Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA Carolina Passarelli Gonçalves Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Compreender as bases conceituais das reações adversas. Descrever a classificação das RAMs. Reconhecer as interações medicamentosas. Introdução O aumento do número de medicamentos disponíveis no mercado, o envelhecimento populacional, impressões negativas em relação aos médicos, a tendência ascendente à automedicação e à polifarmácia são fatores que contribuem ativamente para a ocorrência das reações adversas aos medicamentos em todo o mundo. Desde 1994, estudos estatísticos mostram que, no Brasil, os medicamentos ocupam o primeiro lugar em relação às substâncias que mais causam intoxicação segundo um estudo epidemiológico do Sistema Nacional de Informações Tóxico- -Farmacológicas (Sinitox), vinculado à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Entre 2002 e 2012, foram pelo menos 304,6 mil casos no país segundo os dados mais atualizados do Sinitox. Neste capítulo, você vai estudar as bases das reações adversas a me- dicamentos (RAM), além de aprender a classificá-las e a reconhecer as interações medicamentosas. Bases conceituais das reações adversas Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), reação adversa ao medica- mento (RAM) é defi nida como “[...] qualquer efeito prejudicial ou indesejado que se apresente após a administração de doses normais de medicamento utilizadas no ser humano para a profi laxia, o diagnóstico ou o tratamento de uma enfermidade” (ORGANIZAÇÃO..., 1972 apud CONTI, 1979). As RAMs são frequentemente confundidas com os eventos adversos a medicamentos, que, segundo a ANVISA, são “[...] qualquer ocorrência médica desfavorável que pode ocorrer durante o tratamento com um medicamento, mas que não possui, necessariamente, relação causal com o tratamento” (AGÊNCIA..., 2013, documento on-line). Muitas vezes, a utilização dessas duas definições está diretamente relacio- nada à preferência do autor, dificultando a interpretação em muitos casos, já que o tema comum nas definições aborda eventos indesejado e não intencionais. Assim, identificar, administrar adequadamente e prevenir RAMs é um objetivo desejado, mas, muitas vezes, negligenciado. Padronizar e usar terminologias definidas por órgãos regulamentadores contribui para a melhoria da qualidade e da consistência das informações desse campo. Além das definições de RAM e eventos adversos a medicamentos, é de extrema importância considerar outras definições utilizadas nessa área, como mostra o Quadro 1. Erro de medicação É definido como qualquer evento evitável que pode causar ou levar a um uso inapropriado de medicamentos ou causar dano a um paciente enquanto a medicação está sob o controle dos profissionais de saúde, pacientes ou consumidores. Esse evento pode estar relacionado com a prática profissional, com procedimentos e sistemas, incluindo prescrição, orientações verbais, rotulagem, embalagem e nomenclatura de produtos industrializados e manipulados, dispensação, distribuição, administração, educação, monitorização e uso. O erro de medicação pode ocasionar um evento adverso ao paciente. Quadro 1. Definições relacionadas às reações adversas a medicamentos (Continua) Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas2 Nesses links, você encontra todos os passos e as informações necessárias para notificar uma RAM. https://goo.gl/B1K8tg Caso a notificação seja efetuada por um profissional da saúde, o primeiro passo é efetuar o cadastro em: https://goo.gl/hslMm Depois que você tiver feito o cadastro, é necessário acessar o formulário por meio do seguinte link: https://goo.gl/mbkDEA Para acessar o Formulário de Eventos Adversos a Medicamentos, o notificador deve escolher a opção “Medicamento” e responder “Sim” à pergunta “Houve danos à saúde?”