise envolvendo desigualdades e diversidade deverá ser realizada levando em consideração a sua inter-relação com alguns fatores, tais como: os desafios da articulação entre políticas de igualdade e políticas de identidade ou de reconhecimento da diferença no contexto nacional e internacional, a necessária reinvenção do Estado rumo à emancipação social, o acirramento da pobreza e a desigual distribuição de renda da população, os atuais avanços e desafios dos setores populares e dos movimentos sociais em relação ao acesso à educação, à moradia, ao trabalho, à saúde e aos bens culturais, bem como os impactos da relação entre igualdade, desigualdades e diversidade nas políticas públicas. No Brasil, diferentes alternativas seja no campo da economia, das políticas e dos estudiosos da temática têm sido desencadeadas na intenção de apontar caminhos solucionadores para essa situação. Desde o processo de reabertura política a partir da 12 década de 90 aos dias atuais, vem se configurando um novo foco de interpretações a respeito de como equacionar a oferta da educação pública no contexto das desigualdades socioeconômicas e da diversidade. A postura central dos movimentos sociais, dos profissionais da educação e daqueles comprometidos com uma sociedade democrática e com a educação pública, gratuita e laica tem sido reafirmar o princípio constitucional contido no Art. 205 da Constituição Federal de 1988, ou seja, a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, devendo ser, portanto, promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento do sujeito, preparando-o para o exercício da cidadania e qualificando-o para o trabalho. O objetivo da educação e das suas políticas não é formar gerações para o mercado, para o vestibular ou, tampouco, atingir os índices internacionais de alfabetização, letramento e matemática. Assim sendo, o sujeito não é educado para alguma coisa, pois a educação é um direito e, como tal, deve ser garantido de forma igualitária, equânime e justa. O foco central da educação são os sujeitos sociais, entendidos como cidadãos e sujeitos de direitos. Essa interpretação da educação tem sido densamente trabalhada sob a ótica política e epistemológica pelos movimentos sociais quando estes enfatizam que os sujeitos de direitos são também diversos em raça, etnia, credo, gênero, orientação sexual e idade, dentre outros aspectos. Ressaltando, também, que essa diversidade tem sido tratada de forma desigual e discriminatória ao longo dos séculos, inclusive ainda não foi devidamente resolvida pelas políticas de Estado, pelas escolas e seus currículos. Dessa forma, devido às pressões sociais, o entendimento da diversidade como construção social constituinte dos processos históricos, culturais, políticos, econômicos e educacionais e não mais visto como um problema começou a ganhar mais espaço na sociedade, nos fóruns políticos, nas teorias sociais e educacionais. São também os movimentos sociais, principalmente os de caráter identitário (indígenas, negros, quilombolas, feministas, LGBT, povos do campo, pessoas com deficiência, povos e comunidades tradicionais, entre outros), que, a partir dos anos de 1980, no Brasil, contribuem para a entrada do olhar afirmativo da diversidade na cena social. Eles reivindicam que a educação considere, nos seus níveis, etapas e modalidades, a relação entre desigualdades e diversidade. Indagam o caráter perverso do capitalismo de acirrar não só as desigualdades no plano econômico, mas também de tratar de forma desigual e inferior os coletivos sociais considerados diversos no decorrer da história. 13 A imbricação entre desigualdades e diversidade tem sofrido interpretações diversas no contexto das relações de poder, nas quais se inserem as lutas sociais. São interpretações advindas tanto das políticas neoliberais que se acirraram no Brasil, nos países latino-americanos e em outros contextos do mundo a partir dos anos de 1990, quanto das lutas por identidade e reconhecimento desenvolvidas pelos próprios movimentos sociais, ações coletivas, organizações de caráter emancipatório e novos sujeitos sociais no mesmo período. A pressão histórica dos movimentos sociais, somada a um perfil mais progressista de setores do Estado brasileiro nos últimos anos, trouxeram mudanças no tratamento da diversidade no contexto das políticas públicas de caráter universal, desencadeando, inclusive, a implementação de políticas de ações afirmativas, em que nesse contexto a discussão sobre justiça social passou a ocupar mais espaço na produção teórica, na análise e na implementaçãodas políticas públicas, entre elas, as educacionais. Partindo dessa realidade conhecida, descrita e explicada, as questões concernentes ao âmbito da Diversidade Cultural tornaram, nos últimos anos, a ser uma realidade reconhecida, e, portanto, intencionando ser valorizada, respeitada, sendo fortemente defendida quer no âmbito legal, quer no campo social. Esta transformação, para Reis (2011) corresponde a uma mudança de perspectiva social e educativa em que o conceito de multiculturalismo, movimento que defende a valorização e o reconhecimento das diferentes identidades étnicas, bem como a inter-relação entre os indivíduos de diversos grupos culturais em sua diferença, vem sendo sucedido pelo conceito de interculturalidade, que se pauta pela ação efetiva em direção à qualidade dessas inter-relações que visam articular com de forma mais intensa o local e o global a partir do conhecimento mútuo e comunitário. Embora os primeiros passos tenham sido iniciados, ainda há muito para fazer, especificamente acerca das políticas implementadas, das que emergiram a partir destas, assim como dos seus aperfeiçoamentos visando o seu reconhecimento. Especialmente, porque enquanto fenômeno mundial, as mesmas demandam pesquisas, interpretações e debates sob os diversos enquadramentos conceituais e metodológicos que as circundam. No âmbito das políticas internacionais, destacamos a Convenção sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, a qual entrou em vigor em 18 de março de 2007. De acordo com Duping (2015), a mesma foi ratificada pelos 14 primeiros 30 países que a aderiram a partir da Assembleia Geral da UNESCO realizada em 20 de outubro de 2005, após dois anos de discussões e negociações em torno de seu texto. No campo das políticas nacionais desenvolvidas pelos países membros da Convenção da Diversidade Cultural, apesar da aparente unanimidade da importância da cultura, a passagem da teoria para a prática acontece de forma lenta, e as propostas para a sustentabilidade econômica e ambiental incluem raramente a cultura. Para Duping (2015) essa situação permite justificar os porquês de a ligação entre desenvolvimento econômico e desenvolvimento cultural ser em sua grande maioria ignorada, pois a política de desenvolvimento quase sempre é formulada