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Síndrome isquêmica crônica - Cirurgia Vascular (Resumo)

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1 CC3 – CIRURGIA VASCULAR RAUL BICALHO – MEDUFES 103 
Síndrome Isquêmica Crônica 
INTRODUÇÃO 
• Definição: 
o A SIC pode abranger qualquer território do corpo humano (nessa aula vamos focar em membro inferior) 
o A SIC sempre vai começar com a formação de uma placa de ateroma, que é uma doença inflamatória, 
imunomediada e proliferativa que vai ocluindo os vasos ao longo da vida 
▪ Até mesmo em bebês já há formação de raias de colesterol na aorta (resultado de estudos de necrópsia) 
▪ A aterosclerose acomete a íntima, principalmente de artérias de média e grande calibre 
▪ O resultado disso é a diminuição do fluxo sanguíneo e o aparecimento de sintomas 
▪ Grande parte da população é assintomática mesmo tendo obstrução das artérias, mas parte da população 
terá sintomas e entrará em contato com o serviço de saúde com essas queixas 
• Epidemiologia: 
o Existem alguns fatores de risco primordiais e primários para que ocorra a diminuição do fluxo e a obstrução 
o Os fatores de risco estão todos 
relacionados à aterosclerose 
▪ Os relacionado exclusivamente à 
doença arterial oclusiva periférica 
(DAOP) → Dislipidemia, hipertensão, 
tabagismo (4x), diabetes e idade 
(desses, só não conseguimos 
controlar a idade) 
▪ Outros → Insuficiência renal, raça 
negra e hipercolesterolemia 
o Nos países mais desenvolvidos, há uma taxa de acometimento praticamente igual entre homens e mulheres, 
já em países subdesenvolvidos, as mulheres são mais acometidas 
o Em relação à faixa etária, há uma prevalência progressiva da doença 
▪ Isso é um fator muito importante pois o mundo todo está envelhecendo 
o A taxa de aceleração da prevalência nos países subdesenvolvidos é maior que nos desenvolvidos (devido ao 
nível de educação) 
o A aterosclerose é a principal causa de IAM, AVC e DAOP (há outras síndromes crônicas que podem cursar, 
mas menos importantes) 
o Os sintomas aparecem mais recorrentemente na 5ª ou na 6ª década 
o Tem um curso indolente/devagar (desde bebê estamos acumulando colesterol nas artérias), mas as 
manifestações podem ser agudas 
o Existe predisposição genética → Há famílias que mesmo com mudança do estilo de vida (MEV), a incidência 
continua sendo alta 
PROF. CARLOS DAHER 
 
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o É uma doença multifatorial 
• História natural da doença: 
o A obstrução arterial pela placa de ateroma culmina no final em 2 possibilidades 
▪ Perda de membro → Amputação menor (abaixo do joelho) ou amputação maior (acima do joelho) 
▪ Evento cardiovascular (doença difusa) evoluindo com infarto 
o Por esses resultados, vemos que a SIC tem um grande impacto populacional 
o Quando o paciente começa a desenvolver sintomas (claudicação intermitente), em 5 anos ou ele vai para a 
possibilidade da amputação ou para o lado da morbidade e mortalidade cardiovascular 
▪ O prognóstico de pacientes com DAOP de MMII é caracterizado por um risco aumentado de eventos 
isquêmicos cardiovasculares devido à doença arterial coronariana concomitante e doença cerebrovascular 
▪ Eventos isquêmicos cardiovasculares são mais frequentes do que eventos isquêmicos de membros em 
qualquer coorte de DAOP de MMII 
▪ Todos os indivíduos com DAOP apresentam risco de sintomas isquêmicos progressivos nos membros, bem 
como alta taxa de eventos isquêmicos cardiovasculares de curto prazo e aumento da mortalidade 
❖ Essas taxas de eventos são mais claramente definidas para indivíduos com claudicação ou isquemia 
crítica de membros e menos bem definidas para indivíduos com DAOP assintomática 
 
