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o canto coral como prática social

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107
Educação, Batatais, v. 6, n. 2, p. 107-129, jul./dez.2016
O canto coral como prática social: reflexões 
para além do fazer música
Mariana GALON1
Resumo: A pesquisa aqui apresentada buscou identificar as práticas sociais e 
os processos educativos presentes em aulas de canto coral de um projeto social 
na cidade de Batatais, interior de São Paulo. Para tanto, partiu de uma inserção 
dentro desse espaço, para que essa identificação acontecesse no convívio com 
alunos e alunas, nas aulas de canto coral e no intervalo do lanche desses alunos e 
alunas. As inserções ocorreram em 5 encontros em que me tornei aluna de Canto 
Coral, participando ativamente das aulas. As coletas de dados foram feitas por 
meio de diálogos com os alunos e alunas, e registro em diário de campo. Por 
meio do diálogo com autores da educação, foi possível identificar a prática social 
e também alguns processos educativos presentes na prática do “coral”. Após essa 
identificação, objetivou-se a reflexão sobre o processo de inserção, e os proces-
sos educativos vivenciados com os alunos de canto coral.
Palavras-chave: Processos Educativos. Canto Coral. Convivência.
1 Mariana Galon. Mestre em Educação pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). 
Especialista em Arte-Educação pela Universidade de Brasília (UnB). Atualmente é docente nos 
cursos de Licenciatura em Música e Pós-Graduação em Educação Musical do Claretiano – Centro 
Universitário e na Universidade Federal de São Carlos. E-mail: <marianagalon@gmail.com>.
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Educação, Batatais, v. 6, n. 2, p. 107-129, jul./dez. 2016
Coral corner as social practice: reflections 
beyond making music
Mariana GALON
Abstract: The research presented here sought to identify the current social 
practices in choral singing classes in a social project in the city of Batatais, São 
Paulo. To do so, left an insertion within this space, so that the identification 
happened in living with male and female students in the classes of choral singing 
and lunch break these students. Insertions occurred in 5 meetings that I became a 
student of Choral Singing, actively participating in lessons. The data collections 
were made through dialogues with students and students, and journaling field. 
Through dialogue with authors such as Paulo Freire, Maria Fiori Ernane and 
Enrique Dussel, it was possible to identify the social practice and also some 
educational processes present in choir practice. After identifying aimed to 
reflect on the process of integration, and educational processes experienced with 
students and students of coral.
Keywords: Educational Processes. Choir. Coexistence.
109
Educação, Batatais, v. 6, n. 2, p. 107-129, jul./dez.2016
1. INTRODUÇÃO
A prática do canto coral atualmente é algo muito presente nas 
instituições de ensino (DIAS, 2012). Hoje, em nosso país, o can-
to coral está intimamente ligado à educação. O número crescente 
de coros nas escolas, em diversas regiões do Brasil, e o interesse 
acadêmico pela formação coral na área de educação musical levam-
-nos a considerar o canto coral não só como uma prática de música 
vocal, mas também como uma ferramenta socioeducativa efetiva. 
Nascemos carregando um instrumento musical, que é a nossa voz. 
Desse modo, todos podemos cantar, ou seja, fazer música, sem que 
tenhamos de comprar um instrumento musical. Isso, por si só, torna 
a prática do canto coral acessível, o que motiva empresas, esco-
las, centros comunitários, projetos sociais e igrejas a escolherem 
essa prática para ser desenvolvida em seu meio (JUNKER, 1999). 
Dentro das escolas de educação básica, o canto coral ganhou espa-
ço principalmente pelo cumprimento da Lei 11.769/08, que torna 
obrigatório o ensino de música na escola e pelas facilidades eco-
nômicas que envolvem essa prática. Além dessas facilidades já 
mencionadas, o canto coral é uma ferramenta de integração, mo-
tivação, desenvolvimento de múltiplas habilidades e competências 
(FUCCI-AMATO, 2007).
Por apresentar-se como um trabalho em grupo, identificamos 
que o canto coral é uma prática social que pode desenvolver não 
só a capacidade vocal, mas também a interação, a convivência, a 
inclusão social e as relações interpessoais em um grupo social.
A pesquisa que será relatada buscou, por meio de uma inser-
ção nas aulas de canto coral em um projeto social, observar e par-
ticipar dos processos educativos ali desencadeados. Desse modo, 
buscou-se ampliar o olhar para o ensino de música, mostrando que 
ele pode estar inserido em um contexto humanizador de educação.
Na convivência com os educandos de canto coral, buscou-
-se por meio do diálogo, da relação amorosa e respeitosa, aprender 
com eles, e observar como eles se educam na coletividade dentro 
de um contexto de ensino musical. Nesse convívio relações afetivas 
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Educação, Batatais, v. 6, n. 2, p. 107-129, jul./dez. 2016
foram construídas, aprendizados ocorreram, confirmando a nossa 
constante transformação no mundo.
2. EU, O OUTRO E NOSSAS CONSTITUIÇÕES
No fluxo contínuo da vida, nos encontramos, distanciamos, 
nos fazemos e refazemos em uma constante transformação no mun-
do. A vida é um processo contínuo de conhecimento e criação. Nes-
sa transformação que se dá no viver, nos relacionamos com o ou-
tro e criamos vínculos de cooperação. Desse modo, “[...] vivemos 
com os outros seres vivos, e, portanto, compartilhamos com eles o 
processo vital. Construímos o mundo em que vivemos durante as 
nossas vidas. Por sua vez ele também nos constrói ao longo des-
sa viagem comum” (MATURANA; VARELA, 2004, p. 10). Esse 
processo de constante construção conjunta dos seres humanos só 
é possível por conta de sua inconclusão. Freire (2011b) define ho-
mens e mulheres como seres inconclusos, conscientes de sua in-
completude, o que possibilita vários caminhos vitais.
