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1 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 MÓDULO DISPNEIA, DOR TORÁCICA E EDEMA 1. Conhecer a dor anginosa e sua classificação. A angina é uma síndrome clinica caracterizada por dor ou desconforto em quaisquer das seguintes regiões: to ́rax, epigástrio, mandi ́bula, ombro, dorso ou membros superiores. É tipicamente desencadeada ou agravada com a atividade física ou estresse emocional, e atenuada com uso de nitroglicerina e derivados. A angina usualmente acomete portadores de DAC com comprometimento de, pelo menos, uma artéria epica ́rdica. Entretanto, pode também ocorrer em casos de doença cardíaca valvar, cardiomiopatia hipertrófica e hipertensão não controlada. Pacientes com coronárias normais e isquemia miocárdica relacionada ao espasmo ou disfunção endotelial também podem apresentar angina. 2. Estudar a anatomia da circulação coronariana. Os nutrientes não conseguem se difundir rapidamente o suficiente do sangue das câmaras do coração para suprir todas as camadas de células que formam a parede do coração. Por isso, o miocárdio tem a sua própria rede de vasos sanguíneos, que é a circulação coronariana. As artérias coronárias ramificam-se da parte ascendente da aorta e cercam o coração como se fosse uma coroa. Enquanto o coração está contraindo, pouco sangue flui nas artérias coronárias, porque elas estão bem comprimidas. Já quando o coração relaxa, a pressão elevada da aorta impulsiona o sangue ao longo das artérias coronárias até os vasos capilares e em seguida as veias coronárias. Problema 02 - Exercício físico é bom mesmo? 2 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 ARTÉRIAS CORONÁRIAS: As artérias coronárias direita e esquerda se ramificam da parte ascendente da aorta e fornecem sangue oxigenado para o miocárdio. O tronco da coronária esquerda se divide em ramos interventricular anterior e circunflexo. O ramo circunflexo distribui sangue oxigenado para as paredes do ventrículo esquerdo e átrio esquerdo. O ramo interventricular anterior ou descendente anterior fornece sangue oxigenado as paredes de ambos os ventrículos. A artéria coronariana direita se divide em ramos interventricular posterior e marginal direito. O ramo interventricular posterior irriga as paredes dos dois ventrículos. O ramo marginal posterior transporta sangue oxigenado a parede do ventrículo direito. Ramo nodal: irriga o nó sinusal. Portanto a obstrução dessa artéria pode causar arritmia. O miocárdio contém muitas anastomoses que conectam ramos de uma determinada artéria coronária ou se estendem entre os ramos de diferentes artérias coronárias. Elas fornecem desvios para o sangue arterial se uma via principal estiver obstruída. VEIAS CORONÁRIAS A maior parte do sangue venoso do miocárdio drena para um grande seio vascular no sulco coronário na face posterior do coração, chamado seio coronário. O sangue venoso do seio coronário drena para o átrio direito. As principais tributárias que transportam sangue para o seio coronário são: Veia cardíaca magna no sulco interventricular anterior, que drena as áreas do coração irrigadas pela artéria coronária esquerda (ventrículos esquerdo e direito e átrio esquerdo) Veia interventricular posterior no sulco interventricular posterior, que drena as áreas irrigadas pelo ramo interventricular posterior da artéria coronária direita (ventrículos esquerdo e direito) Veia cardíaca parva no sulco coronário, que drena o átrio direito e o ventrículo direito Veias anteriores do ventrículo direito, que drenam o ventrículo direito e drenam diretamente para o átrio direito. 3 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 3. Elucidar acerca da epidemiologia, fatores de risco, fisiopatologia, quadro clínico, diagnóstico e tratamento da dac. DOENÇA arterial coronariana crônica A doença arterial coronariana refere-se ao comprometimento da circulação coronária com alterações da luz das artérias, podendo levar a alterações no fluxo sanguíneo coronário. Os sintomas mais frequentes da DAC se deve a insuficiência coronária que se caracteriza por um desequilíbrio entre a oferta de oxigênio para o miocárdio e seu consumo. Isso se deve a alterações em qualquer ponto da circulação coronariana. O termo isquemia significa “desequilíbrio entre oferta e consumo de oxigênio”, devido a diminuição da oferta e/ou aumento do consumo. O resultado final da isquemia é a queda na produção celular de energia (ATP), o que leva a perda de função e, se a isquemia for grave e