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UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - UNIJUI DÉBORA MAPELI A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO E OS DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS Santa Rosa - RS 2020 DÉBORA MAPELI A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO E OS DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Psicologia da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - UNIJUÍ, como requisito parcial à obtenção do título de Psicólogo. Orientadora: Doutora Taís Cervi Santa Rosa - RS 2020 AGRADECIMENTOS Agradeço a toda minha família pelo apoio, compreensão e paciência durante esta caminhada, principalmente aos meus pais do coração Armindo e Maria que sempre me guiaram, acreditaram nos meus sonhos e me incentivaram a buscar eles. Agradeço ao meu namorado Juliano, por estar sempre ao meu lado, me dando força nos momentos mais difíceis, me motivando, sendo carinhoso, gentil, alto astral. És meu porto seguro. Agradeço também às minhas amigas Andrize Griza e Nadine Krauss, colegas já formadas que me acompanharam e seguiram junto durante um longo período da graduação. Nossa amizade construída pelas tantas trocas, conselhos e amparo permanecerá para toda vida. Agradeço a Professora Doutora Taís Cervi, minha orientadora neste trabalho, que norteou e direcionou minhas ideias sempre de forma acolhedora, profissional e também humana. Que mesmo com tantas turbulências ocasionadas pelo momento que o mundo enfrentou, não poupou esforços para cumprir com excelência o seu papel na minha formação. “Não creio que seja necessário saber exatamente quem sou. O principal interesse na vida e no trabalho consiste em chegar a ser alguém diferente do inicial. Se, ao começar um livro, você souber o que vai dizer no final, acredita que teria valor escrevê-lo?” (Foucault, 1990, p. 45) RESUMO O estudo apresenta uma revisão histórica da Psicologia Organizacional e do Trabalho (POT), considerando seu aspecto evolutivo e a continuidade de sua transformação demandada pela contemporaneidade. Discorre também sobre o entendimento das práticas que constituem o campo de atuação do psicólogo dentro da área e os desafios que esses profissionais enfrentam diante das problemáticas relacionadas ao trabalho. Diante disso, através de elementos das obras de autores estudiosos da POT, o estudo visa também uma investigação do cenário atual da disciplina. Palavras-chave: Trabalho. Psicologia Organizacional e do Trabalho. Organizações contemporâneas. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................... 7 1 A TRANSFORMAÇÃO DO TRABALHO ...................................................... 10 1.1 A contemporaneidade e suas faces ....................................................... 12 2 CONTRUÇÕES HISTÓRICAS SOBRE A PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO ........................................................................................... 17 2.1 A Psicologia Organizacional e do Trabalho no contexto internacional ......................................................................................................................... 17 2.2 A Psicologia Organizacional e do Trabalho no contexto nacional ...... 24 2.3 Discussões acerca da nomenclatura ..................................................... 27 2.4 A formação do Psicólogo Organizacional e do Trabalho no Brasil ..... 30 2.5 O papel do psicólogo organizacional e do trabalho .............................. 32 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 36 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................ 38 INTRODUÇÃO Neste trabalho apresentamos uma investigação sobre a construção da Psicologia Organizacional e do Trabalho (POT) e as formas de atuação do psicólogo no contexto contemporâneo. O interesse pelo tema foi despertado durante a realização de um estágio extra curricular no setor de recursos humanos de uma empresa, onde foi possível ter contato com os processos envolvidos na atuação de um psicólogo organizacional, bem como participar ativamente dos mesmos. Esse contato com a prática despertou a curiosidade em pesquisar sobre as possibilidades de trabalho da POT, de modo a agregar conhecimento e novas percepções para continuar atuando nesta área depois de concluída a graduação. A POT consolidou-se como uma disciplina científica, contribuindo para o avanço do conhecimento sobre o comportamento humano no contexto do trabalho. O conjunto de atividades que constituem esse campo de atuação e as interfaces necessárias que estabelecem com outras áreas e saberes, revelam a complexidade das competências esperadas para inserção e atuação nessa área (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2004). De acordo com Rothmann e Cooper (2009) a POT é uma das áreas que vem crescendo muito, sendo considerada uma das mais estudadas nesses últimos anos e reconhecida como um campo em ascensão de atuação da psicologia. Em sua tese de doutorado, Pereira (2015) apresenta a POT como uma das áreas que mais empregam psicólogos no Brasil. Uma das justificativas dessa inserção se refere à importância do trabalho na sociedade. Citando a pesquisa de Malvezzi, Souza e Zanelli (2010), observamos que 18,1% dos recém-formados têm seu primeiro emprego na área organizacional, sendo esta a segunda especialidade mais atrativa (a primeira continua sendo a clínica, com 35,3 %). Isso aponta para a necessidade de maiores produções teóricas acerca da associação entre as práticas percebidas na atualidade. O trabalho sempre ocupou um lugar importante na cultura. Para Dejours (1992), psiquiatra e psicanalista francês que estudou o sofrimento psíquico no trabalho, este seria um regulador social, fundamental para a subjetividade 8 humana e, quando possibilita ao trabalhador uma estruturação positiva de sua personalidade, pode inclusive aumentar a resistência dos sujeitos aos desequilíbrios psíquicos e corporais. Contudo, quando não ocorre uma canalização de seus medos ao meio em que está inserido, acaba por ser gerador de sofrimento psíquico. O conceito de trabalho passou a gerar discussões e reflexões teóricas nos dois últimos séculos. O trabalho ocupa a vida inteira de algumas pessoas, nossa própria existência é direcionada ao trabalho. Desde cedo as pessoas são preparadas para ingressarem no mercado e depois passam grande parte do dia e da vida trabalhando. O trabalho passou a ser o principal meio de vínculo social, preenchendo funções importantes na vida do sujeito e promovendo a interação (BASTOS, 2007). Um dos aspectos que caracteriza o trabalho na contemporaneidade é a gestão neoliberal ocorrida pela globalização, que modifica o mundo capitalista e também a Psicologia, uma vez que a evolução tecnológica entra cada vez mais em cena, mudando as condições e os interesses trabalhistas que buscam alcançar e se adaptar aos novos padrões (FLACH; GRISCI; SILVA; MANFREDINI, 2009). Percebe-se que ao longo dos anos muitas modificações vão ocorrendo na organização da sociedade, muitos princípios que norteavam a vida humana foram sendo abandonados e novos começam a ser construídos. Ao lançar um olhar para o passado, antes mesmo da existência da psicologia nas organizações, nota-se uma significativa mudança no campo do trabalho, desde o significado deste na vida das pessoas, até a forma de gestar os meios de produção. Diante disso, o objetivo deste trabalho é traçar o caminho pelo qual a POT atravessou para chegaraté a construção atual e relacionar com os desafios que surgem da contemporaneidade. Entender as concepções que já fizeram parte da prática psicológica nas organizações é indispensável para analisar quais as possibilidades de atuação em uma perspectiva evolutiva. 