Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
26 Valden Luis Matos Capistrano Junior e Daniel Cordeiro Gurgel w w w .v po nl in e. co m .b r Utilização do ômega-3 na síntese proteica e recuperação muscular Use of omega 3 in protein synthesis and muscle recovery Resumo A prática do exercício físico provoca uma sequência de eventos mecânicos e metabólicos que causam microtraumas no tecido muscular. Diversas estratégias nutricionais são utilizadas para promover a recuperação do tecido danificado, e um dos nutrientes que pode atuar em várias fases da recuperação muscular é o ômega-3. Nessa revisão, apresentamos um panorama geral a respeito da utilização do óleo de peixe – e, mais especificamente, do nutriente ômega-3 – na modulação da resposta inflamatória, melhora da síntese proteica e recuperação muscular associada ou não ao exercício físico em adultos jovens e idosos. Os resultados encontrados apontam que a utilização de óleo de peixe tem como função modular a resposta inflamatória induzida pelo exercício, controlar a exacerbação da inflamação em situações clínicas como desportistas obesos, diabéticos, renais, oncológicos e atletas em overtraining. Além da modulação inflamatória, componentes como ácido docosaexaenoico (DHA) e, principalmente, ácido eicosapentaenoico (EPA) possuem ação de sensibilizar o processo de síntese proteica miofibrilar, contribuindo, assim, para o processo de hipertrofia muscular. Dessa forma, surgem mais evidências de que o ômega-3 derivado de óleo de peixe modula os processo inflamatórios, não permitindo a sua exacerbação, e estimula os ganhos de massa muscular em adultos jovens e, principalmente, em idosos por superar a resistência anabólica induzida pelo envelhecimento. Palavras-chave: Óleo de peixe, exercício, músculo esquelético, nutrição, síntese proteica, recuperação muscular, ômega-3. Abstract The practice of physical exercise triggers a sequence of mechanical and metabolic events that cause microtraumas in the muscular tissue. Several nutritional strategies are used to promote the recovery of damaged tissue, and one of the nutrients that can act at various stages of muscle recovery is omega-3. In this review, we present an overview of the use of fish oil – and, more specifically, of omega-3 – in modulating the inflammatory response, improving protein synthesis and muscle recovery associated or not to physical exercise in young and old adults. The results show that the use of fish oil modulates the inflammatory response induced by exercise, controlling the exacerbation of inflammation in clinical situations such as obese, diabetic, renal, oncological and overtraining athletes. In addition to inflammatory modulation, components such as docosahexaenoic acid (DHA) and, specially, eicosapentaenoic acid (EPA) can sensitize the process of myofibrillar protein synthesis, thus contributing to the muscular hypertrophy process. Thus, more evidence emerges that omega-3 derived from fish oil modulates the inflammatory processes, not allowing its exacerbation, and stimulates gains in muscle mass in young adults and especially in the elderly by overcoming the anabolic resistance induced by aging. Keywords: “fish oil”, “exercise”, “skeletal muscle”, “nutrition”, “protein synthesis”, “muscle recovery”, “omega-3”. 27 Re vi st a Br as ile ir a de N ut ri çã o Fu nc io na l Valden Luis Matos Capistrano Junior e Daniel Cordeiro Gurgel A Introdução Após a prática do exercício físico há uma sequência de eventos mecânicos e metabólicos que causam microtraumas no tecido muscular estriado esquelético (Figura 1). Vejamos estes eventos em uma ordem cronológica1: - Antes das primeiras 4 horas: Primeiramente, há um overstretch dos miofilamentos, disruptura dos sarcômeros e desalinhamento das linhas Z, que conduzem a uma perda de força e potência durante o exercício físico2; - Após 24 horas: Ocorre um maior influxo de cálcio, inflamação local, produção de espécies reativas de oxigênio e ativação do sistema proteolítico (ex.: ubiquitina-proteossoma) – é nesse momento que surge a dor muscular pós- exercício3-5; - Após 48 horas: Observam-se danos à integridade da membrana celular, além “fugas” de proteínas intramusculares e com persistência da dor muscular 4,5; - Após 72 horas: Após uma sequência de danos musculares, há uma liberação de citocinas anti-inflamatórias e fatores de crescimento que promovem reparação das proteínas musculares danificadas4,5. Figura 1. Sequência de eventos mecânicos e metabólicos após o exercício que causam microtraumas musculares. Fonte: Smith1. Ao observar os microtraumas provocados pelo exercício no tecido muscular e os processos inflamatórios que são responsáveis pela remodelação do tecido danificado, vale ressaltar que estratégias nutricionais são adotadas para acelerar tal processo, ou para que essa cascata inflamatória não se exacerbe e induza um quadro clínico de dor muscular de início tardio (DMIT). A prescrição nutricional pode ser recomendada para os seguintes pontos (Figura 2)6: - aumento no turnover proteico: podendo utilizar, como estratégias nutricionais, whey protein, BCAA (Branched-Chain Amino Acids), leite, carnes em geral (bovina, aves e peixes) e ômega-3; - ação anti-inflamatória: pode ser utilizado em um cardápio com alimentos como beterraba, cereja e ômega-3; - ação antioxidante: uma prescrição dietote- rápica abrangeria romã, uva, beterraba, cereja e vitamina E; - preservação da integridade da membrana celular: prescrição de ômega-3. <4 horas 24 horas 48 horas 72 horas Primário Miofilamentos estendidos Disruptura de sarcômeros Transmissão pela linha-Z Perda de força muscular Remoção/degradação de proteínas musculares danificadas Reparo de proteínas musculares danificadas Secundário Dor muscular Dor muscular Influxo de cálcio no músculo Inflamação local Produção de ROS Ativação de sistemas proteolíticos Danos à integridade da membrana Escape de proteínas intramusculares Liberação de citocinas anti-inflamatórias e fatores de crescimento 28 w w w .v po nl in e. co m .b r Utilização do ômega-3 na síntese proteica e recuperação muscular Dos quatros pontos citados acima, que culminam em uma reparação do tecido muscular danificado, o nutriente ômega-3 aparece em três: aumento no turnover proteico, ação anti- inflamatória e preservação da integridade da membrana celular, evidenciando um importante papel desse ácido graxo de cadeia longa no âmbito da prescrição nutricional esportiva. Dessa forma, o objetivo desta revisão é averiguar a utilização de óleo de peixe na modulação da síntese proteica e recuperação muscular. Métodos A revisão de literatura é descrita como busca de informações sobre um tema ou tópico que resumam a situação dos conhecimentos sobre um problema. O principal objetivo da revisão de literatura é fornecer uma síntese dos resultados de pesquisa, para auxiliar o profissional a tomar decisões na clínica. Neste tipo de estudo são abordados os tópicos relevantes sobre o tema, de forma a proporcionar ao leitor uma compreensão do que existe publicado sobre o assunto. Assim, a revisão tem uma função integradora e facilita o acúmulo de conhecimento. Na identificação das fontes bibliográficas foi pesquisada a base de dados PUBMED/MEDLINE, e para identificar as publicações indexadas nesta base de dados foram utilizadas as seguintes palavras chaves: “fish oil”, “exercise”, “skeletal muscle”, “nutrition”, “protein synthesis”, “muscle recovery”, “omega-3”. Este estudo trata-se de uma revisão de literatura onde foram levantados artigos referentes ao tipo de nutriente como “omega-3” no processo de síntese proteica e recuperação muscular, considerando artigos originais – incluindo estudos transversais e longitudinais – e revisões, publicados em revistas internacionais. Resultados e discussão Será apresentada, a seguir,uma análise dos artigos segundo o objetivo traçado neste trabalho, descrevendo a utilização do ômega-3 no processo de síntese proteica e recuperação muscular. Exercício físico e processo inflamatório A prática do exercício físico gera microtraumas no tecido muscular esquelético, que, quando investigado em nível clínico por exames bioquímicos, evidencia elevação de mioglobina (Mb), creatina quinase (CK), lactato