persistente, culmina em necrose da célula, A doença isquêmica do miocárdio é caracterizada pelo surgimento de isquemia em uma ou mais porções do músculo cardíaco. Sua principal etiologia é a aterosclerose das artérias coronárias, sendo as demais causas (embolia, vasculite, dissecção coronariana) menos comuns, A doença isquêmica do miocárdio secundaria à aterosclerose pode ter 3 apresentações clinicas distintas: assintomática, aguda e crônica. Na forma assintomática (isquemia silenciosa), o paciente é portador de fatores de risco para aterosclerose, porem os indícios de isquemia miocárdica só podem ser detectados através da realização de exames complementares. Esses indivíduos possuem o mesmo prognostico daqueles sintomáticos, por isso é crucial identificar essas pessoas. Na forma aguda (síndrome coronariana aguda), o paciente evolui em curto espaço de tempo com sinais e sintomas de isquemia progressiva, que se manifesta em REPOUSO. A causa deste problema é a instabilidade da placa de ateroma, que sofre rupturas em sua superfície originando um trombo. Existem 3 síndromes coronarianas agudas: (1) Angina Instável (AI); (2) IAM sem supradesnível do segmento ST (IAMSST); (3) IAM com supradesnível do segmento ST (IAMST). Na forma crônica (angina estável), o paciente refere sinais e sintomas de isquemia durante o ESFORÇO, mas em repouso essas manifestações desaparecem. Não há instabilidade da placa de ateroma, mas esta é grande o suficiente para obstruir a maior parte do lúmen coronariano (>50%), produzindo isquemia somente em face de um aumento na demanda miocárdica. Na ausência de tratamento, o desfecho de todas as formas de aterosclerose coronária é o mesmo: infarto miocárdico na região suprida pelo vaso doente, que pode evolui com complicações elétricas (arritmias) ou mecânicas (falência ventricular esquerda, ruptura de septos). EPIDEMIOLOGIA A doença isquêmica do miocárdio é a principal causa de óbito no Brasil. Tais determinantes que condicionam essa situação é o novo estilo de vida moderno com aumento de dietas ricas em gorduras e calorias, aliadas ao sedentarismo e hábitos de tabagismo. Não podemos esquecer do crescente processo de envelhecimento populacional atrelado ao aumento da expectativa de vida da população mundial. Tais fatores descritos acima estão presentes em todos os países do mundo. Entretanto, os países ricos vêm demonstrando uma queda dos índices de mortalidade o que pode ser associado ao aumento e oferta de recursos avançados de prevenção e terapêutica o que contrasta com a realidade de países em desenvolvimento. 4 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 FISIOPATOLOGIA O tecido do miocárdio apresenta uma particularidade fisiológica, diferentemente de outros tecidos orgânicos, o qual facilita a ocorrência de um processo isquêmico derivado da obstrução do lúmen coronariano, esse tecido apresenta uma taxa de extração de oxigênio muito alta quando comparada com outros tecidos, cerca de 75%. Desse modo, a única forma de aumentar o aporte de oxigênio ao tecido cardíaco é aumentando o fluxo de sangue no leito coronário. Cabe destacar que o fluxo de sangue arterial pelas coronárias apresenta o denominamos de autorregulação.Como sabemos o fluxo de sangue só é possível nesses vasos durante a diástole ventricular, pois durante a sístole a musculatura toda se contrai e, por conseguinte, contrai os vasos impedindo o fluxo de sangue nos mesmos. Desse modo, a pressão do sangue para estabelecer o fluxo nas coronárias vai descaindo com o tempo. Uma forma de compensar a queda da pressão é a promoção de vasodilatação dos vasos coronarianos (mediado por marcadores bioquímicos – tramboxano A2, NO, prostaciclina e bradicinina). Tal efeito é chamado de reserva coronariana: capacidade das arteríolas pré- capilares do leito coronário se dilatar de acordo com a necessidade de oxigênio. À medida que observamos oclusões hemodinamicamente significativas nas artérias coronarianas (> 50% do lúmen) a reserva coronariana será requisitada a fim de manter o equilíbrio entre a oferta e demanda de oxigênio. Embora haja a reserva, a mesma vai se “esgotando” o que diminui a capacidade de aumentar o fluxo sanguíneo quando se depara com uma situação de aumento verdadeiro da demanda (atividade física/estresse). Se a obstrução for aguda e grave, acometendo mais de 80% do lúmen, o fluxo ficará baixo e não será suficiente para suprir a necessidade basal de oxigênio, dando origem a uma isquemia miocárdica de repouso e posteriormente um infarto. (Isso é o que