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Dermatoses bolhosas (buloses) Introdução As doenças bolhosas são definidas como dermatoses geralmente autoimunes, caracterizadas por bolhas ou, menos frequentemente, por vesículas. Do ponto de vista clínico, as bolhas intraepidérmicas tendem a ser mais efêmeras e superficiais, como no caso dos pênfigos. As bolhas subepidérmicas, por sua vez, tendem a ser maiores e mais duradouras, como nas demais doenças do grupo das buloses autoimunes. Buloses intraepidérmicas (pênfigos) São doenças bolhosas autoimunes antidesmogleína com tendência à progressão, de evolução crônica e ilimitada, com prognóstico reservado. As bolhas são intraepidérmicas e decorrem de processo acantolítico, induzido por autoimunidade. Os antígenos variam segundo o tipo de pênfigo, podendo ser as desmogleínas, desmocolinas e desmoplaquinas moléculas constituintes dos desmossomos, incluindo a placa desmossômica. Pênfigo vulgar Doença autoimune. Envolve pele e mucosas. É a forma mais grave - risco de vida. Descrição: bolhas flácidas, não pruriginosas e de tamanhos variados, que surgem em pele normal ou eritematosa. Epidemiologia Costuma se apresentar entre 50-60 anos. Patogênese Ruptura da coesão entre os queratinócitos (acantólise) devido a destruição de estruturas de adesão celular, denominadas desmossomos. O diagnóstico histopatológico caracteriza-se pelo descolamento intraepidérmico logo acima da camada basal, destacando todo o restante da epiderme. A imunofluorescência direta da pele demonstra acúmulo de IgG na superfície dos queratinócitos. Manifestações clínicas Acometimento predominante em mucosas, especialmente a mucosa oral. Erosões orais dolorosas (50-70% dos pacientes), precedem semanas/meses as manifestações cutâneas. Crescimento centrifugo e tendência à generalização. As lesões orais são ulceras aftosas, evoluindo para erosões dolorosas e extensas. Eventualmente lábios, língua, orofaringe e outros sítios de mucosa no corpo podem ser afetadas. Prurido por conta de sensibilidade ou irritação na pele e dor podem estar presentes. Diagnóstico Clínica e confirmado através do histopatológico e imunofluorescências (direta – pele; indireta – sangue). Na imunofluorescência indireta pode ser encontrado, em até 75% dos casos, anticorpos antidesmossomais. Curso e prognóstico Aumento do risco de infecção cutânea secundária (sepse e choque séptico) – Principal complicação. Desnutrição e caquexia. Comprometimento do estado geral. Osteoporose/DM/HAS → aumentam o risco de mortalidade. Gestação: retardo do crescimento, prematuridade, morte uterina, pênfigo neonatal. Tratamento Corticoides sistêmicos (ex: prednisona - 2mg/kg/ dia) por 6 semanas até estabilizar o paciente. Em alguns casos associar com imunossupressores como azatioprina ou ciclofosfamida. Casos muito graves podem precisar de plasmaférese ou imunoglobulina intravenosa. Verificar se o paciente tem Strongyloides stercoralis, porque os corticoides causarão uma imunossupressão e esse parasita pode proliferar de forma extrema e complicar o estado geral do paciente. Pênfigo vegetante (dentro de P. Vulgar) Hallopeau: forma localizada principalmente em regiões flexoras. Neumann: lesões que durante a sua reparação se tornam vegetações. Pênfigo foliáceo Doença bolhosa autoimune intradérmica. Lesões em face, couro cabeludo e áreas seborreicas (esternal, interescapular). Mais superficial que o pênfigo vulgar. Pode ser induzido por drogas (Penicilamina, captopril). São lesões vesicocrostosas. Suas bolhas deixam intensa descamação. Febre irregular pode ocorrer. Endêmico (fogo selvagem) A lesão primária é uma vesícula ou uma bolha