. Fonte: Adaptado de Agência Nacional de Vigilância Sanitária (2018). Queixa técnica É qualquer suspeita de alteração/irregularidade de um produto/ empresa relacionada a aspectos técnicos ou legais. Poderá, ou não, causar um evento adverso. De maneira geral, as queixas técnicas se referem aos casos que não acarretaram danos à saúde do paciente, mas que poderiam acarretar. São exemplos de queixas técnicas: ampolas com material particulado (partículas visíveis); rótulo descolando; solução que deveria ser incolor e apresenta outra coloração; ausência do número de autorização de funcionamento da empresa, número de registro do produto e/ou prazo de validade no rótulo; produto comercializado por empresa diferente da que detém o seu registro; frascos incompatíveis com a indicação do volume expresso no rótulo; produto irregular ou clandestino; presença de corpo estranho; defeito na tampa; alterações na consistência do produto. Quadro 1. Definições relacionadas as reações adversas a medicamentos (Continuação) 3Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas O risco de uma RAM difere entre os membros de uma população exposta. Em alguns casos, o risco de uma reação adversa estará presente em indivíduos suscetíveis e ausente em outros. Em outros casos, a suscetibilidade segue uma dis- tribuição contínua — por exemplo, aumentando a suscetibilidade com o aumento do comprometimento da função renal. Embora as razões para a hiper-suscetibilidade possam ser desconhecidas, vários tipos são reconhecidos e incluem variação gené- tica, idade, sexo, variação fisiológica, fatores exógenos e doença, como mostra o Quadro 2. É importante ressaltar que, também, mais de um fator de suscetibilidade pode estar presente em um único indivíduo (ARONSON; FERNER, 2003). Fonte de suscetibilidade Exemplo Implicações Genético Porfiria Rastrear anormalidades; evitar drogas específicas Hipertermia maligna Polimorfismos Idade Neonatos Ajustar doses de acordo com a idade Pessoas idosas Gênero Mefloquina — efeitos neuropsiquiátricos Doses diferentes em homens e mulheres Inibidores da enzima conversora de angiotensina — tosse Síndrome semelhante ao lúpus Gestante Aumento do volume sanguíneo Altear ou suspender dose Desenvolvimento do feto (teratogenicidade) Fatores exógenos Interações medicamentosas Alterar a dose ou evitar a administração concomitanteInterações com alimentos (por exemplo, suco de toranja com medicamentos liberados pelo CYP3A4) Quadro 2. Fontes de suscetibilidade a reações adversas a medicamentos (Continua) Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas4 Classificação das RAMs Existem diversas maneiras de classifi car as RAMs. O modelo mais empregado e simples é o proposto por Rawlins e Thompson, o qual foi modifi cado, posterior- mente, por Wills e Brown. Nessa classifi cação, as RAMs são categorizadas em duas grandes classes, Tipo A e Tipo B (ARULMANI; RAJENDRAN; SURESH, 2007). 1. Reações do Tipo A: incluem as reações previsíveis, ou seja, as reações conhecidas da droga, que, geralmente, estão associadas à dosagem. Sua incidência para morbidade é, geralmente, alta, enquanto para mortalidade é, geralmente, baixa. Exemplos são bradicardia com β-bloqueadores adrenérgicos, hemorragia com anticoagulantes, hipoglicemia com sul- fonilureias, etc. Algumas reações tipo A têm longo período de latência, como teratogenicidade, retinopatia, adenocarcinoma vaginal em filhas de mulheres que receberam dietilestilbestrol durante a gravidez, etc. 2. Reações do tipo B: são efeitos desconhecidos ou “bizarros” que não podem ser previstos com base na farmacologia do medicamento. Essas reações, geralmente, não estão relacionadas à dosagem e, embora comparativamente raras, muitas vezes, causam doenças graves e até a morte. Essas reações, geralmente, não são observadas durante os programas convencionaisde triagem farmacológica e toxicológica e, consequentemente, são responsáveis por muitas retiradas de medi- camentos do mercado. Alguns exemplos são hipertermia maligna da anestesia, anafilaxia devido à penicilina e muitas reações imunológicas. Fonte: Adaptado de Aronson e Ferner (2013). Fonte de suscetibilidade Exemplo Implicações Patologia Insuficiência renal Rastrear anormalidades; evitar drogas específicas; usar doses reduzidas Cirrose hepática Hipersensibilidade Reações alérgicas Suspensão ou troca do medicamento Quadro 2. Fontes de susceptibilidade a reações adversas a medicamentos (Continuação) 5Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas Limitações da classificação de Rawlins e Thompson Algumas das principais limitações da classifi cação de Rawlins e Thompson são: 1. Tudo o que não é do tipo A é classificado como tipo B, tornando o último um grupo altamente heterogêneo, com pouco em comum. 