acontece nas síndromes coronarianas agudas). Se a obstrução for gradual, acometendo 50-80% do lúmen, situações que envolvem aumento da demanda miocárdica, por exemplo um exercício físico, a reserva coronariana residual não será suficiente para suprir as necessidades. (Isso é o que acontece na angina estável o ou na síndrome coronariana crônica). Em situações de oclusão aguda total da artéria coronária o tempo é crucial. A necrose inicia cerca de 20 minutos após a isquemia. Por isso, o achado de supradesnível do segmento ST (traduz que a coronária está fechada) é um sinal de mal prognóstico e as condutas devem ser instauradas de forma ágil, pois tempo é miocárdio!! Os principais determinantes da demanda de oxigênio do miocárdio são: (1) frequência cardíaca – quanto maior, maior será a demanda; (2) contratilidade e (3) tensão na parede ventricular – forças mecânicas. Não podemos esquecer que o aporte de oxigênio contido no sangue depende da fração de oxigênio inspirado, de uma boa função pulmonar e de uma saturação de hemoglobina adequada. Devemos destacar que há múltiplos geradores de isquemia em um mesmo paciente. As principais comorbidades associadas são: taquiarritmias, fibrilação atrial, hipertrofia de ventrículo esquerdo, HAS descontrolada, DPOC e anemia. CONSEQUÊNCIAS DA ISQUEMIA MIOCÁRDICA Os cardiomiócitos isquêmicos começam a apresentar alterações bioquímicas na produção do ATP, promovendo a alteração de suas funções mecânicas e elétricas. Os efeitos imediatos são perda de relaxamento muscular (disfunção diastólica) e perda da capacidade contrátil (disfunção sistólica). Podemos classificar esses efeitos mecânicos em três estágios, são eles: (1) hipocinesia – segmento isquêmico se contrai, mas de forma “fraca”; (2) acinesia – segmento isquêmico não se contrai, torna-se imóvel; (3) discinesia – segmento isquêmico não se contrai e apresenta um movimento paradoxal de abaulamento. Como foi dito acima o tempo tem valor prognóstico importante durante um episódio de isquemia, pois a extensão da área afetada é diretamente proporcional a ele. A depender da localização e da extensão os sinais clínicos dos pacientes podem variar, sendo: (1) acometimento de uma área extensa da massa ventricular (ex: > 40% do VE) a contratibilidade global diminui e o paciente passa a apresentar uma insuficiência cardíaca aguda; o acometimento dos músculos papilares (ex: da valva mitral), pode ocasionar um fechamento anormal da valva e culminar em uma insuficiência mitral aguda. 5 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 Os efeitos elétricos de uma isquemia podem ser observados através das alterações do ECG. A principal alteração notada no exame é na repolarização ventricular. Desse modo, a onda T se apresenta alta, pontiaguda e simétrica (traduzindo uma isquemia subendocárdica). Por outro lado, se observarmos uma onda T invertida, pontiaguda e simétrica (traduz uma isquemia subepicárdica). Se a isquemia persiste observamos o desnivelamento de ST. Quando há INFRAdesnivelamento indica lesão “não transmural” – acometimento predominante no subendocárdio; enquanto o SUPRAdesnivelamento indica lesão “transmural” – acometimento de toda espessura da parede cardíaca: do endocárdio ao epicárdio. Outra consequência vista na parte da condução elétrica do coração frente a um quadro de isquemia é a mudança das propriedades eletrofisiológicas. Dessa forma, ocorre o surgimento do fenômeno de reentrada o principal substrato fisiopatológico para originar uma taquiarritmia. MIOCÁRDIO HIBERNANTE: Por mecanismos pouco compreendidos, alguns pacientes com doença coronariana desenvolvem um processo adaptativo chamado “miocárdio hibernante” – uma disfunção contrátil crônica dos segmentos irrigados pelas artérias doentes que, diferentemente do infarto, é REVERSÍVEL após o restabelecimento do fluxo coronariano. Não há isquemia no miocárdio hibernante... Na realidade, há uma diminuição “voluntária” do gasto energético a fim de manter em equilíbrio a relação oferta/consumo de O2... Quando grandes porções de miocárdio “hibernam”, o paciente desenvolve insuficiência cardíaca. A boa notícia é que, nestes indivíduos, a função ventricular pode ser recuperada com a revascularização! ANGINA ESTÁVEL O termo angina estável se configura como a forma sintomática da doença crônica coronariana, tal condição surge devido a uma isquemia miocárdica transitória, esforço- induzida que melhora com o repouso. A sua principal causa é a obstrução de mais de 50% do lúmen das artérias coronárias. Epidemiologicamente homens apresentam o maior grupo de prevalência dessa doença, enquanto as mulheres se tornam evidentes após a menopausa. 