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2 SUMÁRIO BIOSSEGURANÇA NA NECROPSIA ............................................................... 3 TÉCNICAS DE NECROPSIA DA CAVIDADE ORAL PARA IDENTIFICAÇÃO HUMANA ........................................................................................................... 4 PLASTINAÇÃO ............................................................................................... 11 A FIXAÇÃO ...................................................................................................... 14 DISSECAÇÃO ................................................................................................. 15 DESIDRATAÇÃO ............................................................................................ 15 IMPREGNAÇÃO .............................................................................................. 17 CURA OU POLIMERIZAÇÃO .......................................................................... 18 ESTADOS DE DECOMPOSIÇÃO DO CORPO HUMANO .............................. 19 PUTREGAÇÃO ................................................................................................ 23 COLOZINAÇÃO ............................................................................................... 25 ENTERRO ........................................................................................................ 30 ANTROPOLOGIA FORENSE .......................................................................... 32 ETAPAS PARA A LIBERAÇÃO DE UM CORPO ........................................... 39 LAUDOS REALIZADOS NO IML .................................................................... 44 PAPILOSCOPIA .............................................................................................. 45 VIRTÓPSIA ...................................................................................................... 49 NECROMAQUIAGEM ...................................................................................... 52 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 57 3 BIOSSEGURANÇA NA NECROPSIA Os cadáveres podem atuar como vetores de uma pluralidade de doenças infecciosas que serão transmitidas no manejo e análise do material orgânico em decomposição, logo, discutir sobre biossegurança em necrotérios e no serviço de autópsia é dialogar sobre a saúde e a segurança dos diversos trabalhadores deste local insalubre, além de lhes proporcionar melhores condições ocupacionais. Este assunto também se faz necessário ao passo que os necrotérios são pouco explorados pela comunidade acadêmico-científica. A manipulação de cadáveres nos institutos médicos legais brasileiros requer medidas urgentes de biossegurança, uma vez que a natureza da atividade oferece risco de contaminação aos profissionais de saúde e técnicos de necropsia. O alerta foi feito pelo odonto-legista Marcus Vinícius Ribeiro de Carvalho, depois de avaliar 50 cadáveres, para detectar a presença do vírus HIV, na cidade fluminense de Volta Redonda. Em 2,4% das amostras, ele constatou a presença do agente etiológico, mesmo passadas 24 horas da morte do indivíduo. 4 Uso de EPIs é fundamental, pois o risco fica também para Tuberculose, meningites e Hepatites. Dica de como trabalhar com higiene na sala de necropsia: - Manter a limpeza da mesa com água corrente para evitar sangue parado. A higienização constante é fundamental e depois das necropsias a equipe de limpeza deve fazer a lavagem da sala e os instrumentos devem ser lavados e colocados de molho em soluções especificas. TÉCNICAS DE NECROPSIA DA CAVIDADE ORAL PARA IDENTIFICAÇÃO HUMANA Em procedimentos de identificação, quando a Papiloscopia não pode ser aplicada (como em desastres em massa, carbonização, putrefações e outros) a Odontologia Legal assume o protagonismo no processo de identificação humana. Juntamente com os ossos, os dentes possuem unicidade e alta resistência após transformações tanatológicas, tornando possível o confronto de suas características com dados odontológicos registrados em vida. O acesso à cavidade bucal e suas estruturas deve ser amplo e com boa visibilidade, o que pode demandar a remoção e ressecção especializada de mandíbula ou dissecção facial. http://3.bp.blogspot.com/-7UUUx8l5NhA/U07w8ALphqI/AAAAAAAABPc/7YVZnff6dPA/s1600/EPI-Dicas-Odonto.jpg 5 A necropsia bucal permite o acesso detalhado dos arcos dentais para uma melhor descrição da estrutura estomatognática. A análise de características dentárias (como dentes cuneiformes, geminação, atrição), materiais odontológicos de restaurações, próteses e manifestações patológicas podem indicar uma possível vítima, com o auxílio de registros odontológicos para o confronto ante e post mortem. As técnicas preconizam incisões em regiões de face e pescoço, com a remoção ou não dos maxilares, selecionadas para serem utilizadas de acordo com a necessidade de preservação das estruturas faciais ou o estado de degradação dos corpos – decomposição, rigidez cadavérica, carbonização. TÉCNICA DE LUNTZ Para carbonizados, cadáveres putrefeitos, desastres em massa: Incisão em formato de “V”. São feitas duas incisões a partir das comissuras labiais: a superior, indo até o arco zigomático, expondo o côndilo mandibular (cavidade glenoide do osso temporal), e a inferior, atingindo o ângulo da mandíbula. Remove-se os músculos da mastigação (principalmente o masseter) e os ligamentos inseridos, expondo a região. Depois é feita uma incisão na borda inferior do osso mandibular, no assoalho bucal, dissecando a musculatura aderida. Por fim, remove-se a mandíbula da articulação temporomandibular. A maxila é retirada com um corte horizontal com uma serra, iniciando pela espinha nasal até o processo pterigoide. Essa técnica é aconselhada para melhor manuseio, observação e possibilidade de se fazer uma radiografia, caso necessário. TÉCNICA SUBMANDIBULAR (OU DA MÁSCARA): A incisão é feita em formato de ferradura, na base até o ângulo da mandíbula, rebatendo os tecidos superiormente acima da região nasal, 6 expondo os ossos maxilares e mandibulares. A mandíbula é removida com um corte bilateral dos ramos, na altura dos terceiros molares. A maxila não é retirada. A técnica submandibular causa menor prejuízo as estruturas faciais, mantendo a estética do cadáver. Após as técnicas de incisão, é feita a limpeza das peças para serem usadas nos procedimentos de comparação. Usa-se sabão, água e escova no processo inicial, para a remoção do tecido biológico aderido. Depois ferve-se com água e detergente, ou com cristais de soda cáustica (NaOH) para degradação de remanescentes. Por último, os ossos são mergulhados em peróxido de hidrogênio (H2O2) por 24 horas para o branqueamento. TÉCNICA DE IDENTIFICAÇÃO Este processo inclui minucioso exame da arcada durante a necrópsia, e confronto com dados de prontuários, moldes em gesso, fotografias e radiografias, para uma correta identificação. Trata-se de um método comparativo dos registros odontológicos ante mortem com a perícia post mortem de enucleação dos arcos dentais. O confronto é feito relacionando-se os números de dentes presentes e ausentes, restaurações, posicionamentos dos elementos, existência de anomalias e deformidades e, sendo possível, a análise das rugosidades palatinas (quando edentados). Dessa forma, é importante que o cirurgião-dentista elabore um prontuário odontológico detalhado e atualizado, a fim de facilitar o procedimento pericial de comparação. A documentação odontológica é uma ferramenta essencial por oferecer características singulares do complexo estomatognático, auxiliando a perícia criminal de forma simples e eficiente na identificação de vítimas e suas famílias. 7 ESTRATÉGIAS PARAPREVENÇÃO E CONTROLE DE INFECÇÕES. Como os patologistas trabalham em laboratórios, as melhores práticas para evitar e controlar as infecções são praticamente as mesmas nos dois departamentos. Uma lista de estratégias para prevenção e controle de infecções (PCI) que deve ser obedecida no departamento de patologia está descrita a seguir: Usar as precauções-padrão; Fazer a higiene adequada das mãos; Usar equipamentos de proteção individual (EPIs) adequados para a exposição de patógenos transmitidos pelo sangue (máscaras, proteção para olhos ou escudos de face, roupas, aventais, jalecos); Descartar o EPI ou lavar a roupa não descartável de forma adequada; Receber educação e treinamento, incluindo o treinamento sobre a prevenção de tuberculose (TB) e as precauções com sangue e fluidos corporais; Tomar vacinas específicas, como a da hepatite B; Observar as precauções do nível de biossegurança; Tratar todas as amostras como infectadas; Descartar os perfurocortantes em recipientes adequados; Limpar e desinfetar os equipamentos; Comunicar casos suspeitos da doença de Creutzfeldt-Jakob. 8 A obediência a esses padrões de precaução e as estratégias de PCI deve ser monitorada pelos supervisores. ESTRATÉGIAS DE PREVENÇÃO E CONTROLE DE INFECÇÕES NO CUIDADO PÓS-MORTE. Além das precauções para os laboratórios, os patologistas que realizam necrópsias lidam com os riscos adicionais dos cadáveres e dos procedimentos. Todos os cadáveres que chegam ao departamento de patologia podem ser fontes de infecção. Os patologistas que fazem necrópsias estão sob risco de exposição a hepatite viral, vírus da imunodeficiência humana (HIV), TB e doença de Creutzfeldt-Jakob, entre outras doenças. Para evitar a transmissão de infecções, os líderes do departamento de patologia devem exigir que os PASs desse setor adotem as seguintes estratégias: Ao cuidar de um cadáver na necrópsia, todos os PASs na área devem usar as precauções-padrão. Tais precauções incluem o uso de EPI e a higiene das mãos. Os EPIs adequados para necrópsia incluem avental cirúrgico, touca cirúrgica, roupa impermeável ou avental com mangas compridas, propés, óculos ou proteção para rosto, olhos, pele e membranas mucosas. Os PASs devem usar dois pares de luvas cirúrgicas ou luva de malha de aço, de rede ou de Kevlar sobre as luvas cirúrgicas para proteger contra cortes com facas. Também existem luvas não metálicas à prova de perfuração. Quando existe risco de patógenos em aerossóis, como TB, os PASs presentes durante a necrópsia devem usar respiradores N95. 