desidrogenase (LDH), aspartato aminotransferase (AST/TGO) e alanina aminotransferase (ALT/TGP), ou seja, biomarcadores de lesão muscular. Desse modo, Figura 2. Estratégias nutricionais para promover índices de reparação muscular após microtraumas induzidos pelo exercício físico. Fonte: Sousa, Teixeira e Soares6. Anti-inflamatório Antioxidante Vitamina Preservação da integridade de membranas celulares Aumento de turnover de proteínas musculares https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Sousa%20M%5BAuthor%5D&cauthor=true&cauthor_uid=24180469 https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Teixeira%20VH%5BAuthor%5D&cauthor=true&cauthor_uid=24180469 https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Soares%20J%5BAuthor%5D&cauthor=true&cauthor_uid=24180469 29 Re vi st a Br as ile ir a de N ut ri çã o Fu nc io na l Valden Luis Matos Capistrano Junior e Daniel Cordeiro Gurgel ao correlacionar a investigação clínica com os marcadores a nível molecular, podemos observar os mecanismos de reparo do dano muscular, que são divididos em uma primeira fase degenerativa, uma segunda fase regenerativa e uma última fase de remodelamento3. Com o quadro clínico de um processo inflamatório instalado, as células que atuam na resposta inflamatória promovem tanto dano quanto regeneração. Podemos observar melhor essa dualidade das células que atuam na resposta inflamatória na Figura 3, que apresenta a ação de diversas citocinas, espécies reativas de oxigênio, antioxidantes enzimáticos, fatores de crescimento e hormônios que conseguem equilibrar as diversas atividades pró-oxidantes e antioxidantes, pró-inflamatórias e anti- inflamatórias4,5. Figura 3. Mecanismo de reparo do dano do tecido muscular esquelético. A fase degenerativa ocorre quando há uma lesão do sarcolema, que libera os eicosanoides derivados do ácido araquidônico dos fosfolipídios das membranas celulares (prostaglandinas, prostaciclinas, leucotrienos e tromboxanas), favorecendo a diapedese3. Como podemos observar na Figura 3, os neutrófilos são os primeiros a migrar para o tecido danificado, apresentando um pico após 60 minutos do exercício, que pode perdurar por até 5 dias4. Sua função primordial é a fagocitose dos debris celulares, tanto que essa ação inicial é considerada como o gatilho para as respostas subsequentes de reparo e crescimento tecidual4. Dessa forma, os neutrófilos ativados liberam proteases lisossomais que degradam as proteínas locais, ocorrendo produção de espécies reativas de oxigênio como resultado da ação enzimática (NADPH oxidase e mieloperoxidase)4. Após os neutrófilos migrarem para o tecido danificado, o segundo grupo de células brancas que aparece no local são os monócitos, que, ao chegarem ao tecido muscular, passam a ser chamados de macrófagos4. Mas existem evidências científicas de que há dois tipos de invasões de macrófagos: - Invasão precoce: dentro de 24 a 48 horas, ocorre uma invasão de macrófagos, com o objetivo 30 w w w .v po nl in e. co m .b r Utilização do ômega-3 na síntese proteica e recuperação muscular de remoção do tecido danificado5; - Invasão tardia: após 48 horas e não ultrapassando as 96 horas, há uma segunda invasão de macrófagos, com a função de reparo muscular através de moléculas pró-regenerativas (fator de crescimento semelhante à insulina, fator de crescimento dos fibroblastos e fator de necrose tumoral- α (TNF-α)5-8. No período entre 48 e 96 horas, as citocinas liberadas atuam ativando e recrutando fibroblastos para produzirem colágeno e, consequentemente, ajudarem na reparação tecidual, em paralelo com a ação hormonal que promove a ativação, proliferação e diferenciação de células-satélites musculares, que também são de extrema importância para a regeneração do tecido danificado9. Como podemos observar, o exercício físico induz um processo inflamatório, que é importante para promover adaptações celulares, como ativação de células satélites quiescentes em mioblastos e miofibrilas que irão se fundir e formar uma nova fibra muscular. Porém, quando temos situações clínicas de desportistas em quadros de