1. HISTÓRIA Diante de um homem com > 50 anos, ou uma mulher com > 60 anos de idade, a clássica queixa de desconforto torácico “típico” (dor anginosa) deve ESTABELECER O DIAGNÓSTICO de doença coronariana até prova em contrário! O adjetivo “típico”, neste caso, se refere à coexistência de três caracteres semiológicos: I. Sensação de aperto, peso ou pressão retroesternal (às vezes queimação ou pontada, mas raramente “dor”); II. Início durante esforço físico ou emoções; III. Alívio após repouso ou nitrato sublingual (em 1-5min) A presença de apenas duas das características acima define o desconforto torácico como “atípico” (interpretação: a doença coronariana continua sendo o diagnóstico mais provável). 6 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 A precordialgia atípica tende a ser mais frequente em mulheres, idosos e diabéticos... Com somente um ou nenhum desses caracteres, o desconforto torácico é dito “não anginoso” (interpretação: provavelmente não se trata de doença coronariana). Quando solicitamos ao paciente que localize o desconforto isquêmico, ele esfrega a mão difusamente sobre o esterno ou coloca o punho cerrado no meio do peito (“sinal de Levine”). No desconforto não isquêmico, por outro lado, de um modo geral o paciente consegue delimitar bem a sensação, podendo, por exemplo, apontar com o dedo a região, e isso fala contra a possibilidade de isquemia miocárdica. Em pacientes mulheres, idosos, diabéticos e transplantados a DAC se manifesta pelo que denominamos de equivalentes anginosos que nada mais é do que sinais e sintomas diferentes da angina clássica do peito. Vale destacar que transplantados não possuem nervos sensitivos com o “novo coração” ao passo que uma doranginosa é bastante improvável de acontecer. Estão dentro desses equivalentes anginosos: dispneia (oriundo da queda da fração de ejeção, levando a uma congestão pulmonar), fadiga/tonteira/sensação de desmaio (redução do débito cardíaco), sopro transitório de regurgitação mitral (isquemia dos músculos papilares), palpitações (taquiarritmias induzidas pela isquemia). Muitos têm a ideia equivocada de que a irradiação da dor anginosa se dá apenas para o membro superior esquerdo. Na realidade, a angina costuma se irradiar para ambos os lados do corpo, podendo ser referida em qualquer localização entre a mandíbula e o umbigo. No entanto, o mais tradicional é realmente a irradiação para o membro superior esquerdo. Um detalhe útil na prática é que a dor isquêmica NÃO SE IRRADIA para o músculo trapézio! Pacientes com dor precordial irradiada especificamente para esta topografia mais provavelmente são Detalhar durante a história clínica a qualidade da dor anginosa é fundamental para que possamos estabelecer um diagnóstico correto. De tal forma que podemos nos deparar com uma DAC crônica que a angina pode ser desencadeada pelo decúbito. Isso acontece porque a posição facilita o retorno venoso, o que paralelamente aumenta a pré-carga ventricular demandando maior trabalho ao miocárdio, desencadeado a dor. Outra característica é a dispneia paroxística noturna que é oriunda de uma redução da oferta de oxigênio (apneia do sono) somado a um aumento do tônus adrenérgico. Quando falamos da DAC não podemos esquecer das repercussões extra cardíacas que a mesma manifesta, haja vista que estamos tratando de uma vasculopatia obliterativa. Um achado clínico importante é a claudicação intermitente – dores nos membros inferiores, sobretudo na panturrilha, originada pelo esforço; história de AVE, presença de massa abdominal pulsátil (aneurisma de aorta). DIAGNÓSTICO Ao exame físico de um paciente com suspeita de DAC, podemos observar um exame normal sem alterações ou com alterações transitórias secundárias à disfunção cardíaca induzida pela isquemia. Não podemos esquecer que a queixa de desconforto torácico possui elevado valor diagnóstico, bem como prognóstico nos pacientes. A grande maioria que apresenta alteração no exame físico deriva dos seus fatores de risco, por exemplo: HAS, obesidade centrípeta e acantose, sopro carotídeo, xantomas e xantelasmas. O diagnóstico da DAC pode ser alcançado apenas pela anamnese e exame físico. Entretanto, dispomos de uma gama de exames complementares que são necessários para estratificar a gravidade e o prognóstico do quadro, além de permitir afastar outras possíveis doenças. EXAMES COMPLEMENTARES 1. EXAMES LABORATORIAIS GERAIS Podemos lançar mão inicialmente de exames de laboratório para identificação dos fatores de risco para doenças cardiovasculares, são eles: hemograma, lipidograma (colesterol total, frações e triglicérides), função renal (creatinina e ácido 7 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 úrico), glicemia de jejum, hemoglobina glicada, pesquisa de microalbuminúria (EAS) e função tireoidiana. Outro marcador inespecífico que tem sido valorizado é a dosagem de proteína C reativa. Isso porque quanto mais inflamado estiver o paciente, maior o risco de instabilidade e rotura de placas de ateroma. 