2. Certas RAMs não se encaixam em nenhuma categoria confor- tavelmente; portanto, é difícil decidir se tais RAMs são do tipo A ou tipo B. Para superar as limitações da classificação de Rawlins e Thompson, Wills e Brown executaram modificações pertinentes, classificando as RAMs em nove categorias com base em seu mecanismo de ação. Nessa classificação, o termo “medicamento” tem sido utilizado no lugar de “fármaco” para assegurar que as reações secundárias ao método de administração ou excipientes sejam claramente incorporadas dentro da definição. O Quadro 3 apresenta os tipos e características comuns das RAMs de acordo com a classificação de Wills e Brown. Categoria Classificação Características Orientação 1 Tipo A (Aumentado) Augmented Relativamente comum; farmacologicamente previsível; relacionada à dose; melhora com a suspensão do medicamento. Hipoglicemia com sulfonilréias; Bradicardia e β-bloqueadores. 2 Tipo B (Bugs) Bugs Envolve interação com um micro-organismo; farmacologicamente previsível; melhora com a suspensão do medicamento. Cárie dentária com comprimidos revestidos de açúcar; resistência devido ao uso excessivo de qualquer um antibiótico, etc. Quadro 3. Classificação de Wills e Brown para as reações adversas aos medicamentos (Continua) Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas6 Categoria Classificação Características Orientação 3 Tipo C (Químico) Chemistry Relacionado com a concentração do medicamento; gera reação irritante. Flebite, etc. 4 Tipo D (Administração) Delivery Causado pelo método de administração ou natureza da formulação; melhora se o medicamento é retirado ou o método de administração é alterado. Inflamação ou infecção em torno do local da administração. 5 Tipo E (Fim de uso) Exit Farmacologicamente previsível; começa quando o medicamento é interrompido ou a dose é reduzida; melhora se o medicamento é reintroduzido. Reações de abstinência causados por opioides, benzodiazepínicos, β-bloqueadores, etc. 6 Tipo F (Familiar) Familial Ocorre apenas na predisposição genética. Anemia hemolítica com primaquina em indivíduos com deficiência de G6PD, etc. 7 Tipo G (Genético) Genotoxicity Causa danos genéticos irreversíveis. Agentes teratogênicos, como a talidomida, causando danos genéticos no feto, etc. Quadro 3. Classificação de Wills e Brown para as reações adversas aos medicamentos (Continuação) (Continua) 7Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas Existem outras classificações para reações adversas a medicamentos. A classificação de Edwards e Aronson, publicada em 2000, também é bastante utilizada. Veja os detalhes dessa classificação no link a seguir. https://goo.gl/vm6EZ5 Reconhecimento das RAMs Tanto no ambiente hospitalar quanto no ambulatorial, um novo sintoma ou o agravamento de algum sintoma relatado pelo paciente pode ser o primeiro sinal de uma RAM. Em diversas comunidades, em bairros ou farmácias co- munitárias, os pacientes, inúmeras vezes, buscam orientação do farmacêutico para tratar vários sintomas em casa. Essa pode ser uma oportunidade para o farmacêutico indagar sobre os sintomas do paciente e determinar se eles podem ter sido causados por uma RAM. Por exemplo, se um paciente pedir ao farmacêutico uma recomendação para tratar diarreia, o farmacêutico pode Categoria Classificação Características Orientação 8 Tipo H (Hipersensibilidade) Hypersensitivity Requer ativação do sistema imunológico; melhora se o medicamento é suspenso. Anafilaxia com penicilina; reações cutâneas alérgicas com agentes antimicrobianos, etc. 9 Tipo U (Sem classificação) Unclassified Mecanismo não entendido. Náuseas e vômitos com anestesia gasosa, etc. Quadro 3. Classificação de Wills e Brown para as reações adversas aos medicamentos (Continuação) Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas8 perguntar sobre outros medicamentos que o paciente está tomando, de modo a determinar se a diarreia é uma RAM conhecida, associada à terapia medi- camentosa, com antibióticos. Uma medicação sem prescrição médica (OTC) pode não ser necessária, e a diarreia pode desaparecer após a conclusão da antibioticoterapia. No ambiente hospitalar, os pacientes podem informar ao enfermeiro ou ao médico sobre o novo sintoma que estão tendo, o que pode resultar em um telefonema para o farmacêutico. Fazer perguntas detalha- das sobre os sintomas do paciente, em vez de fornecer imediatamente uma recomendação de tratamento, pode revelar uma RAM e evitar uma terapia medicamentosa desnecessária ou ainda mais sintomas de RAM. Não é uma tarefa fácil determinar se um paciente está experimentando uma RAM, quanto mais