9 Fazer a necrópsia em uma área de risco biológico indicada. As salas de necrópsia devem ser fisicamente separadas das áreas administrativas e de todas as outras do hospital. Essa separação ajuda a evitar potenciais infecções a partir da disseminação a funcionários ou pessoas que não realizam as necrópsias. Essas salas devem ter pressão negativa, com o ar da sala retirado diretamente para a parte externa. O American Institute of Architects recomenda pelo menos 12 trocas de ar por hora nessas áreas. Equipamentos adicionais podem ajudar a reduzir o risco da exposição a patógenos em aerossóis, como mesas de necrópsia com esvaziamento descendente, filtração de ar particulado de alta eficiência (HEPA), radiação ultravioleta (para esterilizar o ar) e cabines de segurança biológica para manusear os tecidos infectados. Usar o equipamento de segurança durante as necrópsias, como equipamento com proteção, anexos com vácuo e drenos ou unidades para descarte. Restringir a entrada ou saída da área de necropsia durante a execução do procedimento. Implantar os controles de prática de trabalho, como tratar todas as amostras como infectantes, separar todo o material necessário antes de iniciar um procedimento, manter todos os tecidos na mesa de necrópsia até serem fixados – exceto se transportados em uma bandeja ou recipiente –, cortar seções apenas em tecidos fixados e indicar uma pessoa para monitorar as práticas de PCI durante o procedimento. Rotular claramente todas as partes congeladas ou não fixadas com a expressão “risco de infecção”. As partes do corpo fixadas devem ser seladas em recipientes seguros, à prova de vazamento, para evitar a contaminação para o ambiente externo. Tornar a imunização, especialmente para hepatite B, obrigatória para todas as pessoas que trabalhem no departamento de patologia. Um teste cutâneo inicial com tuberculina durante o exame admissional também é importante. Os hospitais podem solicitar que os patologistas façam exames 10 médicos anuais para verificar a saúde desses profissionais e identificar qualquer possível exposição. Preparar o cadáver após o término da necrópsia. Isso envolve suturar qualquer incisão com agulhas e pinças, lavar o corpo com detergente seguido por uma solução de água sanitária e acondicionar o corpo em uma embalagem específica à prova de vazamento. Limpar adequadamente as superfícies. A limpeza envolve retirar produtos do corpo, fluidos corporais e outros materiais orgânicos grosseiros com água, esfregar e desinfetar todas as superfícies e enxaguar a área desinfetada. Para alguns tipos de procedimentos de alto risco, pode ser necessária uma limpeza mais profunda. Por exemplo, as superfícies contaminadas com Mycobacterium tuberculosis devem ser descontaminadas com soluções tuberculocidas líquidas, como compostos fenólicos. (Ver o Destaque 13.1 para informações de limpeza específicas para doença de Creutzfeldt-Jakob.) Limpar e reprocessar os equipamentos médicos adequados. Limpadores enzimáticos, desinfetantes de nível intermediário e lavadoras esterilizantes de instrumentos podem ser incluídos nos processos de limpeza dos equipamentos de patologia. PREVENÇÃO E CONTROLE DE RISCOS DE INFECÇÃO COM A DOENÇA DE CREUTZFELDT-JAKOB Dentro do departamento de patologia, existem alguns procedimentos que são considerados de maior risco para transmissão de infecção do que outros. Isso ocorre principalmente por causa das consequências da transmissão de infecções. Por exemplo, fazer necrópsias de cadáveres ou manusear tecidos de pacientes com doença de Creutzfeldt-Jakob são considerados procedimentos de alto risco, e os patologistas que cuidam de pacientes com suspeita ou confirmação de doença de Creutzfeldt-Jakob devem tomar precauções adequadas, como: Ter uma sala de procedimento dentro do necrotério para fazer 11 necrópsias em pacientes de alto risco. Isso é recomendável, mas não essencial; Usar um conjunto separado de instrumentos para casos de doença de Creutzfeldt-Jakob. Se não for possível, usar instrumentos descartáveis; Após manusear cadáveres com suspeita de doença de Creutzfeldt- Jakob, descontaminar os instrumentos do necrotério e as superfícies de trabalho usando um dos seguintes métodos: 18 minutos de autoclavagem a vapor a 134°C ou 6 ciclos de 134°C por 3 minutos; 1 hora de autoclavagem a vapor com deslocamento de gravidade a 134°C; Aplicar hidróxido de sódio 1 N por 1 hora (incluindo molhar as superfícies com frequência); Usar solução de hipoclorito de sódio com 20.000 ppm de cloro (Nota: a solução de hipoclorito é muito corrosiva para metais, portanto, deve-se ter cuidado ao aplicá-la sobre superfícies); 1 hora de ácido fórmico a 96% (Nota: a solução de ácido fórmico é muito corrosiva para metais, portanto, deve-se ter cuidado ao aplicá-la sobre superfícies); Incineração. PLASTINAÇÃO A Plastinação é o procedimento técnico, moderno, de preservação de materiais biológicos, criado pelo médico, anatomista, artista e cientista de Heidelberg na Alemanha, Gunther Von Hagens em 1977, e que consiste basicamente em extrair os líquidos corporais (água e soluções fixadora) e os lipídios, atravésde métodos químicos, substituindo-os por resinas plásticas como silicone, poliéster e epóxi. Tal técnica tem numerosas vantagens, tais como: Melhor conservação dos corpos e tecidos; 12 Diminuição da insalubridade da manipulação das peças anatômicas; Durabilidade de peças anatômicas; Diminuição da manutenção; Morfologia natural das estruturas; Facilidade na manipulação; Aumenta o rendimento do aluno (maior tempo do aluno com a peça); Ferramenta na pesquisa morfológica; Facilita a exposição em Museus. Sem sombra de dúvida, Von Hagens teve uma grande ideia: o desenvolvimento de uma técnica de conservação que permite o estudo macrocósmico de cadáveres sem os incômodos odores ou as mudanças de tonalidade dos tecidos, normalmente produzidas pelas químicas de conservação tradicionais. Os estudos anátomo-científicos do corpo humano puderam ser, então, mais didáticos e esclarecedores. No Brasil, bem como em boa parte dos países, a aquisição do cadáver humano para estudo, e até mesmo animais, vem cada vez sendo mais difícil. As questões éticas e legais têm sido empecilho em muitos lugares. A Plastinação hoje é apontada como uma técnica que pode ajudar a minimizar tais dificuldades, haja vista a maior durabilidade de a peça anatômica resultar em uma menor demanda por corpos humanos e animais. Outro grande ganho trazido pela Plastinação é a melhor formação de museus de anatomia, onde as peças conferem um melhor entendimento ao visitante, maior interação e proximidade do público e até mesmo propiciando inclusão, como o caso de deficientes visuais que podem ter oportunidade de manipular peças anatômicas. A International society for Plastination (isp.plastination.org), fundada em 1986, tem sido uma grande difusora da técnica mundialmente, e reúne plastinadores de todos os lugares do mundo, no objetivo de difundir, 13 desenvolver e aprimorar as técnicas de Plastinação, promove fóruns de discussão para troca mútua de informações sobre Plastinação, além de manter o The Journal of International society for Plastination. TIPOS DE PLASTINAÇÃO A Plastinação pode ser dividida em 3 tipos, segundo o polímero a ser impregnado: a Plastinação em Silicone (que pode ser subdividida em Plastinação a Frio e Plastinação em temperatura ambiente), Plastinação em poliéster e Plastinação em Epóxi. A Plastinação em Silicone obtém peças com aspecto emborrachado, flexível, e é mais usada em peça sólidas, espessas. A impregnação usa silicones tipo S40 e S10 da Biodur, associados a um cross-linker S3 e um reticulante S6 (alongador de cadeias) também da Biodur. No Brasil laboratórios de Plastinação têm obtido sucesso com produtos nacionais, ainda em experimentação. A Plastinação em silicone pode ainda ser realizada a baixa temperatura (-25ºC) e a temperatura ambiente, cada uma com suas particularidades de procedimentos, combinação de reagentes, forma de desidratação, tempo de impregnação e controle de pressão. Vale ressaltar que a Plastinação em silicone a frio, mostra melhores resultados na qualidade das peças obtidas, na flexibilidade, no nível de retração tecidual e coloração, principalmente em peças de sistema nervoso. A Plastinação em silicone a frio é mais lenta, e requer também maior investimento em freezers adaptados e em segurança. A Plastinação a temperatura ambiente funciona muito bem, apesar da menor qualidade, com exceção de material de sistema nervoso, recomenda-se para quem está iniciando e implantando seu laboratório por seu baixo custo e maior simplicidade do processo. A Plastinação em poliéster e epóxi são usadas no preparo de peças em slides, cortes de 1, 2 e 3 mm, com características de transparência. A Plastinação com poliéster usa o P35 ou P40 da Biodur, onde a cura é feita com ultravioleta, já o Epóxi usa o E12 e a cura é feita através do calor. 