DIAGNÓSTICO 
Quando o paciente é arterial, na maioria das vezes (80-90%) conseguimos diagnosticar a etiologia, a anatomia e a 
topografia da doença apenas com anamnese e exame físico. 
• Anamnese: 
o Claudicação intermitente → Desconforto de um grupamento muscular induzido pelo exercício e que melhora 
com o repouso, podendo ser reproduzido novamente com o exercício 
▪ O paciente fala, por exemplo “ando 1 quarteirão e preciso parar porque minha batata da perna dói” 
• Exame físico: 
o Palpamos os pulsos periféricos de proximal para distal 
▪ Pulso femoral → Pulso poplíteo → Pulso pedioso → Pulso tibial posterior 
 
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▪ Assim conseguimos saber a topografia da doença 
▪ Ex.: Se palpamos pulso femoral e não palpamos poplíteo, a obstrução é fêmoro-poplítea 
• Índice tornozelo-braço: 
o Foi muito usado por muito tempo como medida de screening populacional (mediam o índice tornozelo-braço 
de todo mundo para saber quem era assintomático) 
o Tem alta sensibilidade e alta especificidade para doença arterial oclusiva periférica 
o Feito com o paciente deitado 
o Usamos um manguito de pressão e um Doppler de onda contínua (que parece uma caneta) 
o Colocamos o manguito no tornozelo/braço do paciente e usamos o Doppler na topografia das artérias 
escutando o som até desaparecer, depois disso inflamos mais 20 mmHg e vamos soltando devagar, quando o 
som aparecer novamente, vemos quanto está a pressão 
▪ No tornozelo → Artérias tibial posterior e pediosa 
▪ No braço → Artérias radial e ulnar 
o Com os valores do tornozelo e do braço, dividimos um pelo outro 
para achar o índice 
▪ ITB > 1,3 → Não compreensível (paciente diabético, artéria 
toda calcificada, não dá para ocluir a artéria) 
▪ ITB entre 0,91-1,29 → Normal 
▪ ITB entre 0,41-0,90 → DAOP leve a moderada 
▪ ITB ente 0-0,4 → DAOP grave (terá uma lesão trófica 
associada, isquemia, úlcera isquêmica etc.) 
o O ITB passou a ser usado para avaliar prognóstico do tratamento que é feito → Se fizermos uma intervenção 
e o ITB aumentar, significa que a intervenção foi satisfatória e provavelmente a ferida vai cicatrizar 
▪ Todo ITB > 7 significa que cicatriza a ferida 
• Exames complementares: 
o USG Doppler → Exame muito bom, não faz mal ao paciente 
▪ OBS.: USG convencional só possui escala de cinza, Duplex Scan tem a escala de cinza mais uma imagem de 
cor, já Triplex Scan tem a escala de cinza, a cor e uma escala de velocidade 
▪ No Doppler, usando a escala de direção de fluxo, conseguimos ver se o sangue do vaso está se 
aproximando ou se afastando do transdutor (se tiver uma oclusão importante, o fluxo pode se inverter 
para uma colateral e isso será visto no ultrassom) 
▪ O Doppler dá a informação de localização da lesão e a gravidade dela (pela escala de velocidade) 
▪ Com o exame clínico e o Doppler estamos estadiando a doença 
o Angiotomografia computadorizada e angioressonância → Usadas já para o paciente que vai operar 
o Arteriografia → Exame padrão-ouro para avaliação do paciente já diagnosticado 
▪ O paciente tem doença, está isquêmico, é grave e tem que operar, fazemos a arteriografia 
▪ É um exame invasivo e que usa contraste iodado (já há disponível no mercado o contraste CO2) 
 