2. ECG DE REPOUSO Não podemos esquecer do ECG de repouso nas 12 derivações que normalmente se mostra normal em casos de angina estável. Podemos ainda encontrar em alguns casos a onda Q patológica como sinal de ausência de função no miocárdio derivado de uma isquemia prévia. 3. TESTES PROVOCATIVOS Testes “provocativos” são exames onde o coração é forçado a aumentar sua demanda metabólica, permitindo-nos visualizar o surgimento de alterações dinâmicas indicativas de isquemia. O termo “alterações dinâmicas” quer dizer o seguinte: a alteração só aparece quando a demanda miocárdica aumenta, voltando ao normal em repouso. 3.1 TESTE ERGOMÉTRICO É o teste provocativo mais utilizado, por ser o mais barato, de mais fácil execução e mais amplamente disponível. Na ausência de contraindicações, costuma ser o método confirmatório de primeira escolha! É importante salientar que, além de poder confirmar o diagnóstico, o TE também permite estratificar o prognóstico. O exame consiste no registro contínuo do ECG antes, durante e após um protocolo específico de esforço físico (realizado na esteira ou bicicleta ergométrica). O protocolo mais utilizado é o de Bruce, em que a velocidade e a inclinação da esteira são aumentadas a cada 3 minutos. O surgimento de desconforto precordial, dispneia, tonteira, exaustão, depressão de ST > 2 mm (0,2 mV), queda da PA > 10 mmHg ou taquiarritmias ventriculares obriga a suspensão imediata do exame! Para critérios diagnósticos o infradesnível do segmento ST deve ser maior ou igual a 1 mm. Por outro lado, se nenhuma alteração for observada podemos dizer que o TE foi negativo somente se a FC alcançada tiver sido no mínimo 85% da FCmax prevista para sexo e idade do paciente. Além disso, cabe dizer que o exame negativo não descarta o diagnóstico, enquanto o positivo não necessariamente confirma. Devemos sempre lembrar da estimativa da probabilidade pré-teste para doença coronariana (avaliação dos fatores de risco do paciente) antes de interpretar os resultados. O TE não deve ser solicitado diante de certas limitações: Quando o ECG basal possuir alterações que impeçam a detecção do critério de isquemia (síndrome de Wolf-Parkinson- White, BRE de 3º grau, marca passo, infra de ST prévio). Quando o paciente for incapaz de se exercitar (sequelas ortopédicas ou neurológicas, doença arterial periférica grave). Quando houver alguma contraindicação específica (angina em repouso nas últimas 48h, ritmo cardíaco “instável”, estenose aórtica grave, miocardite aguda, insuficiência cardíaca não controlada, hipertensão pulmonar grave, endocardite infecciosa ativa, fase “aguda” de um IAM). 8 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 3.2 CINTILOGRAFIA DE PERFUSÃO MIOCÁRDICA A “cintilo” é um excelente método não invasivo para detecção de isquemia miocárdica, sendo capaz não apenas de confirmar o diagnóstico, mas também de fornecer parâmetros prognósticos, uma vez que visualiza diretamente a extensão da área isquêmica. O teste é feito em dois momentos: um de stress e um de repouso. O de estresse pode ser o esforço físico ou uso de fármacos que induzem isquemia (dipiridamol - induz stress através do roubo coronariano, pois permite a dilatação dos vasos coronarianos o que acaba desviando o sangue para todos os locais do coração). Não podemos esquecer que a droga provoca broncoespasmo, sendo assim seu uso é contraindicado em pacientes com asma e DPOC. A comparação entre as imagens obtidas em cada etapa pode revelar a existência de defeitos perfusionais reversíveis (presentes no stress, mas não no repouso) ou defeitos perfusionais fixos (presentes em ambas as fases). 