obesidade, diabetes, uremia, câncer e atletas em estado de overtraining, há um processo inflamatório em alto grau que é mediado pela resposta dos neutrófilos não regulados devido a um aumento na produção de espécies reativas de oxigênio, causando um dano exacerbado nos tecidos ao redor e na integridade das células, prejudicando o processo de reparo e hipertrofia muscular4,10,11. Dessa maneira, com um processo inflamatório exacerbado uma forma de modular tal situação sem afetar a regeneração, a síntese proteica e a hipertrofia muscular seria por meio de estratégias nutricionais como a administração de ômega-312. O nutriente ômega-3 entraria com uma ação de modular a resposta infamatória por meio da ativação do PPAR-y, redução da fosforilação do IkB (proteína inibidora do fator nuclear kappa-B –NF-kB) e maior expressão da PGC-1α (proliferador de peroxissoma-1α), que promove a redução da IL-6 (interleucina-6), TNF-α e TNF-b, que irão promover maior ativação de células satélites, proliferação em mioblastos e miócitos (Figura 4)12,13. Figura 4. Mecanismo de ação do ômega-3 modulando a resposta inflamatória no tecido muscular esquelético. Fonte: Bhullar, Putman, Mazurak12. Ativação Ácidos graxos ômega-3 PPAR-γ ↓fosforilação de IkB ↓NF-kB ↑PGC-1 α ↓Inflamação ↓IL-6, TNF-α, TGF-β ↑sindecan-4 ↑glipican-1 Autorrenovação ↑Myf5 Mobilização Células satélites quiescentes (Pax7+/Myf5-) Células satélites quiescentes (Pax7+/Myf5+) Mioblastos (Pax7+/Myf5+/MyoD+) Miócitos (MyoD+/miogenina+) Miotubos (fusão) Ativação ↑MyoD ↑miogenina ↑ MRF4 ↓Pax7 31 Re vi st a Br as ile ir a de N ut ri çã o Fu nc io na l Valden Luis Matos Capistrano Junior e Daniel Cordeiro Gurgel Estudos clínicos com ômega-3 e síntese proteica Para averiguar a eficácia da utilização de ômega-3 na redução de biomarcadores de lesão no músculo esquelético que resultam em dor muscular, um estudo com atletas de elite de futebol comparou 3 grupos de suplementação14: - o Grupo: recebeu apenas suplementação de carboidratos; - 2o Grupo: recebeu suplementação de carboidratos, proteínas e antioxidantes; - 3o Grupo: recebeu suplementação de carboidratos, proteínas, antioxidantes e óleo de peixe (ômega-3). No Gráfico 1, podemos observar que o grupo que teve a administração de ômega-3 apresentou menores níveis de CK (creatina quinase) e dor muscular pós competição14. Esse resultado encontrado com a administração de óleo de peixe em atletas de elite se deve, provavelmente, à redução da atividade do sistema proteolítico ubiquitina-proteossoma, do fator de atrofia muscular MuRF1 (Muscle RING-Finger-1), NF- kB e fator de transcrição FOXO3a (forkhead box O3a), que repercutiram em um menor grau de catabolismo muscular e da exacerbação do processo inflamatório15. Gráfico 1. Níveis de CK de acordo com o tempo e tipo de intervenção. Fonte: Philpott et al.14 Além disso, outro estudo conduzido com 8 atletas de basquete em cadeira de roda (sexo masculino), que foram suplementados com 3 g de óleo de peixe (1,5 g/dia de DHA e 0,3 g/dia de EPA) rico em ácido docosaexaenoico (DHA), demonstrou uma redução nos marcadores de dano muscular (LDH) e marcadores inflamatórios (IL- 6)16. Uma recente pesquisa que avaliou 27 homens fisicamente ativos observou algo diferente do estudo citado anteriormente, pois apresentou como resultado um efeito positivo com suplementaçãode 8 g óleo de peixe rico em EPA (cada 1 g possuía 0,75 g de EPA/dia e 0,05 g de DHA/dia) na redução da lesão muscular induzida pelo exercício17. Em 2011, Smith et al.18 conduziram um estudo clínico de 8 semanas com administração de 4 g de ômega-3, sendo 1,86 g/dia de EPA e 1,5 g/ dia de DHA, em 9 jovens saudáveis e treinados. Os resultados evidenciaram maior expressão de p70s6k (proteína quinase ribossomal S6 de 70 kDA) (Gráfico 2), mTOR (proteína alvo de rapamicina em mamíferos) (Gráfico 3) e maior taxa síntese proteica miofibrilar (Gráfico 4) no grupo suplementado com ômega-3 juntamente com a refeição que continha proteína. Gráfico 2. Expressão de p70s6k antes e depois da suplementação com ômega-3. Fonte: Smith et al.18 Pre 24 48 72 Tempo (h) 0 50 100 Ex FO PRO CHO * ** * 10.0 4.0 