em termos econômicos, por meio de política orçamentária e monetária, política comercial, política de mercado de trabalho dentre outras, e os economistas que controlam os ministérios das finanças têm tendência a não se deixar impressionar por argumentos baseados nos benefícios da cultura, considerados “subjetivos”. No presente momento, mediante o quadro social em vigência no Brasil, podemos dizer que a proposta intercultural corresponde a uma prática de educação intercultural que implica a adoção de concepções que elencam o outro e o diverso como ponto de partida para a reflexão dessas questões. Conforme identificado por Boaventura de Souza Santos (2006, p.316), “Temos o direito a ser iguais sempre que a diferença nos inferioriza; temos o direito a ser diferentes sempre que a igualdade nos descaracteriza”, o problema não está na afirmação de um polo e desconsideração do outro, mas sim a partir da adoção de uma visão dialética da relação entre igualdade e diferença. O que foi posto pelo pesquisador ao afirmar que: "As pessoas e os grupos sociais têm o direito a ser iguais quando a diferença os inferioriza, e o direito a ser diferentes quando a igualdade os descaracteriza". O autor ressalta que é “um imperativo muito difícil de atingir e manter" (p. 10), contudo é reconhecido por todos nós como necessário e urgente, à medida que há um vantajoso diálogo intercultural comprometido com os direitos humanos, no entanto, tem sobreposto a este, visões e posicionamentos dominantes, elitistas, mais excludentes do que inclusivos. Ressaltamos a importância da compreensão de uma educação segundo orientações de Paulo Freire: integral e holística, libertadora e emancipatória, dialogal e dialética; educação embasada de uma visão ampliada de sociedade e que parte do 15 conhecimento indispensável de seu público alvo. Assim, retomando os conceitos de educação social para uma sociedade diversa e pluricultural, ressaltamos alguns outros conceitos importantes a uma compreensão consistente dos temas que aqui se destacam como propostas de uma melhor educação e formação profissional e cidadã. Educação Social como resposta à diversidade Cultural, Social e Sexual e a construção de uma educação sem preconceitos, diversa e como tal, inclusiva. Assim sendo vamos refletir: Como poderá a educação social contribuir para uma efetiva superação das condições existentes? Em caráter de reflexão, mediante a questão proposta, a educação não deve mais se impor com base nos parâmetros das tendências pedagógicas tradicionais, mas isso não significa que devemos abrir mão de sua essência, contudo para sistematizar a educação mediante as abordagens teórico-metodológicas, pois os convites à diversidade não ameaçam a construção das identidades tradicionais, muito pelo contrário, a diversidade torna importante o reconhecimento do movimento em que elas se constituíram e se reconstituem em novas identidades. Sendo esse movimento que torna evidente as configurações de diferentes limites pertinentes às relações entre as gerações, entre os sexos, as classes sociais e a(s) cultura(s). De modo a inverter as condições discriminatórias e mesmo as violências simbólicas presentes em toda educação que desconsidera as diferenças, a educação social será aquela que se apropriará da diversidade das visões religiosas, culturais e políticas de grupos sociais diversos, associando tais visões aos fundamentos das ciências sociais e humanas em conjunto com as prerrogativas do Estado de modo a sustentar a finalidade maior da educação que é emancipar os sujeitos pela crítica social e política. Ou seja, superar uma educação e uma prática pedagógica que demandem estratégias de submissão, através de meios de comunicação social como de políticas educativas formatadas para atender os interesses do capital nacional e internacional. Pelo exposto, é possível depreender que a educação social circunscreve-se no interior da crítica da sociedade e das comunidades educativa e científica a partir de suas práticas, dos conhecimentos das pessoas comuns, das finalidades emancipatórias bem como das teorias e metodologias das ciências sociais e humanas que a sustenta. Assim, educar para a diversidade exige a formação em dimensões tanto objetivas quanto subjetivas, associadas às práticas educativas de revisão de valores e atitudes 16 voltados à superação de injustiças e estereótipos, por tanto, são eleitos como princípios éticos e educacionais, bem como desafios para a educação social as concepções de educação intercultural, sexual e socioeducativa em suas emergências frente às disfunções sociais emergentes, tais como: o abandono material e afetivo das crianças e adolescentes sob o jugo das drogas e dos riscos sociais; o desemprego e empregos precarizados; as violências e discriminações étnico-raciais e sexuais; bem como a intensão e extensão dos movimentos migratórios em nível planetário, todas estas disfunções associadas a um crescente desequilíbrio mundial da atividade econômica dos países-nações. Se pensarmos que o racismo, a xenofobia, e diversas modalidades de intolerância e todas as outras formas de discriminação recusam até a ideia de diálogo e representam uma afronta permanente à troca de ideia. Por isso, conforme refere Reis (2011), nesta perspectiva a educação intercultural deve construir práticas que eliminem a hierarquização de culturas e quaisquer formas de preconceitos. Referências ABRAMOWICZ, A.; RODRIGUES, T.C.; CRUZ, A.C.J. A diferença e a diversidade na educação.Contemporânea, São Carlos, n. 2, p. 85-97, ago.-dez. 2011. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 20 set. 2012. DUPIN, Giselle. Dez anos da Convenção da Diversidade Cultural: contribuições para um balanço. Disponível em: https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/18127/1/Diversidade-Cultural-repositorio.pdf. 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O impacto da diversidade cultural nas políticas educacionais: uma crítica às propostas das agências internacionais. Disponível em: http://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/histedbr/article/view/8640517. Acesso em: Jan.2017. UNESCO. Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural. Disponível em: http://www.unesco.org/new/fileadmin/MULTIMEDIA/HQ/CLT/diversity/pdf/declarati on_cultural_diversity_pt.pdf. Acesso em: Dez.2016. http://hdl.handle.net/10400.2/2186 http://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/histedbr/article/view/8640517 http://www.unesco.org/new/fileadmin/MULTIMEDIA/HQ/CLT/diversity/pdf/declaration_cultural_diversity_pt.pdf http://www.unesco.org/new/fileadmin/MULTIMEDIA/HQ/CLT/diversity/pdf/declaration_cultural_diversity_pt.pdf 19 AULA 3 Ações Afirmativas, Reconhecimento e Afirmação de Direitos Sejam todos e todas muito bem-vindos e bem-vindas a nossa terceira aula! Nas aulas anteriores, foram apresentadas algumas noções introdutórias sobre o tema Educação, Diversidade e Direitos Humanos, bem como a compreensão do contexto no qual estes tiveram seu surgimento, especificando a questão da Diversidade Cultural, de suma importância à reflexão sobre o seu contexto político e o seu campo de atuação. Nesta aula, estaremos trabalhando com Ações Afirmativas, Reconhecimento e Afirmação de Direitos, de forma a refletirmos determinados construtos sociais considerados como padrão, que em sua grande maioria são construções equivocadas, de que os grupos discriminados “favorecem” a discriminação. Convidando a todos a superar as idéias que nos isentam de responsabilidades na transformação da sociedade. Convidamos vocês, a serem responsáveis, no sentido de buscarem respostas para que a realidade de discriminações seja alterada, principalmente porque a escola consiste em um lócus muito propício ao desencadeamento de discriminações e preconceitos. Assim, importa que sobressaia a verdadeira função da escola que é a de fornecer uma educação ampla e qualitativa para todos. 20 A escola consiste em uma instituição social e como tal não há a possibilidade desta se isentar dos benefícios ou das mazelas produzidos pela sociedade. Nessa perspectiva, a mesma atua como um organismo vivo e, portanto, não está isenta de influências, o que implica em modos e estruturas de pensamentos e pontos de vista, assim como também de como os indivíduos se relacionarão com a e na sociedade. De forma análoga a esse processo, elencamos os elementos que têm influenciado a escola e as instituições de educação, quer na modalidade básica ou superior, contribuem para as suas transformações, que se dão de duas maneiras ou aspectos: de forma positiva e negativa, esta última pode ser identificada por meio dos cenários de discriminações e preconceitos, os quais são constantemente presenciados no espaço da escola. Compreendemos que não se faz uma educação de qualidade sem uma educação cidadã, uma educação que valorize a diversidade. Reconhecemos, contudo, que a escola tem uma antiga trajetória: normatizada e homogeneizada, a qual precisa ser revista. Os ideais de homogeneização das instituições escolares levavam a crer que os/as estudantes que não estavam dentro dos parâmetros adotados como socialmente correto: o modelo eurocêntrico, que ao excluir as diversidades de gênero, étnico-racial e de orientação sexual, dentre outras, implica em legitimar as desigualdades e as violências decorrentes delas. Essa concepção de educação justificou e justifica-se, ainda hoje, a fala de educadores e educadoras, os quais, ainda que reconheçam a existência de discriminações dentro e fora da escola, acreditam que é melhor se silenciar, pois falar do tema seria acordar preconceitos antes adormecidos, podendo provocar um efeito contrário: em vez de reduzir os preconceitos, aumentá-los. E, nos silêncios vão se reproduzindo desigualdades. Quando a escola não oferece possibilidades concretas de legitimação das diversidades (nas falas, nos textos escolhidos, nas imagens veiculadas nas instituições de ensino, dentre outros), o que resta aos alunos e alunas é senão a luta cotidiana para adaptar-se ao que esperam deles/as ou conformar-se com o status de “desencaminhados” ou reagirem aos xingamentos e piadinhas e configurarem-se entre os indisciplinados, e como consequência do processo, o abandono da escola, o que permite o dialogo com Pereira e André (2014), ao elencarem que a escola como reflexo da sociedade também é palco de inúmeras discriminações, que são permeadas por supostas brincadeiras e preconceitos disfarçados, sendo assim um constante processo de estigmatização dos sujeitos. É no ambiente das instituições de educação que os/as estudantes podem construir suas identidades individuais e de grupo, podem exercitar o direito e o respeito à diferença. 21 Propomos que educadores e educadoras observem o espaço escolar, quem o compõe, as relações que se estabelecem nesse âmbito, quem tem voz e quem não tem, assim como os materiais didáticos adotados nas diferentes áreas do conhecimento, as imagens impressas nas paredes das salas de aula, enfim, como a diversidade está representada, como e o quanto é valorizada, ultrapassando as restrições às datas comemorativas, que em sua maioria são constantemente invisibilizadas. Pretendemos contribuir, nesta disciplina, para um avanço na reflexão de que a diversidade não se trata de mais um dos assuntos que são jogados nas costas dos/das educadores/as para roubar tempo e espaço para trabalhar os “conteúdos” considerados mais importantes dentre os componentes curriculares cobrados veementes nos processos seletivos para o ingresso aos cursos superiores. Sabemos que o currículo escolar não é neutro, portanto, a diversidade está presente em cada entrelinha, em cada imagem, em cada dado, nas diferentes áreas do conhecimento, valorizando-a ou negando-a. É no ambiente escolar que as diversidades podem ser respeitadas ou negadas. É da relação entre educadores/as, entre estes/as e os/as educandos/as e entre os educandos/as que nascerá a aprendizagem da convivência e do respeito à diversidade que se devidamente reconhecida, torna-se um recurso social dotado de altas potencialidades pedagógicas e libertadoras, portanto, a sua valorização é indispensável para o desenvolvimento e a inclusão de todos os indivíduos. Faz-se necessário contextualizar o currículo, cultivandouma cultura de abertura ao novo, a fim de ser capaz de absorver e reconhecer a importância da afirmação da identidade, levando em conta os valores culturais dos/as estudantes e seus familiares, favorecendo que estudantes e educadores/as respeitem os valores positivos que emergem do confronto dessas diferenças, possibilitando, ainda, desativar a carga negativa e eivada de preconceitos que marca a visão discriminatória de grupos sociais, com base em sua origem étnico-racial, suas crenças religiosas, suas práticas culturais, seu modo de viver. Nessa perspectiva, emergiram as políticas de ação afirmativa aplicadas à educação no Brasil, as quais se justificam mediantes as imensas desigualdades sociais, principalmente para os socialmente vulneráveis, configurando um novo cenário e atrelado a este uma inovadora função da educação pública superior, que vem ganhando força e sendo amplamente discutida em razão das políticas de ação afirmativa para grupos étnicos e socialmente carentes, discriminados, enquanto uma política de inclusão social e como forma de ampliar o acesso 22 destes grupos sociais economicamente desfavorecidos dentro da universidade, bem como forma de autoafirmação. As políticas de ação afirmativa são justificadas mediante três argumentos básicos: reparação, justiça distributiva e diversidade, os quais têm sido historicamente os pilares sobre os quais se assenta a justificação das políticas, tanto no Brasil