14 Devido ao curto tempo de curso e a complexidade das demais técnicas envolvidas na Plastinação e suas peculiaridades, tanto neste material como em nossa aula teórica e prática nos ateremos somente a Plastinação em sílice a temperatura ambiente. PRINCÍPIOS DA PLASTINAÇÃO (AMBIENTE) Basicamente a Plastinação se baseia na preparação da peça anatômica (fixação e dissecação), desidratação, impregnação do polímero e cura ou polimerização. Onde cada etapa é um ponto crítico para a próxima etapa e para o sucesso do resultado do processo de Plastinação. A má execução de um destes pontos compromete e inviabiliza todo o restante do processo. A FIXAÇÃO A fixação é o início de todo o processo de Plastinação, teoricamente pode se plastinar sem fixação dos tecidos, entretanto é necessário preservar os tecidos de espécime durante o processo de dissecação, que costuma ser 15 bastante demorado. É recomendado que não se use soluções fixadoras que contenham glicerina, esta pode comprometer o processo de impregnação. Na verdade, a melhor técnica a ser utilizada para fixação é o nosso velho conhecido do dia a dia, o formaldeído (formol), que pode ser usado de 5% a 10%. Particularmente, para uso em peças com objetivos de Plastinação, preferimos utilizar o formol a 5%, por conferir maior flexibilidade. Também recomendamos que se acondicione as peças fixadas com formol a 5% em refrigeração 2 a 5ºC, com objetivo de manter em parte as cores naturais da peça. Peças preservadas em glicerina ou glicerinadas impossibilitam a impregnação dos polímeros, portanto não são recomendadas para a Plastinação. Contudo, alguns laboratórios de anatomia têm relatado ter tido sucesso na reversão da glicerinação e bons resultados de uso destas peças em plastinação. DISSECAÇÃO Passado o período de cura da fixação, a dissecação torna-se em minha opinião o ponto mais crítico de todo o processo, haja vista uma peça mal dissecada, se tornará “feia” e mal esclarecedora em sua anatomia antes e depois da Plastinação, e após a Plastinação, fica quase impossível corrigir tais erros. Assim, uma boa escolha da metodologia de dissecação, uso de bom material e a definição do objetivo da dissecação (o que desejamos “mostrar”) é imprescindível para obter uma peça ótima. A dissecação deve ser feita com cuidado e calma. O ditado popular “ A pressa é inimiga da perfeição” se aplica muitíssimo bem a essa situação. DESIDRATAÇÃO Tendo uma peça de qualidade, bem preparada, bem conservada, bem dissecada ou seccionada, ou seja, uma peça digna de ser “imortalizada”, digna de ser plastinada, podemos iniciar o protocolo de Plastinação propriamente 16 dito. Lembrando que se temos uma peça mal preparada “feia”, ao ser plastinada teremos como resultado uma peça “feia” plastinada. A primeira etapa da Plastinação é desidratação da peça, remover agua dos tecidos, juntamente com as gorduras (restantes da dissecação). Assim como a preparação da peça é fundamental para o sucesso da Plastinação, a desidratação também é um ponto crítico do processo. Falhas nessa etapa comprometem o sucesso das etapas seguintes. Resíduos de água no tecido impedem a penetração do polímero, bem com atrapalham a cura do material, provocando manchas na peça. A desidratação pode ser feita com acetona ou álcool, apesar da acetona ser mais cara que o álcool, a acetona confere melhor resultado. A desidratação deve ocorrer de forma lenta, portanto deve ser feia em baixas temperaturas (-15 a -25ºC), o que evita a saída rápida da água e o colabamento da peça. Pelo mesmo motivo a desidratação deve iniciar em menor concentrações em banhos de acetona 80%, 90%, 100% e 100% novamente, com intervalo de 7 dias. Vale ressaltar que após a retirada da acetona de cada banho, sua concentração deve ser verificada com acetonômetro, só devendo parar o processo quando a acetona retirada banho chegar a 100%, ou seja, não haver mais água para retirar dapeça. Tecido ou peças com maior quantidade de água necessitam de uma maior quantidade de banhos para chegar a 100%. Alguns autores aceitam a concentração de 98% de acetona, entretanto, é melhor chegar a 100% e garantir o sucesso do processo. Após a chegada aos 100% de acetona, deve-se ainda fazer mais um banho a temperatura ambiente para retirada de gorduras excedentes das peças. A desidratação pode ser feita a temperatura ambiente, mas deve ser evitada por levar a um maior nível de retração, principalmente em tecidos moles. A desidratação deve ocorrer em recipiente que suportem a acetona, e que sejam herméticos. Os freezers usados na Plastinação devem ser adaptados, seus componentes elétricos e compressor devem ser removidos e colocado em uma sala diferente da sala onde o freezer se encontra. Tal medida 17 deve ser feita para evitar explosões, haja vista a acetona ser extremamente explosiva, ser pesada e não se dissipar do ambiente facilmente. IMPREGNAÇÃO Tendo obtido um material bem desidratado, este material pode ser retirado e enxugado com papel toalha, seguindo diretamente para o polímero a ser utilizado, neste caso silicone. O silicone mais usado para Plastinação em temperatura ambiente é o S10 da Biodur (existe alguns equivalentes nacionais, mas ainda se encontram em teste). A Plastinação a frio, assim como a desidratação a frio, confere maior qualidade as peças, menor nível de retração pelo mesmo motivo, entretanto esta é mais demorada, e requer maior investimento na adaptação das câmaras de vácuo dentro de freezers, que por sua vez também devem ter adaptação de seu circuito elétrico e compressor. Nesta fase é necessário ter uma bomba de vácua capaz de gerar um vácua mínimo de -760 mmHg para o volume de sua câmara. Quanto maior a câmara de vácuo, maior deve ser a capacidade de drenagem por minuto de sua bomba, algo que deve ser calculado antes de aquisição de sua bomba. O vácuo gerado pela bomba é diferente da potência da mesma. Também devemos ter acoplado ao sistema vacuômetros (diferente de manômetro) para o fiel controle da pressão ideal de plastinação e para evitar implosões do sistema. Também é necessário ter uma câmara de vácuo capaz de suportar pressões inferiores a -760 mmHg. Tenha em mente o quanto de vácuo seu sistema é capaz de suportar para evitar implosões, assim nunca excedendo estes limites. As câmaras normalmente são de aço inoxidável, com chapas compatíveis com o tamanho da câmara e do vácuo a ser usado, quanto maior a câmara mais reforço ela deve ter. Também deve conter tampa de vidro ou acrílico transparentes que possibilitem a visualização das peças e das bolhas de acetona que saem das mesmas. Também pode-se usar como câmaras de vácuo, dissecadores para 18 pequenos trabalhos (recomendado para quem está iniciando). O mesmo cuidado deve ser observado com dissecadores, pois o risco de implosões é eminente, lembre-se que o dissecador é feito de vidro, e que o vidro do mesmo deve ser adequado e suportar vácuo (deve ser temperado). Ao S10 deve ser adicionado o alongador de cadeia (Cross-Linker) S6 na concentração de 8%, e bem homogeneizado. A peça é mergulhada no polímero com ajuda de uma tela com peso suficiente para fazê-la afundar. Depois disso inicia-se a formação do vácuo, regulando-se a pressão através de válvulas acoplados em seu sistema de vácuo. O tempo de plastinação vai variar de acordo com o volume da peça, até que não se saia mais acetona da mesma. CURA OU POLIMERIZAÇÃO Após a impregnação forçada com o silicone, a peça deve ser colocada em uma tela que possibilite o escorrimento do silicone excedente. Nesta fase deve ser pincelado em sua superfície o cross-linker ou S3 que irá promover a vulcanização do silicone (solidificação). Em aproximadamente 3 dias a peça irá começar a adquirir características de peça plastinada, podendo já ser manipulada, entretanto tal processo continua a ocorrer de fora para dentro da peça por aproximadamente 3 meses dependendo de seu volume. CUIDADOS COM SEGURANÇA Os laboratórios de plastinação devem ter ambientes distintos para 19 desidratação e impregnação, e adaptados com exaustores baixos (peso da acetona) por tubulação e instalações elétricas anti-explosão. O sistema de refrigeração, bem condicionadores de ar assim como os freezers devem ter as instalações elétricas e compressores no ambiente externo. CUIDADOS COM A BOMBA A Bomba de vácuo necessita de troca constate de óleo, mesmo que o mesmo ainda esteja com boa aparência e viscosidade. A acetona passa dentro da bomba, e pode impregnar no óleo, danificando as peças. Limpeza interna das peças da bomba também é recomendada a cada 1 ano. ESTADOS DE DECOMPOSIÇÃO DO CORPO HUMANO A maioria de nós preferiria não imaginar o que acontece com o nosso corpo depois que morremos, mas este processo faz nascer novas formas de vida de maneiras inesperadas, escreve Moheb Costandi. “Talvez seja preciso um pouco de força para mover isso daqui”, diz a agente funerária Holly Williams, carregando o braço de John e gentilmente flexionando os dedos, cotovelos e pulsos dele. “Geralmente, quanto mais fresco o corpo, mais fácil é meu trabalho”. Williams fala de forma leve e tem um comportamento sorridente que vai contra a natureza do trabalho dela. Criada e agora empregada na funerária de sua família no norte do Texas, EUA, ela viu e lidou com corpos quase que de forma diária desde a infância. Agora, com 28 anos, ela estima que já tenha trabalhado em mais de 1.000 cadáveres. O trabalho dela envolve coletar corpos recém falecidos da região de Dallas e Fort Worth e prepará-los para o funeral. “A maioria das pessoas que recolhemos morre em casas de repouso”, 20 diz Williams, “mas em alguns casos recolhemos pessoas mortas por tiros ou em acidentes de carro. Podemos receber uma ligação para pegar uma pessoa que morreu sozinha e foi encontrada dias ou semanas depois, e ela já