determinar qual tipo de RAM está ocorrendo. A causa pode estar no perfil farmacocinético da droga, na hipersensibilidade do paciente, na interação medicamentosa ou, até mesmo, em um erro de prescrição. Essa dificuldade pode explicar, em parte, porque muitas RAMs nunca são reconhecidas. Tais descuidos podem levar ao uso subsequente de outros medicamentos para corrigir uma condição induzida por outros medi- camentos, um fator contribuinte para a polifarmácia. Além disso, RAMs não reconhecidas podem ser diagnosticadas erroneamente como uma exacerbação de um problema médico existente ou como um novo problema médico, o que pode fazer com que as doses dos medicamentos atuais sejam aumentadas ou com que se adicione novos medicamentos para tratar um problema médico que não existe. À medida que as dosagens são aumentadas ou mais drogas são adicionadas ao regime do paciente, a probabilidade de interações medi- camentosas e outras RAMs aumenta. Os fatores: pessoas, medicamentos e condições Infelizmente, as difi culdades em avaliar a causalidade das RAMS são infi nitas. As RAMs são problemas clínicos complexos que envolvem três variáveis-chave: a pessoa, o medicamento e a condição. Cada um desses fatores tem múltiplos aspectos que podem estar envolvidos em uma RAM. Pessoa: existem multidões de variáveis a serem consideradas. Por exem- plo, fatores de risco, como idade, sexo, doença, gravidade da doença, características comórbidas, insuficiência renal ou função hepática, entre outros fatores, podem estar envolvidos. Medicamento: dosagem, duração de uso, toxicidade conhecida, tempo de administração e outras variáveis devem ser consideradas. Se você 9Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas estiver lidando com um novo medicamento, os ensaios clínicos, durante o desenvolvimento do novo fármaco, podem não ter sido suficientemente robustos para detectar RAMs raras. Condição: relatórios anteriores, o tempo de início, a exacerbação da doença e os novos problemas médicos, geralmente, obscurecem o quadro do paciente, podendo gerar confusões. O quadro clínico em pacientes idosos ou em terapia intensiva é frequentementetão complexo, com a presença de múltiplos distúrbios e múltiplas drogas, que os possíveis efeitos relacionados aos medicamentos não são facilmente resolvidos. Suspeitas Sempre deve-se considerar a possibilidade de que um medicamento possa estar associado a uma exacerbação da condição do paciente ou ao surgimento de um novo problema médico. A chave é reconhecer mudanças no organismo de uma pessoa, pois isso pode ser um sinal precoce de uma RAM. Quando há suspeita de uma reação medicamentosa, deve-se determinar se o medicamento foi previamente associado a essa reação, descartar explicações alternativas e, fi nalmente, estabelecer uma ligação temporal entre o início da reação e a administração do medicamento. Também é aconselhável revisar o curso clínico do paciente, avaliando as características pertinentes desse paciente, o medicamento suspeito e o evento adverso. Em particular, os medicamentos recentemente administrados pelo paciente, problemas médicos significativos e fatores de risco (como idade, gravidade da doença ou redução da função renal ou hepática) devem ser examinados quanto a sinais de uma possível RAM. O paciente deve ser questionado sobre o uso de outros agentes, como medicamentos sem receita, suplementos vitamínicos, fitoterápicos, entre outras possibilidades. A RAM também precisa ser avaliada com o estado clínico do paciente em mente: o evento poderia ser explicado por características conhecidas das doenças médicas do paciente? Lembre-se: se a morbidade foi causada por um medicamento, o tempo é um fator-chave, pois a maioria das reações adversas ocorre em até 12 horas após a exposição ou, geralmente, em um período ainda mais curto. Portanto, devemos perguntar: com o que a pessoa pode ter tido contato durante esse período de tempo? Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas10 Além disso, é importante considerar que os alvos de RAMs mais comuns são a pele e o trato gastrointestinal, e os agentes responsáveis mais comuns são os antibióticos. Como identificar uma RAM? Infelizmente, uma abordagem empírica para identifi car RAMs não existe. Uma análise mais formal e lógica pode ajudar a distinguir eventos que são atribuíveis a um medicamento daqueles associados a doenças subjacentes ou a outros fatores. Vários investigadores, incluindo pesquisadores da FDA, desenvolveram procedimentos de avaliação lógica ou algoritmos para avaliar a probabilidade de uma RAM. O método amplamente aceito é o algoritmo de Naranjo, desenvolvido em 1981. Naranjo e colaboradores (1981) propuseram uma escala de probabilidade muito simples, projetada para monitorar de maneira sensível as RAMs e para realizar o acompanhamento pós-dispensação de medicamentos. Essa escala permite classificar as categorias de RAMs como “definidas”, “prováveis”, “possíveis” ou “duvidosas” com base nas respostas de 10 perguntas. Seis pesquisadores (dois médicos e quatro farmacêuticos) revisaram 63 RAMs aleatoriamente selecionadas. Eles elaboraram 10 perguntas, cada uma com respostas de “sim”, “não” e “indefinido”, e usaram um sistema empírico de pontuação para as respostas. Uma resposta “sim” a uma pergunta recebe pontuação de -1, +1 ou +2. Uma resposta “não” recebe uma pontuação de -1, 0, +1 ou +2. A resposta “desconhecido” recebe pontuação 0. A soma das pontuações das dez perguntas varia de quatro (-4) a +13 e foi interpretada para refletir a probabilidade de que um medicamento tenha causado uma RAM e que a complicação não seja uma manifestação da doença. Uma soma superior a nove foi empiricamente definida como “definida”, tendo causado a RAM; uma soma de cinco a oito “provavelmente” causou a RAM; uma soma de um a quatro “possivelmente” causou a RAM; e um score menor que 1 indica associação de que a RAM é “duvidosa”. A somatória dos pontos irá identificar se a causa da RAM é definida, provável, possível ou duvidosa, conforme mostra o Quadro 5: 11Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas Questões Sim Não Desconhecido Score 1. Existem notificações conclusivas sobre essa reação? + 1 0 0 Sim (+1) Não (0) Desconhecido (0) 2. A reação apareceu após a administração do fármaco? +2 -1 0 Sim (+2) Não (-1) Desconhecido (0) 3. A reação melhorou quando o fármaco foi suspenso? +1 0 0 Sim (+1) Não (0) Desconhecido (0) 4. A reação reapareceu quando da sua readministração? +2 -1 0 Sim (+2) Não (-1) Desconhecido (0) 5. Existem causas alternativas (ou até mesmo outro fármaco)? -1 +2 0 Sim (-1) Não (+2) Desconhecido (0) 6. A reação reaparece com a introdução de um placebo? -1 +1 0 Sim (-1) Não (+1) Desconhecido (0) 7. A concentração plasmática está em nível tóxico? +1 0 0 Sim (+1) Não (0) Desconhecido (0) Quadro 4. Algoritmo de Naranjo, utilizado para determinação da causa das RAMs (Continua) Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas12 Fonte: Adaptado de Naranjo et al. (1981). Somatória dos scores Classes de casualidade 9 ou + Definida 5 a 8 Provável 1 a 4 Possível 0 ou - Duvidosa Quadro 5. Somatória de scores proposta por Naranjo para determinação da causalidade de RAM Fonte: Adaptado de Naranjo et al. (1981). Questões Sim Não Desconhecido Score 8. A reação aumentou com dose maior ou reduziu com dose menor? +1 0 0 Sim (+1) Não (0) Desconhecido (0) 9. O paciente já experimentou semelhante reação anteriormente com medicamentos de mesmo fármaco? +1 0 0 Sim (+1) Não (0) Desconhecido (0) 10. A reação foi confirmada por qualquer evidência objetiva? +1 0 0 Sim (+1) Não (0) Desconhecido (0) TOTAL Quadro 4. Algoritmo de Naranjo, utilizado para determinação da causa das RAMs (Continuação) 13Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas Os valores obtidos a partir desse algoritmo são, por vezes, utilizados em avaliações por pares para verificar a validade das conclusões do autor sobre reações adversas a medicamentos. Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), um terço dos medicamen- tos saem de circulação depois de 2 anos de comercialização; em 5 anos, esse número chega a 50%. A alta taxa de reprovação deve-se aos efeitos colaterais inesperados em humanos. Saiba mais acessando a RDC nº. 18/2014 no link abaixo. https://goo.gl/Bt7nCo Instruções para a aplicação do algoritmo de Naranjo A resposta “desconhecido” deve ser usada com moderação e somente quando a qualidade dos dados não permitir uma resposta “sim” ou “não”. “Desco- nhecido” pode ser aplicável se a informação não estiver disponível e também se a questão não for aplicável ao caso. Quando mais de um fármaco está envolvido ou é suspeito, a escala de probabilidade de Naranjo é, geralmente, aplicada separadamente a cada um dos medicamentos, e o que alcançar maior pontuação deve ser considerado