3.3 ECOCARDIOGRAMA COM STRESS O ecocardiograma com stress visualiza diretamente o coração permitindo a análise em tempo real da função contrátil global e segmentar. O stress pode ser alcançado ou por esforço físico ou por métodos farmacológicos (dobutamina o dipiridamol). Tal exame é mais indisponível nos demais serviços espalhados em nosso país, entretanto ele serve como um bom complementar na avaliação pré-operatória de pacientes com múltiplos fatores de risco para DAC. 3.4 CARDIORRESONÂNCIA A cardiorressonância é o exame considerado padrão ouro para volume ventricular e diferenciação entre miocárdio viável e não viável. A sua principal indicação formal é em pacientes que apresentam limitações para realização de TE, cintilografia e eco- stress, bemcomo indivíduos muito obesos e mulheres com mamas grandes. 3.5 CORONARIOGRAFIA (CATE) A coronariografia (CATE) é o método padrão-ouro para diagnóstico de DAC, pois ele identifica com precisão anatômica as obstruções coronarianas secundárias à aterosclerose, bem como outras alterações congênitas. O CATE está indicado sempre que as informações fornecidas superar os benefícios dos riscos e custos do exame, pois se trata de uma intervenção invasiva. Desse modo, quando paciente necessita de revascularização o CATE é ótimo para definir a anatomia das lesões e quando a realização ou interpretação dos testes não invasivos for impossível ou conflitante. 9 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 TRATAMENTO Não existe ainda um consenso absoluto acerca da melhor estratégia terapêutica para isquemia silenciosa (pacientes completamente assintomáticas, mas que apresentam alterações isquêmicas associadas à dor e alterações). Desse modo, o controle dos fatores de risco identificados é uma boa estratégia terapêutica individualizada. Sendo assim, podemos utilizar os dados obtidos pelos testes provocativos, idade, ocupação e condição clínica geral do paciente. As mudanças de estilo de vida cabem de forma certeira nesse tipo de paciente a fim de reduzir a progressão da aterosclerose. Podemos somar ainda a profilaxia ao uso de vacina contra vírus influenza que são destinadas para esse grupo. Dentre as evidências que temos hoje a busca firme pelo abandono do uso de cigarro é um ótimo preditor de prognóstico de paciente. Todos os coronariopatas devem seguir um plano dietético exclusivo a fim de que eles atinjam as metas lipídicas que cada grau de risco determina. A diretriz brasileira não recomenda o uso de ômega-3 para DAC estável, pois não há evidência de melhora. A prática de atividade física deve ser estimulada de acordo com as limitações observadas pelos pacientes. Podemos estimar a capacidade funcional do paciente através da anamnese ou utilizar o teste ergométrico como parâmetro. Não podemos esquecer que atividade sexual é semelhante a atividade física de subir um lance de escadas. Em alguns pacientes a prática sexual pode ser não recomendada. Pacientes já sedentários torna-se difícil a inserção de prática de atividades físicas. Para tanto, podemos dispor de mudanças de hábitos como trocar o elevador pela escada como medidas úteis e eficazes. Cabe destacar que todo paciente com DAC deve andar com um nitrato sublingual para prevenção de dor angina por atividade física ou sexual dado 10-15 minutos antes. Além disso, devem ser orientados que uma dor anginosa que não melhora com o uso do nitrato sublingual, estes pacientes devem procurar o atendimento médico, pois podemos estar diante de um IAM. TRATAMENTO - PREVENÇÃO DO IAM E REDUÇÃO DE MORTALIDADE 1. ANTIAGREGANTE AAS: Em doses antiplaquetárias (75 mg/dia a 325 mg em dias alternados), tem mostrado excelentes resultados na doença isquêmica do miocárdio, em qualquer uma de suas formas de apresentação. A posologia descrita para uso é de 100 mg/dia. O mecanismo de ação da droga consiste em impedir a formação do tromboxano A2 pela capacidade de inibir de forma irreversível a COX. Por tanto, sua meia-vida é curta, mas seu efeito é longo, durando de 5-7 dias. Pacientes que serão submetidos a uma intervenção cirúrgica devem cessar o uso da droga por 5-7 dias antes. CLOPIDOGREL: O clopidogrel é a droga de escolha, e deve ser utilizado na dose de 75 mg 1x/dia, em todos os pacientes que apresentam contraindicação ou intolerância ao AAS. Seu mecanismo de ação é na inibição específica da ativação da glicoproteína IIb/IIIa pelo ADP. Pacientes que realizaram angioplastia também devem ser tratados com clopidrogel (em associação com AAS) por no mínimo 30 dias. 2. ANTICOAGULANTE ORAL - CUMARINICO Anticoagulante oral cumarínico (warfarina) pode ser utilizado em associação aos antiagregantes citados acima. A indicação específica para anticoagulação é em pacientes com FA com risco cardioembólico alto e pós-IAM anterior extenso ou com presença de trombo intramural. 