Rev. Humanidades, Fortaleza, v. 23, n. 2, p. 176-180, jul./dez. 2008.176 Amanda Alencar Machado Rolim, Siena Sales Freitas Guerra, Mônica Mota Tassigny Uma leitura de Vygotsky sobre o brincar na aprendizagem e no desenvolvimento infantil A reading of Vygotsky on the play in learning and child development Amanda Alencar Machado Rolim1 Siena Sales Freitas Guerra2 Mônica Mota Tassigny3 Resumo Dentre os vários aspectos ligados à infância, elegemos como objeto desta investigação algumas questões presentes no ato de brincar da criança, atividade considerada importante para o desenvolvimento infantil, segundo muitas perspectivas teóricas na Psicologia. Focamos as análises nos conceitos desenvolvidos por Lev S. Vygotsky, percorrendo suas principais contribuições sobre o tema. O presente estudo teve como objetivo analisar a relação do lúdico com o desenvolvimento e a aprendizagem. Tratou-se de pesquisa bibliográfica. Como resultado, foi possível mostrar o quanto o brincar é imprescindível para o desenvolvimento infantil e o quanto fundamenta a aprendizagem por meio de avanços sociais e cognitivos mediados pelo brinquedo. Palavras-chave: Brincar. Desenvolvimento. Aprendizagem. Abstract Between some aspects of the childhood, this work is about issues of children play. This activity is considerated very important for their development. Taking a closed look, I used Lev S. Vygotsky’s concepts. This work aims to analyse the relation between playful, development and learning. This subject is very studied currently. I used bibliographical research and reading of periodics. Because of this work, it was possible to show how to play is important for the infantile development, and how to play bases learning through cogntive advances allowed by the use of toys. Keywords: To play. Development. Learning. Introdução A brincadeira tem sido fonte de pesquisa na Psi- cologia devido a sua influência no desenvolvimento infantil e pela motivação interna para tal atividade. O brincar, tão característico da infância, traz inúmeras vantagens para a constituição da criança, proporcio- nando a capacitação de uma série de experiências que irão contribuir para o desenvolvimento futuro dela. Um dos pensadores que desenvolveu uma teoria sobre o tema foi Lev S. Vygotsky, o qual buscou compreender a origem e o desenvolvimento dos processos psicológicos ao longo da história da espécie humana, levando sempre em conta a individualidade de cada sujeito, o qual está imerso no meio cultural que o define. Para ele, o homem constitui-se enquanto ser social e necessita do outro para desenvolver-se. Vygotsky, ao longo de sua obra, discute aspectos da infância, destacando-se suas contribuições acerca do papel que o brinquedo desempenha, fazendo referência a sua capacidade de estruturar o funcionamento psíquico da criança. 1 Graduanda do curso de Psicologia da Universidade de Fortaleza-UNIFOR. Email: amanda_rolim@hotmail.com 2 Graduanda do curso de Psicologia da Universidade de Fortaleza-UNIFOR. Monitora da disciplina de Pesquisa em Psicologia I. Email: sienaguerra@ hotmail.com 3 Professora Doutora da Universidade de Fortaleza-UNIFOR Email: monicam@secrel.com.br 177Rev. Humanidades, Fortaleza, v. 23, n. 2, p. 176-180, jul./dez. 2008. Uma leitura de Vygotsky sobre o brincar na aprendizagem e no desenvolvimento infantil Vygotsky fala que o brinquedo ajudará a desenvolver uma diferenciação entre a ação e o significado. A criança, com o seu evoluir, passa a estabelecer relação entre o seu brincar e a idéia que se tem dele, deixando de ser dependente dos estímulos físicos, ou seja, do ambiente concreto que a rodeia. O brincar relaciona-se ainda com a aprendiza- gem. Brincar é aprender; na brincadeira, reside a base daquilo que, mais tarde, permitirá à criança aprendiza- gens mais elaboradas. O lúdico torna-se, assim, uma proposta educacional para o enfrentamento das dificul- dades no processo ensino-aprendizagem. 