o agente causador. Além disso, o potencial de interação deve ser avaliado (NARANJO et al., 1981). Questão 1. Existem notificações conclusivas sobre essa reação? Re- latórios sobre essa reação? A resposta “sim” (+1) se aplica se houver dois ou mais relatórios publicados nos quais a reação adversa tenha sido descrita em detalhes ou se a reação adversa estiver listada em uma fonte confiável, como um livro médico, artigo de revisão sobre a medicação ou sobre reações adversas a medicamentos ou folheto informativo do produto. A resposta “não” se aplica quando o evento adverso não foi descrito anteriormente, se apenas um relatório foi publicado, se os relatórios publicados foram considerados inconclusivos ou pouco convincentes. A resposta “desconhecido” é aplicável somente quando não há informação, pois o medicamento é novo e informações mais aprofundadas sobre as reações adversas ainda não estão disponíveis. As pontuações dadas para “não” e “desconhecido” são as mesmas (0). Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas14 Questão 2. A reação adversa apareceu após o medicamento suspeito ter sido administrado? Essa questão avalia a relação temporal entre a reação e a administração do medicamento. A resposta “sim” (+2) se aplica se houver evidência definitiva de que o evento adverso ocorreu após o início da medicação. “Não” (-1) se aplica quando o evento adverso se desenvolveu antes da primeira dose do medicamento. “Desconhecido” (0) se aplica se a informação não estiver disponível ou não estiver clara. Questão 3. O evento adverso melhorou quando o medicamento foi suspenso ou um antagonista específico foi administrado? Essa questão avalia a resposta à suspensão da medicação. A resposta “sim” (+1) se aplica caso o evento adverso diminua ou desapareça a qualquer momento após a interrupção da medicação ou se a reação desaparecer após a administração de um antagonista farmacológico específico (por exemplo, um anticolinérgico administrado para uma reação colinérgica à fisostigmina). A resposta “não” (0) se aplica se o evento adverso não melhorar com a suspensão da medicação ou se não melhorar em resposta a uma terapia específica, como um antagonista, por exemplo. A resposta “não sei” (0) aplica-se se a medicação não foi interrompida ou se o curso subsequente foi desconhecido, inconclusivo ou pouco claro. Questão 4. A reação adversa reapareceu quando a droga foi readmi- nistrada? Essa questão avalia a resposta à reexposição. Uma resposta “sim” (+2) indica que a medicação foi interrompida, o evento adverso foi resolvido ou melhorado e houve um reaparecimento inequívoco ou uma piora da reação quando o medicamento foi reiniciado em uma dose semelhante e pela mesma via. A escala de Naranjo também permite um “sim” se a associação causal for bem conhecida e a retirada do medicamento não puder ser realizada por razões clínicas ou éticas. Uma resposta de “não” (-1) só se aplica se a reexposição foi feita, mas o evento adverso não reapareceu ou piorou. A resposta “desconhecido” (0) aplica-se se a reexposição não foi feita, se não houver informação sobre a reexposição ou se a reação foi ambígua. Questão 5. Existem causas alternativas que por si só causaram a reação? Essa questão avalia explicações alternativas para o evento adverso. Como os eventos adversos são frequentemente inespecíficos e podem ser manifestações da doença em tratamento ou condição conco- mitante não relacionada, outros diagnósticos precisam ser considerados. A resposta “não” (+2) aplica-se caso as alternativas tenham sido excluí- das, com base em uma avaliação sistemática e completa, implicando mais fortemente com o medicamento. Um fator de risco ou suscetibilidade 15Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas não é uma causa alternativa. A resposta “sim” (-1) se aplica quando há uma causa ou explicação alternativa. “Desconhecido” (0) se aplica se a investigação de outras causas estiver incompleta, inconclusiva ou não tiver sido feita. Questão 6. Reação reapareceu quando um placebo foi administrado? Essa questão aplica-se a estudos clínicos em que um placebo foi admi- nistrado. A resposta “sim” (-1) aplica-se se a medicação foi interrompida e a reação adversa se resolveu ou melhorou de forma conclusiva e, consequentemente, houve um reaparecimento da reação adversa após a administração de placebo (simples ou duplo cego). A resposta “não” (+1) se aplica se a