está em decomposição, o que torna o meu trabalho muito mais difícil”. John estava morto havia cerca de 4 horas antes do corpo dele ser trazido à funerária. Ele foi relativamente saudável pela maior parte da vida. Ele trabalhou a vida inteira nos campos de petróleo do Texas, um emprego que o mantinha fisicamente ativo e em boa forma; parou de fumar há décadas; e bebia álcool de forma moderada. Daí, em um dia frio de janeiro, ele sofreu um terrível ataque cardíaco em casa (aparentemente desencadeado por outras complicações desconhecidas), caiu no chão e morreu quase que imediatamente, aos 57 anos de idade. Agora, John deita sobre a mesa de metal de Williams, o corpo dele envolto em um lençol de linho branco, frio e duro ao toque, a pele dele com uma coloração roxa e acinzentada — sinais de que os estágios iniciais da decomposição já estavam acontecendo. AUTODIGESTÃO Longe de estar “morto”, um cadáver apodrecendo está cheio de vida. Um crescente número de cientistas vê um cadáver em apodrecimento como os fundamentos de um vasto e complexo ecossistema, que emerge depois da morte e evolui com a decomposição. A decomposição começa alguns minutos depois da morte em um processo chamado autólise, ou autodigestão. Momentos depois do coração ter parado de bater, as células ficam privadas de oxigênio e a acidez delas aumenta, à medida que os subprodutos tóxicos das reações químicas começa a se acumular dentro delas. As enzimas começam a digerir as membranas celulares e vazam; assim, as células começam a se romper. Isso geralmente começa no fígado, rico em enzimas, e no cérebro, que possui um nível maior de água. Depois, todos os outros tecidos e órgãos começam a se desmembrar. Glóbulos brancos danificados começam a vazar 21 de vasos rompidos e, auxiliados pela gravidade, instalam-se nos capilares e em pequenas veias,descolorindo a pele. A temperatura do corpo também começa a cair, até se aclimatar ao ambiente. Então chega o rigor mortis — a rigidez cadavérica — começando pelas pálpebras, queixo e músculos do pescoço, antes de prosseguir ao tronco e aos membros. Em vida, células musculares se contraem e relaxam graças à ação de duas proteínas filamentosas (actina e miosina), que andam juntas. Depois da morte, as células ficam sem energia e as proteínas filamentosas ficam paradas no lugar. Isso faz com que o músculo fique rígido, prendendo as articulações. Durante estes primeiros estágios, o ecossistema cadavérico consiste em grande parte nas bactérias que vivem dentro e fora do corpo humano. Nossos corpos hospedam uma enorme quantidade de bactérias; todas as superfícies e cantos do corpo providenciam um habitat para uma comunidade microbial especializada. De longe, a maior dessas comunidades vive no intestino, lar de trilhões de bactérias que pertencem a centenas ou milhares de espécies diferentes. O microbioma do intestino é um dos tópicos mais pesquisados na biologia; ele está ligado à saúde humana e a uma pletora de doenças e problemas, incluindo autismo, depressão, síndrome do cólon irritável e obesidade. Mas ainda sabemos pouco destes passageiros microbiais. Sabemos ainda menos sobre o que acontece com eles quando nós morremos. Em agosto de 2014, a cientista forense Gulnaz Javan, da Universidade Estadual do Alabama (EUA), e seus colegas publicaram o primeiro estudo 22 sobre o que eles chamaram de tanatomicrobioma (de “thanatos”, a palavra grega para morte). “Muitos dos nossos exemplos vêm de casos criminais”, diz Javan. “Alguém morre em um suicídio, homicídio, overdose de drogas ou em um acidente de carro, e eu coleto amostras do corpo. Existem problemas éticos porque preciso de consentimento”. A maioria dos órgãos internos são desprovidos de micróbios quando estão vivos. Pouco depois da morte, no entanto, o sistema imunológico para de funcionar, deixando que eles se espalhem livremente por todo o corpo. Isso geralmente começa no intestino, na junção do intestino grosso e delgado — e então os tecidos adjacentes — de dentro para fora, usando o coquetel químico que vaza das células danificadas como fonte de alimentação. Então eles invadem os capilares do sistema digestivo e os linfonodos, espalhando-se primeiro no fígado e no baço, depois o coração e o cérebro. Javan e a equipe dela colheram amostras do fígado, baço, cérebro, coração e sangue de 11 cadáveres, entre 20 e 240 horas depois da morte. Eles usaram duas tecnologias de ponta de sequenciamento de DNA, combinadas com bioinformática, para analisar e comparar as bactérias presentes em cada amostra. As amostras colhidas de diferentes órgãos no mesmo cadáver eram parecidas umas com as outras, mas muito diferentes das amostras colhidas do mesmo órgão em outros pacientes. Isso talvez seja devido parcialmente às diferenças na composição do microbioma de cada cadáver, ou talvez seja causado pela diferença na hora da morte de cada corpo. Um estudo anterior avaliou a decomposição de camundongos e descobriu que, apesar do microbioma mudar drasticamente após a morte, ele faz isso de forma consistente e mensurável. Os pesquisadores puderam estimar a data da morte 23 dentro de um intervalo de três dias. O estudo de Javan também sugere que este ‘relógio microbiológico’ pode estar funcionando dentro do corpo humano em decomposição. Ele mostrou que as bactérias alcançaram o fígado em cerca de 20 horas depois da morte, e elas levaram cerca de 58 horas para se espalhar pelo restante do corpo de forma sistemática. O tempo levado para infiltrar o primeiro órgão interno e então outro pode prover uma nova forma de estimar a hora da morte. “Depois da morte, a composição das bactérias muda”, diz Javan. “Elas se movem para dentro do coração, do cérebro e então órgãos reprodutores por último”. Em 2014, Javan e seus colegas obtiveram US$ 200.000 da Fundação de Ciências Naturais para continuar as pesquisas. “Nós utilizaremos sequenciamento e bioinformática de próxima geração para ver qual órgão é o melhor para estimar [a hora da morte] — isso ainda não é claro”, ela diz. Uma coisa que parece clara, entretanto, é que uma composição diferente de bactérias está associada a diferentes estágios da decomposição. PUTREFAÇÃO Espalhados entre pinheiros em Huntsville, no Texas, EUA, estão cerca de meia dúzia de cadáveres em vários estágios de decomposição. Os dois corpos postos recentemente estão de braços abertos próximos ao centro do local, com grande parte da pele acinzentada macilenta ainda intacta, as costelas e os ossos pélvicos visíveis entre a pele que apodrece pouco a pouco. A alguns metros deste local está outro corpo, completamente esqueletizado, com a pele dura e escura agarrada aos ossos, como se o cadáver vestisse uma roupa de látex brilhante com capuz. Próximo dali, entre outros restos esqueléticos espalhados por abutres, está um terceiro corpo, dentro de uma gaiola de metal e arame. Este está próximo do fim do ciclo da morte, parcialmente mumificado. Diversos cogumelos marrons crescem onde um dia estava um abdômen. Para a maioria de nós, avistar um corpo em decomposição é na melhor nas possibilidades desconfortante; e na pior, algo repulsivo e assustador, coisa 24 de pesadelos. Mas este é o dia a dia dos pesquisadores do Departamento de Ciências Forense Aplicada do Sudeste do Texas. Aberto em 2009, o departamento está localizado em uma área de cerca de 100 hectares de floresta nacional mantida pela Universidade Pública de Sam Houston (SHSU). Dentro dela, um trecho de mais ou menos 4 hectares de terrenos densamente arborizados foi selado da área maior e subdividido por cercas de arame farpado de 3 metros de altura. No final de 2011, os pesquisadores Sibyl Bucheli, Aaron Lynne e seus colegas da SHSU deixaram dois cadáveres novos ali, e deixaram eles se decomporem em condições naturais. Uma vez que a autodigestão se inicia e a bactéria começa a escapar do trato gastrointestinal, a putrefação começa. Isso é a morte molecular: a quebra dos tecidos moles que os transforma em gases, líquidos e sais. Este processo já se inicia em estágios iniciais da decomposição, mas ele fica bem mais forte quando bactérias anaeróbicas entram em ação. A putrefação está associada a uma mudança de bactérias aeróbicas, que precisam de oxigênio para crescer, para as anaeróbicas, que não precisam de oxigênio. Estas então se alimentam de tecidos do corpo, fermentando açúcar para produzir subprodutos gasosos como metano, sulfureto de hidrogênio e amônia, que acumulam dentro do corpo, inflando (ou estufando) o abdômen e, em alguns casos, outras partes do corpo. Isso causa uma maior descoloração do corpo. À medida que glóbulos brancos danificados continuam a se romper dos vasos em desintegração, as bactérias anaeróbicas convertem moléculas de hemoglobina, que costumavam carregar oxigênio pelo corpo, em sulfoemoglobinemia. A presença desta molécula em sangue parado dá a pele uma aparência esverdeada, característica de um corpo em decomposição ativa. A pressão do gás que continua a se acumular dentro do corpo faz com que bolhas apareçam por toda a superfície da pele. Isso é seguido pelo afrouxamento de grande parte da pele, que permanece presa apenas à estrutura em deteriorando abaixo delas. Os gases e os tecidos liquefeitos acabam saindo do corpo, geralmente vazando pelo ânus e outros 25 orifícios, e frequentemente também de peles rasgadas de outras partes do corpo. Em alguns casos, a pressão é tão forte que o abdômen chega a estourar. O estufamento é muitas vezes usado para demarcar a transição entre os estágios da decomposição, e outro estudo recente mostra que essa transição é caracterizada por uma distinta mudançana composição das bactérias cadavéricas. Bucheli e Lyne colheram amostras das bactérias de várias partes do corpo no início e no final do estágio de estufamento. Eles então extraíram o DNA das bactérias das amostras e o sequenciaram. Como uma entomologista, Bucheli está mais interessado nos insetos que colonizam os cadáveres. Ela vê um cadáver como um habitat especializado para várias espécies de insetos necrófagos (ou comedores de mortos), alguns dos quais passam por um ciclo de vida inteiro dentro do corpo ou em seus arredores. COLOZINAÇÃO Quando um corpo em decomposição começa a eliminar substâncias, ele fica completamente exposto às redondezas. Neste estágio, o ecossistema cadavérico chega ao seu ponto máximo: trata-se de um ‘centro’ para micróbios, insetos e detritívoros. 