3. ESTATINAS O efeito mais conhecido das estatinas é a inibição da enzima HMG CoA redutase, responsável pela síntese de colesterol nos hepatócitos. Portanto, as estatinas são potentes inibidores do LDL. 10 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 Recomenda-se que coronariopatas classificados como de “alto risco” cardiovascular mantenham o LDL obrigatoriamente abaixo de 70 mg/dl (e não 100 mg/dl). Pacientes de “risco intermediário” devem manter o LDL obrigatoriamente abaixo de 100 mg/dl. 4. INIBIDORES DA ENZIMA CONVERSORA DE ANGIOTENSINA - IECA Não são medicamentos antianginosos, mas seus efeitos inesperados na redução de eventos cardiovasculares em portadores de DAC, sobretudo nos diabéticos, transformaram os IECA em medicamentos fundamentais no arsenal terapêutico dos pacientes portadores de DAC. Seu uso pode se estender a pacientes assintomáticos com FE reduzida e indivíduos com disfunção ventricular após IAM. Seu uso de rotina sempre está associado à disfunção ventricular, insuficiência cardíaca e diabetes. TRATAMEMTO - CONTROLE DOS SINTOMAS 1. BETABLOQUEADOR Esses fármacos são considerados primeira escolha no tratamento da angina estável por sua capacidade de reduzir as chances de IAM e mortalidade. Sua ação consiste no bloqueio dos receptores adrenérgicos do miocárdio e nó sinusal. Desse modo, esse grupo consegue produzir um ionotropismo (contratilidade) e cronotropismo (FC) negativo. Essas drogas têm a capacidade de reduzir arritmias ventriculares, internações e necessidade de revascularização. Desse modo, podem ser indicadas para os pacientes com ou sem história de IAM. Os betabloqueadores agem reduzindo o consumo miocárdico de O2 pela redução na frequência cardíaca, redução na pressão arterial e redução na contratilidade. Essas drogas não possuem propriedades vasodilatadoras. 2. ANTAGONISTAS DOS CANAIS DE CÁLCIO Essas drogas possuem um efeito vasodilatador coronariano e sistêmico (principalmente arteriolar) através do bloqueio dos canais de cálcio na membrana da célula cardíaca. Representam os antianginosos de segunda escolha. As di-idropiridinas, como a nifedipina e a anlodipina, são mais vasosseletivas, tendo um efeito coronariodilatador mais potente. Agem, em maior ou menor grau, tanto na redução da contratilidade miocárdica e da frequência cardíaca, quanto na vasodilatação coronária e na redução da pós-carga pelo efeito vasodilatador periférico. Quando associados a um betabloqueador, porém, constituem excelente opção de terapia antianginosa. O ditiazem e verapamil não podem ser associados com BB e seu uso é contraindicado em pacientes com ICFEr. 3. NITRATOS Os nitratos aumentam a produção endotelial de oxido nítrico, um poderoso vasodilatador. Seus efeitos benéficos na DAC são: redução da pré- carga, redução da pós-carga e vasodilatação coronariana direta. Podem ser de ação rápida ou longa: Os nitratos de ação rápida (isossorbida, porpatilnitrato) são ministrados por via sublingual e começam a agir nos primeiros 5 minutos, mantendo seu efeito por 30-45 minutos. Por esse motivo, é um excelente antianginoso SOS, sendo a droga de escolha para o tratamento abortivo das 11 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 crises anginosas. É ideal que o paciente tome enquanto estiver sentado, pois a ortostase aumenta o risco de hipotensão e o decúbito aumenta o retorno venoso. Também podem ser usados de maneira profilática, antes de eventos que sabidamente provocam angina (relação sexual, estresse emocional). Por outro lado, os de longa ação (mononitrato e dinitrato de isossobidol) NÃO SÃO MAIS INDICADOScomo antianginosos de primeira linha de tratamento, pois pioram a morbidade da DAC crônica. A vasodilatação prolongada induz uma resposta adrenérgica e ativação do sistema renina- angiotensina-aldosterona e agravamento da disfunção endotelial. A grande indicação dos nitratos de ação longa na DAC estável é como droga de terceira linha em pacientes com angina refratária à combinação de betabloqueadores e antagonistas dos canais de cálcio. 