reação não reaparecer ou piorar após a administração do placebo. “Desconhecido” (0) aplica-se se a administração do placebo não foi feita ou se os resultados foram inconclusivos. Questão 7. O medicamento foi detectado no sangue ou há outros fluidos em concentrações conhecidas como tóxicas? Essa questão aplica-se especificamente a reações adversas dose-dependentes quando estão disponíveis concentrações do fármaco no sangue ou urina. A resposta “sim” (+1) se aplica se a concentração estiver na faixa tóxica ou supra- terapêutica aceita. “Não” (0) aplica-se se a concentração estiver abaixo do intervalo tóxico. A resposta “desconhecido” (0) aplica-se se os níveis de droga não estiverem disponíveis ou forem inconclusivos. Questão 8. A reação foi mais severa quando a dose foi aumentada ou menos severa quando a dose foi diminuída? Essa questão avalia a relação dose-resposta da medicação e da reação adversa. “Sim” (+1) se aplica se o evento adverso foi mais grave ou piorou quando a dose da medicação foi aumentada ou se foi menos severa e melhorou quando a dose foi diminuída. “Não” (0) aplica-se se não houve alteração significativa na gravidade do evento adverso com a modificação da dose. “Desconhe- cido” (0) aplica-se se a dose não foi alterada ou se a informação não estava disponível ou era inconclusiva. Questão 9. O paciente teve uma reação semelhante ao mesmo medica- mento ou a medicamentos similares em qualquer exposição anterior? Essa questão é direcionada ao histórico médico de RAM ao mesmo medicamento ou a um medicamento estruturalmente relacionado. “Sim” (+1) se aplica quando há documentação de uma reação similar anterior ao medicamento específico ou a um medicamento relacionado. “Não” (0) se aplica quando o paciente não tem uma exposição anterior ao mesmo Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas16 medicamento ou quando o paciente não desenvolveu a reação adversa em uma exposição anterior ao mesmo medicamento ou medicamentos relacionados. “Desconhecido” (0) se aplica quando não há informações sobre reações anteriores ou quando a informação é inconclusiva. Questão 10. O evento adverso foi confirmado por alguma evidência objetiva? A última questão avalia a qualidade dos dados sobre os quais o evento adverso é avaliado. “Sim” (+1) indica que há documentação de teste laboratorial da reação adversa ou se o evento foi diretamente ob- servado por uma pessoa qualificada (por exemplo, uma erupção cutânea descrita em anotações de enfermagem ou médico). A resposta “Não” (0) aplica-se quando nem os testes laboratoriais nem a documentação clínica direta podem verificar a reação. “Desconhecido” (0) aplica-se se não houver informação específica disponível (sem testes laboratoriais e sem descrição clínica) ou se a informação for inconclusiva. 1. As RAMs podem ser classificadas de diversas maneiras. A maneira utilizada amplamente nos dias atuais é a classificação de Rawlins e Thompson, modificada por Wills e Brown. Segundo essa classificação, podemos afirmar que: a) a letra B classifica as reações como bizarras quando o risco de morte é eminente. b) a letra A classifica as reações relacionadas à polifarmácia. c) a letra C classifica as reações de acordo com a dose. d) a letra E trata das reações que são inevitáveis devido à abstinência ao medicamento. e) a letra H está relacionada, principalmente, a reações alérgicas. 2. Segundo a ANVISA, por hora, três cidadãos são afetados pelo consumo excessivo de medicamentos. Considerando as RAMs, assinale a alternativa correta. a) RAM é um evento que está diretamente ligado à dose do medicamento. b) Uma droga utilizada como profilática não pode apresentar alguma RAM. c) A RAM somente é considerada grave quando leva o paciente a óbito. d) Pacientes com diversas patologias apresentam maior risco de apresentar RAM. e) É uma reação prevista e consciente já determinada na bula. 17Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas 3. Ao receber uma notificação de suspeitas de RAM em um hospital, por exemplo, o farmacêutico deve avaliar o paciente, aplicar o algoritmo de Naranjo e acompanhar a evolução do paciente. Sobre o algoritmo de Naranjo, é correto afirmar que: a) é o único método para detecção de RAM. b) pode determinar se o paciente está experimentando uma RAM por meio de questionário. c) trata de RAM e utiliza exame clínico, além de questionário. d) deve ser utilizado para acompanhamentodo paciente após identificação de RAM. e) não é um método extremamente robusto e deve ser utilizado apenas quando não existe outra opção. 