flácida, mas, como são de localização mais superficial, as bolhas tendem a romper, então geralmente não se vê bolhas ou vesículas íntegras. Tardiamente, podem surgir lesões papilomatosas, verrucosas (acantomatas, lesões verrucosas e persistentes), hiperpigmentação, aspecto de pele de leopardo e em “salpico de lama” (lesões amarronzadas, crostosas e focais como que jogadas no dorso), onicorrexe, onicólise com descoloração, alopecia difusa do couro cabeludo, das sobrancelhas, das axilas e do púbis, e ceratodermia palmoplantar. Comum em crianças, adolescentes e adultos jovens. Predileção em populações ribeirinhas e acredita-se ter relação com a picada de um mosquito simulíneo (Simulium nigrimanum). Pode ainda ser desencadeado por fármacos, sendo os principais: d-penicilamina, penicilina, rifampicina, captopril e propranolol. Não endêmico (doença de Cazenave) Lesões eritematosas dispersas, com crosta e bem demarcadas. Acomete pessoas a partir de 40-50 anos. É associado ao HLA-B16 e A26 e A24. Patogênese e patologia (ambos) Exame histopatológico - zona de clivagem em uma região superficial da epiderme. O achado na imunofluorescência direta é semelhante ao de PV. Diagnóstico (ambos) Suspeita clínica e confirmação pela biópsia (histopatológico + imunofluorescência). Tratamento (ambos) Corticosteroides sistêmicos – 1mg/kg/dia de prednisona. Em casos de PF localizado, corticoides tópicos. Curso e prognóstico Pode ser localizado por anos e depois evoluir para eritrodermia esfoliativa (generalizado). Pênfigo eritematoso (síndrome de Senear-Usher) Uma forma benigna e localizada do PF. Ocorre na etapa inicial ou regressiva (espontânea ou terapêutica) do PF. Chama-se a atenção para o aspecto morfotopográfico (lesão em "asa de borboleta" na face). Anticorpo IgG e antígeno desmogleína 1. Quadro clínico Apresenta-se como placas eritematosas ou eritematocrostrosas bem definidas. Possui aspecto e distribuição seborreica, agravadas pela exposição ao sol. Diagnóstico Clínica + histopatológico + imunofluorescência. Tratamento Uso de corticoides sistêmicos. Pênfigo herpetiforme As lesões simulam a dermatite herpetiforme, ou seja, vesículas, bolhas ou pápulas agrupadas que tendem a formar arranjo anular, inclusive prurido intenso. Raramente mucosas estão acometidas. Não é uma doença causada por Herpes. Pênfigo por IgA Trata-se de uma entidade rara responsiva à dapsona, caracterizada por vesículas ou pústulas, sobre base eritematosa ou pele normal. Estas lesões agrupam-se, exibindo aspecto anular ou circinado. O sinal de Nikolsky pode ser negativo. A IFD é negativa. Pênfigo paraneoplásico Caracteriza-se clinicamente por mucosite erosiva e dolorosa. Manifestação intensa, com má resposta terapêutica. As lesões cutâneas polimórficas lembram eritema multiforme ou lúpus subagudo. A intensidade do acometimento da traqueia, dos brônquios e dos pulmões leva, com frequência, o paciente ao óbito. Estomatite erosiva com neoplasia positiva ou oculta. Associação: Linfomas não Hodgkin, LLC, mama, pulmão, pâncreas, timoma, doença de castleman e sarcoma pouco diferenciado. Histologia Dermatite vacuolar de interface, necrose de queratinócitos e acantólise epidémica. Diagnóstico Clínica + histopatológico + imunofluorescência. Tratamento Uso de corticoides sistêmicos e tratamento do câncer. Em casos mais graves, faz-se uso de plasmaférese e de imunoglobulina endovenosa. Buloses subepidérmicas (complexo penfigoide) Grupo de doenças que compartilham, ao menos parcialmente, certos antígenos. Diferenças clínicas, epidemiológicas e histopatológicas, nem sempre tornam possível uma nítida diferenciação entre elas, embora as bolhas sejam sempre