3.0 2.0 1.0 0 e Basal FED FEDBasal Antes da suplementação de ômega-3 Depois da suplementação de ômega-3 p7 0s 6k Th r3 89 32 w w w .v po nl in e. co m .b r Utilização do ômega-3 na síntese proteica e recuperação muscular Gráfico 4. Taxa de síntese proteica miofibrilar antes e depois da suplementação com ômega-3. Fonte: Smith et al.18 Gráfico 6. Expressão de p70s6k antes e depois da suplementação com ômega-3. Fonte: Smith et al.19 Gráfico 5. Expressão de mTOR antes e depois da suplementação com ômega-3. Fonte: Smith et al.19 Gráfico 7. Taxa de síntese proteica miofibrilar antes e depois da suplementação com ômega-3. Fonte: Smith et al.19 No mesmo ano de 2011, Smith et al.19 conduziram um estudo clínico, controlado e randomizado semelhante à pesquisa anteriormente citada, porém com uma diferença nos voluntários estudados: esse estudo clínico foi realizado com 16 idosos saudáveis e treinados, durante 8 semanas, com administração de 4 g de ômega-3, sendo 1,86 g/dia de EPA e 1,5 g/dia de DHA. Houve maior expressão de mTOR (Gráfico 5), p70s6k (Gráfico 6) e maior taxa de síntese proteica miofibrilar (Gráfico 7) no grupo suplementado com ômega-3 juntamente com a refeição que continha proteína. Basal BasalFED FED 4.0 2.0 1.0 0 c d Basal BasalClamp Clamp Basal BasalFED FED b a c 2.5 2.0 1.5 1.0 0.5 0.0 Basal BasalFED FED Antes Depois d e d 2.5 2.0 1.5 1.0 0.5 0.0 Basal BasalFED FED Antes Depois b b cÁcidos graxos ômega-3 Gráfico 3. Expressão de mTOR antes e depois da suplementação com ômega-3. Fonte: Smith et al.18 Antes da suplementação de ômega-3 Antes da suplementação de ômega-3 Antes da suplementação de ômega-3 Depois da suplementação de ômega-3 Depois da suplementação de ômega-3 Depois da suplementação de ômega-3 m TO RS er 24 48 m TO RS er 24 48 p7 0s 6k Th r3 89 Pr ot eí na m us cu la r m ist a FS R( % -h -1 ) Pr ot eí na m us cu la r m ist a FS R( % -h -1 ) 0.10 0.09 0.08 0.07 0.06 0.05 0.04 0.03 0.02 0.01 0.00 33 Re vi st a Br as ile ir a de N ut ri çã o Fu nc io na l Valden Luis Matos Capistrano Junior e Daniel Cordeiro Gurgel Após 4 anos, Smith et al.20 realizaram um estudo clínico maior, duplo cego e randomizado, com 60 idosos saudáveis e sedentários, que receberam um tratamento de 6 meses. O grupo placebo recebeu 4 g de óleo de milho, e o grupo tratado, 4 g de ômega-3 (1,86 g/dia de EPA e 1,5 g/dia de DHA). Após diversas avaliações de força e potência muscular e composição corporal no pré-estudo e no pós-estudo, os resultados obtidos foram aumentos significativos no volume de coxa (Gráfico 8) e na força muscular (Gráfico 9) e sem a presença de exercício físico no grupo suplementado com ômega-3. Gráfico 8. Volume da coxa (porcentagem e cm3) antes e depois da suplementação com ômega-3. Gráfico 9. Força muscular antes e depois da suplementação com ômega-3. Fonte: Adaptado de Smith et al.19 Fonte: Adaptado de Smith et al.19 Em 2016, McGlory et al.21 conduziram um estudo clínico com 20 jovens treinados, durante 8 semanas de treinamento de contra-resistência, com administração de 5 g de ômega-3, sendo 3,5 g/ dia de EPA e 0,9 g/dia de DHA, associada, em um primeiro momento, com uma refeição contendo 30 g de proteínas sem exercício e, em um segundo momento, com exercício físico. O grupo controle utilizou 5 g de óleo de coco, pelo fato de essa gordura não apresentar nenhuma interferência na síntese proteica. Como resultado final, os autores observaram que não houve diferença estatística no estímulo da taxa de síntese proteica miofibrilar com a suplementação de ômega-3 juntamente com 30 g de proteínas na refeição e associado com o exercício físico. O achado do estudo do McGlory et al.21 com jovens treinados, no qual não houve aumento no estímulo de síntese proteica miofibrilar, foi contra o que Smith et al. acharam em dois estudos18,19, um com jovens treinados e outro com idosos treinados, nos quais houve aumento da taxa de síntese proteica miofibrilar. Porém, ao analisar as refeições proteicas administradas em cada estudo, observou-se que nos dois estudos conduzidos por Smith et al.18,19 o pico de leucina plasmático foi de 165–175 umol (refeição