Essa dinâmica da vida que leva ao encontro e à partilha pro-
porciona que pessoas se eduquem por meio de práticas sociais em 
diferentes ambientes. “Se a vida é um processo de conhecimento, 
os seres vivos constroem esse conhecimento não a partir de uma 
atitude passiva e sim pela interação” (MATURANA; VARELA, 
2004, p. 12).
Compreendemos que “[...] práticas sociais decorrem de e ge-
ram interações entre os indivíduos e entre eles e os ambientes, na-
tural, social, cultural em que vivem” (OLIVEIRA et al., 2009, p. 4), 
transmitindo valores e significados, criando identidades dentro de 
uma sociedade. Como faz parte do encadeamento da vida, práticas 
sociais estão presentes em toda a história da humanidade, nas mais 
diversas culturas que se organizam em sociedade, e permitem que 
as pessoas se construam, se eduquem na coletividade (OLIVEIRA 
et al., 2009).
Entendemos também que toda prática social desencadeia pro-
cessos educativos. Partindo desse pressuposto compreende-se que 
o aprendizado “para a vida” dentro das mais diversas sociedades 
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Educação, Batatais, v. 6, n. 2, p. 107-129, jul./dez.2016
ocorre pela interação, pelas experiências que se tem junto, ou seja, 
das práticas sociais. Interação e vivência que é um processo con-
tínuo e permanente, em que as pessoas se educam na convivência. 
Desse modo, é possível considerar que o aprendizado e a educação 
não estão restritos e destinados somente à educação formal, eles 
ocorrem em vários momentos e ambientes, dentro e fora da escola, 
onde há convivência e comunhão entre as pessoas.
O educar se constitui no processo em que a criança ou o 
adulto convive com o outro e, ao conviver com o outro, se 
transforma espontaneamente, de maneira que seu modo de 
viver se faz progressivamente mais congruente com o do 
outro no espaço de convivência. O educar ocorre, portan-
to, todo o tempo e de maneira recíproca (MATURANA, 
1998, p. 29).
Acreditando que “[...] eu me construo enquanto pessoa no 
convívio com outras pessoas; e, cada um ao fazê-lo contribui para a 
construção de ‘um’ nós em que todos estão implicados” (OLIVEI-
RA et al., 2009, p. 1), e que as pessoas se educam na coletividade 
por meio dainteração, essa pesquisa foi desenvolvida objetivando 
a inserção dentro de uma determinada prática social, participando 
ativamente com as pessoas que fazem parte dessa prática, a fim de 
reconhecer quais os processos educativos ali gerados.
Segundo Freire (2011b), homens e mulheres se criam e re-
criam no encontro, na comunhão das consciências, mediatizados 
pelo mundo, ou seja, em práticas sociais.
Não posso entender os homens e as mulheres, a não ser 
mais do eu simplesmente vivendo, histórica, cultural e 
socialmente existindo, como seres fazedores de seu cami-
nho que ao fazê-lo, se expõem ou se entregam ao caminho 
que estão fazendo e que assim os refaz também (FREIRE, 
2011a, p. 135, grifos do autor).
Homens e mulheres autônomos constroem sua história atra-
vés da troca e da partilha. E nesse encontro se educam uns com os 
outros, de maneira colaborativa, na convivência. É na comunicação 
e na fecundidade criativa do encontro que a vida humana ganha 
sentido (FREIRE, 2011a). A comunicação é o que proporciona pen-
sarmos juntos, criarmos juntos, em práticas sociais, sem que haja 
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Educação, Batatais, v. 6, n. 2, p. 107-129, jul./dez. 2016
superposição de uns sobre os outros, nem dominação, somente a 
fecundidade das relações fundamentadas no diálogo.
 “O diálogo é esse encontro dos homens, mediatizados pelo 
mundo, para pronunciá-lo, não se esgotando, portanto, na relação 
eu-tú”, nesse encontro em que homens e mulheres refletem e agem 
sobre o mundo, o diálogo torna-se uma exigência existencial, pois 
“[...] se impõe como caminho pelo qual os homens ganham signi-
ficação enquanto homens” (FREIRE, 2011b, p. 109). Desse modo, 
os seres humanos só se reconhecem como tal no encontro com o 
outro. Por meio do diálogo homens e mulheres ganham significa-
ção no mundo, se historicizam, se fazem e refazem, autenticam-se, 
humanizam-se, tornando-se sujeitos de suas ações.
Ao pronunciarem sua própria palavra homens e mulheres 
tornam-se agentes transformadores, criadores e produzem “[...] não 
somente os bens materiais, as coisas sensíveis, os objetos, mas tam-
bém as instituições sociais, suas ideias, suas concepções” (FREI-
RE, 2011b, p. 128). Pela sua ação no mundo os seres humanos 
constroem sua própria história, como sujeito autônomo e crítico, 
educando-se, humanizando-se, e libertando-se.
É pelo diálogo e pela convivência, em práticas sociais, que 
o homem se liberta. De modo que “[...] ninguém liberta ninguém, 
ninguém se liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão” 
(FREIRE, 2011b, p. 71).
No entanto, as relações dialógicas, em que os seres humanos 
se educam e se libertam, só são possíveis quando há humildade, 
respeito e amorosidade: “Se não amo o mundo, se não amo a vida, 
se não amo os homens não me é possível o diálogo” (FREIRE, 
2011b, p. 111).