quanto nos demais países onde as mesmas foram implementadas. Feres Júnior (2007) ressalta que nem sempre os três argumentos estarão ou precisarão estar presentes em um determinado momento histórico, pois os mesmos também são equipotentes em cada discurso de justificação, mas onde quer que a ação afirmativa for implantada, pelo menos um desses argumentos será utilizado em sua justificação pública. O termo “ação afirmativa” como expressão, emergiu na década de 60, na ativa da luta pelos direitos civis nos Estados Unidos, quando no dia 6 de março de 1961, na Ordem executiva 10925 do presidente John F. Kennedy, que além do objetivo de proibir as diversas instituições governamentais norte-americanas de exercerem atos discriminatórios contra candidatos a empregos norteados por critérios de cor, religião ou nacionalidade, instigava também tais agências a aderirem ao uso da ação afirmativa na contratação dos seus funcionários. Como políticas, as ações afirmativas não foram implementadas por acaso nos Estados Unidos, mas em decorrência do princípio democrático da igualdade de oportunidades, já que foi comprovado a não possibilidade do estabelecimento de uma igualdade de maneira efetiva entre brancos e negros americanos a não ser partindo do pressuposto de se favorecer os negros com maneiras de se compensar a discriminação sofrida no passado e também em virtude das marcas deixadas pela escravidão. Após o falecimento do presidente Kennedy, o seu sucessor, o presidente Lyndon Johnson gerou mais um avanço na intenção de instituir mecanismos de combate à desigualdade. Por meio da Ordem Executiva, este presidente norte-americano proporcionou um estímulo para que aquelas firmas contratadas pelo governo buscassem a ação afirmativa, tendo em vista a igualdade de oportunidades aos membros advindos das minorias raciais e dos deficientes físicos, proibindo a discriminação. O histórico da implementação da política de ações afirmativas implicou perspectivas e conflitos ou tensões. Tais políticas não são aplicadas há muitos tempos, constituem-se como recentes na história da ideologia antirracista. Já foram aderidas em alguns países como: Índia 23 (inclusive, é o país com a mais extensa experiência de políticas afirmativas da qual se tem registro, aderindo às mesmas nos anos de 1950), Estados Unidos, Inglaterra, Canadá, Alemanha, Austrália, Nova Zelândia e Malásia, dentre outros, com vista a oferecer aos grupos discriminados e excluídos um tratamento diferenciado, com caráter compensatório nas desvantagens provenientes da situação de vítima do racismo e de outras formas de discriminação. No caso do Brasil, o termo adveio repleto de uma diversidade de sentidos, o que em sua maioria reflete os debates e experiências históricas dos países em que as políticas afirmativas foram desenvolvidas (MOEHLECHE, 2002). As ações afirmativas foram implementadas buscando a garantia da igualdade de tratamento e principalmente de oportunidades, bem como compensar as perdas provocadas pela discriminação e marginalização decorrentes dos inúmeros motivos próprios da sociedade brasileira que foram sendo acumulados e camuflados ao longo dos anos, buscando-se a partir destas medidas temporárias e emergenciais, atingir plenamente a cidadania. Gomes (2001) ao realizar uma retrospectiva da evolução histórica do conceito de políticas de ações afirmativas, destaca que a priori estas foram definidas como um “encorajamento” do Estado para que as pessoas com poder decisório considerassem, em suas deliberações sobre acesso à educação e ao mercado de trabalho, fatores como a raça, a cor, o sexo e a nacionalidade das pessoas. Esse encorajamento objetivava concretizar, quando possível, que escolas e empresas tivessem em sua composição sujeitos representantes destes grupos. A posteriori, por conta da ineficácia do combate à discriminação, as ações afirmativas tiveram seu conceito associado à ideia de igualdade de oportunidades por meio da imposição de cotas de acesso das minorias às instituições educacionais e alguns setores do mercado de trabalho. Neste segundo momento, a ação afirmativa e o alcance de metas estatísticas relacionadas à presença de negros e mulheres no mercado de trabalho ou instituição de ensino passaram a vincular-se (GOMES, 2001). Atualmente, as ações afirmativas podem ser definidas como um conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com vistas ao combate à discriminação racial, de gênero, por deficiência física e de origem nacional, bem como para corrigir ou mitigar os efeitos presentes da discriminação praticada no passado, tendo por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade de acesso a bens fundamentais como a educação e o emprego (GOMES, 2001 p. 94). 24 Gomes (2007) define as políticas de ação afirmativa como políticas públicas e privadas volvidas à concretização do princípio constitucional da igualdade material, bem como neutralizar os efeitos da discriminação racial, de gênero, de idade, de origem nacional e de aparência física. O Brasil foi remetente de diversos documentos em fóruns internacionais contra a discriminação e o racismo, em que já deveria ser adotada uma posição mais rígida pelo País, no sentido de concretizar os ideais propostos, mesmo que muitas iniciativas realizadas no País não tenham tido a necessidade de uma legislação específica, em algum momento seria necessário o início da regulamentação desses direitos, com o intuito de efetivá-los (GONÇALVES, 2004). Assim, a sociedade brasileira já estava experimentando práticas afirmativas há algum tempo, em sua história jurídica e constitucional, mediante leis que alicerçam o princípio de tratamento diferenciado direcionado aos grupos socialmente minoritários, a saber, as ações positivas para os índios, mulheres e deficientes físicos, tão comuns na Magna Carta de 1988, a denominada “constituição cidadã”. Contudo, foi a partir deste instrumento legal que foi positivado o instituto de forma consolidada e estabeleceu diversas medidas a serem adotadas pelo Estado em prol da promoção da igualdade de oportunidades, tendo a grande tomada de força das ações afirmativas no País. Gomes (2001) ressalta que as ações afirmativas têm como meta propiciar mudanças culturais, pedagógicas e psicológicas. Isso ocorre quando retira-se da sociedade as ideias de superioridade racial ede subordinação étnico-racial e/ou de gênero; quando a sociedade faz cessar a discriminação e elimina seus efeitos; implanta a diversidade e amplia a representatividade dos grupos minoritários nos diversos setores da sociedade; cria personalidades emblemáticas como exemplo para os mais jovens e mostra a estes que podem investir em educação, pois há na sociedade espaço para todos. Nesta perspectiva, a igualdade é um objetivo constitucional que a sociedade e o Estado devem alcançar e as ações afirmativas podem ser associadas