9 A metodologia utilizada para a construção do trabalho contou, em um primeiro momento, com o levantamento de bibliografias referentes ao tema, partindo de uma pesquisa em algumas bases de dados, revistas e artigos publicados nos Periódicos Eletrônicos de Psicologia (PePSIC) e Scientific Electronic Library Online (SciELO). Em seguida, foram selecionados os autores importantes da área no Brasil como José Carlos Zanelli, Jairo Eduardo Borges- Andrade, Antonio Virgíliio Bittencourt e também o autor Christophe Dejours que são interlocutores neste estudo. Importante destacar que foram utilizados também, artigos acadêmicos e publicações do site da Sociedade Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho e da Revista Psicologia: Organizações e Trabalho. Portanto, para dar conta deste estudo e melhor compreender o tema, dividimos o trabalho em dois capítulos. No primeiro, trataremos das mudanças de concepção do trabalho, desde seu significado ao longo das épocas até a contemporaneidade. O modelo de trabalho marcado pela flexibilidade, metas e um ritmo acelerado exige que a psicologia consiga intervir e acompanhar e as demandas e consequências desse movimento de mudança constante. O segundo capítulo trata da história da Psicologia Organizacional e do Trabalho, traçando de forma cronológica uma perspectiva da sua evolução, refletindo também sobre as dificuldades e desafios da disciplina. A partir do percurso histórico entende-se que a psicologia vai se transformando conforme as demandas e necessidades sociais e a cada passo novos estudos e avanços contribuem para sua abrangência. A partir disso, o capitulo traz também a importância do psicólogo dentro das organizações, apontando algumas de suas ações mais comuns e destacando a responsabilidade de suas práticas serem voltadas à promoção de saúde. 10 1 A TRANSFORMAÇÃO DO TRABALHO Para entendemos as mudanças e a importância que a psicologia tem para o mundo do trabalho, é preciso também compreender o que este significa e qual a relação dele com o homem e com a sociedade (SANTOS, CALDEIRA, 2015). Para tanto, trataremos neste capítulo de trazer considerações sobre os aspectos históricos e concepções que vislumbram o seu sentido. Segundo Albarnoz (1988), a palavra “trabalho’’ tem origem do latim medieval tripalium e caracterizava um artefato composto de três paus aguçados, alguns até mesmo com ponta de ferro, no qual os agricultores batiam o trigo, milho, e desfiavam o linho. A maioria dos dicionários registra tripalium apenas como um instrumento de tortura, que teria sido a função original do objeto ou se tornado depois. Borges e Yamamoto (2014) trazem em seu texto a ambiguidade do sentido do trabalho. Cotidianamente ouvimos frases como “primeiro o trabalho, depois o prazer”. Dessa forma: “ao mesmo tempo que exalta a importância do trabalho, tornando-o como uma prioridade de vida, supõe-no oposto ao prazer, como se este existisse apenas fora do âmbito laboral (BORGES, YAMAMOTO, 2014, p.25). Por outro lado, também ouvimos pessoas que falam sobre seus trabalhos com orgulho, explicando detalhes do que fazem e como fazem. A questão é que múltiplos sentidos podem ser relacionados ao trabalho, desde a garantia da subsistência até muito mais que isso. Bauman (2001) trata o trabalho como um conceito básico em que a condição humana passa a construir suas narrativas. Para o autor, nos tempos de “modernidade sólida”, período em que o trabalho era vinculado ao capital de forma estável, passa a ser uma espécie de esforço coletivo, conquistando o feito de “condição natural’’, logo, o fato de não trabalhar seria uma “anormalidade’’. A ética e moralidade estavam associadas ao trabalho de maneira a elevar os padrões da sociedade. 11 O trabalho incialmente era extrativista, apenas um esforço complementar ao trabalho da natureza. A subsistência era garantida pela coleta de frutos, pesca e caça. Depois a agricultura surge amparada em duas hipóteses para sua origem: a primeira seria a descoberta ao acaso, quando um incêndio de floresta destrói a vegetação, assim as pessoas podem ter percebido que as sementes cresciam nas cinzas. A outra suposição é de que as mulheres tenham forçado o desenvolvimento da agricultura, já que a vida nômade era um empecilho para mulheres grávidas ou com bebê de colo e dessa forma se negaram a seguir adiante. Assim, sentiram a necessidade de começar a plantar para a sua sobrevivência. Por conta desse fato, os povos primitivos teriam a divisão do trabalho onde mulheres plantavam e homens caçavam (ALBARNOZ,1998). Para França (2011) na concepção clássica do trabalho, que surge no berço da Grécia e Roma antigas, o indivíduo e a tarefa eram desprovidos de valor, o que importava era o atendimento das necessidades básicas. Ao longo da Antiguidade, Idade Média e Renascimento o trabalho não representava importância na construção subjetiva pois não havia atribuições de prestígio e poder relacionados a ele. A exemplo disso, na Grécia antiga, o trabalho era considerado uma atividade inferior e humilhante, destinada às mulheres e aos escravos. O trabalho intelectual, como o cultivo da razão, este sim era importante e pertencia às classes superiores. Filósofos importantes da época como Platão e Aristóteles exaltavam a ociosidade. Para Platão o cidadão deveria ser poupado do trabalho. Aristóteles dava grande valor a política e entendia o trabalho como atividade que impedia as pessoas de terem virtudes (BORGES & YAMAMOTO, 2014). Albarnoz (1988) aponta que na tradição judaica “o trabalho também é encarado como uma labuta penosa, à qual o homem está condenado pelo pecado’’ (p.51). O trabalho é apresentado na Bíblia como um castigo pelo homem ter perdido a inocência original no paraíso. Adão é condenado a ganhar o pão com o suor de seu rosto e Eva é condenada às dores do parto. 12 Ainda para Albarnoz (1998) o Cristianismo em seus primeiros tempos também via o trabalho como punição e pecado. Já no tempo de Agostinho, o trabalho devia ser obrigatório, mas alternado com oração, e na medida para satisfazer as reais necessidades da comunidade. Foi com a Reforma protestante que o trabalho é reavaliado dentro do cristianismo e passa a ser a chave da vida. O ócio passou a ser visto com maus olhos e o trabalho passou a ser uma vocação e um modo de servir a Deus. A ideia de trabalho como fonte de identidade e auto-realização humana, se constituiu a partir do Renascimento. O trabalho passa a ver visto não mais como uma ocupação servil, mas sim como uma possibilidade de desenvolvimento, transformação e de liberdade (RIBEIRO, LÉDA, 2004). A visão do trabalho renascentista abrangeu a soma das ideias cristãs às greco-romanas. A quebra das certezas sobre o universo com a descoberta que a Terra gira em torno do Sol e de que o mar não leva para o fim do mundo e sim para outros continentes promoveu grandes mudanças nas estruturas de pensamento. O trabalho foi então visto como um meio do homem ser criador de sua própria atividade, capaz de realizar qualquer feito (ALBARNOZ, 1988). Nessa época o artesão era dono dos seus próprios instrumentos de trabalho sendo capaz de transforma-lo, aprender e ver seus próprios resultados (SILVA; VIEIRA; GUIMARÃES; MELO, 2017). 