Nesse sentido, Maturana e Varela complementam o pensa-
mento de Freire quando manifestam que o diálogo, o linguagear, 
é elemento central na relação que produz o conhecimento e esta só 
é possível quando há amor. “O central na convivência humana é o 
amor, as ações que constituem o outro como um legítimo outro na 
realização do ser social que tanto vive na aceitação e respeito por si 
mesmo quanto na aceitação e respeito pelo outro” (MATURANA, 
1998, p. 32).
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O conceito de amor, definido pelos autores como aceitação 
do outro como legítimo outro na convivência, é o afeto que possi-
bilita esse encontro fecundo e alteritário das relações. Nas práticas 
sociais em que o amor e o respeito fazem-se presente, por meio do 
diálogo as pessoas se educam em comunhão e conservam no viver 
o mundo que vivem com o outro, no conviver:
Sem amor, sem aceitação ao outro ao nosso lado, não há 
socialização, e sem socialização não há humanidade. Só 
temos o mundo que criamos com o outro, e que só o amor 
nos permite criar esse mundo em comum (MATURANA; 
VARELA, 2004 p. 253).
Nesse caminho da vida trilhado junto como o outro, diante 
de sua inconclusão, homens e mulheres podem se humanizar ou 
desumanizar. 
Mas, se ambas são possibilidades, só a primeira nos parece 
ser o que chamamos de vocação dos homens. Vocação ne-
gada, mas também afirmada na própria negação. Vocação 
negada na injustiça, na exploração, na opressão, na violên-
cia dos opressores. Mas afirmada no anseio de liberdade, 
de justiça, de luta dos oprimidos, pela recuperação de sua 
humanidade roubada (FREIRE, 2011b, p. 16).
Historicamente os povos da América Latina foram marcados 
por fortes processos de desumanização e desenraizamento (DUS-
SEL, 1995).
A colonização violenta a qual experienciamos nos colocou 
como exterioridade em face de uma totalidade2 imposta pelos colo-
nizadores, nos categorizou como coisas e não como seres humanos 
(DUSSEL, 1995).
Dussel aponta que o problema da totalidade vigente é quan-
do, entendendo o mundo como nosso, passa a ser dominadora, do-
minando homens como se fossem coisas. Quando não reconhece o 
outro como igual, o coisifica e o usa como meio de se chegar a seu 
projeto de existência. O que não é reconhecido pela experiência não 
2 A totalidade é o mundo em que vivemos e reconhecemos por meio de nossas experiências. Dentro 
desse mundo o homem relaciona-se com coisas (ente), as reconhece, atribui a esses objetos valor, de 
modo que ganham sentindo em sua existência. O que não faz parte dessa totalidade é exterioridade, 
portanto não reconhecido como algo legitimo (DUSSEL, 1995).
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pertence à totalidade. O outro é aquele que estando além da totali-
dade não é ouvido, reconhecido como ser, é negado.
Essa relação de dominação, em que há um opressor e um 
oprimido, também se faz presente nas relações existentes no siste-
ma educacional, principalmente nas relações entre professor/aluno 
(FREIRE, 2011b).
Quanto mais analisamos as relações educador-educandos, 
na escola, em quaisquer de seus níveis (ou fora dela), pare-
ce que mais nos podemos convencer de que essas relações 
apresentam um caráter especial e marcante – o de serem 
relações fundamentalmente, narradoras, dissertadoras. 
[...] Narração ou dissertação que implica num sujeito – o 
narrador – e em objetos pacientes, ouvintes – os educandos 
(FREIRE, 2011b, p. 67, grifo do autor).
A ideia de um professor detentor do saber que o transmite 
aos alunos por meio de uma educação bancária3 ainda é recorrente 
dentro das salas de aulas. Nesses espaços muitas vezes são negados 
os processos educativos oriundos da coletividade e da convivência 
entre as pessoas, “o saber de experiência feito” (FREIRE, 2011a) 
do aluno não é levado em conta na ação educativa. Ao contrário 
disso, pesquisas nos mostram e apresentam exemplos de que os 
processos educativos gerados de práticas sociais, baseadas em rela-
ções de alteridade, levam a processos de humanização (OLIVEIRA 
et al., 2009).
Para a superação desse pensamento “civilizatório”, Dussel 
aponta que devemos nos autovalorizar e nos reconhecermos como 
sujeitos e, ao nos reconhecermos, olhar o outro como igual, em uma 
relação de alteridade.
Dussel define alteridade como o estar cara a cara com o ou-
tro, reconhecendo-o como igual e essencial em minhas ações e 
em minha existência. É na aceitação do outro como legítimo que 
abrimo-nos ao diálogo, pois somente quando amo o outro posso 
escutar e confiar em sua palavra. “A pedagógica se desenvolve es-
3 Paulo Freire define educação bancária como aquela em que o professor deposita o seu conhecimento 
nos alunos. “Dessa maneira, a educação se torna um ato de depositar, em que os educandos são os 
depositários e o educador, o depositante. [...] Eis aí a concepção ‘bancária’ da educação, em que a única 
margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los” 
(FREIRE, 2011b, p. 81).
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Educação, Batatais, v. 6, n. 2, p. 107-129, jul./dez.2016
sencialmente na bipolaridade palavra-ouvido, interpretação-escuta,acolhimento da Alteridade para servir o Outro como Outro” (DUS-
SEL, 1977, p. 191). Argumenta que o processo de humanização e 
de libertação se apresenta na aceitação do outro enquanto sujeito 
de sua história, sendo sujeito participante do processo de humani-
zação. Propõe que somente pelas relações baseadas na alteridade o 
processo de humanização torna-se viável. 