26 Duas moscas diretamente conectadas à decomposição são as varejeiras (e suas larvas) das famílias Calliphoridae e Sarcophagidae. Os cadáveres liberam um desagradável odor adocicado, feito de um complexo coquetel de compostos voláteis que mudam conforme a decomposição avança. As varejeiras detectam o cheiro usando receptores especializados em suas antenas, elas então pousam no cadáver e botam ovos nos orifícios e nas feridas abertas. Cada mosca deposita cerca de 250 ovos que se chocam dentro de 24 horas, dando vida a larvas de primeiro nível. Estas larvas se alimentam de carne apodrecendo e se transformam em larvas maiores, que se alimentam por várias horas antes se transformar mais uma vez. Depois de se alimentarem um pouco mais, elas se distanciam do corpo. Elas então se transformam em pupas, para, enfim, se tornarem moscas adultas. Este ciclo se repete até não existir mais nada no que elas possam se alimentar. Sob condições ideais, um corpo em decomposição ativa terá um grande número de larvas em terceiro nível se alimentando dele. Estas “larvas em massa” geram muito calor, aumentando a temperatura interna do corpo em mais de 10˚C. Como pinguins amontoados no Polo Sul, larvas individuais dentro da massa estão em movimento constante. Mas enquanto pinguins se amontoam para se aquecerem, as larvas se movimentam para se resfriarem. “É uma faca de dois gumes”, explica Bucheli, cercada de grandes larvas de brinquedo e uma coleção de bonecas de Monster High em seu escritório na SHSU. “Se a larva está sempre pelas bordas, ela pode ser comida por um pássaro, e se ela está sempre pelo centro, ela pode sofrer com o calor. Então elas estão sempre se movimentando do centro para as bordas, indo e voltando”. A presença de moscas atrai predadores como besouros de couro, ácaros, vespas e aranhas, que se alimentam das moscas ou parasitam em seus ovos e larvas. Abutres e outros detritívoros, assim como outros grandes animais comedores de carne, também podem se aproximar do corpo.No entanto, na ausência de detritívoros, as larvas são responsáveis por remover os tecidos moles. Conforme notou Carl Linnaeus (que idealizou o sistema o 27 qual cientistas nomeiam espécies) em 1767, “três moscas podem consumir o cadáver de um cavalo tão rápido quanto um leão”. Larvas de terceiro nível se distanciam em grandes quantidades do cadáver, geralmente seguindo uma mesma rota. A atividade delas é tão rigorosa que seus caminhos de migração podem ser vistos depois que a decomposição chega ao fim, como fundos sulcos no solo emanando do cadáver. Toda espécie que visita um cadáver tem o próprio repertório de micróbios do intestino, e espécies diferentes de solo tendem a acolher comunidades distintas de bactérias — uma composição que é provavelmente determinada por fatores como temperatura, umidade, tipo de solo e textura. Todos estes micróbios se misturam e se associam com o ecossistema cadavérico. As moscas que pousam no cadáver não vão apenas depositar os ovos nele, mas também levam consigo algumas das bactérias presentes no cadáver, além de deixar algumas delas próprias neles. E os tecidos liquefeitos vazando do corpo permitem uma troca de bactérias entre o corpo e o solo abaixo dele. Quando colheram amostras dos cadáveres, Bucheli e Lynne detectaram bactérias originadas da pele no corpo e de moscas e detritívoros que o visitaram, além de bactérias presentes no solo. “Quando um corpo vaza líquidos, as bactérias do intestino começam a sair, e vemos uma grande proporção delas do lado de fora do corpo”, diz Lynne. Portanto, é provável que todo corpo tenha a sua própria assinatura microbiológica, e essa assinatura pode mudar com o tempo de acordo com as condições exatas do local em que a morte ocorreu. Um melhor entendimento da composição dessas comunidades de bactérias, a relação entre ela e como 28 elas influenciam umas às outras conforme a decomposição avança, pode um dia ajudar equipes forenses a saber mais onde, quando e como uma pessoa morreu. Por exemplo, detectar sequências de DNA pertencentes a um organismo ou tipo de solo em particular a um cadáver pode ajudar investigadores de cenas do crime a conectar o corpo de uma vítima a uma geolocalização específica ou tornar menor a busca por pistas, talvez até especificar um campo dentro de uma área. “Existem diversos casos judiciais no qual a entomologia forense forneceu importantes peças de um quebra cabeça”, diz Bucheli, e ela espera que bactérias possam providenciar informações adicionais, se tornando mais uma ferramenta para aperfeiçoar a estimativa da hora da morte. “Espero que, em mais ou menos cinco anos, possamos começar a usar dados de bactérias em julgamentos”, ela diz. Até então, pesquisadores estão ocupados catalogando as espécies de bactérias que estão presentes dentro e fora do corpo humano, estudando como populações de bactérias se diferenciam entre cada indivíduo. “Eu amaria ter uma base de dados da vida para a morte”, diz Bucheli. “Eu amaria conhecer um doador que me permita colher amostras de bactérias enquanto ele está vivo, durante o processo de morte dele e enquanto ele se decompõe”. PURGANDO “Este aqui é o líquido que é expelido de corpos em decomposição”, diz Daniel Wescott, diretor do Centro de Antropologia Forense da Universidade Estadual do Texas, em San Marcos. Wescott, um antropólogo especializado na estrutura do crânio, usa um tomógrafo para analisar a estrutura microscópica dos ossos trazidos da fazenda de corpos. Ele também colabora com entomólogos e microbiólogos — incluindo Javan, que tem se ocupado analisando amostras do solo de cadáveres coletados do departamento de San Marcos — além de engenheiros da computação e um piloto, que opera um drone fotográfico que registra 29 imagens do local. “Eu li um artigo sobre drones que voavam sobre campos de colheita, pesquisando quais seriam os melhores para plantar”, ele diz. “Eles procuravam por espectrometria de infravermelho próximo, e solos organicamente mais ricos apresentavam uma coloração mais escura que os outros. Eu pensei que se eles podiam fazer isso, então talvez nós pudéssemos detectar esses pequenos círculos”. Os “pequenos círculos” são ilhas de cadáveres em decomposição. Um corpo em decomposição altera significativamente a composição química do solo abaixo dele. A purgação — o vazamento de materiais que restam dentro de um corpo — libera nutrientes no solo, e a migração de larvas transfere muita da energia no corpo para o ambiente. Todo o processo acaba criando uma “ilha de cadáveres em decomposição”, uma área de solo organicamente rico e altamente concentrado. Além de liberar nutrientes para um amplo ecossistema, isso atrai outros materiais orgânicos, como animais mortos e matéria fecal de animais maiores. De acordo com uma estimativa, um corpo humano padrão consiste em 50 a 70% de água, e cada quilograma de massa corporal seca libera 32g de nitrogênio, 10g de fósforo, 4g de potássio e 1g de magnésio no solo. Inicialmente, isso mataparte da vegetação abaixo e ao redor do corpo, possivelmente por causa da toxicidade do nitrogênio ou por causa dos antibióticos encontrados no corpo, que são secretados pelas larvas de insetos conforme elas se alimentam da carne. Mas, depois, a decomposição é benéfica ao ecossistema. A biomassa microbial existente dentro de uma ilha de cadáveres em decomposição é maior que outras áreas próximas. Vermes nematoides, associados com a retirada de nutrientes, se tornam mais abundantes, e a vegetação se torna mais diversa. O avanço nas pesquisas sobre como corpos em decomposição alteram a ecologia dos arredores pode fornecer novas formas de encontrar vítimas de assassinatos cujos corpos foram enterrados em sepulturas rasas. Análises do solo da sepultura podem providenciar outra possível forma de estimar a hora da morte. Um estudo de 2008 sobre as mudanças 30 bioquímicas que ocorrem na ilha de um cadáver em decomposição mostrou que a concentração de lipídios no solo de um cadáver vazando tem seu auge 40 dias após a morte, enquanto os de nitrogênio e fósforo extraível alcançam o auge em 72 e 100 dias, respectivamente. Com um entendimento mais detalhado deste processo, análises da bioquímica do solo de sepulturas podem um dia ajudar pesquisadores forenses a estimar há quanto tempo um corpo foi posto em uma sepultura escondida. ENTERRO No implacável tempo seco do verão texano, um corpo exposto a estes elementos será mumificado antes de se decompor por completo. A pele rapidamente perderá quase toda a umidade, ficando perdurada nos ossos quando o processo estiver completo. A velocidade das reações químicas envolvidas dobra a cada aumento de 10˚C na temperatura. Desta forma, um cadáver alcança um avançado estágio de decomposição depois de 16 dias a uma temperatura média diária de 25˚C. Até lá, a maior parte da carne já terá sido removida do corpo, e a migração em massa das larvas pode começar. Os egípcios antigos