de localização subepidérmica. É mandatória a imunofluorescência para confirmação diagnóstica. Penfigoide bolhoso Doença de bolhas autoimune e subepidérmica, tensas, grandes, generalizadas. Mais comum em pele e mucosa.IgG contra os antígenos penfigoide 1 e 2 (AP1 e AP2). D-penicilamina, captopril, furosemida podem causar PB em pacientes mais jovens. Epidemiologia Mais comum após os 60 anos. Patogênese Autoanticorpos dirigidos contra o antígeno penfigoide, onde ocorre descolamento e a formação de bolha e acúmulo de eosinófilos. Não há acantólise. A histopatologia apresenta bolha subepidérmica com degeneração da membrana basal e epiderme completamente deslocada. Fenda entre derme e epiderme. A imunofluorescência direta mostra depósitos de IgG, de padrão linear ao longo da camada basal. Imunofluorescência indireta apresenta autoanticorpos de 65-100% dos casos. Manifestações clínicas Início com área localizada de eritema ou pápulas urticariformes pruriginosas → placas (juntas). Bolhas tensas, duradouras e grandes sobre pele sã ou eritematosa, com conteúdo citrino ou hemorrágico de distribuição simétrica. Predominando em áreas flexoras (face interna da coxa, virilha, abdome inferior, axila). Podem ser isoladas ou agrupadas. Erupção generalizada. Bolhas em mucosas orais (24% dos pacientes). Sinal de Nikolsky negativo. Prurido moderado-grave. Diagnóstico Clínico + histopatológico (presença de bolhas subepidérmicas com degeneração da camada basal e deslocamento da camada epiderme) + imunofluorescência (evidencia depósitos de IgG com padrão linear na camada basal). Curso e prognóstico Sem tratamento: pode permanecer localizado, sofrer remissão ou generalizar. Remissão: 30% em 2 anos, 50% em 3 anos. Relativamente benigno. Mortalidade: 19% (colaterais dos medicamentos). Tratamento Corticosteroides sistêmicos em doses moderadas – 0,5-1mg/kg/dia (controle atingido com 1 a 2 semanas). Corticoide tópico é indicado em casos localizados. Podemos associar azatioprina, ciclofosfamida, mtx, ciclosporina, Ig venosa, plasmaférese. Penfigoide cicatricial Penfigoide das membranas mucosas. Bolhas subepidérmicas e escoriações. Rara e crônica, circunscrito às mucosas, com involução cicatricial. Mais comum: oral (91%), conjuntival (66%). Anticorpo IgG e antígeno hemidesmossomos. Epidemiologia Mais comum em Idosos e Mulheres. Patogênese Resulta da união de autoanticorpos contra antígenos da zona da membrana basal. Tratamento Prednisona altas doses, podem ser utilizadas com o objetivo de evitar cegueira e estenose. Associação com citotóxicos (ciclofosfamida). Casos graves: traqueostomia, gastrostomia. Penfigoide gestacional Erupção pruriginosa, seguida pelo surgimento de lesões vesicobolhosas, muito provavelmente, de natureza autoimune, que ocorre, em geral, do 5º mês em diante, ou logo após o parto. É raríssima (1/50.000 parturientes) e menos comum em negros. Tem forte correlação com os antígenos HLA-DR3 e – DR4. Tem sido associado um fator hormonal, particularmente o estrogênio, mas há evidências muito fortes de que se trata também de patologia imunológica induzida por alguma alteração antigênica na gravidez. Clínica Caracteriza-se por polimorfismo lesional: eritema, lesões urticariformes, bolhas pequenas (como vesículas), bolhas tensas, escoriações e crostas. As lesões geralmente começam ao redor do umbigo (80%), generalizando-se para todo o tronco e extremidades. Em geral, não afeta as regiões palmoplantares, a face e as mucosas. O exantema piora durante o trabalho de parto ou imediatamente após o parto, regredindo em poucas semanas ou meses. Histopatologia e imunofluorescência A histopatologia evidencia bolha subepidérmica