1.1 A contemporaneidade e suas faces É com o surgimento do capitalismo que novas ideias sobre o trabalho vão sendo consolidadas. Albarnoz (1988) afirma que com a ciência aplicada à produção, a expansão capitalista deu origem a Revolução Industrial. A autora destaca três estágios de desenvolvimento da tecnologiapresentes na era moderna. O primeiro, com a invenção da máquina a vapor no século XVIII, o segundo se caracteriza pelo uso da eletricidade, no século XIX e o estágio mais presente marcado pela automação: a invenção do computador, no século XX. 13 Para Silva, Vieira, Guimarães e Melo (2017) com a Revolução Industrial, a organização e as novas formas de pensar a produção dão origem ao capitalismo. A sobrevivência do trabalhador passa a depender da força de trabalho, pois já não é mais ele o detentor dos meios de produção. O surgimento do contrato de trabalho se dá a partir da troca do trabalho pelo capital, onde o indivíduo desprovido dos meios de produção passa a vender seu trabalho, a força do trabalho passa a ser uma mercadoria. Além disso, com o tempo surge a concepção de instrumentalidade do trabalho, em que este valia mais quando o rendimento do detentor do capital aumentava (BORGES & YAMAMOTO, 2014). Borges e Yamamoto (2014) trazem as contribuições de Marx (1975) e Marx e Engels (1982) sobre a visão do desenvolvimento capitalista. Para eles apesar de haver uma construção ideológica a respeito da dedicação máxima ao trabalho e as possibilidades de poder como recompensa, a insatisfação pela exploração sentida despertou reações nos trabalhadores. A luta em torno da regulamentação da jornada de trabalho é um exemplo disso. Ainda trazendo os apontamentos de Marx e Engels (1982), Borges e Yamamoto (2014) tratam da massificação da produção como uma impossibilidade de identificação do trabalhador com o que ele próprio produz, já que é uma fragmentação de um processo. Dessa forma, interliga-se a força do trabalho como mercadoria à alienação, já que o trabalhador não tem controle sobre o produto e nem detém os meios de produção. Relacionando as questões psíquicas implicadas no modelo de produção capitalista, Dejours (1998) em sua obra A Loucura do Trabalho, fala do sofrimento dos trabalhadores e discorre sobre os mecanismos de defesa desenvolvidos por eles para enfrentarem a realidade. Essa ideologia defensiva acaba sendo desenvolvida com a finalidade de abafar questões relacionadas a morte, a doença, o corpo, a sexualidade e suas inúmeras angústias existenciais. 14 Bauman (2001) caracteriza a “modernidade sólida’’ a partir das constantes revoluções a partir do século XV e da quebra de padrões ligados à Idade Média, também anteriormente sólidos, que dão lugar ao avanço das ideias do capitalismo. O emprego da razão instrumental e o iluminismo levaram a modernidade a depositar no homem grandes esperanças que antes eram destinadas à religião e a magia. O autor traz como exemplo da concretude da modernidade sólida a fábrica fordista, grandiosa, imponente e firme, onde a organização do capital e o trabalho eram vistos como garantia de estabilidade duradoura. No século XX o desenvolvimento se acelera e as incertezas passam a fazer parte da sociedade. Para Bauman (2001) a modernidade líquida é a fase seguinte da modernidade sólida e a intensificação da mesma. O que era sólido novamente se derrete, a forma líquida dá a possibilidade de a qualquer momento adquirir formas diferentes e desejadas. O trabalho hoje para Albarnoz (1988) é “um esforço planejado e coletivo “(p.25), grandes multinacionais foram se instalando pelo mundo, até mesmo em regiões marginais e empregam muitas pessoas que passam a depender dessas organizações. Cada vez mais o trabalho autônomo passa a ser trocado por um emprego na organização, ou mesmo “pelo desemprego ante a organização’’ (ALBARNOZ, 1988, p. 26). Albarnoz (1988) cita o pensamento de Hannah Arendt, a pensadora do século XX. Diante da contemporaneidade Arendt repensa a distinção grega entre labor, práxis e poiesis. Para a autora o mundo contemporâneo reduz o trabalho ao nível de labor, um esforço cansativo e rotineiro com o único objetivo da sobrevivência. Na perspectiva de Bauman (2001) o trabalho foi perdendo o valor que se tinha na modernidade sólida e do capitalismo pesado. A ideia de segurança, identidade e projetos de vida passam a não ser fixadas no trabalho. Um significado puramente estético passa a ser atribuído a ele e espera-se que seja satisfatório por si mesmo e em si mesmo, sem levar em conta o impacto desse 15 na humanidade e a elevação dos padrões éticos da sociedade. Uma minoria de pessoas ainda honram a importância e os benefícios comuns do trabalho (FERNANDES; GONÇALVES; OLIVEIRA; PORTUGAL, 2012). De acordo com Rohn e Lopes (2015) na contemporaneidade, marcada pela pós-modernidade, começa a acontecer uma reestruturação econômica. Para haver a manutenção do capitalismo começou-se a adotar medidas em relação à flexibilização do capital. O processo de trabalho deixa de ter uma base taylorista-fordista para ser substituído pelo toyotismo e para isso esse novo sistema de produção flexível, um novo tipo de trabalhador precisou surgir: Não seria mais suficiente um trabalhador que vencesse a separação entre atividades mentais e manuais do período taylorista. Exige-se um trabalhador que integre pensamento e ação, e que também possa criar, produzir conhecimentos úteis para a organização capitalista. Esse processo não se constitui mais de operários que executam tarefas repetitivas, mas de trabalhadores do conhecimento, cuja função é agregar outro tipo de valor aos produtos ou nos processos de produção e gestão (ROHN, LOPES, 2015, p.339). Esse modelo de trabalhado exige profissionais de fácil adaptação e resilientes. O cenário é de demandas cada vez mais complexas e imprevisíveis e o ambiente de trabalho é competitivo. Dessa forma, não ocorre um grau de envolvimento afetivo na relação com o trabalho, potencializando assim riscos à saúde psíquica do sujeito (DEJOURS, 1998). Silva, Vieira, Guimarães e Melo (2017) falam sobre as ideias de Bauman (2001) que aponta para o problema do trabalho ser tomado apenas pelo grau de eficiência, uma vez que o trabalhador se vê despido de suas garantias e perspectivas sólidas e assume uma relação onde não existe chance de lealdade. A nova identidade de trabalho é comparada a um acampamento onde as pessoas visitam por alguns dias e sentem-se à vontade para ir embora a qualquer momento quando não percebem vantagens. As formas de regulamentação trabalhista se transformam em “contratos temporários”, “horário flexível’’, “trabalho part-time”, “redução de jornada”, “teletrabalho” e outras formas que acabam impedindo o trabalhador de participar do coletivo. Além disso, o número de trabalhadores terceirizados aumenta cada 16 vez mais bem como os trabalhos ditos “frios’’, onde não são submetidos a nenhuma lei que ampara o trabalhador (ROHN, LOPES, 2015). Com todas as mudanças, rupturas de padrões e incertezas que o mundo vem demonstrando, o homem moderno enfrenta diferentes desafios, e o trabalho é visto como uma das grandes inquietações da contemporaneidade (SILVA, VIEIRA, GUIMARÃES E MELO, 2017). Como percebemos ao longo desse capítulo, os reflexos da flexibilização e os vínculos fragilizados de trabalho se deslocam muitas vezes para a saúde do trabalhador, que diante das exigências da organização passam a lidar com uma carga grande de diversos sentimentos. Daí a importância de ter um profissional capacitado para acolher e entender esses fenômenos. 17 2 CONTRUÇÕES HISTÓRICAS SOBRE A PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO Assim como as mudanças na concepção sobre o trabalho refletem o pensamento de cada época, a POT da mesma forma se constrói a partir dessas demandas. O contexto social, o avanço do conhecimento tecnológico e também as interações interdisciplinares que surgiram ao longo do tempo traçaram uma identidade dos profissionais da psicologia que se dedicaram a entender como as organizações se estruturam e atuam (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014).Considerada como uma das disciplinas de grande ascensão, é importante conhecermos os aspectos de sua múltipla trajetória para poder compreender suas dimensões teóricas, influências e relações socioculturais. (DALBOSCO; ROSA; PISONI, 2016). Nesse sentido, ao longo do texto serão resgatados elementos históricos constitutivos da POT que serão visualizados no contexto internacional e nacional, e também serão apresentados alguns dos desafios em torno da disciplina e sua responsabilidade dentro das organizações. 