a um remédio razoável para os males crônicos, como exclusão, discriminação e marginalização. Portanto, é imprescindível que a sociedade por meio de suas lideranças políticas se conscientizem acerca da urgente necessidade de se eliminar ou reduzir as desigualdades sociais, com destaque para 25 as de vertente raciais, fruto da marginalização socioeconômica sofrida pelas minorias constituindo a gênese do fenômeno da discriminação (GOMES, 2001). Piovesan (2010) ressalta que, no contexto de democratização da sociedade brasileira as ações afirmativas são políticas compensatórias de alívio e remediação de um passado discriminatório, que cumprem a finalidade pública do projeto democrático de assegurar a igualdade, diversidade e a pluralidade social. Vale lembrar que as medidas que concretizam o direito à igualdade devem fundamentar-se no preceito de que esta se molda no respeito à diferença. Portanto, a igualdade formal deve alcançar a igualdade material ou substantiva e as políticas afirmativas consistem como um dos instrumentos para a concretização desta. Segundo Gonçalves (2004), no Brasil a visibilidade das políticas de ações afirmativas se iniciaram após a Conferência Internacional em Durban na África do Sul, em 2001, mas já existiam ciências de ações afirmativas em inúmeras regiões do Brasil, anteriores a Durban, em áreas não vinculadas a educação superior. Podemos citar como exemplo a experiência de Santa Catarina que criou um programa de ação afirmativa com o objetivo de formar operadores jurídicos, habilitados para discutir as questões sobre problemas raciais e prestar assistência jurídica nas comunidades negras no combate à discriminação social. No entanto, tais ações começaram a se desencadear, segundo Amaral (2006), nos primórdios do período da escravidão, por meio de práticas de revolta entre os escravos, prosseguindo até os séculos XVII e XIX, o Movimento Negro nascido nos meados do século XVI pode ser considerado o movimento social mais antigo do Brasil, em que os avanços obtidos por este em prol de beneficiar a população negra, frutos das inúmeras lutas travadas pelos seus militantes sustentam os avanços obtidos até o presente momento no Brasil. Em virtude da assinatura da Lei n.º 3.353, no dia 13 de maio de 1888, conhecida como Lei Áurea, foi decretada a abolição da escravidão no Brasil. No entanto, há controvérsias acerca da mesma já que foi liberto somente o escravo do cativeiro, dos grilhões, pois a lei não se preocupou em amparar, dar subsídios a fim de que os ex-escravos pudessem ser reconhecidos como cidadãos brasileiros, atitudes essas perceptíveis mediante a omissão estatal, que não proporcionou educação e respaldo econômico aos negros libertos, que findaram em originar os grupos designados “minoria”, a saber: os sem-terra, os sem-teto e os analfabetos, constituindo-se em atitudes extensivas também aos índios, as mulheres, aos pobres e aos estrangeiros, pois estes não possuíam voz ativa na sociedade brasileira. 26 Após o efeito festivo da comemoração, gerada pelo advento da escravidão, os negros ficaram sem abrigo, trabalho e meio de subsistência, condições que desencadearam o processo de marginalização. Os que moravam nas cidades ficaram perambulando pelas ruas, passando a habitar cortiços, originando as favelas, já os que residiam no campo iniciaram o processo de emigração para as cidades, pois não podiam continuar nas antigas fazendas em que eram escravos, pois as terras não lhes pertenciam, não permitindo assim a sua permanência no campo. Cujos lugares sociais e no mercado de trabalho foram ocupados pela mão de ora imigrante, que em consonância com as ideologias predominantes na época, segundo as teorias do pensamento social brasileiro do século XIX, na busca pela eugenia, era a solução para o problema negro do Brasil, e a sua colocação no ranking de país desenvolvido. De acordo com o cenário exposto, o mesmo colaborou para que o Movimento Negro se mobilizasse por intermédio das associações culturais e recreativas visando à conscientização da sociedade acerca de uma efetiva inclusão dos negros, que passava necessariamente pela educação e pelo mercado de trabalho, criando a partir daí diversas instituições de apoio as lutas e reinvindicações do movimento negro. A partir de 1970, novos movimentos sociais foram valorizados, nesse contexto o movimento negro ressurgiu, denunciando, a falsa democracia racial, que servira como mito fundante do Brasil-Nação, ao esconder, por detrás das diferenças de classe, as profundas desigualdades de cor existentes no país, em que pese o ideário contrário de saudável convívio entre as “raças” no Brasil. Até os anos 80, não houve espaço por parte dos governantes para que o Movimento Negro atuasse no âmbito do Estado. A partir de 1980, com o processo de redemocratização do país e na conjuntura de falência dos modelos de socialismo real, o Poder Público foi mais sensível aos anseios do Movimento Negro e implementou ações concretas de valorização e inserção da população negra (AMARAL, 2006). Na década de 90, no que diz respeito ao Poder Público, novas respostas foram dadas à problemática racial brasileira. De acordo com Machado e Fernandes (2014), nesta década teve início a representação de um cenário político de aproximação entre o Estado brasileiro e as reinvindicações de grupos do Movimento Negro, aproximação esta que colaborou no avanço da exposição de estudos e pesquisas acadêmicas que confirmaram intensas desigualdades raciais no Brasil e pressões geradas pelas exigências de atos mais sólidos que discutem as desigualdades raciais postas pelo Movimento Negro e por grupos estabelecidos tanto no Brasil quanto no exterior, principalmente após a Conferência de Durban, cuja intensificação 27 do debate em diversos âmbitos teve início a partir do ano 2000, inclusive dentro do Governo Federal, que culminou entre os dias 06 e 08 de julho de 2001, na realização da I Conferência Nacional Contra o Racismo e a Intolerância, no Rio de Janeiro, e em 31 de agosto e 7 de setembro de 2001, ocorreu, em Durban, na África do Sul, a III Conferência Mundial Contra o Racismo, a Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada com a finalidade de se promover a equidade de oportunidades (igualdade material), bem como das discussões acerca das questões étnico-raciais, a qual é destacada por (AMARAL, 2006; MAIO e SANTOS, 2005) como “um marco na luta antirracista em escala internacional”. A Conferência de Durban teve como reflexo interno no Brasil ainda em 2001, a criação, por decreto presidencial, do Conselho Nacional de Combate à Discriminação (CNCD), cujo propósito primário consistiu no incentivo à criação de políticas públicas afirmativas de promoção da igualdade e da proteção dos direitos de indivíduos e de grupos sociais e étnicos afetados por discriminação racial e por demais formas de