aprenderam sem querer como o ambiente afeta a decomposição. No período pré-dinástico, antes que eles começassem a construir caixões e tumbas elaboradas, os mortos eram envoltos em linho e enterrados diretamente na areia. O calor inibia a atividade dos micróbios, enquanto o enterro prevenia que os insetos alcançassem os corpos, então eles ficavam muitos bem preservados. Depois, eles começaram a construir tumbas elaboradas para os mortos, para providenciar uma vida ainda melhor na vida após a morte, mas isso teve um efeito oposto ao esperado: separar o corpo da areia acelerava a decomposição. Aí os egípcios inventaram o embalsamamento e a mumificação. O embalsamamento envolve tratar o corpo com produtos químicos que desaceleram o processo de decomposição. O embalsamador egípcio primeiramente lavava o corpo do falecido com vinho de palma e água do Rio 31 Nilo, removia a maioria dos órgãos internos por incisões feitas do lado esquerdo, e os enchia de natrão (uma mistura natural de sais encontrada por todo o Rio Nilo). Ele usava um longo gancho para puxar o cérebro pelas narinas, para então cobrir todo o corpo com natrão, deixando-o secar por 40 dias. Inicialmente, os órgãos secos eram postos dentro de vasos canópicos que eram enterrados juntamente ao corpo; depois, eles passaram a ser envolvidos em linho e retornados ao corpo. Finalmente, o corpo era envolto em múltiplas camadas de linho, em preparação para o enterro. Agentes funerários estudam os métodos de embalsamamento do Egito Antigo até os dias de hoje. De volta à casa funerária, Holly Williams executa algo semelhante para que a família e os amigos possam ver os entes queridos no funeral como eles foram em vida, em vez de vê-los como eles são agora. Para as vítimas de traumas e mortes violentas, isso envolve extensas reconstruções faciais. Por morar em uma cidade pequena, Williams trabalhou em muitas pessoas que ela conhecia e com quem conviveu — amigos que morreram de overdose, cometeram suicídio ou morreram mexendo no celular enquanto dirigiam. Quando a mãe dela faleceu, há quatro anos, foi Williams quem cuidou do enterro dela, adicionando toques finais à maquiagem facial da mãe: “Fui eu quem sempre cuidou do cabelo e da maquiagem dela quando ela era viva, então eu sabia como fazer isso bem”. Ela transfere John para a mesa de preparação, remove as roupas dele e o posiciona, então pega diversas garrafinhas de fluido de embalsamamento da parede. O fluido contém uma mistura de formol, metanol e outros solventes; ele temporariamente preserva os tecidos do corpo conectando células de proteína umas às outras, e arrumando-as no lugar certo. O fluido mata bactérias e previne que elas quebrem as proteínas para usá-las como alimento. Williams derrama o conteúdo das garrafas na máquina de embalsamamento. O fluído possui uma série de cores; cada uma correspondente a um tom de pele diferente. Ela seca o corpo com uma esponja molhada e faz incisões diagonais acima da clavícula. Depois, ela levanta a 32 artéria carótida e a veia subclávia do pescoço e as amarra com fios, ela então empurra uma cânula (um tubo fino) na artéria e pequenas pinças na veia para abrir os vasos. A seguir, ela liga a máquina, que bombeia o fluido dentro da artéria carótida e ao redor do corpo de John. Conforme o fluido entra, o sangue sai pelas incisões, escorregando pelas bordas da mesa de metal e caindo dentro de uma grande pia. Enquanto isso, ela pega um dos braços e o massageia gentilmente. “Leva cerca de uma hora para remover todo o sangue de uma pessoa e substitui-lo pelo fluido de embalsamamento”, diz ela. “Coágulos de sangue podem desacelerar o processo; a massagem ajuda a rompê-los e a acelerar o fluxo do fluido de embalsamamento”. Uma vez que o sangue é substituído, ela aperta um aspirador contra o abdômen de John e suga todos os fluidos da cavidade, sugando também qualquer urina e fezes que ainda possam estar dentro do corpo. Finalmente, ela costura as incisões, seca o corpo uma segunda vez, acerta o rosto e o veste novamente. John está pronto para o funeral. Corpos embalsamados também se decompõem. Exatamente quando, e quanto tempo isso leva, depende da forma como o embalsamamento foi feito, o tipo de caixão em que o corpo foi posto e como ele foi enterrado. Afinal, nossos corpos são meras formas de energia presas em pedaços de matéria, esperando serem lançadas de volta ao universo. De acordo com a lei da termodinâmica, a energia não pode ser criada ou destruída, apenas convertida de uma forma para outra. Em outras palavras: as coisas têm fim, convertendo massa para energia enquanto acabam. A decomposição é uma lembrança mórbida e final que toda matéria no universo deve seguir estas leis fundamentais. Ela nos destrói, equilibrando nossa massa corpórea com os arredores e nos reciclando para que outros seres vivos possam fazer bom uso dela. ANTROPOLOGIA FORENSE O Direito e a Medicina sempre buscaram harmonizar a vida do ser 33 humano, cada uma com seus objetos e aspectos próprios, tem como foco o homem. Se por um lado o Direito se preocupa com o homem integrado no meio social, com regras e leis que organizam seus direitos e obrigações, a medicina busca cuidar de sua fisiologia, para preservação de sua vida e manutenção de sua saúde. O elo entre essas duas ciências ocorre no momento em que há violação de um dos direitos ligados aos objetos da ciência médica (saúde, integridade física e psicológica, vida). Assim surge a medicina legal como ponte, unindo as ciências como forma de melhor interpretar casos indissolúveis apenas pela aplicação de uma ciência ou de outra puramente. Na aplicação das normas jurídicas, não raros os casos, deparamo-nos com eventos em que se fazem imprescindíveis a utilização de recursos técnico- científicos provenientes de outros ramos do conhecimento. Assim, a medicinaforense é uma das ferramentas auxiliadoras da justiça na resolução de crimes. Novamente, o Direito é uma ciência que abrange inúmeras áreas e em razão disso, por si só, nem sempre é autossuficiente. Assim a medicina legal, como uma das matérias auxiliadoras do Direito, fornece o devido aparato para análise de elementos e objetos que envolvam a cena de crimes e através desse olhar é possível gerar documentos, ou seja, provas documentais, capazes de formar a convicção do juízo criminal para que este diga o direito de forma precisa, consoante com a busca da verdade real. No ramo da medicina legal existem vários seguimentos, dentre eles, a 34 antropologia forense, a traumatologia forense, a asfixiologia forense, a sexologia forense, a tanatologia, a toxicologia, a psiquiatria e psicologia forense, a química forense, a infortunística, a vitimologia e a criminologia. No entanto na presente dissertação teremos nossa visão direcionada exclusivamente para a antropologia forense, com seus principais aspectos, características e forma de aplicação. CONCEITOS E TERMOS. Conceituar a antropologia forense, sem antes conceituar o seu núcleo, não atingiria o objetivo da presente dissertação. Assim, para plenos esclarecimentos, a conceituação partira da medicina legal, que é de onde se origina a antropologia forense e em seguida os termos que complementarão o conceito desta ciência. Medicina legal: é uma especialidade concomitantemente médica e jurídica que utiliza conhecimentos técnico-científicos da medicina para o esclarecimento de fatos de interesse da justiça; Antropologia: ciência do homem no sentido mais lato, que engloba origens, evolução, desenvolvimento físico, material e cultural, fisiologia, psicologia características raciais, costumes sociais, crenças, etc; Forense: relativo aos tribunais e à justiça; jurídico, judiciário, judicial; Antropologia forense: é a área científica que estuda e aplica métodos para individualização e identificação de raça, cor, idade, sexo em indivíduos ou restos cadavéricos. ANTROPOLOGIA FORENSE A antropologia forense é a área da antropologia que interessa a medicina legal, em especial em duas modalidades: a identificação policial ou judiciária e a identificação médico-legal. Ainda que a antropologia possa ser conceituada de forma simples, para ela existem diversos conceitos. Para melhor compreensão buscou-se conceitos dos renomados doutrinadores da 35 área. Vejamos: Segundo o Professor Doutor Hugo Filipe Violante Cardoso da Associação Portuguesa de Ciência Forense temos que: “Tradicionalmente, a Antropologia Forense ocupa-se de vários aspetos da investigação médico-legal relacionada com a morte, nomeadamente quando o cadáver do indivíduo se encontra em avançado estado de decomposição ou esqueletizados. Nestes casos, o antropólogo forense aplica conhecimentos e princípios teóricos e práticos desenvolvidos e utilizados pela antropologia, biologia e pela arqueologia para responder a questões relacionadas com a identidade, como seja o sexo ou a idade, assim como com as circunstâncias da morte, através da análise e estudo detalhado dos restos ósseos e dentários do indivíduo e do contexto físico em que ele foi encontrado. Mais recentemente, na Europa e noutras partes do mundo, a aplicação de conhecimentos e princípios de antropologia biológica tem-se estendido a áreas da medicina-legal que envolvem indivíduos vivos. Nomeadamente a estimativa da idade em indivíduos sobre os quais recai a suspeita de menoridade, em casos de investigação da imputabilidade criminal ou de atribuição de asilo político.”