2.1 A Psicologia Organizacional e do Trabalho no contexto internacional Segundo as ideias de Peirró (2011) existe uma grande dificuldade de demarcar com exatidão o início de uma disciplina ou um campo profissional. O campo vai se constituindo através de contribuições de autores de diferentes momentos e nem sempre de forma intencional. Porém, um conjunto de fatores levam a associação de um nome que marca uma forma de pensar sobre algo já existente, e que influência outros autores a também se basear e dar uma continuidade na produção de pensamento (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). Dessa forma, na POT destaca-se precursores como Patrizi, em Modena, que em 1899 criou um laboratório para pesquisar a fadiga; Kraeplin, na Alemanha, e Mosso, na Itália, que nos anos 90 estudaram aspectos psicofisiológicos relacionados à carga de trabalho; Lahy, na França, que foi um 18 dos iniciantes na utilização de testes na seleção de trabalhadores; e Scott que em 1903, publicou o livro The teory of Advertising, sobre a psicologia da publicidade (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). Contudo, em 1913 foi publicada por Hugo Munsterberg a obra Psychology and Industrial Efficiency, que focalizou as técnicas de seleção de pessoal e de ajuste funcional que marcou de forma importante o nascimento da Psicologia Industrial (BASTOS, 2007). A obra discorre sobre a busca do homem certo para o lugar certo como forma de aproveitar as habilidades já desenvolvidas para promover satisfação ao trabalhador e produtividade para as empresas. Além disso, influenciou a recomendação de reorganizar os trabalhadores em seus postos de modo que não fosse possível que conversassem entre si, pois se interpretava que este seria um fator que diminuía a produtividade (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). Nessa mesma época os trabalhos de Frederick Taylor, pioneiro da administração científica tiveram grande espaço. Sua obra destinava estabelecer critérios para orientar a ação laboral e aumentar a produtividade (BASTOS 2007). Com tais ideias conseguiu elaborar um planejamento de funções afim de melhorar a atuação dos profissionais facilitando a especialização das funções e o aumento de produção em massa. Contudo, suas ideias também sofreram represálias por conta de abranger somente os ganhos da empresa e não levar em conta o fator humano, visando somente resultados e produzindo fenômenos na ordem da alienação dos empregados (ROTHMANN; COOPER, 2009). Para Dejours (1992) o sistema de Taylor produz consequências na saúde do corpo do trabalhador. A nova tecnologia gera exigências fisiológicas provocadas principalmente pelo controle do tempo e ritmo e que começaram a impactar a saúde física. As performances desejadas eram novas e o esgotamento não poupou o conjunto todo de operários pelos prejuízos da demanda de trabalho. “Ao separar, radicalmente, o trabalho intelectual do trabalho manual, o sistema Taylor neutraliza a atividade mental dos operários” (DEJOURS, 1992, p. 18-19). 19 De acordo com Sampaio (1998) com a psicologia atrelada aos interesses das indústrias, o Taylorismo traz consigo a “Lei da Fadiga”. Essa lei apontava a necessidade de intervalos periódicos, bem como o direito de repouso semanal remunerado, para que houvesse uma recuperação muscular. A lei também apontava para a divisão do trabalho em partes, para que cada um trabalhasse somente na parte condizente com suas habilidades. Tudo isso foi determinado cientificamente visando a implantação de cotas de produção para os empregados. O motivo do interesse em estudar a maneira pelas quais as tarefas eram executadas se dava pela crescente demanda de produtividade e maximização do trabalho humano (BASTOS, 2007). Dejours (1992) ao retomar as principais fases históricas para explicar as dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores em relação a saúde, comenta que o século XIX caracterizou-se como a luta pela sobrevivência. Foi um período marcado pelo crescimento da produção e desenvolvimento do capitalismo. As condições de trabalho eram desumanas: crianças trabalhavam frequentemente a partir dos 7 anos, a carga horária ultrapassava 14 horas por dia, os salários não asseguravam as necessidades básicas como alimentação e moradia, as condições de higiene eram precárias e o esgotamento físico era evidente. Tudo isso cria uma condição de alta morbidade, mortalidade e longevidade reduzida. As ideias de Munsterberg e Taylor de certa forma se conectavam, e essa aproximação do entendimento que se tinha sobre o trabalho, desenvolvimento e capacidade humana revela a imersão em um cenário de crescente industrialização, aumento populacional e o aumento da procura por bens de serviço. A psicologia industrial nasceu ao lado da administração científica, e por isso muito se sobrepôs entre um campo e outro, já que ambos estavam implicados no desenvolvimento dos modelos de gestão focados na produtividade (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). Segundo Bastos (2007) no período referente aos anos 20 e 30 os psicólogos tinham suas atividades destinadas ao treinamento de pessoas e também à pesquisas relacionadas aos fatores ambientais que afetavam a 20 produtividade. Muitos desses estudos com o viés behaviorista buscavam avaliar estímulos e respostas do grupo de trabalhadores, ainda com o objetivo de melhorar os processos para atingir maior produtividade. Já no ano de 1924, um estudo iniciado na unidade Hawthorne Works, da Western Electric Company, em Chicago, buscou avaliar em um primeiro momento a reação dos funcionários em relação às alterações de luminosidade na fábrica. Anos depois, o estudo passou a ser dirigido por Elton Mayo, que teve seu reconhecimento validado pelas descobertas que mudaram a forma de conceber o trabalho (BASTOS, 2007). Bastos (2007) aponta que Mayo chegou a conclusão a partir dos seus estudos, que diferente do que se pensava sobre a eficiência baseada em regras e em processos rígidos determinados cientificamente, a produtividade dos trabalhadores parecia associada a um conjunto complexo de razões: Mayo chegou à conclusão de que eram mais importantes as relações humanas e os sentimentos A satisfação estava associada à valorização da ‘função social’’ do indivíduo. Enfim, Mayo percebeu que os fatores psicológicos e subjetivos tinham mais importância do que os fisiológicos. (BASTOS, 2007, p. 26). Esse novo pensamento relacionado ao universo do trabalho trouxe à tona a concepção de que para muito além do trabalho puramente laboral existe a individualidade com as noções de pertencimento e aceitação. Conforme destacam Zanelli, Borges-Andrade e Bastos (2014) as ciências do comportamento baseadas nas questões contextuais do ser humano, tiveram grande relevância no mundo dos negócios e a obra de Mayo, divulgada em 1933 denominada The Human Problems of Industrial Civilization apresentou seus estudos e foi o impulso inicial para o campo e para a era das relações humanas. Além disso, ao falarmos de relações humanas é importante marcar a Teoria X (tradicional) e a Teoria Y (emergente) de McGregor, divulgadas em 1960, na obra The Human Side of Enterprise. Nesse estudo, veem-se dois modos divergentes de encarar o trabalhador: na Teoria X, a ênfase é dirigida às metas da organização, administrando seus recursos humanos de modo autoritário; por outro lado,na Teoria Y, a atenção é dirigida à valorização do 21 empregado, estimulando-o a alcançar suas metas e satisfazer suas necessidades (ROTHMANN; COOPER, 2009). Afim de tornar mais fácil a compreensão da linha evolutiva na construção da POT, dada as demandas que foram surgindo para a psicologia a partir de grandes eventos históricos, Zanelli, Borges-Andrade e Bastos (2014) situam de forma didática períodos importantes no desenvolvimento da área. No primeiro período, os autores trazem características sobre o contexto da época: [...] O processo de industrialização (Segunda Revolução Industrial, com a invenção de novas máquinas, demandando racionalização dos processos de trabalho); o avanço das ciências naturais e biológicas, que reestruturaram crenças sobre a natureza humana; a pressão por reformas sociais e a luta contra a exploração do trabalho, que ganha voz na teoria marxista; a Primeira Grande Guerra, que incrementa a indústria bélica, demandando solução de problemas decorrentes da sobrecarga de trabalho; a grande depressão na década de 1930; e a eclosão da Segunda Grande Guerra. (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014, p. 553). Todos esses eventos são constituintes da psicologia industrial, onde o trabalho foi bastante marcado pelas avaliações psicológicas e que aproximava cada vez mais os trabalhadores das