intolerância. Nessa perspectiva, pautam-se as políticas de ação afirmativa, as quais constituem-se como medidas especiais e temporárias que, buscando remediar um passado discriminatório, cujo objetivo consiste acelerar o processo no alcance da equidade por parte de grupos vulneráveis, como as minorias étnicas e raciais e as mulheres, entre outros grupos. Das diversas medidas de ação afirmativa, no Brasil ganharam destaque a modalidade cotas,que consonante Gomes e Martins (2004), quem sabe pode ser considerada como uma das modalidades mais radical dessas políticas, pois por meio delas foi notória a urgência de um posicionamento e a visibilidade da existência de privilégios na sociedade brasileira, centralizando o debate acerca da garantia do direito a todos. Amaral (2006, p.60), salienta que o Estado do Rio de Janeiro foi um dos pioneiros a buscar minimizar a desigualdade de acesso entre negros e brancos nas Universidades Públicas Fluminenses, ao adotar, em 2002, a reserva de vagas para negros e pardos nos processos seletivos para ingresso na Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) e na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), em meio a polêmicas. Nas universidades, elencadas, diversos foram os discursos enunciados contrários e favoráveis à adesão de políticas de cotas, bem como da sua eficácia, o que culminou na adoção de novos critérios de seleção e admissão nos cursos de graduação das universidades estaduais do Rio de Janeiro, estabelecidos em decorrência de sucessivas leis estaduais, atualmente em vigência, a Lei 5.346 de 2008 decretada pela Assembleia Legislativa do Estado 28 do Rio de Janeiro (ALERJ) e sancionada pelo então do Governador do Estado do Rio de Janeiro na época, Sérgio Cabral, no dia 11 de dezembro, e que prevê o prazo de dez anos da política para comprovar a eficácia ou não da implementação do sistema de reserva de vagas nas universidades contempladas pela política (AMARAL, 2012). A partir das experiências com as políticas de cotas nas universidades estaduais do Rio de Janeiro, diversas instituições de ensino públicas estaduais e federais adotaram política de cotas por critérios variados, sejam aderindo ao mecanismo cotas de vagas, a sistema de pontuação, a programas de reservas de vagas extras, já podendo considerar uma tendência à adesão de políticas de ação afirmativa pelas universidades brasileiras (MACHADO, 2007; HERINGER E FERREIRA, 2009; TAPAJÓS, 2015). Inicialmente, a adesão de políticas que visam à inclusão de “minorias” ao acesso ao ensino de nível superior e público, ocorreu não apenas no estado do Rio de Janeiro, mas também em outros estados e regiões brasileiros, mesmo que não de forma equivalente, no sentido da utilização do aparato legal, como foi o caso das universidades estaduais da Bahia e do Mato Grosso do Sul, a saber, UNEB e UEMS, ambas no ano de 2002. Em 2003, com a notoriedade da UnB como a primeira instituição federal a implementar uma política dessa natureza, em resposta a um caso de discriminação na pós-graduação, o qual ganhou notoriedade, em que o primeiro vestibular com reserva de 20% das vagas para estudantes negros foi realizado em junho de 2004. A experiência no âmbito federal teve seguimento com a Universidade Federal de Alagoas (UFAL), que buscou nesse período também atendimentos a estudantes negros. A partir dos ensaios elencados, a medida passou a ganhar aderência por parte de diversas instituições de nível superior, que passaram a adotar majoritariamente o sistema de cotas, variando os percentuais estabelecidos, inclusive, algumas seguiram por outros critérios, conforme elencado por Heringer e Ferreira (2009), que não foram dadas sequências apenas ao modelo de cotas, como foi o caso das seguintes instituições: Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP), Faculdade de Tecnologia de São Paulo (FATEC), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Universidade Federal Fluminense (UFF), que optaram pela adoção ao sistema de acréscimo de pontos e bonificação no vestibular. Cabem destaques, também, a Universidade Federal do Paraná (UFPR), que implantou em 2004 um programa de Ações Afirmativas e a Universidade Federal do Rio Grande do 29 Norte (UFRN), que desde o ano 2006 vem fazendo uso do argumento da inclusão, criando programas de bonificação no vestibular para alunos oriundos da rede pública de ensino. Conforme levantamento realizado por Renato Ferreira, em 2008, denominado de “O mapa das ações afirmativas nas instituições públicas de ensino superior e técnico”, Heringer e Ferreira (2009) afirmam que diversas instituições federais do país dentre as duzentas e vinte e quatro instituições públicas de ensino superior, setenta e nove promovem algum tipo de ação afirmativa. Pesquisadores com destaque para (MACHADO, 2007; HERINGER e FERREIRA, 2009) já apontavam para uma tendência à adesão de políticas de ação afirmativa pelas universidades brasileiras, o que atualmente pode ser justificado, inclusive pela regularização da política de cotas nas universidades públicas federais, no intuito de ampliar o acesso de jovens carentes em desigualdade de oportunidades, a partir da aprovação da Lei das Cotas nº 12.711/2012, em que no Art. 3º da legislação foi decretado que dentro do percentual de vagas a ser reservado, estas deveriam ser preenchidas por estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas sendo o número de vagas distribuídos por curso e turno em proporção no mínimo igual entre pretos, pardos e indígenas da população que compõe a unidade da Federação na qual encontra-se instalada a instituição de ensino de acordo com o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (DAFLON, JÚNIOR & CAMPOS, 2013). Como foi citado por Silva (2014) “Quando a palavra negro complementa nominalmente as Ações afirmativas (AA) é um “Deus nos acuda”. Isso porquê, a sociedade brasileira se vê como composta por uma mestiçagem e um multiculturalismo que é usado como argumento a obscurecer o preconceito, que se manifesta, na maior parte das vezes, de maneira implícita. Assim, conforme bem pontuam Amaral e Mello (2013), há uma construção “da nação como comunidade ‘imaginada’, pelo fato de que se estabelece dentro dela uma comunhão entre os indivíduos sem qualquer tipo de contato uns com os outros”. A postura das universidades ao aderirem ao sistema de reservas vagas para negros gerou discussões efervescentes, principalmente por parte daqueles contrários à política de cotas étnico-raciais, cujo argumento de justificação foi pautado no princípio da constitucionalidade. Não obstante, as cotas foram declaradas como medidas constitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2012 por unanimidade da corte, inclusive no componente étnico-racial, estruturando, desse modo, que a reserva de vagas para negros nas 30 universidades públicas não ofende a Constituição Federal de 1988 (HERINGER, 2014; TAPAJÓS, 2015). Apesar de a discriminação racial ser constantemente mascarada neste país, há um claro esforço em prol de sua desconstrução, como a própria política de cotas abalizada na “raça” no ensino superior público brasileiro, no âmbito da graduação, quando as políticas surgidas primeiramente no estado do Rio de Janeiro em 2001, por força de lei e aprovada por aclamação na Assembleia Estadual, possuía, segundo os proponentes, o objetivo de minimizar a desigualdade racial; e hoje, há mais de quinze anos após as primeiras iniciativas, é obrigatório que as instituições públicas de ensino, a partir da aprovação da Lei nº 12.711/2012, conhecida como Lei das Cotas, e o Decreto Federal n.