com aproximadamente 15 g de Volume muscular de coxa Força 1RM Volume muscular de coxa Força 1RM Po rc en ta ge m Po rc en ta ge m cm 3 kg +7,5% +5,3% +0,242 cm3 +10kg 6 4 2 0 -2 -4 6 3 0 -3 -6 240 160 80 0 -80 -160 15 10 5 0 -5 -10Controle ControleÔmega-3 Ômega-3 Efeito de 6 meses de tratamento 34 w w w .v po nl in e. co m .b r Utilização do ômega-3 na síntese proteica e recuperação muscular proteínas); já no estudo realizado por McGlory et al.21, a refeição que continha 30 g de proteínas atingiu um pico de leucina plasmático de 250- 300 umol, atingindo, consequentemente, a taxa de síntese proteica máxima pelo alto consumo proteico, e não pelo acréscimo de ômega-3 (Gráfico 10). Gráfico 10. Taxas de síntese proteica miofibrilar (% mudança) com suplementação com ômega-3 ou óleo controle. FED: após a ingestão de proteína; FEDEX: ingestão de proteína precedida por exercício de resistência; FO: óleo de peixe; CO: óleo controle; MPS: síntese proteica miofibrilar Fonte: Adaptado de McGlory et al.21 Dessa maneira, quando há uma refeição com quantidades subótimas de proteínas, ao se associar 4 g de ômega-3 (1,86 g/dia de EPA e 1,5 g/dia de DHA) pode-se aumentar a taxa de síntese proteica miofibrilar sem a necessidade de aumentar a ingestão proteica. Dessa forma, podemos inferir que a suplementação de ômega-3 altera processos de sinalização anabolizantes, sem modular as taxas de síntese proteica miofibrilares em resposta à ingestão de proteínas ou quando associado ao exercício. Ou seja, menos atividade de quinase é necessária para maximizar as taxas de síntese proteica miofibrilar em resposta à administração de proteína via oral e ao exercício18,19,21. Um estudo mais recente que avaliou 23 mulheres suplementadas com 3 g de óleo de peixe (2,1 g/dia de EPA e 0,6 g/dia de DHA), com treinamento de contra-resistência em membros inferiores (duas vezes por semana) por 18 semanas, apresentou melhora na qualidade muscular, por meio de uma avaliação de ressonância magnética que averiguou a área anatômica transversal do tecido muscular das voluntárias suplementadas22. Mecanismos de ação do ômega-3 na sina- lização dos processos anabólicos Um estudo clínico observou que a suplementação de ômega-3 em adultos jovens apresentou como resultado uma atividade reduzida da proteína quinase PKB/Akt, mas sem diminuir a taxa de síntese proteica miofibrilar23, e isso ocorreu exatamente pelo fato de esse nutriente sensibilizar outras proteínas, como a mTOR e a p70s6k21 (Figura 5). M PS m io fib ril ar (% d e m ud an ça ) 400 300 200 100 0 35 Re vi st a Br as ile ir a de N ut ri çã o Fu nc io na l Valden Luis Matos Capistrano Junior e Daniel Cordeiro Gurgel Pesquisadores mostraram que o grande responsável pela maior resposta ao aumento da taxa de síntese proteica miofibrilare redução do processo catabólico é o EPA, tendo ação de 25% maior que o DHA em relação à síntese proteica25. Os mecanismos apresentados na literatura, nos quais o EPA é responsável por reduzir o Figura 5. Mecanismo de ação do ômega-3 sensibilizando a resposta anabólica. Fonte: Adaptado de Smith et al.20; Da Boit et al.22; Liu et al.23 Fonte: Adaptado de Smith et al.20; Da Boit et al.22; Liu et al.23 catabolismo muscular, envolvem a diminuição da ativação do NF-Kb, menor expressão do RNAm do MuRF1 (Figura 6) e redução da atividade do TNF-α, que resulta em um downregulation do sistema ubiquitina-proteossoma26-29. Existe apenas um estudo que demonstra a ação do DHA sendo superior na atenuação da degradação de proteínas por meio dos mesmos mecanismos apresentados Figura 6. Mecanismo de ação do ômega-3 para reduzir o catabolismo muscular por meio da diminuição da ativação do NF-kB e menor expressão do RNAm do MuRF. Contração Insulina Hipóxia Leucina Biogênese de ribossomosFormação do complexo de iniciação da tradução Iniciação da tradução Síntese proteica Regulador positivo da mTORC1/síntese proteica Regulador negativo da mTORC1/síntese proteica Energia Legenda da figura 36 w w w .v po nl in e. co m .b r Utilização do ômega-3 na síntese proteica e recuperação muscular pelo EPA30. Demonstrando a superioridade