4. OUTRAS DROGAS A TRIMETAZIDINA (Vastarel) é uma droga que não exerce efeitos hemodinâmicos e não altera FC ou PA. Ela apresenta um mecanismo protetor da célula miocárdica sobre a isquemia, por evitar aumento da depleção de ATP, aumento do cálcio e radicais livres. Pode ser associada a terapia antianginosa padrão. A IVABRADINA (Procoralau) atua na corrente que passa pelo nó sinusal. Desse modo, exerce um efeito cronotrópico negativo, mas não interfere na contratibilidade do miocárdio. Pode ser utilizada associada aos antianginosos para o TTO de angina refratária, sobretudo em pacientes com disfunção VE e FC basal maior ou igual 70 bpm. O ALUPURINOL, droga utilizada no tratamento de gota pode ser um hipourecimiante por inibição da xantina-oxidase, apresenta em altas doses (600 mg/dia) efeito antianginoso pouco compreendido. Seu uso pode ser indicado para pacientes com angina refratária a todas as demais medicações. 12 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 4. Pontuar as indicações para cirurgia de revascularização. TODOS os portadores de Doença Arterial Coronariana (DAC) estável devem receber tratamento clínico otimizado, lançando mão do tratamento medicamentoso (no mínimo, mudanças no estilo de vida + AAS + estatina, na ausência de contraindicações). Alguns, no entanto, necessitam também de uma abordagem intervencionista, isto é, procedimentos de revascularização! O termo “revascularização miocárdica” se refere aos procedimentos que restabelecem o aporte sanguíneo ao miocárdio, que no caso da DAC estável, tem a função de eliminar a isquemia esforço-induzida. As indicações GERAIS de revascularização miocárdica na DAC estável são apenas duas: 1. Angina estável refratária ao tratamento clínico otimizado, ou intolerância a este. 2. Situações de ALTO RISCO onde a literatura mostrou ganho de sobrevida com a revascularização, mesmo na ausência de sintomas. AVALIANDO A COMPLEXIDADE DAS LESÕES CORONARIANAS O escore SYNTAX avalia a extensão e a complexidade das lesões ateroscleróticas coronarianas. Em pacientes com indicação de revascularização, o SYNTAX pode auxiliar na escolha entre a Cirurgia de Revascularização Miocárdica (CRVM) e a Intervenção Coronariana Percutânea (ICP). SYNTAX < 22 (doença pouco extensa e menos complexa) tem melhores resultados com a ICP. Por outro lado, SYNTAX >33 se beneficiam mais da CRVM. Embora o controle dos pacientes com doença arterial coronária deva ser feito permanentemente, muitos pacientes experimentam melhora substancial dos sintomas e também aumento da sobrevivência após a intervenção cirúrgica ou por angioplastia. INTERVENÇÃO CORONÁRIA PERCUTÂNEA (PCI) OU ANGIOPLASTIA Esse é um método terapêutico amplamente utilizado para revascularizar o miocárdio isquêmico em pacientes com estenoses coronárias. A ICP é realizada através de cateterismo coronariano cujo acesso pode ser feito pelas artérias femoral ou radial. Neste procedimento, um balonete é inflado no interior da região estenosada, dilatando, por força mecânica, o referido segmento. Os stents mais utilizados atualmente são os farmacológicos, nos quais são impregnados com substancias antiproliferativas e com isso tem uma chance reduzida de reestenose. Porém, é preciso que esse paciente seja mantido com dupla antiagregação plaquetária (AAS+Clopidrogrel) por pelo menos 12 meses. Embora os pacientes com estenoses no tronco da artéria coronária esquerda e/ou lesões em três vasos e com algum grau de disfunção ventricular tenham melhor benefício com a intervenção cirúrgica, o procedimento via cateter é amplamente empregado, A indicação clínica mais comum para PCI é a angina do peito estável, ou não, acompanhada de evidências de isquemia miocárdica. Esse procedimento não está indicado para pacientes com pouco sintomas ou assintomáticos. No caso de reestenose, os sintomas anginosos reaparecem, em geral, dentro de 6 meses, em cerca de 25% dos pacientes. A recorrência dos sintomas e a reestenose são mais frequentes em pacientes diabéticos, dilatações incompletas das artérias, envolvimento da artéria descendente anterior e trombose arterial. CIRURGIA DE REVASCULARIZAÇÃO DO MIOCÁRDIO O procedimento cirúrgico baseia-se, em linhas gerais, na anastomose proximal entre a artéria aorta (provedora de sangue) e a distal com a artéria coronária (receptora de sangue) por meio de um enxerto. A veia safena ou a artéria radial ou as artérias mamárias são os enxertos livres mais usados. 13 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 As indicações consensuais para revascularizar o miocárdio são as estenoses do tronco da artéria coronária esquerda, o comprometimento de múltiplas artérias e a angina de difícil controle, independentemente da qualidade da função ventricular; O candidato ideal deve ser homem com menos de 75 anos, sem outras morbidades, em que o tratamento clínico não foi suficiente para remissão dos sintomas ou para melhorar a qualidade de vida.
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