º 7.824/2012, regulamento executivo que a normatizou estendendo as cotas para as Universidades Federais e Institutos Federais de Ensino Técnico de Nível Médio, reservem até 50% das vagas para estudantes egressos de escolas públicas, em especial negros e indígenas. Referências AMARAL, Shirlena Campos de Souza. 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Acesso em: Out.2016. http://www.achegas.net/numero/30/joao_feres_30.pdf http://www.scielo.br/pdf/cp/n117/15559.pdf http://www.conpedi.org.br/publicacoes/66fsl345/g5znv4pn/7a13mpAcHpbZr0E3.pdf 32 Material para Leitura GOMES, Joaquim Benedito Barbosa; SILVA, Fernanda Duarte Lopes Lucas da. As ações afirmativas e os processos de promoção da igualdade efetiva. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/cp/v35n124/a0435124.pdf. Acesso em: Ago.2016 (p.86-108). http://www.scielo.br/pdf/cp/v35n124/a0435124.pdf AULA 4 - Racismo, Preconceito, Discriminação e o Discurso da Igualdade Racial “A expansão da cidadania social implica, além de uma ação efetiva dos poderes públicos e da pressão popular, um tipo de mudança cultural, no sentido de mexer com o que está mais enraizado nas mentalidades marcadas por preconceitos, por discriminação, pela não aceitação dos direitos de todos, pela não aceitação da diferença. Trata-se, portanto, de uma mudança cultural especialmente importante no Brasil, pois implica a derrocada de valores e costumes arraigados entre nós, decorrentes de vários fatores historicamente definidos.” Maria Victoria Benevides PRINCÍPIOS ORIENTADORES DOS DIREITOS HUMANOS • A luta pelos Direitos Humanos e a sua afirmação se dá no cotidiano; • Os Direitos Humanos são conquistas históricas; • Os Direitos Humanos são percebidos de acordo com o contexto social em que vivemos; • Direitos humanos são direitos de todos; dos negros, dos índios, das mulheres, dos homens, dos homossexuais, dos trabalhadores, dos empresários e também dos presos; e • Direitos Humanos: muitos lutam por eles; uns são “sujeitos” e outros “parceiros”. “Diferentes, mas não desiguais!” “Viva a diferença” Frases como as ilustradas acima, fazem parte do conjunto de livros, trabalhos acadêmicos, campanhas e ações que denunciam e conscientizam as pessoas para a questão do respeito as diferenças, como elementos que engrandeceram a nação brasileira, mesmo sendo o país afamado como representante da diversidade, em que todo mundo ama todo mundo, da receptividade que é a nossa marca, o acolhimento. Contudo não é bem assim que as coisas acontecem no Brasil, pois diversas denúncias, quer de forma formal ou não, são apresentadas mostrando situações em que, por exemplo, diversos jovens mesmo detendo as qualificações necessárias para angariar uma vaga, principalmente se for bem visada, mas em virtude de ser negro, não consegue o emprego sob a alegação de não preencher o critério subjetivo de “boa aparência”, “boa imagem” , cujos discursos enunciados pelos que o cercam e com proximidade serão: “mas você também não deu um jeito nesse cabelo ruinzinho e nessa barba grande, assim fica difícil mesmo de conseguir uma vaga de emprego mais visada”. Oracy Nogueira (2007) considera como preconceito racial uma disposição (ou atitude) desfavorável, culturalmente condicionada, em relação aos membros de uma população, aos quais são considerados como estigmatizados, seja devido à aparência, a toda ou parte da ascendência étnica a qual lhes são atribuído ou reconhecido. Quando o preconceito de raça se exerce em relação à aparência, isto é, quando toma por pretexto para as suas manifestações os traços físicos do indivíduo, diz-se que é de marca. Por sua vez, quando parte-se do princípio de que o preconceito decorre do fato do indivíduo ser descendente de certo grupo étnico, sinalizando, assim, que no Brasil o preconceito assume a característica de marca diferentemente de outras nações, em que o mesmo é de origem. Frases como essas, sinalizam uma característica, inclusive, bastante antiga de que quando as diferenças e as desigualdades são postas em xeque, os discriminados/as ou as vítimas são os culpados/as pela própria discriminação; são culpados/as pelo estado no qual se encontram, ao fugirem a “regra”. Regra esta de que deveriam seguir os padrões socialmente construídos, alicerçados no modelo europeu. PERGUNTA-SE: • Quais são os grupos que hoje no Brasil estão lutando pelos Direitos Humanos? • O que tudo isso tem a ver com a educação? A escola é concebida como um espaço de diálogo crítico e reflexivo entre diferentes saberes e linguagens. De reflexão, análise crítica e construção de autonomia. De articulação entre igualdade e diferença. De exercício da cidadania. Um espaço de busca, construção de identidade, socialização, confronto, prazer, desafio, aventura, afirmação da dimensão ética e descoberta de sentido e transcendência. Vera Candau IGUALDADE NA LEI “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil” (CF/1988). Art.5º da CF/1988: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, e à propriedade, nos seguintes termos: DIFERENÇA E DESIGUALDADE Há inúmeros outros dispositivos que tratam da diferençae desigualdade, em busca de um tratamento mais igualitário na Constituição Brasileira de 1988, tais como: Afro-brasileiros e Indígenas – artigos 215 e 216 da CF/88, reconhecimento do direito à diferença e proteção dos direitos culturais) Pessoas com Deficiência– artigo 37, VIII da CF/88 (percentual de cargos e empregos públicos reservados em lei ) Mulheres – artigo 7º, XX da CF/88 (incentivos especiais de proteção ao mercado de trabalho da mulher) A partir das reivindicações de diferentes movimentos sociais que defendem o direito à diferença se tem levantado, cada vez com maior força, a concepção de que a lei, como instrumento regulador da vida social, não deve servir de fonte de privilégios e perseguições. Antes, pelo contrário, ela precisa tratar de forma equitativa todos os cidadãos. É este o fundamento político- ideológico central do princípio da igualdade. └ O princípio da igualdade pretende expressar a igualdade de tratamento na lei e perante a lei, e não afirmar que todos são iguais