do EPA em reduzir o catabolismo do tecido muscular esquelético, um estudo clínico foi realizado com 40 pacientes recém diagnosticados com tumor de pulmão de não pequenas células, recebendo tratamento quimioterápico. O grupo tratado recebeu 2,2 g/dia de EPA por 10,2 semanas e teve a avaliação da composição corporal realizada por tomografia computadorizada. Ao fazer o comparativo, o grupo padrão (sem tratamento) apresentou uma perda ponderal média de 2,3 kg, enquanto o grupo suplementado com EPA manteve o peso corporal (p<0,05). Interessante ressaltar que 69% dos voluntários que perfaziam o grupo tratado foram os que obtiveram os maiores ganhos ou manutenção do músculo esquelético (p<0,05), enquanto apenas 29% do grupo padrão conseguiram manter o tecido muscular, e a média desse grupo sem tratamento foi a perda de 1 kg de músculo31. Considerações finais Os mecanismos de sensibilização das vias anabólicas por intermédio do nutriente ômega-3, propostos nesta revisão, são de extrema importância para a manutenção da massa muscular esquelética, em decorrência de baixa oferta proteica, tendo em vista situações clínicas específicas como: pacientes oncológicos, os quais, dependendo do tipo de tumor, devem evitar a hiperestimulação da mTOR, a fim de não contribuir com a carcinogênese e evitar a progressão tumoral; pacientes idosos sarcopênicos, que normalmente apresentam uma baixa ingestão proteica e necessitam manter ou ganhar tecido muscular; atletas que apresentem quadros de overtraining ou são extremamente exigidos durante uma temporada e que apresentam vias inflamatórias exacerbadas, que precisam ser moduladas. Tendo observado algumas condições clínicas, o ômega-3 parece ser uma alternativa bastante interessante dentre as inúmeras estratégias nutricionais para manejo da síntese proteica e recuperação muscular. Há evidências crescentes de que o ômega-3 derivado do óleo de peixe estimula os ganhos de massa muscular em adultos jovens e, principalmente, em idosos, por superar a resistência anabólica induzida pelo envelhecimento. Os resultados positivos induzidos pelo ômega-3 na taxa de síntese proteica miofibrilar e no volume muscular ocorrem de forma dependente da dose. Diversas perguntas ainda seguem sem respostas em relação à elucidação dos papeis desempenhados pelo EPA e DHA na regulação anabólica do tecido muscular esquelético em seres humanos. Referências 1. SMITH, L.L. Cytokine hypothesis of overtraining: a physiological adaptation to excessive stress? Med Sci Sports Exerc; 32: 317-31, 2000. 2. LAZARIM, F.L.; ANTUNES-NETO, J.M.; DA SILVA, F.O. et al. The upper values of plasma creatine kinase of professional soccer players during the Brazilian National Championship. J Sci Med Sport; 12: 85-90, 2009. 3. SMITH, L.L. Tissue trauma: the underlying cause of overtraining syndrome? J Strength Cond Res; 18: 185-193, 2004. 4. TIDBALL, J.G. Inflammatory processes in muscle injury and repair. Am J Physiol Regul Integr Comp Physiol; 288: R345-R353, 2005. 5. GLEESON, M. Immune function in sport and exercise. J Appl Physiol; 103: 693-9, 2007. 6. SOUSA, M.; TEIXEIRA, V.H.; SOARES, J. Dietary strategies to recover from exercise-induced muscle damage. Int J Food Sci Nutr; 65 (2): 151-63, 2014. 7. TIDBALL, J.G.; WEHLING-HENRICKS, M. Macrophages promote muscle membrane repair and muscle fibre growth and regeneration during modified muscle loading in mice in vivo. J Physiol; 578: 327-36, 2007. 8. BUTTERFIELD, T.A.; BEST, T.M.; MERRICK, M.A. The dual roles of neutrophils and macrophages in inflammation: a critical balance between tissue damage and repair. J Athl Train; 41: 457-65, 2006. 9. PEDERSEN, B.K.; ROHDE, T.; OSTROWSKI, K. Recovery of the immune system after exercise. Acta Physiol Scand; 162: 325-32, 1998. 10. BASSEL-DUBY, R.; OLSON, E.N. Signaling pathways in skeletal muscle remodeling. Annu Rev Biochem; 75: 19-37, 2006. 11. LANGEN, R.C.J.; SCHOLS, A.M.W.J,; KELDERS, M.C.J.M. et al. Am J Physiol Cell Physiol; 283: C714-C721, 2002. 