com eosinófilos e necrose focal das células basais. Na IFD é encontrada uma banda linear de C3 na junção dermoepidérmica, e esse achado é característico em pele perilesional ou normal. Tratamento O tratamento, nos casos mais brandos, é feito com anti-histamínicos e corticosteroides tópicos classe 1, sem grandes respostas. Nos casos mais graves, doses de 20 a 40 mg/dia de prednisona estão indicadas. Em geral, em um período de 3 meses pós-parto, ocorre melhora clínica acentuada ou até cura. Epidermólise bolhosa adquirida Doença autoimune adquirida. Doença aguda de lesões eritemato-urticadas e vesicobolhosas subepiteliais. Relação com doenças como: DM, LES, doença inflamatória intestinal, tireoidopatias. Unhas podem ser acometidas. Anticorpo IgG, IgA e IgM. Mutações no colágeno tipo VII. Quadro clínico As manifestações iniciais são variáveis, às vezes semelhantes ao penfigóide bolhoso. Há prurido acentuado. Após o tratamento, geralmente ficam cicatrizes, mílios (cistos superficiais epidérmicos) e hiperpigmentação. Locais mais comuns: as lesões bolhosas geralmente ocorrem em áreas mais sujeitas a pequenos traumas, como as regiões extensoras dos cotovelos e as regiões dorsais das mãos e dos pés. Diagnóstico Histopatológico: apresentam bolhas subepidérmicas com neutrófilos. Imunofluorescência direta: mostra depósitos lineares de IgG e ocasionalmente de IgA e IgM na zona da membrana basal. Tratamento Corticoides em altas doses. Imunossupressores. Ig e plasmaférese: alguns bons resultados. Esteroides + dapsona ou sulfonamidas. Dermatite herpetiforme (dermatite de Duhring-Broc) Importante relação com doença celíaca. Depósitos de IgA granular na derme papilar. Início insidioso. Epidemiologia Mais comum entre os 20 a 50 anos e homens. Maioria descendente do norte europeu. Manifestações clínicas Pode ter prurido ou sensação de queimação antes. Lesões eritematosas de aspecto urticariforme, seropápulas, pequenas bolhas, ou bolhas grandes. Simétrico e tende a generalização. Agrupamento das lesões: crescimento centrífugo. Manifestação da sensibilidade ao glúten. Erupção cutânea vesicular pruriginosa crônica. Mais comum em superfícies extensoras. Distribuídas em: cotovelos, joelhos, sacro, base do couro cabeludo. OBS: podem ser difíceis de identificar por conta de arranhões. Lesões em face e orais são raras. Diagnóstico Sinais clínicos + Histopatologia. Imunofluorescência direta perilesional: padrão granular de IgA na papila. Depósito na papila dérmica -> microabcessos papilares de neutrófilos na papila dérmica. Investigação de doença celíaca. Tratamento Dieta isenta de glúten. Dapsona 100 a 200 mg/dia. Outros Lúpus bolhoso As bolhas geralmente indicam doença sistêmica mais grave. Por vezes, a presença de anticorpo anti-colágeno VII pode indicar certa superposição com EBA. Bolha subepidérmica contendo neutrófilos ao invés de linfócitos. Em geral há mais mucina na derme. Porfiria cutânea tardia A pessoa tem bolhas cronicamente recorrentes nas áreas do corpo expostas ao sol. O excesso de ferro pode se acumular no fígado e causar lesões hepáticas. O médico analisa amostras de urina e de fezes quanto à presença de uma alta concentração de protoporfirina. A remoção de sangue (flebotomia), a administração de cloroquina (ou hidroxicloroquina) ou ambas são úteis. Mastocitose bolhosa Mastocitose: doença comum, com infiltração da pele por mastócitos, com evolução benigna, geralmente sem comprometimento sistêmico e regressão na vida adulta. Nos adultos o envolvimento sistêmico é maior: TGI, osteólise, leucemia. A escarificação das lesões causa degranulação dos mastócitos com urticação. As lesões podem ser bolhosas.