máquinas. Esse conjunto de demandas contextuais desafiaram a psicologia a se posicionar como uma ciência capaz de oferecer subsídios para essa transformação (ROTHMANN; COOPER, 2009). O segundo marco importante apontado por Zanelli, Borges-Andrade e Bastos (2014), é a denominada “expansão pós guerra’’, que vai de 1945 a 1960 e foi um período onde tudo começa a se reerguer e seguir o curso do desenvolvimento. Existe nesse período também, uma oposição entre capitalismo e socialismo, um mundo bipolar. Foi na Europa capitalista que surge a preocupação do Estado com a saúde do trabalhador e passa a oferecer um suporte em prol da política do bem–estar social. Diante do surgimento de movimentos principalmente nos Estados Unidos e Europa é que a POT inicia sua consolidação: O escopo dos problemas tratados pelos psicólogos se amplia: eles se tornam consultores para uma gama de problemas organizacionais – desde o desenho de postos de trabalho, passando por seleção, treinamento, introdução de novas tecnologias e desenvolvimento 22 organizacional (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014, p. 554). A então psicologia industrial passou a ser substituída pela psicologia organizacional, incorporando novas atribuições nas organizações e abrangendo olhares para as características dos indivíduos, grupos e a própria organização. Apesar do recrutamento e seleção continuar sendo uma das principais atividades muitas ações voltadas ao suporte na gestão passaram a ser desenvolvidas (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). Por fim, o terceiro e último período é demarcado pelo fim dos anos de 1970, onde as incertezas se faziam presentes. A guerra fria gerou conflitos em todo mundo. Na economia surgem novas estruturas geradas pelo aumento no setor de serviços e surgimento de organizações sem fins lucrativos. O Japão, mesmo depois da guerra, acaba caminhando para se tornar uma grande potência. A crescente modernização e avanços tecnológicos alteraram as organizações de trabalho e muitos conflitos também surgiram, apesar do discurso de qualidade de vida no trabalho (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). Ainda, seguindo os apontamentos de Zanelli, Borges-Andrade e Bastos (2014), a psicologia passou a se ampliar para um modelo de atuação que compreende o todo e não apenas o indivíduo, as intervenções saíram dos pequenos grupos e começaram a ser mais abrangentes. O campo da ergonomia cognitiva cresceu com os avanços tecnológicos. O compromisso e envolvimento passam a ser modelos fundamentais na gestão. Os mesmos autores expõem que por conta das questões contemporâneas que começaram a surgir no final do século XX e início do século XXI, pensa-se em situar um quarto período que abrange também o momento atual da disciplina. O processo de globalização e as mudanças nas relações de trabalhos, onde cresce a oferta de empregos temporários e de tempo parcial, o novo formato das organizações e perfis de gestores marcam essa nova fase. (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). 23 Dejours (1992) refere-se aos anos após 1968, como sendo marcados por reivindicações que tratam da “mudança de vida”. O trabalho foi reconhecido como forma de alienação e a “libertação da palavra”, movimento que marcou o mês de maio de 1968, e que trouxe a luta contra a alienação e a sociedade de consumo. O que o autor analisa deste período é o fenômeno da saúde mental. O sofrimento psíquico dos trabalhadores permanece neutralizado, sem ser analisado, o que eclode para tais reivindicações qualitativas. Com os tantos eventos mundiais que tiveram forte impacto nas relações de trabalho ao longo do tempo, é clara a mudança na forma que a psicologia compreende e atua nos contextos impostos. O século atual é marcado pelo poder do capital, onde a busca por lucros é prioridade, e a crise assombra muitas vezes alguns países. A gestão neoliberal produziu nos espaços de trabalho um aumento de fenômenos como estresse, assédio moral, violência psicológica (BORGES E YAMAMOTO, 2014) Em contrapartida os profissionais da psicologia, se sentiram convocados a promover pesquisas e estudos referentes à saúde do trabalho, onde expandem mais uma vez seus olhares para tópicos até então não tradicionais, aumentando a atenção para eventos de múltiplos níveis da organização. Questões sobre conflitos trabalho-família, aposentadoria, estresse, foram ganhando espaço, bem como capital intelectual, gestão do conhecimento, alianças estratégicas, ética empresarial, organizações estratégicas se tornaram temas cada vez mais pertinentes e importantes de serem discutidos (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). A partir desta trajetória histórica, entendemos que a POT sempre respondeu a uma demanda do contexto social, político e econômico de uma época, e foi se constituindo a partir de desafios que inquietaram e despertaram o interesse dos profissionais em pesquisar, entender e se necessário, modificar as práticas nas organizações. Hoje se vê o campo de atuação com um leque mais amplo de possibilidades, onde são mantidas as atividades tradicionais mas que se somam a outras e dão um sentido muito maior do que ao antigo profissional da psicotécnica. 24 2.2 A Psicologia Organizacional e do Trabalho no contexto nacional O Brasil em sua história está marcado pelo trabalho escravo. A economia até quase o fim do século XIX era puramente escravocrata. Com a chegada dos imigrantes e os novos empreendimentos, investimentos estrangeiros também começam a surgir, porém ainda permaneciam os modos de trabalho exploratório e baseado nos princípios de controle (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). Acompanhando as mudanças mundiais, a psicologia no Brasil começa a aparecer no final do século XIX e início do século XX com a industrialização, que se constituiu com a mão de obra dos imigrantes europeus e a partir do movimento migratório da zona rural. A psicologia aplicada ao trabalho já dava seus primeiros passos antes mesmo da regulamentação da profissão, que se deu nos anos de 1960 (BORGES, 2010). Zanelli, Bastos e Rodrigues (2014) dizem que no processo de industrialização as ideias Tayloristas foram cada vez mais sendo implantas e acolhidas. Léon Walther trouxe a psicotécnica para o país, prática que viabilizava e sustentava as ideias. Posteriormente, Henri Piéron desencadeou os estudos dos testes psicológicos, também em um curso sobre psicotécnica, ministrado na Escola Normal de São Paulo. Segundo Leão (2012) a psicotécnica se constitui no Brasil como a principalprática. Era utilizada com a finalidade de conduzir cientificamente a tentativa de controle de processos e contribuiu para a adaptação dos trabalhadores, a produção e a obtenção de produtividade máxima. Faziam parte das atividades do psicólogo a identificação de indivíduos aptos ou não para as fábricas, sendo que o fundamento se dava através de testes psicológicos. Zanelli (2002) aponta a importância de duas instituições ligadas à pesquisas sobre o trabalho: O Instituto de Organização Racional do Trabalho e o Instituto de Seleção e Orientação Profissional. O primeiro foi fundado em 1930, com a finalidade de buscar soluções para os problemas empresariais, estudando 25 a organização da prática administrativa e a seleção e o treinamento dos trabalhadores. Para o autor a instituição “teve um papel centralizador, no treinamento de psicotécnicos, em geral, profissionais formados em Engenharia que se dedicavam aos problemas do ajustamento humano ao trabalho” (ZANELLI; p.22, 2002). Já a segunda instituição foi fundada em 1947, tendo como uma de suas principais atividades a preparação de técnicos para o tratamento cientifico dos problemas administrativos. Em 1960, quando acontece a regulamentação da psicologia no Brasil e a profissão passa a ser reconhecida legalmente, o campo da psicologia aplicado ao trabalho já estava bem consolidado. A inserção dos profissionais nas empresas se constituía dentro da busca pela racionalização e também pelas organizações acreditarem que os testes serviam somente para