37 Re vi st a Br as ile ir a de N ut ri çã o Fu nc io na l Valden Luis Matos Capistrano Junior e Daniel Cordeiro Gurgel 12. BHULLAR, A.S.; PUTMAN, C.T.; MAZURAK, V.C. Potential role of omega-3 fatty acids on the myogenic program of satellite cells. Nutr Metab Insights: 9: 1-10, 2016. 13. MAGEE, P,; PEARSON, S.; ALLEN, J. The omega-3 fatty acid, eicosapentaenoic acid (EPA), prevents the damaging effects of tumour necrosis factor (TNF)-alpha during murine skeletal muscle cell differentiation. Lipids Health Dis; 7: 24, 2008. 14. PHILPOTT, J.D.; DONNELLY, C.; WALSHE, I.H. et al. Adding fish oil and natural antioxidants to whey protein improves eccentric- exercise recovery in soccer players. 17th Annual ECSS-Congress, Bruges, 2012. 15. JEROMSON, S.; GALLAGHER, I.J.; GALLOWAY, S.D.R.; HAMILTON, D.L. Omega-3 Fatty Acids and Skeletal Muscle Health. Mar Drugs; 13: 6977-7004, 2015. 16. MARQUES, C.G. et al. Effects of DHA-rich fish oil supplementation on the lipid profile, markers of muscle damage, and neutrophil function in wheelchair basketball athletes before and after acute exercise. Appl Physiol Nutr Metab; 40 (6): 596- 604, 2015. 17. JAKEMAN, J.R. et al. Effect of an acute dose of omega-3 fish oil following exercise-induced muscle damage. Eur J Appl Physiol; 117 (3): 575-582, 2017. 18. SMITH, G.I. et al. Omega-3 polyunsaturated fatty acids augment the muscle protein anabolic response to hyperaminoacidemia- hyperinsulinaemia in healthy young and middle aged men and women. Clin Sci (Lond); 121 (6): 267-278, 2011. 19. SMITH, G.I. et al. Dietary omega-3 fatty acid supplementation increases the rate of muscle protein synthesis in old adults: a randomized controlled Trial. Am J Clin Nutr; 93 (2): 402-12, 2011. 20. SMITH, G.I. et al. Fish oil–derived n–3 PUFA therapy increases muscle mass and function in healthy older adults. Am J Clin Nutr; 102 (1): 115-22, 2015. 21. MCGLORY, C. WARDLE, S.L.; MACNAUGHTON, L.S. et al. Fish oil supplementation suppresses resistance exercise and feeding- induced increases in anabolic signaling without affecting myofibrillar protein synthesis in young men. Physiol Rep; 4 (6): e12715, 2016. 22. DA BOIT, M. et al. Sex differences in the effect of fish-oil supplementation on the adaptive response to resistance exercise training in older people: a randomized controlled trial. Am J Clin Nutr; 105 (1): 151-8, 2017. 23. LIU, Y. et al. Fish oil increases muscle protein mass and modulates akt/foxo, tlr4, and nod signaling in weanling piglets after lipopolysaccharide challenge. J Nutr; 143 (8): 1331-9, 2013. 24. DRUMMOND, M.J.;DRYER, H.C.; FRY, C.S. et al. Nutritional and contractile regulation of human skeletal muscle protein synthesis and mTORC1 signaling. J Appl Physiol; 106 (4): 1374-1384, 2009. 25. KAMOLRAT, T.; GRAY, S.R. The effect of eicosapentaenoic and docosahexaenoic acid on protein synthesis and breakdown in murine C2C12 myotubes. Biochem Biophys Res Commun; 432 (4): 593-598, 2013. 26. KUBOTA, H.; MATSUMOTO, H.; HIGASHIDA, M. et al. Eicosapentaenoic acid modifies cytokine activity and inhibits cell proliferation in an oesophageal cancer cell line. Anticancer Res; 33 (10): 4319-4324, 2013. 27. HUANG, F.; WEI, H.; LUO, H. et al. EPA inhibits the inhibitor of kBa (IkBa)/NF-kB/muscle RING finger 1 pathway in C2C12 myotubes in a PPARg-dependent manner. Br J Nutr; 105 (3): 348-356, 2011. 28. MAGEE, P.; PEARSON, S.; WHITTINGHAM-DOWD, J.; ALLEN, J. PPARγ as a molecular target of EPA anti-inflammatory activity during TNF-α-impaired skeletal muscle cell differentiation. J Nutr Biochem; 23 (11): 1440-1448, 2012. 29. WHITEHOUSE, A.S.; TISDALE, M.J. Downregulation of ubiquitin-dependent proteolysis by eicosapentaenoic acid in acute starvation. Biochem Biophys Res Commun; 285 (3): 598-602, 2001. 30. WANG, Y.; LIN, Q.; ZHENG, P. et al. DHA inhibits protein degradation more efficiently than EPA by regulating the PPARy/NFkB pathway in C2C12 myotubes. BioMed Res Int; 2013:318981, 2013. 31. MURPHY, R.A.; MOURTZAKIS, M.; CHU, Q.S.C. et al. Nutritional intervention with fish oil provides a benefit over standard of care for weight and skeletal muscle mass in patients with nonsmall cell lung cancer receiving chemotherapy. Cancer; 117 (8): 1775-82, 2011.
Compartilhar