Para que nas práticas sociais entre os diferentes haja “mútua 
fecundidade criadora”, homens e mulheres precisam autovalorizar-
-se, e reconhecerem suas práticas e culturas como legítimas. Desse 
modo, temos práticas sociais que não desumanizam, mas que ge-
ram processos educativos que possibilitam a criação de identidades 
sociais, que fomentam a autonomia, a criticidade, a valorização de 
si e dos outros, por meio de uma educação conscientizadora.
Fiori, ao refletir sobre o processo de conscientização e educa-
ção, pontua que ambas fazem parte do mesmo processo de huma-
nização. Conscientização e educação estão intrinsicamente ligadas, 
pois, ao tomar consciência de si, o ser humano refaz seu mundo, e 
ao refazê-lo se constitui nele: “[...] educar, pois, é conscientizar, e 
conscientizar equivale a buscar essa plenitude da condição huma-
na” (FIORI, 1986, p. 1). O autor, assim como Freire, aponta que é 
no diálogo que homens e mulheres se conscientizam na intersubje-
tividade das consciências, ou seja, o ser consciente se completa no 
reconhecimento do outro. Destaca que “[...] a intersubjetividade, 
em que as consciências se enfrentam, dialetizam-se, promovem-se, 
é a tessitura última do processo histórico de humanização” (FIORI, 
2011, p. 17). Desse modo, recriar-se no mundo só é possível perante 
a tomada de consciência que leva homens e mulheres a historicizar-
-se, tornar-se sujeitos e criadores de sua cultura autônoma.
Fiori entende a cultura como a renovação de homens e mu-
lheres humanizados no mundo: “A forma humana se recria em dife-
rentes formas de vida na concretização histórica: a cultura se refaz e 
se reassume na diversidade das culturas” (FIORI, 1986, p. 7). Con-
sidera que a cultura autônoma, cultura viva, é aquela que é fruto da 
práxis de homens e mulheres autônomos(as), que se constituem e 
reconstituem no mundo, e tornam-se sujeito de seu próprio projeto 
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Educação, Batatais, v. 6, n. 2, p. 107-129, jul./dez. 2016
histórico-social. A cultura está intrinsicamente ligada à criticidade e 
à consciência histórica dos homens. “A cultura é um processo vivo 
de permanente criação: perpetua-se refazendo-se em novas formas 
de vida. Só cultiva, quem participa desse processo ao refazê-lo e 
refazer-se nele realmente. A transmissão do já feito, é cultura mor-
ta” (FIORI, 1986, p. 8).
É nas práticas sociais baseadas no diálogo, no convívio, na 
autovalorização, na criticidade, na alteridade que os seres humanos 
constroem a sua cultura autônoma, se historicizam, se enraízam, 
humanizam-se e libertam-se, modificando o mundo pela sua práxis 
libertadora. Desse modo, na prática social do canto coral, é possí-
vel aos educandos tornar-se sujeitos, construírem sua história em 
comunhão com o outro, ou seja, em práticas sociais.
3. CONTEXTUALIZANDO O CAMPO DE INSERÇÃO
A inserção aconteceu em uma turma de canto coral em um 
projeto sociocultural da cidade de Batatais. Esse projeto oferece 
ensino de música coletivo para crianças e adolescentes de 08 a 18 
anos, gratuitamente. O Projeto oferece o ensino de diversos ins-
trumentos e Canto Coral. Os alunos ingressantes não precisam ter 
instrumento musical, pois há a política de empréstimo de instru-
mentos. O acesso é universal, não há renda mínima para os educan-
dos poderem fazer parte do projeto, e nem testes de aptidão musical 
para os ingressantes, a única obrigatoriedade é estarem matricula-
dos em uma escola regular.
Quando o ensino coletivo de instrumentos musicais surgiu na 
Europa e posteriormente foi levado aos Estados Unidos, havia um 
interesse pela lucratividade em torno do uso dessa modalidade de 
ensino:
As academias possuíam três fontes de renda conjuntas ou 
não: as taxas, a venda de instrumentos musicais e acessó-
rios e ainda, a venda dos métodos de uso exclusivo. Portan-
to, a lucratividade foi um grande incentivo para a utiliza-
ção de aulas coletivas (CRUVINEL, 2004, p. 76).
117
Educação, Batatais, v. 6, n. 2, p. 107-129, jul./dez.2016
No entanto, a escolha por essa modalidade de ensino feita 
pelo Projeto vai além de fatores econômicos. Essa escolha foi por 
acreditar que é possível compartilhar conhecimento e que a intera-
ção e a diferença são partes importantes do aprendizado, de modo 
que é possível todos aprenderem com todos (TOURINHO, 2007). 
Os educandos “[...] trabalham juntos e se ajudam mutuamente sob 
a supervisão do professor quem sabe mais ensina a quem sabe me-
nos” (TOURINHO, 2007, p. 5).
Na cidade de Batatais, interior de São Paulo, o Projeto está 
presente desde 2006, e conta com a parceria da prefeitura. O Proje-
to atende 150 crianças e adolescentes nos cursos de sopros, cordas 
friccionadas, percussão e canto coral. Esses educandos frequentam 
o projeto de segunda-feira e quarta-feira no período da tarde.
A maioria dos educandos que ali estuda faz parte da rede mu-
nicipal e estadual de ensino. Por estar situada em uma cidade pe-
quena, a maioria dos alunos, mesmos os menores, vai até o projeto 
de bicicleta ou caminhando. A minoria dos educandos chega e vai 
embora das aulas acompanhada pelos pais. Esse fato também favo-
rece a interação dos educandos, já que muitos combinam de irem 
juntos ao projeto, estendendo a convivência que ocorre durante as 
aulas para outros espaços, como o caminho para casa.