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❖ O CO2 só pode ser usado do diafragma para baixo, de diafragma para cima há risco de AVC 
❖ O CO2 é mais caro, então não é muito usado no SUS 
▪ Contraindicações da arteriografia → Contraste iodado em paciente com IRC grave, infecção na área de 
punção ou alergia ao contraste 
• Diagnóstico diferencial: 
o Síndrome compartimental → É uma dor progressiva (vai aumentando) 
▪ Dói na panturrilha, rara prevalência, acontece depois de estar se exercitando (caminhada longa ou corrida) 
o Claudicação venosa → Contrário da claudicação arterial (intermitente), quando o paciente está parado ele 
tem dor e quando está andando não 
o Compressão radicular → Normalmente irradia por nádegas e atrás da coxa, chegando à face posterior do pé 
o Cisto de Baker sintomático (cisto de tendão da parte posterior da perna) → Acaba comprimindo estruturas 
adjacentes (às vezes até compressão nervosa), levandoà dor 
o Artrite de quadril, tornozelo e pé → Dor normalmente localizada 
o Estenose espinhal → Mimetiza uma compressão nervosa 
o OBS.: Claudicação intermitente é a única dor na perna que é um desconforto tipo câimbra, é reprodutível 
(sempre aparece na mesma distância) e é rapidamente aliviada no descanso 
CLASSIFICAÇÃO 
• Classificação de Fontaine (mais antiga): 
o É mais antiga, não é tão usada mais hoje em dia pelo advento da de Rutherford e Wifi 
o Classifica a SIC de I a IV estágios 
▪ I (Assintomático) 
▪ IIa (Claudicação leve) → Consegue caminhar mais de 200m até a dor aparecer 
▪ IIb (Claudicação de moderada a grave) → Não consegue caminhar mais de 200m até a dor aparecer 
▪ III (Dor isquêmica de repouso) → Não consegue caminhar, deitado já tem dor e geralmente fica em 
posição antálgica (abraçando a perna) 
▪ IV (Úlcera ou gangrena) 
o Funciona bem no dia a dia, mas quando vamos fazer uma universalização da classificação fica confuso (para 
entrar em consenso o que seria cada estágio) 
• Classificação de Rutherford: 
o Surgiu tentando pegar a classificação de Fontaine e deixar um pouco mais detalhada 
o Classifica a SIC de 0 a 6 categorias 
▪ 0 (Assintomático) 
▪ 1 (Claudicação leve) 
▪ 2 (Claudicação moderada) 
▪ 3 (Claudicação grave) 
▪ 4 (Dor isquêmica de repouso) 
 
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▪ 5 (Lesão tecidual menor) 
▪ 6 (Lesão tecidual maior) 
o Com a classificação de Rutherford, ficou um pouco mais fácil dos trabalhos conversarem entre si, mas ainda 
assim existe confusão para entrar em consenso de onde se classifica cada caso 
• Classificação Wifi: 
o É o que se tem de mais novo em classificação 
o Classifica a SIC em relação à ferida, à isquemia e à infecção do pé 
▪ W → Wound / Ferida 
▪ I → Isquemia 
▪ FI → Foot infection / infecção do pé 
o Surgiu para solucionar o problema das classificações antigas, já que utiliza dados mais objetivos 
o Com essa classificação, foi feito um estadiamento para estratificar risco de amputação e necessidade de 
revascularização 
 
OBS.: Não é necessário gravar essa classificação detalhadamente, só precisamos saber que ela existe 
MANEJO 
• Manejo do paciente assintomático: 
o Será sempre multidisciplinar para tentar fazer com que o paciente pare de fumar (nível A de evidência) 
▪ Parar de fumar aumenta distância de marcha e o tempo de vida da perna (minimiza o risco de amputação) 
▪ Reduz mortalidade e morbidade em todos que param de fumar (nível A de evidência) 
o Educação → Paciente precisa ser educado sobre os sinais e sintomas de gravidade 
▪ Países com menores níveis de educação têm uma taxa de prevalência de DAOP aumentando + rápido 
o No paciente assintomático, não fazemos exames invasivos (nível B de evidência), no máximo um Doppler 
o Não é necessário fazer índice tornozelo-braço em paciente assintomático, não há benefício comprovado 
(nível C de evidência) 
 