. (Autor Prof. Doutor Hugo Filipe Violante Cardoso). Ainda sobre o tema, o Dr. André Vicente Pires Alves acrescenta: “A Antropologia Forense consiste na aplicação dos conhecimentos da antropologia física numa investigação de caráter forense, ou seja, numa investigação legal, tentando estabelecer um perfil biológico, auxiliar na determinação da causa de morte e estimativa do intervalo post mortem. Criada por Thomas Dwight nos finais do século XIX, nos EUA, com o intuito de auxiliar investigações legais, a antropologia forense é agora parte integrante do conceito ciências forenses, sendo uma das principais intervenientes nas investigações de crimes de guerra e desastres de massa tentando determinar o perfil biológico de restos esqueletizados com vista à identificação dos mesmos. Em Portugal, devido às suas características criminais, a antropologia forense não assume um papel fundamental na maior parte das investigações criminais, no entanto, na presença de restos esqueléticos é, juntamente com a odontologia e a genética forense, a única ciência capaz de fornecer 36 informações essências à investigação de um crime. Para além da utilização em cadáveres a antropologia forense pode ainda ser utilizada para determinar a estatura de indivíduos presentes em gravações de câmaras de videovigilância e na previsão das alterações sofridas fruto do envelhecimento de indivíduos desaparecidos.”. (Autor Dr. André Vicente Pires Alves). Concluímos então que o objetivo da Antropologia Forense é: I. Determinar identidade do indivíduo (origem dos restos, características gerais de identificação, características individualizantes); II. Determinar data da morte; III. Determinar a causa da morte; IV. Determinar o modo da morte (homicídio, suicídio, acidental, natural, desconhecido); V. Interpretar as circunstâncias da morte. O trabalho de um antropólogo começa no local do crime e estende-se até ao laboratório. Dividindo-se parcialmente em três etapas: 1º etapa – Arqueologia forense: É feita uma escavação minuciosa do local onde se encontra o corpo. 2º etapa – Antropologia social: Consiste na recolha de informações em redor da área do crime (entrevistas às pessoas da região, consultas em arquivos municipais, eclesiásticos e militares, etc.) 3º etapa – Investigação: laboratorial. Há uma aplicação de técnicas como a osteologia humana (área que se debruça sobre o estudo dos ossos que compõe o esqueleto), paleopatologia (ramo da ciência que se dedica ao estudo 37 das doenças do passado) e tafonomia (estudo sistemático da evolução de fósseis). Pode ainda ser feita uma reconstrução facial do cadáver e superposição fotográfica. Os estudos da antropologia forense têm como objetivo o sucesso das investigações criminais. Vale ressaltar que a participação de antropólogos forenses se inicia no momento da recuperação das evidências, que são extremamente importantes para aclaramento dos fatos. Assim, com a aplicação dos métodos e técnicas próprias é possível atingir os resultados pretendidos das análises. Quando requisitados, os primeiros trabalhos dos técnicos no local das averiguações é estabelecer se existem restos humanos no local (tecidos ou ossadas), pois eventualmente podem ser de animais. Assim que identificada a natureza humana da evidência, começa o trabalho de preservação, remoção, documentação de todas as fases e aspectos físicos do material colhido. Realizando-se a perícia é possível determinar as características do sujeito antes de sua morte e condições desta. 38 Determinação do sexo: O primeiro parâmetro a ser observado será o sexo. Analisa-se a pélvis ou bacia, sendo este o elemento mais importante nesta determinação, haja vista a grande desproporção entre os sexos neste osso. Determinação de idade: É incontestável na avaliação da idade, principalmente até os 21 anos, o estudo radiológico do sistema ósseo (punho, palma da mão, cotovelo) de um lado apenas (direito) visando o aparecimento de pontos de ossificação e soldaduras dos ossos. Importante ressaltar que na fase infantil, juvenil ou adulta requer análise macroscópica de indicadores diferentes. Estimativa de estatura: quando não se tem a integralidadedos ossos, é possível determinar a estatura aproximada de acordo com as medidas dos ossos encontrados, pois estes normalmente guardam proporção com os outros. Afinidades popolacionais (raça): grupos humanos apresentam características esqueléticas que permitem determinar a que grupo pertencia o cadáver a partir de comparação. Assim, determina-se a raça. Para determinação da raça o crânio fornece os melhores elementos de diferenciação, sendo feito exame: detalhando os contornos vertical, horizontal, anterior e posterior e lateral. 39 Atualmente a identificação também pode ser realizada mediante exame da DNA, quando há material genético comparativo à disposição. Após essas etapas e métodos o antropólogo forese procederá à análise dos restos esqueléticos a fim de colher evidências que permitam determinar a causa da morte e em quais circunstâncias ocorreu. Apesar da analise antropológica ser uma parte bastante relevante na investigação, é importante frisar que na maioria das vezes, a causa de morte ou circunstâncias não são envolvidas apenas com análise dos restos da ossada. Em outras palavras, o antropólogo deverá, a partir de uma lesão óssea, caracterizar a ação ou ferramenta utilizada, qual a direção e a força empenhada, para que o potologista forense possa estimar as lesões e a sua severidade ao nível. O exame pormenorizado das informações colhidas no desenvolver desta dissertação demonstra que as técnicas e métodos aplicados no campo da antropologia são bastante seguros na investigação criminal. A antropologia forense possui um índice muito alto em resolução de crimes, pois mesmo em avançado estado e deterioração dos corpos é possível determinar diversos aspectos que envolvem a vítima e o crime, sendo fica clara a relevância desta ciência de distinção para o campo jurídico. ETAPAS PARA A LIBERAÇÃO DE UM CORPO 1º PASSO: ATESTADO DE ÓBITO O primeiro passo após o falecimento de uma pessoa é obter o Atestado de Óbito, documento sem o qual nenhuma outra providência pode ser tomada em relação ao falecido. O Atestado de Óbito é um documento atestando o falecimento e a causa da morte, fornecido por um médico, que será determinado pelas circunstâncias em que o falecimento ocorreu. As circunstâncias que ocasionarão a emissão do Atestado de Óbito de maneira diferente dependem do tipo de morte (Natural e Não Natural / Acidental) e o local onde está ocorreu (casa, hospital ou via 40 pública). Morte Natural é aquela que ocorre em consequência de causas naturais como envelhecimento, doenças, sem a contribuição de qualquer fator externo. Morte Não Natural/Acidental é aquela que ocorre por causas externas. Quedas, atropelamentos, afogamentos, homicídios, suicídios caracterizam mortes violentas. Vamos abordar cada caso e identificar quem será o responsável por lhe fornecer o ATESTADO DE ÓBITO: Em caso de morte natural: Em Casa, acompanhada por um médico da família – O próprio médico da família providenciará o atestado de óbito; Em Casa, sem acompanhamento médico – A família deve procurar o distrito policial mais próximo e solicitar a remoção do corpo para o Serviço de Verificação de Óbitos (SVO) ou o Instituto Médico Legal do município (IML). Neste caso é um médico do SVO ou IML quem emitirá, depois dos exames, o atestado de óbito; No Hospital – O próprio médico do hospital que acompanhou o falecido fornecerá o atestado de óbito; Em Via Pública – Nestes casos, quando acontece em via pública, o corpo é encaminhado ao hospital municipal e a família deverá comparecer para retirar a declaração de óbito. Em caso de morte não natural/acidental: Em Casa, deve-se procurar o distrito policial mais próximo para o registro da ocorrência e solicitar a remoção do corpo para o Serviço de Verificação de Óbitos (SVO) ou o Instituto Médico Legal do município (IML). Neste caso é um médico do SVO ou IML quem emitirá, depois dos exames, o atestado de óbito; No Hospital, se a morte for considerada violenta o corpo será encaminhado ao IML e a família deverá comparecer a uma Delegacia de Polícia para registrar o Boletim de Ocorrência. Após este procedimento a família deverá comparecer ao IML para retirar a declaração de óbito; Em Via Pública – Neste caso a família deverá registrar o Boletim de 41 Ocorrência na Delegacia de Polícia. Após a liberação da polícia técnica, o corpo será encaminhado ao IML, e então a família poderá retirar a declaração de óbito. 2° PASSO: SERVIÇO FUNERÁRIO – PROVIDÊNCIAS PARA O VELÓRIO E ENTERRO/CREMAÇÃO: Depois de obter o atestado de óbito, a família ou responsável deve procurar a agência de serviço funerário municipal ou uma casa funerária, para contratar o velório e o funeral. Para contratar estes serviços, devem-se levar os seguintes documentos do falecido: Atestado de óbito assinado por um médico para sepultamento; No caso de cremação, dois médicos deverão assinar o Atestado. Em caso de Morte Violenta, é necessária também a apresentação de uma autorização judicial. Cédula de Identidade; Certidão de Nascimento (em caso de falecidos menores) ou Certidão de Casamento; Carteira Profissional; Título Eleitoral; Certificado de Reservista; CPF; Cartão do INSS; PIS/PASEP. Apresentados estes documentos, o funcionário do Serviço Funerário procederá ao REGISTRO DO ÓBITO com todos os dados do falecido e o anexará ao Atestado de Óbito para envio ao Cartório de Registro Civil do Distrito onde ocorreu a morte. Após a emissão do registro de óbito é entregue um protocolo ao declarante para a retirada da CERTIDÃO DE ÓBITO em cartório após 5 dias úteis. A partir da efetivação do registro de óbito a equipe da funerária realiza a remoção do corpo, na residência, IML ou hospital. 