4. IDENTIFICANDO UMA PRÁTICA SOCIAL
Esse trabalho foi realizado dentro das perspectivas da pesquisa 
qualitativa que privilegia a compreensão dos comportamentos 
a partir da perspectiva dos sujeitos da investigação (BOGDAN; 
BIKLEN, 1994).
Por meio da convivência nas aulas de canto coral e nos in-
tervalos das aulas, com as crianças que fazem parte de um projeto 
sociocultural em Batatais, buscou-se identificar as práticas sociais 
ali presentes, bem como os processos educativos decorrentes delas. 
Essa busca se deu pela convivência com os alunos, por meio da 
observação e do diálogo pautado no respeito mutuo. No decorrer 
do processo foi possível produzir conhecimento juntos, e educar-se 
a partir da convivência.
118
Educação, Batatais, v. 6, n. 2, p. 107-129, jul./dez. 2016
A escolha da disciplina de canto coral se deu por ser a prática 
musical mais distante de mim naquele momento. Outra questão foi 
que participar de um coro infantil sendo adulta seria uma experiên-
cia nova.
Após obter a autorização da coordenadora do projeto e da 
educadora de coral, iniciei a minha inserção. O próximo passo foi 
conversar com os educandos de coral. O grupo era formado por 17 
meninos e meninas de 9 a 12 anos.
Planejei participar de 5 aulas. Há duas aulas por semana, 
segunda-feira e quarta-feira, e eu estaria junto com os educandos 
somente nas segundas-feiras, ou seja, durante 5 semanas. A minha 
estratégia de trabalho era participar da aula de coral e também ficar 
com os alunos durante o intervalo de 15 minutos antes de volta-
rem para a segunda aula e durante esses dois momentos observar, 
interagir e conviver com os educandos, para compreender quais 
eram os processos educativos decorrentes daquela prática social. 
Para tanto, era preciso uma participação ativa junto ao grupo. Se-
gundo Oliveira (2009), para compreender e dialogar com o outro, 
há a exigência de uma vivência próxima, afetiva e comprometida, 
pois muitos aspectos das relações sociais só são percebidos desta 
forma: “É a convivência, com olhar e escuta atentos, que nos leva a 
compreender a diversidade” (OLIVEIRA, 2009, p. 314).
Para compreender o porquê desses educandos escolherem fa-
zer parte desse projeto, por que continuavam frequentando as aulas 
mesmo sem uma obrigatoriedade, o que pretendiam naquele espa-
ço, era necessário me assumir enquantoaluna de coral e descobrir 
com eles o que havia ali.
Após a participação nas aulas, essas vivências eram relatadas 
em um diário de campo. Busquei redigir o diário de campo sempre 
no mesmo dia da inserção, tentando ser fiel ao relatar a experiência 
vivida, e tentando rememorar fatos e diálogos que me chamavam a 
atenção. Esses relatos foram fonte de material para a reflexão futura 
sobre o que vivi junto aos educandos de coral. Segundo Oliveira 
(2009, p. 315), “[...] quanto mais mergulhados estamos na realidade 
que queremos compreender criticamente, mais molhados dela esta-
remos quando nesse afastamento”. Isso se confirmou ao voltar aos 
119
Educação, Batatais, v. 6, n. 2, p. 107-129, jul./dez.2016
diários de campos a fim de compreender os processos educativos 
vivenciados por mim juntamente com os educandos de canto coral.
Quando estamos envolvidos em processo dinâmico, que é a 
vida, nem tudo segue o curso que planejamos inicialmente. Ao me 
inserir, tinha em mente um número de aulas, um número de se-
manas, lugares onde estaria inserida, mas na vivência dinâmica e 
conjunta com o grupo, algumas coisas tomaram novos caminhos. 
Inicialmente planejei participar das aulas e dos intervalos, mas por 
convite dos educandos acabei participando também de uma apre-
sentação do coro. A vivência com o grupo me levou a perceber o 
quão importante seria estar com eles também nesse momento da 
apresentação, assumindo um compromisso social com todos os par-
ticipantes, me tornando parte efetiva do coro.
Ao final da minha inserção pude identificar, nesse espaço em 
que as pessoas escolheram estarem presentes e consequentemente 
conviverem com outros nas suas diferenças, não só a prática social 
de pessoas que se encontram para cantar juntas, mas também, a 
prática da convivência amorosa, presente no prazer que sentem ao 
cantar juntas, práticas que fomentam autonomia, diálogo e conse-
quentemente humanização.
5. O “CORAL4” COMO PRÁTICA SOCIAL
Na prática musical pode haver processos agregadores ou não. 
A vaidade, a competição pode afastar os indivíduos, mesmo que 
eles estejam fazendo música juntos, levando a processos desuma-
nizadores. Em contrapartida, o fazer musical quando feito no com-
partilhar, na troca de experiências, na relação amorosa de quem 
participa, agrega e leva a processos humanizadores. Desse modo, 
o ensino de música favorece a convivência que, por sua vez, leva 
os seus participantes a se educarem juntos, em uma educação para 
além do aprendizado musical.
Ao me tornar aluna da turma de canto coral, participei de 
uma prática social que me levou à reflexão sobre as dificuldades 
4 A escolha pela utilização da palavra “coral” e não coro se deu pelo fato de as crianças denominarem 
assim essa prática. 