fins econômicos de aumento de produtividade (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). Zanelli (2012) comenta que o surgimento da Psicologia Industrial ou do Trabalho se deu efetivamente na década de 50 e foi marcado pela obra de Roberto Mange, Emilio Mira y Lopez, Betty katzenstein e Oswaldo de Barros Santos, que produziram textos importantes e trabalharam fora do cenário acadêmico. Esse desvinculo da POT com a universidade em seus primórdios muito se deu pelas pressões do desenvolvimento industrial, que promoveram o incremento das práticas psicológicas para consumo próprio, ou seja, as situações de aprendizado são produzidas no próprio contexto de trabalho e não se divulga. Zanelli, Bastos e Rodrigues (2014) apontam que a crescente intensificação do processo de industrialização no Brasil, principalmente após a Segunda Guerra, propiciou a preocupação com a mão de obra, já que grande parte até então era desqualificada. Essa preocupação com a formação profissional começou a fazer parte das empresas e atraiu também profissionais da psicologia. Ainda para os autores Zanelli, Bastos e Rodrigues (2014) na gestão de Juscelino Kubitschek (1956-1961), houve uma ampliação dos investimentos na 26 qualificação dos trabalhadores. Também passou a se pensar novas estratégias e métodos de gestão adaptadas para a realidade nacional. Houve uma tendência em seguir o que estava sendo visto no cenário internacional. A ampliação do foco nas organizações considerando a dinâmica cultural e suas estruturas é um exemplo disso. Os anos de 1970 e 1980 foram marcados na história da POT pelas críticas ao modelo de atuação do psicólogo no Brasil. O profissional que atuava em organizações, ainda nos moldes industriais foi alvo das maiores críticas devido ao argumento de descomprometimento desta área com as demandas sociais. Zanelli, Bastos e Rodrigues (2014) afirmam que no ano de 1984, uma coletânea de textos organizacionais foram lançados, e em um dos textos de autoria de Wanderley Codo, chamado O papel do psicólogo na organização industrial (notas sobre o lobo mau em psicologia), pautado no pensamento crítico relacionado ao trabalho dos psicólogos nas empresas, trouxe uma polêmica que movimentou a área. Os autores apontam que: Esse texto, em particular, teve um importante impacto, ao apontar que a psicologia produzida e a prática profissional, mesmo dos psicólogos organizacionais, desconsideravam a categoria trabalho. Para Codo, de um lado, havia muitos psicólogos que atuavam no mundo do trabalho sem qualquer perspectiva crítica e, de outro lado, muitos psicólogos críticos sem qualquer inserção nas questões práticas postas por esse domínio. (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014, p. 559). Essa produção gerou muita movimentação nos profissionais e pesquisadores pois alertava sobre a necessidade de mudar suas práticas e olhar também para o trabalhador e sua saúde, e não somente nas pautas relacionadas à gestão, empresa e capital. A partir de então, surge uma ampliação das ações voltadas à gestão de pessoas, saúde e clima organizacional. Borges (2010) afirma que a psicologia deste campo começa a florescer mais no final da década de 1980 até os dias atuais. Essa expansão se destaca pelo aumento do número de pesquisas nessa área, pela fundação da Sociedade Brasileira de Psicologia do Trabalho e das Organizações (SBPOT) em 2001, pelo Congresso Cientifico Bianual (CBPOT), surgimento de revistas da área e também a qualificação e estudo de várias abordagens para sustentar a prática. 27 A POT no Brasil segundo Borges (2010), tem desencadeado polêmicas por suas tensões internas principalmente entre os subdomínios. Muito se discute sobre a segmentação no campo, separando os profissionais que se dedicam as atividades clássicas da psicologia organizacional daqueles que se ocupam das questões direcionadas ao trabalho e saúde do trabalhador. Diante desses empasses teóricos-metodológicos a SBPOT lançou um manifesto, em 2009, defendendo a necessidade de que o trabalho e a organização não sejam vistos como coisas distintas. O documento aponta a centralidade do trabalho como atividade humana e social e a necessidade de organiza-lo. Além disso, comenta a importância das organizações como mecanismos sociais em atender as necessidade coletivas, e que não há possibilidade de fazer psicologia somente para o trabalho sem pensar nas organizações em que ele ocorre. Reflete também sobre a importância de se implicar na gestão e nas decisões e políticas da organização para que haja bem- estar no trabalho. Por fim, faz apontamentos em relação às condições de trabalho que ainda são desumanas em inúmeros segmentos. (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO, 2009). Ainda que essas tensões existam, a movimentação através de pesquisas, diálogos e discussões geram uma construção nova a cada passo. Entender e respeitar que a diversidade é uma forma de evolução e que principalmente o trabalho está inserido dentro desse todo, é dar abertura para as novas organizações que surgem no cenário atual onde a tecnologia e a palavra se tornam instrumentos poderosos. 2.3 Discussões acerca da nomenclatura Uma das discussões dentro da psicologia relacionada ao trabalho diz respeito ao próprio nome da disciplina. Nas publicações estudadas ao longo dessa pesquisa percebeu-se a não uniformidade sobre a escolha de um nome que defina as articulações da prática e teoria, e essa característica diz muito sobre o processo de construção que ainda está em movimento e das adaptações e mudanças impostas pela contemporaneidade. 28 As diversas teorias sinalizam as múltiplas práticas relacionadas à psicologia. Dentre as expressões mais encontradas na literatura científica encontram-se: Psicologia do Trabalho, Psicologia Organizacional e do Trabalho, Clínica do Trabalho, Psicologia Aplicada ao Trabalho, Psicologia Aplicada à Administração, Psicologia Social e do Trabalho, entre outros (HASHIMOTO, 2013). Dentro do Campo da POT, duas vertentes se sobrepõem: a Psicologia do Trabalho, que surge da Psicologia Industrial, tendo como características o uso da psicotécnica e os recursos tradicionais de atuação; e a Psicologia Organizacional com foco mais abrangente dentro da organização, se preocupando com as questões de grupos, indivíduos,relações de trabalho e saúde do trabalhador (ROTHMANN; COOPER, 2009). Para Zanelli (2002) o nome “Psicologia Organizacional’’ é capaz de transmitir o sentido da área de atuação. Para o autor o interesse da disciplina está direcionado ao indivíduo, sua singularidade e também aos comportamentos que o ambiente onde está inserido, o influencia. Desde o início da área o olhar para o trabalhador e para o trabalho não pode ser alheio ao contexto organizacional e esse é um bom argumento para a solidificação do nome, além da já familiaridade que o Brasil tem com o termo. Zanelli, Borges-Andrade e Bastos (2014), situam três campos que compõe a POT e pontuam que cada campo visto de forma separada não consegue garantir a efetiva compreensão dos fenômenos que pretende estudar e intervir. O primeiro campo seria o da Psicologia do Trabalho, que se preocupa em estudar a relação homem-trabalho, buscando compreender a natureza dos processos na organização e seus impactos psicossociais, principalmente em relação a saúde. Além disso, estuda problemáticas relacionadas ao desemprego, afastamentos e aposentadorias (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). 