42 Velório: O velório pode ser realizado em hospitais, igrejas, residências ou nos velórios municipais. A escolha do local deve ser feita no momento da contratação do funeral, e contará com a ajuda do funcionário da agência para sua reserva no horário escolhido. Caso se opte por um velório particular (igreja, hospital e residência), a agência cobrará taxa de remoção do corpo e taxa de serviço pelo transporte de materiais como artigos religiosos e enfeites florais. Enterro: O funcionário da agência auxiliará na reserva Cemitério mais próximo à residência, ou aquele que apresente disponibilidade de vagas. Caso a família possua alguma concessão em algum Cemitério, deve citá-la ao funcionário para a reserva do funeral. Cremação: Nos municípios que possuem serviço de cremação, os procedimentos são os mesmos que os adotados para a reserva de cemitérios, desde que apresentada a documentação extra exigida, conforme mencionado acima. IMPORTANTE Dispensa de Pagamento de Taxas Funerárias Pela Lei 11.083/ 91, é concedida, aos moradores da cidade de São Paulo que não tenham condições de pagar as despesas do funeral, a gratuidade dos meios e procedimentos necessários ao sepultamento. Para que obtenha dispensa, é necessário que comunique à agência funerária, que informará qual o procedimento para que seja garantida a gratuidade no sepultamento. Não é necessária a apresentação de atestado de pobreza, basta apenas que ela seja declarada pelo interessado; No Estado de São Paulo há também o auxílio funeral concedido aos servidores embasado na Lei nº. 10.261, de 28 de outubro de 1968; Além disso, conforme Lei 11.479/ 94, regulamentada pelo Decreto 35.198/ 95, a família da pessoa que tiver doado algum órgão para fins de transplante médico poderá se beneficiar da dispensa do pagamento de algumas taxas, emolumentos e tarifas do funeral. Para isso, na contratação do 43 funeral, a família deverá apresentar o comprovante de doação de órgãos do falecido, bem como da imediata comunicação do óbito à instituiçãomédica habilitada em receber os órgãos. Não é necessária a comprovação de efetivo aproveitamento dos órgãos doados. 3º PASSO: CERTIDÃO DE ÓBITO: Depois do velório e do funeral, a família deve ainda providenciar a Certidão de Óbito do falecido. A Certidão de Óbito, também conhecida como óbito definitivo, é um documento diferente do Atestado de Óbito e é o registro do óbito no Cartório Civil do distrito onde ocorreu o falecimento. Para obter a Certidão de Óbito, o funcionário do Serviço Funerário colherá os dados da pessoa que faleceu e os encaminhará para o Cartório de Registro Civil do distrito onde ocorreu a morte e será entregue, a um dos familiares, um protocolo que possibilita a retirada desta certidão no cartório, em até 5 dias. 4º PASSO: DOCUMENTOS E CONTAS DO FALECIDO É importante acompanhar o encerramento de contas e documentos do falecido, de forma a evitar que alguém venha a fazer uso de seus dados. A seguir descrevemos os procedimentos básicos a serem adotados pelos familiares. Cancelar o RG e Carteira de Motorista Os Cartórios de Registro Civil, após a emissão da Certidão de Óbito, enviarão comunicação aos órgãos emissores, para o cancelamento dos devidos documentos. Caso haja alguma falha, a família deverá comparecer às Secretarias de Segurança e/ou Detrans, munida da Certidão de Óbito e solicitar o cancelamento. 44 Cancelar o Título de Eleitor Mensalmente, após um cruzamento entre os dados do cadastro de eleitores e os registros de óbito fornecidos pela Previdência Social, a zona eleitoral procede a este cancelamento. Caso, por falha, este não ocorra, cumpre à família do falecido comparecer à zona eleitoral, munida do Título de Eleitor e Certidão de Óbito para solicitar a baixa. Cancelar o CPF É necessário o comparecimento a uma unidade de atendimento da Receita Federal e, mediante a apresentação da Certidão de Óbito, o CPF do falecido, e um documento de identidade, solicitar o cancelamento. Caso o falecido tenha deixado bens, o CPF não pode ser cancelado, mas transformado em um CPF temporário até a definição do espólio, para seu posterior cancelamento. Encerrar Contas Bancárias Deve-se entrar em contato com o Banco/s em que o falecido mantinha contas e aplicações e solicitar, mediante a apresentação da Certidão de Óbito e documentos de Identidade, seu encerramento assim como o de eventuais cartões de crédito/débito. Os valores que restarem depositados nessas instituições serão incluídos no espólio para sua posterior destinação. LAUDOS REALIZADOS NO IML O Instituto Médico Legal, mais conhecido pela sua sigla IML, é um instituto brasileiro responsável pelas necropsias e laudos cadavéricos para Polícias Científicas de um determinado Estado na área de Medicina Legal. É um órgão público subordinado à Secretaria de Estado da Segurança Pública. 45 Conhecido também como Departamento Médico Legal, ou DML, por ser, este órgão, vinculado à Secretaria de Estado de Segurança Pública através da Superintendência de Polícia Técnica Científica. As atribuições são as mesmas. Nos IMLs ou DMLs são realizados vários exames de corpo de delito e perícias, como: Autópsia; Exame de tanatologia; Exame de toxicologia; Exame de lesões corporais; Exame de constatação de violência sexual; Exame de sanidade mental; Exame de constatação de idade; Exame de constatação de doença sexualmente transmissível. PAPILOSCOPIA Papiloscopia é a ciência forense que trata da identificação humana por meio das papilas dérmicas. A palavra Papiloscopia é resultante de um hibridismo greco-latino (Papilla = papila e Skopêin = examinar). Papilas são pequenas saliências de natureza neurovascular, situadas na parte externa (superficial) da derme, estando os seus ápices reproduzidos pelos relevos observáveis na epiderme. A Papiloscopia estuda a identificação humana pelas digitais, presentes nas palmas das mãos e na sola dos pés. Tem como objetivo a perícia e o estudo a fim de pesquisas técnico-científicas, visando a identificação em indivíduos vivos ou mortos. A coleta, identificação e arquivamento das impressões digitais humanas acontecem muitas vezes em casos de crime nos quais é necessário o 46 levantamento de provas que envolvem as digitais humanas na cena. Podem também ser utilizadas as técnicas da papiloscopia para a identificação de corpos que sofreram decomposição ou estão em estado de difícil identificação. O QUE FAZ UM PAPILOSCOPISTA? Em meio a inúmeros procedimentos e processos voltados à apuração de provas criminais, e também ligados à veracidade de um fato, a prova judicial é o objeto mais importante da ciência processual, já que ela constitui os olhos do processo. Assim, a impressão digital deixada num local de crime é a prova mais direta e incontestável da indicação da presença do indivíduo ou até mesmo da autoria do delito, tornando a papiloscopia uma grande ferramenta judicial e investigatória nesse sentido. Para entendermos melhor o que é a Papiloscopia, como atuar nessa área e quais os principais desafios, é importante saber um pouco da sua história, conforme veremos a seguir. ENTENDA MAIS SOBRE ESTA CIÊNCIA A investigação das papilas dérmicas, presentes na palma das mãos e na sola dos pés (impressões digitais) no Brasil começou por volta de 1901. Tem suas divisões de pesquisa da seguinte maneira: datiloscopia, quiroscopia, podoscopia, poroscopia e cristascopia. 47 A datiloscopia é o processo de identificação humana pelas impressões digitais (dedos). Já quiroscopia é o processo de identificação humana pelas impressões palmares (mãos). A podoscopia é o processo de identificação humana pelas impressões plantares (pés). A poroscopia é o processo de identificação humana dos poros. E a cristascopia é o processo de identificação humana pelo estudo das cristas papilares. A necropapiloscopia é a perícia realizada em cadáveres, que tem como objetivo identificar pessoas falecidas cuja identidade é desconhecida; a sua identificação será feita pelo confronto das impressões papilares. Para a identificação de cadáveres existem técnicas adequadas para cada situação em que se encontra o corpo. Todas essas técnicas fazem parte da Papiloscopia e da atividade do profissional papiloscopista. Na área Criminal, a Papiloscopia trata da identificação de pessoas indiciadas em inquéritos ou acusadas em processo, confeccionando o Boletim de Identificação Criminal (BIC) por força do Código de Processo Penal, o que constitui uma forma de identificação obrigatória, bem como o levantamento de impressões digitais em locais de crime. Mundialmente, o caso criminal mais famoso da utilização desta ciência é o de Will & William West. O CASO WILL & WILLIAM WEST Will e William West não eram irmãos, mas tinham nomes iguais, e em 1903 eles foram presos na Penitenciária Leavenworth no Kansas. O primeiro a ser preso foi William, porém, alguns anos depois, com a chegada de Will e com as incríveis semelhanças entre os dois, a polícia local decidiu investigar seguindo o método de Bertillon – um método de obtenção de medidas criado para identificação humana. O sistema de identificação humana que consistia na medição das diferentes partes do corpo foi batizado como uma homenagem ao policial francês Alphonse Bertillon, em Paris (1879). 48 Após constatar falhas no método Bertillon, e com a insistente afirmação de Will, que dizia nunca ter sido preso antes, a polícia decidiu mudar a técnica e partiu para a investigação das digitais, método que ainda era pouco usado na época, mas que resolveu o problema. Finalmente, após a conclusão de que Will e William West eram duas pessoas distintas, a Papiloscopia passou a ser utilizada com maior frequência nas prisões em todo o
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