em essência. O que a ordem jurídica pretende firmar é a impossibilidade de desequiparações fortuitas ou injustificadas (MELLO, 2004). Preconceito, racismo e discriminação no contexto educacional Existe muito preconceito, racismo e discriminação no contexto escolar brasileiro, e estes consistem em grandes problemas para todos nós. Buscaremos esclarecer um pouco sobre cada um desses conceitos. Flávia Cunha Lima (Professora Formadora da Diversidade) CEFAPRO conceitua cada uma dessas três situações-problemas no Brasil, os quais estão imbricados, em que um emerge do outro: Preconceito É uma opinião que formamos das pessoas antes de conhecê- las. É um julgamento apressado e superficial muito perigoso, pois ao invés de melhorar a nossa vida e da sociedade, acaba trazendo muitas situações complicadas e até mesmo violentas. Racismo Pessoas que não conseguem deixar de ser preconceituosas, podem vir a se tornar racistas. Portanto, as raízes do racismo são oriundas do preconceito. -Uma pessoa racista acredita que existe raças superiores às outras, o que não é verdade, pois na espécie humana, não podemos dizer que existam raças. Discriminação Discriminação é portanto, tratar os outros com inferioridade, se julgando como superior. - A pessoa que faz isso, geralmente, quer valorizar a si próprio e diminuir os demais, com posturas que sinalizam atitudes, que são justificadas com argumentos como “ foi de brincadeira”, se colocando em perguntas “inocentes”, aquelas do tipo “sem querer ofender”; - Os preconceituosos e racistas têm dificuldades em aceitar e conviver com as diferenças e, às vezes, suas atitudes chegam ao extremo. ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL A Lei nº 12.288, de 20 de julho de 2010 busca atender reivindicações históricas do movimento negro brasileiro, em um país no qual ao menos metade da população se considera como negros e mestiços. Dentre os pontos que se podem destacar está a exigência de maior equilíbrio na representatividade racial dos trabalhadores nas empresas, nas instituições de ensino, dentre outras. Tem-se assim: - o desafio de equiparar direitos e superar o racismo na sociedade brasileira. Como resolver essa problemática social? Uma das alternativas de possíveis estratégias de resolução, com base em experiências de outras nações foi a: Criação de diversas medidas, também conhecidas por políticas públicas ou privadas de ação afirmativa. Essas políticas são aplicadas tanto na: Educação Básica, com destaques para: - Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003; - Orientações Curriculares para o Ensino Médio do Ministério da Educação e Cultura de 2006; - Lei nº 1.645/2008, de 10 de março de 2008. Quanto na: Educação Superior, com ênfase na: - Lei nº 5346, de 11 de dezembro de 2008, em âmbito estadual, no Rio de |Janeiro; - Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012, em âmbito federal. Perguntamos, ainda: Como trabalhar o direito à diversidade, a não- discriminação e o direito a proteção de minorias em suas práticas educacionais, em conformidade com as diretrizes das Leis 10.639/2003 e 11.645/2008, além das Orientações Curriculares para o Ensino Médio do Ministério da Educação e Cultura? A educação constitui-se um dos principais ativos e mecanismos de transformação de um povo e é papel da escola, de forma democrática e comprometida com a promoção do ser humano na sua integralidade, estimular a formação de valores, hábitos e comportamentos que respeitem as diferenças e as características próprias de grupos e minorias. Assim, a educação é essencial no processo de formação de qualquer sociedade e abre caminhos para a ampliação da cidadania de um povo. Fonte: Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, 2003. Proposta do Estatuto da Igualdade Racial “É dever do Estado e da sociedade garantir a igualdade de oportunidades, reconhecendo a todo cidadão brasileiro, independentemente da etnia, raça ou cor da pele, o direito à participação na comunidade, especialmente nas atividades política, econômica, empresarial, educacional, cultural e esportiva, defendendo sua dignidade e seus valores religiosos e culturais.” As cotas étnico-raciais ataca a raiz do problema do racismo institucional na sociedade brasileira, controlando a atuação de mecanismos de discriminação na seleção, demissão e evolução das minorias sociais à garantia de direitos e acesso a bens sociais. NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS AFIRMATIVAS, PERGUNTAMOS: A POLÍTICA DE COTAS É LEGÍTIMA? FERE O PRINCÍPIO DA IGUALDADE? A partir dessas questões orientadoras e polêmicas, elencamos alguns dos discursos proferidos quer contrários, quer favoráveis à política. A Polêmica das “cotas étnico-raciais” Argumentos Contra -Somos um só povo, as situações de discriminação são localizadas e contextuais; -Promovem um “racismo às avessas”; -Atentam contra o mérito individual; -As diferenças se reduzem às desigualdades sociais; -As medidas universalistas são mais eficazes. Argumentos a Favor -Raça/etnia são construções sociais e os processos de discriminação estão fortemente presentes no tecido social. -Promovem igualdade de oportunidades. -O mérito é socialmente construído. -Discriminação e desigualdade estão relacionadas, mas uma não pode ser reduzida à outra. -Medidas universalistas não rompem com os mecanismos de exclusão; medidas universalistas e diferencialistas se completam. Muitos desse argumentos são fundamentados pelo Mirto da democracia racial, bastante difundido e apresentado como ideal para a composição de uma sociedade em progressão, de uma nação evoluída, em que o “problema negro”, já fora resolvido com a miscigenação da população. Para Schwarcz ( 2001), o Brasil no final do século XX, era apontado como um caso único e particular de estrema miscigenação racial, pois se caracterizava como uma sociedade de raças mistas, composta por grande diversidade de indivíduos com características específicas. O Mito da democracia racial Para alguns intelectuais contemporâneos, o mito transforma-se em chave interpretativa da cultura brasileira. Mas é preciso que se lembre sempre de que o mito, no sentido antropológico, transforma-se facilmente em falsa ideologia, quando ganha a arena política, perdendo seus referentes históricos e sociais, obscurecendo o jogo de interesses e de poder que lhe dá sentido em cada época. Ou seja, quando é tomado como valor atemporal e a-histórico. Ora, é isso justamente que fez Gilberto Freyre a partir dos 1930. Em Gilberto, a “democracia social e étnica” brasileira é característica imanente e perene à cultura luso-brasileira. Mas, sabemos hoje que todos os sentidos culturais são construídos e reconstruídos a cada momento (AMARAL e MELLO, 2013. Morta a democracia racial, ela continua viva enquanto mito, seja no sentido de falsa
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