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de ser aluna, à análise sobre minha ação como educadora de músi-
ca, e sobre o que é fazer parte de um grupo e as responsabilidades 
que isso traz. A prática social identificada em minha inserção foi 
a prática do “coral”, assim denominada pelos alunos e alunas que 
fazem parte dela.
Práticas sociais são construídas pelas relações estabelecidas 
entre as pessoas, com objetivos e em um período de tempo determi-
nado por aqueles que dela participam, permitindo que os indivíduos 
se construam na coletividade (OLIVEIRA et al., 2009). Durante 
os meus encontros com o grupo pude observar algumas dessas ca-
racterísticas. As crianças que ali estavam interagiam dentro e fora 
de sala de aula, estavam ali com o objetivo de fazer parte do coral, 
tinham um compromisso social com o grupo e aprendiam umas 
com as outras, apesar da diversidade de idade, escolaridade, crença, 
etnia e a presença de uma aluna especial.
Não tive a oportunidade de conversar com todas as crianças, 
pois a inserção ocorreu em um período em que o coral estava se 
preparando para várias apresentações e, por uma questão de bom 
senso, não seria lícito que eu utilizasse o tempo de ensaio para rea-
lizar rodas de conversas com todos. No horário do lanche foi quan-
do eu tive oportunidade de dialogar mais livremente com os alunos 
e alunas; no entanto, muitos dispersavam para brincar, impossibili-
tando o meu contato com todos.
Os alunos e alunas com que eu conversei relataram que o 
tempo que cada um participava do coral era distinto. A aluna Sue-
len5, por exemplo, fazia parte do grupo há 4 anos, enquanto a aluna 
Paola há 6 meses. Perguntei se isso era comum, e por que os alunos 
não continuavam no projeto.
Começaram a falar que alguns começam e param, falaram 
isso com tom de crítica. Perguntei o motivo de pararem e 
Paola disse que a prima dela, que também entrou no come-
ço do ano, parou porque começou a trabalhar, e que não 
sabia dos outros alunos. Suelen disse que em tom de críti-
ca: Tem gente que não quer saber de nada... (D.C 24/046).
5 Durante o trabalho foram utilizados nomes fictícios com o objetivo de preservar a identidades dos 
alunos e alunas.
6 Os trechos do diário de campo utilizados no decorrer do trabalho serão identificados com a sigla D.C 
e a data do encontro de inserção.
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Em outros momentos questionei alunos e alunas sobre por 
que faziam parte do coral e as respostas que eu obtive foram “que 
estavam no coral porque era legal. Gostavam de cantar. Paola me 
disse que ficar em casa era chato, então que preferia ir até o polo” 
(D.C 29/04). O aluno Breno em uma conversa comigo me disse 
“que gostava bastante das aulas, porque a professora dava umas 
brincadeiras para eles e porque gostava de cantar” (D.C 08/05).
Durante a minha convivência com o grupo, nenhum aluno 
ou aluna manifestou durante os diálogos comigo, ou com os outros 
alunos(as) ou com a educadora, o objetivo de se profissionalizar no 
campo musical. Os diálogos que tive com parte dos alunos e alunas 
do coral demonstraram que eles participavam daquela prática por 
prazer, pelo gosto de cantar.
Além de poder identificar a prática social do coral, a experi-
ência da inserção me levou a outras reflexões.
Antes de iniciar a minha inserção, imaginei que seria muito 
fácil participar das aulas de canto coral, afinal participei de corais 
durante boa parte da minha vida. Baseada na minha experiência 
com esse tipo de atividade musical, não imaginei o quanto seria 
diferente ser uma aluna adulta em um coro infantil, e nem o quanto 
as crianças poderiam me auxiliar e me ensinar nesse processo.
Já na primeira aula me surpreendi pela dificuldade que tive 
em fazer os exercícios de aquecimento vocal que eles faziam com 
tanta naturalidade e pelo desconforto físico que senti durante a aula. 
Em vários momentos da aula senti dores nas costas por ficar senta-
da na ponta da cadeira com as costas ereta. Nesses momentos pude 
refletir sobre a minha prática como educadora. Quantas vezes eu 
não devo ter deixado os meus alunos em “posição de coral” sentin-
do dores? E quantas vezes eu não dei broncas nesses alunos quando 
saiam dessa posição?
Dussel (2001) afirma que só podemos compreender a razão 
da vítima, quando assumimos o lugar dela. A inserção me propor-
cionou esse momento de assumir o lugar de aluna de música e per-
ceber um pouco as razões dos alunos(as) e, mais que isso, repensar 
a minha prática docente.
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No decorrer dessa aula, recebi ajuda de uma aluna que divi-
diu comigo a sua pasta, e observei que o mesmo aconteceu com 
outros alunos que também estavam sem pasta, de maneira natural, 
sem que a professora solicitasse.
Ainda nessa aula pude observar que, mesmo a aula não favo-
recendo a comunicação entre os alunos por meio do diálogo verbal, 
eles encontraram uma maneira de se comunicar, mantendo assim a 
interação característica de uma pratica social. “Várias vezes vi as 
meninas se comunicando por gestos. O pouco que deu para enten-
der me pareceu que falavam sobre um livro” (D.C dia 17/04/2013). 
Aqueles gestos não tinhammuito significado para mim, mas sim 
para elas que já conviviam há mais tempo, que tinham construído 
significados juntas. Essa interação se estendeu até o momento do 
lanche, quando as alunas se reuniram para continuar a conversa ini-
ciada por gestos durante a aula. Em práticas sociais os atores criam 
suas identidades e são participantes ativos nas relações sociais, sig-
nificando e ressignificando valores e comportamentos (OLIVEIRA 
et al., 2009).