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o Resumo do manejo → Parar de fumar, começar a caminhar (↑ circulação colateral), educar (sinais de alerta), 
não realizar exames invasivos e o índice tornozelo-braço não serve para vigilância 
• Manejo não invasivo do paciente sintomático: 
o Paciente com claudicação intermitente 
o Base do tratamento → Redução do risco, mudança do estilo de vida e terapia medicamentosa 
antiaterosclerótica (estabiliza a placa) 
▪ Todo paciente claudicante que tem DAOP necessariamente tem que tomar estatina (mesmo que o 
colesterol não seja alto) e antiagregante plaquetário 
o Cessação do tabagismo 
o Estatinas 
▪ Alvo de LDL 
❖ LDL < 100mg/Dl 
❖ LDL < 70 mg/Dl (muito alto risco) → História familiar, comorbidades (HAS, DM) etc. 
▪ Estudo Clever → “O uso da estatina não aumenta distância de marcha, mas diminui o risco cardiovascular” 
o Controle rigoroso do diabetes → Aumenta o risco de infecção e de lesão distal (pela neuropatia diabética) 
▪ A neuropatia diabética é o principal problema, impede a lubrificação da pele (fica seca), o paciente não 
sente o pé direito, os dedos começam a ficar em garra (dedo em martelo, só toca a ponta no chão) 
▪ Aumenta o risco de amputação 
▪ Alvo de hemoglobina glicada < 7% 
o Controle da hipertensão 
▪ Se a pressão sistólica e a pressão diastólica têm valores muito próximos, a pressão de perfusão é baixa 
▪ Se a pressão sistólica e a pressão diastólica estão em valores normais, a pressão de perfusão é normal 
▪ Se a pressão sistólica e a pressão diastólica têm valores muito distantes, a pressão de perfusão também é 
baixa, porque não dá tempo de relaxar a artéria 
▪ Por muito tempo se acreditou que betabloqueador reduziria a distância de marcha, mas o guideline de 
2014 comprovou que o medicamento só diminui o risco cardiovascular e não altera a distância de marcha 
o Medicamentos que aumentam distância de marcha (associado a caminhadas) 
▪ Cilostazol → Principal ação é vasodilatação distal, mas também faz antiagregação plaquetária, também é 
anti-inflamatório, e, associado a pentoxifilina, aumenta a hemorreologia do sangue (diminui a viscosidade) 
❖ Por ser vasodilatador distal, a principal contraindicação do Cilostazol é insuficiência cardíaca 
▪ Pentoxifilina → Sozinha ou associada ao Cilostazol aumenta a hemorreologia do sangue, ou seja, a 
hemácia consegue “se dobrar” mais facilmente, chegando mais distalmente no leito vascular 
o Resumo do manejo → Cessar tabagismo, uso de estatinas, controle do diabetes, uso de betabloqueador na 
hipertensão, uso de antiplaquetário (aspirina e clopidogrel) e uso de cilostazol/pentoxifilina 
▪ Não usar varfarina, ácido fólico ou vitamina B12 
• Indicação de tratamento cirúrgico: 
o Vamos tratar cirurgicamente aqueles pacientes com maior risco de perda do membro (isquemia crítica) 
 
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▪ Claudicação intermitente limitante → Perda de qualidade de vida 
▪ Dor em repouso → Não consegue nem sair da cama 
▪ Lesão trófica → Úlcera isquêmica (na maioria das vezes é uma úlcera distal, extremamente dolorosa, 
podendo estar infectada ou não, mas geralmente não) 
o Podemos tratar em cirurgia aberta ou cirurgia endovascular, dependendo de alguns parâmetros 
• TASC: 
o Classificação utilizada na prática clínica que nos mostra, a depender da anatomia/topografia da lesão e do 
estado clínico do paciente, se o caso é mais favorável para cirurgia aberta ou cirurgia endovascular 
▪ TASC A → Endovascular (doença de extensão curta, paciente com insuficiência cardíaca, lesão única etc.) 
▪ TASC B → Preferencialmente endovascular 
▪ TASC C → Preferencialmente aberta 
▪ TASC D → Aberta (doença extensa, múltiplas lesões etc.) 
o OBS.: Em doença infrapatelar (poplíteo distal), a maioria será endovascular, porque artérias são finas e não 
conseguem suportar o enxerto 
• Seguimento: 
o Cirurgia aberta → USG Doppler em 30 dias, 6 meses e anual; manter tratamento clínico otimizado e mudança 
do estilo de vida (MEV) 
o Cirurgia endovascular → USG Doppler em 30 dias, 6 meses e anual; dupla antiagregação plaquetária (AAS e 
Clopidogrel) por 6 meses e somente AAS após 6 meses; manter tratamento clínico otimizado e MEV 
o O controle com Doppler é para poder identificar possíveis reestenoses ou piora da doenrra 
 
OBS.: 
TASC – Doença aorto-ilíaca 
 
 
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TASC – Doença fêmoro-poplítea 
 
TASC – Doença poplíteo-distal

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