4. Os scores do algoritmo de Naranjo estão relacionados: a) à causa das RAMs. b) ao tipo de RAM. c) à classificação da RAM. d) às informações obtidas por meio do paciente. e) ao entendimento do profissional farmacêutico. 5. A RDC nº. 18 de 2014 dispõe sobre a comunicação à ANVISA dos casos de descontinuação temporária e definitiva de fabricação ou importação de medicamentos, reativação de fabricação ou importação de medicamentos e dá outras providências. Essa norma é válida para todos os medicamentos, incluindo os fitoterápicos e dinamizados. Considerando essas informações, é correto afirmar sobre notificações de RAM, que: a) somente profissionais da saúde podem realizar a notificação. b) todos os cidadãos podem realizar a notificação. c) apenas fiscais da vigilância sanitária podem realizar a notificação. d) apenas as indústrias farmacêuticas podem realizar a notificação. e) as notificações somente são aceitas para medicamentos novos. Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas18 AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Perguntas frequentes: farmacoviglância. 2018. Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/documents/33868/2895429/Pergun tas+frequentes+%E2%80%93+Farmacovigil%C3%A2ncia/f8935efb-7ba4-404e-96a7- 271871f5f9d2>. Acesso em: 10 nov. 2018. AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. RDC nº. 36, de 25 de julho de 2013. Institui ações para a segurança do paciente em serviços de saúde e dá outras providências. Bra- sília, DF, 2013. Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/documents/10181/2871504/ RDC_36_2013_COMP.pdf/36d809a4-e5ed-4835-a375-3b3e93d74d5e>. Acesso em: 10 nov. 2018. ARONSON, J. K.; FERNER, R. E. Joining the DoTS: new approach to classifying adverse drug reactions. BMJ: British medical journal, v. 327, n. 7425, p.1222, 2003. ARULMANI, R.; RAJENDRAN, S. D.; SURESH, B. Adverse drug reaction monitoring in a secondary care hospital in South India. British journal of clinical pharmacology, v. 65, n. 2, p. 210-216, 2007. Disponível em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/ PMC2291214/>. Acesso em: 10 nov. 2018. CONTI, L. M. Z. Reações adversas a medicamentos. A Folha Médica, v.78, n.3, p.29-33, 1979 NARANJO, C. A. et al. A method for estimating the probability of adverse. Clinical Pharmacology and Therapeutics, v. 30, n. 2, p. 239-245, 1981. Leituras recomendadas AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. RDC nº. 18, de 04 de abril de 2014. Dis- põe sobre a comunicação à Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA dos casos de descontinuação temporária e definitiva de fabricação ou importação de medicamentos, reativação de fabricação ou importação de medicamentos, e dá outras providências. Brasília, DF, 2014. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/ bvs/saudelegis/anvisa/2014/rdc0018_04_04_2014_rep.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2018. FIGUEIREDO, P. et al. Reações Adversas a Medicamentos. Portal ANVISA, p. 32-39, 2018. Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/documents/33868/2894427/Reações+ Adversas+a+Medicamentos/1041b8af-9cde-4e94-8f5c-9a5fe95f804d>. Acesso em: 10 nov. 2018. 19Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas MASTROIANNI, P.; VARALLO, F. R. (Org.). Farmacovigilância para Promoção do Uso Correto de Medicamentos. Porto Alegre: Artmed, 2014. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Segurança dos medicamentos: um guia para detectar reações adversas a medicamentos. Brasília, DF: OPAS/OMS, 2004. Disponível em: <http://www.cvs.saude.sp.gov.br/zip/Seguranca%20dos%20medicamento.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2018. ROZENFELD, S. Farmacovigilância: elementos para a discussão e perspectivas. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 14, n. 2, p. 237-263, 1998. Disponível em: <http:// www.scielo.br/pdf/csp/v14n2/0346.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2018. SCHATZ, S.; WEBER, R. Adverse Drug Reactions. 2015. Disponível em: <https://www.accp. com/docs/bookstore/psap/2015B2.SampleChapter.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2018. Reações adversas aos medicamentos: conceito, classificação e interações medicamentosas20 Conteúdo:
Compartilhar