29 O segundo campo é o da Psicologia Organizacional, e está centralizado nas interações entre comportamento no trabalho e a organização. O desafio dessa área é lidar com os processos da organização e compreender que as pessoas fazem parte dela e suas ações precisam estar alinhadas com os objetivos gerais da organização (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). De forma sintética, a contribuição da psicologia para a compreensão dos fenômenos organizacionais envolve o exame de como os processos micro-organizacionais (atitudes, crenças, valores, percepções, construção de significados, emoções, etc.) articulam-se apoiados na diversidade individual e de que modo, a partir dessa articulação, emergem os processos macro-organizacionais (estruturas, cultura, poder, políticas, etc.), que, por sua vez, constituem o contexto que configura, limita e afeta os próprios processos micro- organizacionais (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014, p. 563). Por fim, o terceiro modelo de atuação surge do gerenciamento da ação para que se alinhe com a missão. As práticas de gestão de pessoas cumprem esse papel, apoiando-se na estrutura da organização para definir e traçar estratégias de captação, avaliação, e desenvolvimento dos membros. Através das contribuições desse campo, soluções propícias para um bom desenvolvimento da organização e dos sujeitos são buscadas (ZANELLI; BORGES-ANDRADE; BASTOS, 2014). Zanelli, Borges-Andrade e Bastos (2014) concluem que há grande diversidade de fenômenos que podem ser estudados por todas as disciplinas, mas não se deve ver eles de forma separada, com ações específicas de cada área voltadas para determinado fenômeno. As organizações são amplas e diversificadas, e os três campos podem contribuir de forma distinta a qualquer um dos tópicos estudados. Pereira (2015) entende que diante das posições sobre o campo do trabalho e intervenções, existem autores que negam a existência de diferenças epistemológicas entre as duas vertentes. Existem autores que propõem interações entre as abordagens, e há também quem afirma que se trata de dois campos completamente distintos e com objetos diferentes. 30 Para fins de contextualização, o termo mais usado neste trabalho é o da “Psicologia Organizacional e do Trabalho’’ pois: O termo Psicologia Organizacional e do Trabalho, empregado desde a década de 90, tem por objetivo contemplar a atual diversidade da área, de modo a propor a existência de dois grandes eixos de fenômenos que envolvem aspectos psicossociais: as organizações, enquanto ferramenta social formadora de coletivos humanos e o trabalho, enquanto atividade básica do ser humano, reprodutora de sua própria existência e da sociedade (BASTOS,2003). Assim, a diversidade e a importância de uma compreensão ampla dos fenômenos é capaz de produzir bons frutos no que tange o avanço das pesquisas e práticas. 2.4 A formação do Psicólogo Organizacional e do Trabalho no Brasil Na pesquisa de Kanan e Azevedo (2006), os autores apontam que a psicologia associada ao ensino tem enfrentado muitas dificuldades e críticas relacionadas aos campos de atuação, às pesquisas e à psicologia enquanto profissão. Citando Martin-Baró (1998) em seus estudos tomando o contexto da América Latina, as autoras expõem que a psicologia como ciência não consegue acompanhar e responder as demandas sociais, identificar problemas e buscar soluções, ficando muitas vezes à margem dos movimentos e inquietudes dos povos latino americanos. Zanelli (2002) faz uma crítica a formação brasileira aonde diz que um número considerável de psicólogos foram sendo inseridos no mercado de trabalho denunciando um desajuste nas suas atividades. Para ele, está havendo uma discrepância entre o que é produzido no mundo acadêmico, a formação e os desafios da prática, principalmente no que diz respeito ao psicólogo nas organizações. Kanan e Azevedo trazem a formação do psicólogo brasileiro, regulamentada pela Lei nº 4.119, como uma formação generalista, onde após a graduação o profissional se torna habilitado para atuar em diversas áreas. Para Coelho (2013) a formação generalista, apesar de não estar expressa nos textos 31 das Diretrizes Curriculares Nacionais orienta a formação e isso se justifica pela diversidade das possibilidades de atuação. A defesa por esse tipo de formação se deu depois da implantação do Currículo Mínimo, sendo contatada a predominância da Psicologia Clínica na formação. Através disso, diversos esforços fizeram com que a academia organizasse formas de ensino que não se prendessem somente aos espaços clássicos de atuação do psicólogo e pudesse colocar em pauta uma visão geral e crítica sobre os conhecimentos (COELHO, 2013). No que diz Zanelli (2002), a desatenção para a área do trabalho se justifica muito ainda pela tendência e preferência dos acadêmicos e profissionais pelas atividades da área clínica, onde as disciplinas acabam sendo dirigidas para essa formação. Para o autor a identificação com as práticas de consultório e a atuação liberal desses profissionais, trazem implicações na interação profissional em ambientes de trabalho onde se deve ter o grupo ou a comunidade como foco. Coelho (2013) em sua dissertação de mestrado investigou a presença da Psicologia do Trabalho e das Organizações (PTO) na graduação do psicólogo após a implantação das Diretrizes Curriculares Nacionais e a forma como essa é trabalhada. Sua justificativa para a elaboração da pesquisa foi pautada justamente pelo número considerável de artigos que criticam o modo como a área vem sendo tratada na graduação de Psicologia e paralelo a isso a não integração entre a expansão quantitativa e qualitativa do campo e o que é tratado em sala de aula. Outro fator que contribuiu para a realização da pesquisa foi a reforma curricular que os cursos passaram a partir de 2004. A pesquisa aponta para uma falta de interação das disciplinas com conteúdo de outros campos de conhecimento como a Administração, Economia e Sociologia. Essa dificuldade de diálogo entre os campos acarreta, muitas vezes, em uma formação que se reduz somente aos fenômenos da psicologia e por isso acaba se tornando reducionista. Ao mesmo tempo que aponta falhas no sistema de ensino, o autor deixa a dúvida e o questionamento: é mesmo no 32 espaço das universidades a responsabilidade do preparo imediato do aluno para a atuação qualificada nas organizações depois de formados? (COELHO, 2013). 2.5 O papel do psicólogo organizacional e do trabalho A estruturação de trabalho contemporânea, marcada pela competitividade e desenvolvimento de novas tecnologias, permite o surgimento de novas formas de gestão. As organizações passam a servistas como um sistema dinâmico e orgânico. O planejamento deixa de caber somente à cúpula, a comunicação passa a ser feita de forma estratégica e se busca por parte dos funcionários, o desenvolvimento de habilidades não apenas técnicas (KANAN; AZEVEDO, 2006). A produtividade e o desempenho são fatores que sempre estiveram presentes no campo do trabalho. Zanelli (2002) aponta que a perspectiva da psicologia relativa ao trabalho vai de encontro com a priorização do desenvolvimento da pessoa, através da participação e planejamento. Esse crescimento individual é capaz de promover mudanças em todas as estruturas da organização, pois produzir também é uma forma de alterar o ambiente. A verdade é que a questão do trabalhador com a produção é bastante complexa. Zanelli (2002) traz a ideia de que fatores como motivação, habilidades, valores morais e o próprio significado de produzir não podem ser vistos separados do sujeito. Para o autor, o aumento da produção deve ser pensado “priorizando a melhoria na qualidade de vida de quem produz, de quem consome e a preservação máxima do ambiente (ZANELLI, p.35, 2002). O avanço tecnológico aumentou ainda mais o trabalho penoso e trouxe diferentes formas de sofrimentos. Como já foi tratado no capítulo anterior, o trabalho está ligado ao sofrimento. Dejours (1998) fala do sofrimento patogênico e criativo. O sofrimento criativo é o agenciador de realização do verdadeiro trabalho, é o que produz o processo criativo. O sofrimento patogênico por sua vez, diante da impossibilidade de mobilizar recursos defensivos, empurra o sujeito para uma incapacidade. Cabe ao psicólogo organizacional se atentar a 33 essas características de sofrimentos também individuais que se originam também das constantes mudanças e novas demandas (FLACH, 2009). Zanelli, Bastos e Rodrigues (2014) apontam para as inúmeras possibilidades de atuação da psicologia na área da POT. Os autores citam algumas delas, mas buscam não reduzi-las a um modelo único, apenas expõem um