Em um momento da aula um grupo de alunos foi mostrar para 
a educadora uma música que tinham ouvido juntos, e que gostariam 
que ela ensinasse ao coral. Nessa ação os alunos estavam buscan-
do exercer sua autonomia por meio do diálogo com a educadora, 
participando ativamente da construção da aula e consequentemente 
do processo de aprendizagem deles mesmos, se colocando como 
sujeitos naquele espaço educacional. Em vários momentos da mi-
nha inserção observei atitudes autônomas dos alunos e alunas, seja 
expressando suas opiniões ou organizando-se; em todos esses mo-
mentos o diálogo estava presente.
A comunicação observada nesse momento e em vários outros 
da prática social do coral é o que possibilita o pensar juntos, criar 
juntos, sem que haja superposição de uns sobre os outros, somente 
a fecundidade das relações fundamentadas no diálogo (FREIRE, 
2011b).
O diálogo se torna fundamental na convivência, em que todos 
ensinam e todos aprendem, não há depósitos unilaterais, mas trocas 
entre os sujeitos. Freire nos diz sobre o diálogo: “Neste lugar de 
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encontro, não há ignorantes absolutos, nem sábios absolutos: há 
homens que, em comunhão, buscam saber mais” (FREIRE, 2011b, 
p. 93).
Entre os vários momentos de diálogo entre os alunos e alu-
nas, vale destacar um que aconteceu no horário do lanche. Algumas 
crianças pediram um pouco de salgadinho para uma aluna e ela 
permitiu que pegassem, mas eles “atacaram” o salgadinho dela. A 
aluna disse: “Não põem a mão, façam fila que eu dou um pra cada 
um” (D.C 17/04). Ela se aborreceu, mas logo resolveu o problema 
dialogando com os demais.
Outra questão foi que em todas as aulas pude observar os alu-
nos se ajudando e me ajudando em minhas dificuldades também. 
Em momentos como esse, pude observar que os alunos educavam-
-se na convivência uns com os outros, a todo tempo de maneira 
recíproca (MATURANA, 1998).
Em uma das aulas foi feito um ensaio especificamente para 
duas apresentações que o grupo faria. Quando o coral começou a 
cantar a canção “Cuitelinho”, eu não tinha a letra da música e a 
aluna Luiza me ofereceu a sua pasta, e seguimos lendo a letra da 
música juntas. Mesmo quando a professora me mudou de lugar, 
ela me seguiu com a pasta. Em alguns momentos eu me perdia du-
rante a música e ela colocava o dedo na letra me mostrando onde 
estávamos. Luiza me corrigiu algumas vezes e me ensinou que em 
determinada parte da música deveríamos cantar “laia” ao invés da 
letra. A aluna, reconhecendo que eu precisava de ajuda, se dispôs a 
me ajudar em uma ação baseada na alteridade, pois me reconheceu 
como outro, como parte daquele coro, e que necessitava da sua aju-
da naquele momento (DUSSEL,1995). Nessa mesma aula a aluna 
Luiza também teve dificuldades com a música e pedimos ajuda a 
um aluno que estava atrás de nós. “Ele me explicou como era para 
ser feito, e ficou do nosso lado nos ajudando” (D.C 24/04). No 
decorrer da minha inserção presenciei vários momentos como este, 
em que os alunos ensinavam uns aos outros e construíam laços de 
afetividades que se estendiam para além das aulas, se construindo 
juntos na prática social do coral.
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Em uns dos encontros em que não houve aula, pude presen-
ciar mais uma vez os laços de afetividade entre as crianças e o com-
promisso com o grupo do qual faziam parte. Nesse dia, durante um 
diálogo com as alunas Luiza e Paola, Luiza perguntou a Paola:
Luiza: Paola você vai na apresentação da escola?
Paola: Vou, não posso faltar...
Mariana: Por que você não pode faltar?
Paola: Se todo mundo faltar estraga a apresentação (D.C 
29/04).
O que a aluna queria dizer é que só existe o coral quando to-
dos estão presentes, cantando juntos. O coral só pode acontecer na 
coletividade. Ela tinha um compromisso social com aquele grupo e 
como agora eu fazia parte daquele grupo também, compreendi, por 
meio da fala da aluna, que eu também tinha esse compromisso com 
eles, e por isso também precisava me apresentar com eles. A fala 
da aluna também demostra uma autovalorização, pois ela se enten-
de como um elemento importante e fundamental dentro daquele 
grupo. Autovalorização construída nas experiências com o coral, 
vivências baseadas em relações de alteridade fomentando esse re-
conhecimento da sua importância frente ao grupo.
A educadora e pesquisadora Leila Martins Dias (2012) apon-
ta que
[...] a prática coral torna-se possível a partir do agrupamen-
to das pessoas que dela participam de modo contínuo e 
regular. Portanto, para se tornar factível no processo e nos 
resultados a que se propõe, é necessário o ingresso, a assi-
duidade e o compromisso das pessoas para trazer resulta-
dos musicais que fazem parte da sua própria condição de 
existência (DIAS, 2012, p. 133).
Mesmo sem conhecer as pesquisas na área de educação mu-
sical e canto coral, a aluna Paola percebeu, a partir de sua prática 
junto ao coro e do convívio com os demais, a necessidade não só 
do agrupamento de pessoas para que o coro exista, mas também a 
necessidade de um comprometimento com esse grupo.
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O meu último encontro foi a apresentação do coral em uma 
escola municipal. Fomos de ônibus e, durante o percurso, fomos fa-
zendo exercícios de aquecimento vocal conduzidos pela educadora 
e, ao chegarmos, fomos direto ao palco.