1 Noções gerais sobre o brincar Ao consultar um dicionário, deparamo-nos com diversos significados para a palavra brincar, e todos eles nos passam a idéia de diversão, distração, agitação, faz de conta. A brincadeira é o lúdico em ação. Brincar é importante em todas as fases da vida, mas na infância ele é ainda mais essencial: não é apenas um entretenimento, mas, também, aprendizagem. A criança, ao brincar, expressa sua linguagem por meio de gestos e atitudes, as quais estão repletas de significados, visto que ela investe sua afetividade nessa atividade. Por isso a brincadeira deve ser encarada como algo sério e que é fundamental para o desenvolvimento infantil. As crianças utilizam o brinquedo para externar suas emoções, construindo um mundo a seu modo e, dessa forma, questionam o universo dos adultos. Elas já nascem em um meio pautado por regras sociais e o seu eu deve adaptar-se a essas normas. Na brincadeira, ocorre o processo contrário: são as normas que se encaixam em seu mundo. Não é uma tentativa de fuga da realidade, mas, sim, uma busca por conhecê-la cada vez mais. No brincar, a criança constrói e recria um mundo onde seu espaço esteja garantido. As pressões sofridas no cotidiano de uma criança são compensadas por sua capacidade de imaginar; assim, fantasias de super-heróis, por exemplo, são construídas. (MELO & VALLE, 2005) Aberastury (1972) complementa enfatizando que a brincadeira infantil é um meio de pôr para fora os medos, as angústias e os problemas que a criança enfrentou. Por meio do brinquedo, ela revive de maneira ativa tudo o que sofreu de maneira passiva, modificando um final que lhe foi penoso, consentindo relações que seriam proibidas na vida real. “Brincar de forma livre e prazerosa permite que a criança seja conduzida a uma esfera imaginária, um mundo de faz de conta consciente, porém capaz de reproduzir as relações que observa em seu cotidiano, vivenciando simbolicamente diferentes papéis, exercitando sua capacidade de generalizar e abstrair” (MELO & VALLE, 2005, p. 45). A brincadeira proporciona à criança um contato com sentimentos de alegria, sucesso, realizações de seus desejos, bem como o sentimento de frustração. Esse jogo de emoções a ajuda a estruturar sua personalidade e a lidar com angústias. O brincar prepara para futuras atividades de trabalho: evoca atenção e concentração, estimula a auto-estima e ajuda a desenvolver relações de confiança consigo e com os outros. Colabora para que a criança trabalhe sua relação com o mundo, dividindo espaços e experiências com outras pessoas. “Nenhuma criança brinca só para passar o tempo, sua escolha é motivada por processos íntimos, desejos, problemas, ansiedades. O que está acontecendo com a mente da criança determina suas atividades lúdicas; brincar é sua linguagem secreta, que devemos respeitar mesmo se não a entendemos.” (GARDNEI apud FERREIRA; MISSE; BONADIO, 2004) Todos esses benefícios do brincar devem ser reforçados no meio escolar. Como já foi dito, a brincadeira facilita o aprendizado e ativa a criatividade, ou seja, contribui diretamente para a construção do conhecimento. Portanto os professores devem estar atentos para essa prática lúdica e aprimorar uma contextualização para as brincadeiras. Por meio da observação do brincar, os educadores são capazes de compreender as necessidades de cada criança, os seus níveis de desenvolvimento, a sua organização e, a partir daí, de planejar ações pedagógicas. Segundo Melo e Valle (2005), é por meio do brinquedo e de sua ação lúdica que a criança expressa sua realidade, ordenando e desordenando, construindo e desconstruindo um mundo que lhe seja significativo e que corresponda às necessidades intrínsecas para seu desenvolvimento global. O brincar estimula a criança em várias dimensões, como a intelectual,