No caminho de volta, imaginei que haveria grande algazar-
ra dentro do ônibus, mas, ao contrário disso, os alunos voltaram 
o tempo todo cantando. Ninguém falou para eles cantarem, mas 
mesmo assim cantaram todo o caminho de volta. Essa experiência 
me mostrou que para aqueles alunos a música não se resume ao 
espaço da sala de aula, ela está presente na vida deles, no seu coti-
diano, a música é parte do que eles são, é parte das suas identida-
des. Como vimos no decorrer do trabalho, “As práticas sociais nos 
encaminham para a criação de nossas identidades” (OLIVEIRA et 
al., 2009), ao conviverem em um círculo virtuoso e colaborativo, 
os alunos e alunas do coro se constituem, se criam e recriam na 
convivência.
Durante nossos encontros, pude observar a prática social do 
coral que acontecia na sala de aula e se estendia aos corredores do 
prédio, e no convívio que acontece na praça no horário do lanche. 
Nesse curto espaço de tempo pude participar de alguns processos 
educativos.
Observei como as crianças aprendem a cantar uns com os 
outros, aprendem a conviver com as diferenças, e se educam na 
coletividade. Em alguns momentos da aula, breves discussões en-
tre os alunos ocorriam, envolvendo inclusive a disputa de quem 
canta melhor, mas que logo eram dissipadas, pois para o resultado 
do conjunto ser bom, todos têm igual importância. Pude perceber 
que, no aprendizado colaborativo do coral, esses alunos aprende-
ram que:
[...] podemos jogar as nossas diferenças não para ven-
cermos os outros, mas para sairmos todos como os que 
vencem juntos ao criarem entre todos algo melhor do que 
faríamos se estivéssemos jogando com ideias, sozinhos 
(BRANDÃO, 2005, p. 58, grifo do autor).
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Ao entenderem que o coro é um corpo constituído por várias 
pessoas, aprenderam a transformar a competição em cooperação 
(BRANDÃO, 2005).
Maturana (1998) define a educação como um processo de 
transformação na convivência, em que o aprendiz se transforma 
junto com os professores e com os demais companheiros comos 
quais convive em seu espaço educacional. Tal processo de trans-
formação envolve tanto o aprendizado específico dos envolvidos 
quanto toda construção coletiva enquanto pessoa. Participei des-
se processo de transformação ao me tornar novamente uma aluna 
adulta de coral junto às crianças do Projeto.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer deste trabalho, definiu-se o que são práticas so-
ciais, e a sua importância na educação dos seres humanos. Também 
buscou-se explicitar que essas práticas estão presentes em toda a 
história da humanidade e em ambientes destinados à educação es-
colar ou não.
No diálogo com autores, estabeleceu-se a ligação dessas prá-
ticas sociais e dos processos educativos delas gerados com a cons-
trução da autonomia, do diálogo, da criticidade, e consequentemen-
te da humanização de homens e mulheres.
Esse trabalho teve como objetivo principal identificar a práti-
ca social presente nas aulas de canto coral de um Projeto sociocul-
tural de Batatais, e os possíveis processos educativos decorrentes 
dessa prática. Na inserção nas aulas de canto coral e no interva-
lo do lanche do Projeto foi possível observar como essa prática 
ocorre durante as aulas, e também fora delas, e como as crianças 
envolvidas nessa prática convivem e, ao conviverem, se educam 
na coletividade. Ao fazerem parte de um grupo que se reúne duas 
vezes por semana para fazer parte do coral, acredito que aprende-
ram a ter respeito uns pelos outros, dividir, conviver em grupo, a 
se autovalorizar-se dentro desse grupo e, principalmente, que todos 
fazem parte desse “um”.
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Fazer parte dessa prática social do “coral” também desenca-
deou em mim processos educativos. Ao compreender que ali exis-
tia um compromisso social, firmado naturalmente na convivência, 
percebi que esse compromisso também se estendia a mim. Quando 
me tornei aluna de canto coral, passei a fazer parte daquele corpo, 
constituído por membros de igual importância, que juntos formam 
o coro.
A convivência com esses alunos me levou a perceber o quan-
to há por trás de uma prática, aparentemente, unicamente musical. 
Pude ver que a música parte do ambiente da sala de aula para a vida 
desses alunos, se fazendo presente no seu cotidiano. Ela também 
pode proporcionar o encontro entre pessoas que passam a dialogar 
pela linguagem musical.
O entendimento de que a educação musical pode possibilitar 
o encontro e processos educativos que ensinam “[...] a viver e a 
controlar o viver, enfim, manter a sobrevivência material e simbó-
lica das sociedades humanas” (OLIVEIRA et al., 2009, p. 4) pode 
colaborar com o trabalho dos educadores musicais, levando à re-
flexão sobre o que a música pode proporcionar àqueles que com 
ela interagem. A prática social musical pode desencadear processos 
educativos humanizadores ou desumanizadores, cabe aos que estão 
envolvidos nela decidirem o que pretendem priorizar. Nessa refle-
xão constante faz-se necessário perguntar-se “para quê, contra que, 
a favor de quê” (FREIRE, 2011) eu estou utilizando a música.
Vivenciei, como aluna de canto coral, que quando o ensino 
musical favorece a interação entre os alunos, proporcionando o 
diálogo, dando espaço para exercerem sua autonomia, geram pro-
cessos educativos que contribuem para a humanização dos alunos 
envolvidos, levando-os a se reconhecerem como sujeito perante o 
mundo.
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