conjunto de atividades que costumam se esperar de um profissional, considerando três campos intradisciplinares que estruturam a área: Psicologia Organizacional, Psicologia do Trabalho e Gestão de Pessoas. Dentro do campo interdisciplinar da Psicologia Organizacional, encontramos a disciplina de Comportamento organizacional, onde as atividades se voltam para diagnósticos de clima organizacional, pesquisas sobre satisfação, comprometimento e envolvimento no trabalho, diagnósticos de cultura organizacional, processos grupais, rotatividade, turnover, absteísmo. Outra disciplina ainda desse campo é o Desenho Organizacional, onde as atividades são voltadas para a análise de cenários, planejamento estratégico, design organizacional, modelos de gestão, arranjos flexíveis de trabalho. A última disciplina citada dentro da área é a Consultoria Organizacional, onde a assessoria e consultoria são prestadas às organizações com o objetivo de diagnosticar, intervir e promover mudanças organizacionais. A Psicologia do trabalho destaca as disciplinas de Higiene do Trabalho, abrangendo atividades como segurança e prevenção de acidentes, programas de ajustamento de bem-estar, programas de qualidade de vida no trabalho e assistência psicossocial; saúde do trabalho: realização de diagnósticos de saúde e adoecimento no trabalho; identifica fatores de trabalho, da organização e da gestão propiciadores de adoecimento, clínica do trabalho, diagnóstico e manejo de estresse no trabalho e síndrome de burnout;. A ergonomia: Análise do trabalho e de suas cargas físicas e mentais, Avaliação ergonômica de equipamentos e ferramentas de trabalho, Planejamento, implementação e avaliação de intervenções ergonômicas, Análise da interação homem- computador; A orientação profissional e de carreira: Análise de interesses e aspirações vocacionais, Orientação e aconselhamento nas escolhas 34 profissionais; Emprego, desemprego e empregabilidade: Manejo dos impactos psicossociais do desemprego, Construção de estratégias de recolocação no mercado de trabalho. A Gestão de pessoas, abrange as disciplinas de Administração de pessoal, incluindo atividades como: movimentação e desligamento, remuneração e benefícios, planejamento de recursos humanos; Análise de Trabalho: descrição de rotinas e fluxos de trabalho, análise de postos de trabalho, definições de competências exigidas para os cargos, Alocação de desenho e tarefas, layout de postos de trabalho. Recrutamento e seleção: Diagnósticos de necessidades de pessoal, realização de pesquisas salarial, identificação de candidatos, planejamento do processo seletivo, definição de instrumentos usados no processo de avaliação, realização de avalição psicológica com o objetivo de seleção, atuação no processo de admissão. Treinamento e desenvolvimento de educação; Avaliação de desempenho; Relações de trabalho Diante das inúmeras atividades e disciplinas destacadas por Zanelli, Bastos e Rodrigues (2014) consegue-se ter um panorama da diversidade e interdisciplinaridade da POT e sua atuação nas organizações. Independente das áreas e da proximidade com atividades de outras formações, a psicologia sempre irá contribuir com a sua forma de interpretação dos fenômenos humanos, individuais ou coletivos no contexto de trabalho. A revista Diálogos que é organizada pelo Conselho Federal de Psicologia, em seu ano 4 e número 5, lançada em dezembro do ano de 2007, traz à tona a discussão sobre os desafios e novos rumos da POT. Em entrevista para a revista Antonio Virgínio Bittencourt Bastos trata das produções que se tem na área na atualidade e destaca que: “o desafio é não pensar a área como técnicas para lidar com crises de gestão. É entender sua complexidade” (BASTOS, p. 16, 2007). A função primordial do psicólogo dentro das organizações é contribuir para um ambiente de trabalho saudável e que assegure tanto as necessidades 35 do empregado quanto da organização. Se no passado o objetivo era desenvolver ferramentas para atender as demandas de produção e lucratividade, na sociedade contemporânea busca-se fornecer meios para que os sujeitos e organizações sejam capazes de lidar com as mudanças (BASTOS, 2007). Existe um compromisso ético da POT com a saúde do trabalhador e esse fator deve ser desenvolvido dentro da prática. É importante que o profissional não se atende somente para as questões mecanicistas e se volte para as relações de trabalho, o ambiente e a dinâmica da organização e principalmente a subjetividade e o adoecimento dos trabalhadores (SANTOS; CALDEIRA, 2015). Dado o exposto, as práticas do psicólogo nas organizações contemporâneas devem se apoiar na busca por um equilíbrio entre os interesses das organizações e o desejo do sujeito. Apesar dos desafios da psicologia em estar nessa posição de ‘’ mediação’’ e de se haver também com as inúmeras transformações do cenário contemporâneo, é importante se atentar para as novas possibilidades de intervenção e relembrar que todos os momentos desafiadores da história da POT foram cruciais para movimentar novas construções. 36 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo teve por objetivo abordar questões que dizem respeito a construção histórica da POT enquanto disciplina e área de atuação, e os desafios e práticas contemporâneas. Através da retomada de eventos marcantes na história humanidade é que percebemos a maneira que a psicologia foi se estruturando frente as demandas das épocas. O trabalho é um fator determinante na vida das pessoas, mas também é produtor de sofrimento na medida em que a individualidade é anulada diante das exigências que se apresentam muitas vezes no cenário das organizações. Ao remeter à produção artesanal, o trabalhador era capaz de criar seu produto conforme seus critérios e tinha autonomia para modificar e ajustarao seu gosto. Além disso, existia uma forte ligação subjetiva com o que produzia. A partir dos processos de industrialização, o trabalhador passa a vender sua força de trabalho e se submeter aos ajustes de uma organização, que exige um ritmo diferente de produção e o coloca como uma peça na engrenagem. A psicologia surge como uma aliada na busca pelo avanço do desenvolvimento econômico, trabalhando no ajuste técnico do homem à organização. Com a psicometria, aplicada aos processos de recrutamento e seleção, os primeiros passos foram dados para a inserção da profissão no ambiente de trabalho. Hoje, depois de uma longa caminhada para ocupar outros espaços dentro das organizações, a POT se estrutura como uma disciplina que contribui para a qualidade de vida e saúde do trabalhador. Com o olhar mais abrangente, levando em conta todos os fenômenos que se apresentam, se construiu uma base mais sólida para discussões e pesquisas sobre o trabalhador e as organizações, partindo da ideia de que exista uma unidade entre os dois. Os desafios contemporâneos incluem um dinamismo e uma modificação dos vínculos de trabalho. O que se espera de um trabalhador vai muito além do das competências técnicas, habilidades pessoais estão sendo cada vez mais 37 valorizadas. Esse fator se dá pelas constantes mudanças e a necessidade de reaprender algo. A tecnologia é um grande exemplo disso. A questão que cabe à POT é de responder também ao que se produz dessas relações, assim como em todas as outras épocas que construíram e atravessaram a história da profissão. Não deixamos de estar inseridos em um contexto social e, assim como ele se movimenta, nos movimentamos também. 38 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALBARNOZ, Suzana. O que é trabalho? 3ºed. São Paulo: Brasiliense, 1988. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO. Manifesto da Associação Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho. Psicologia do trabalho e das organizações: não atuamos pela cisão. Brasília: SBPOT, 2009. Disponível em: Pauta de Defesa da Psicologia Organizacional e do Trabalho | Manifestos | SBPOT - Associação Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho Acesso em 26 nov. 2020 BASTOS, Antonio Virgínio Bittencourt. Psicologia Organizacional e do Trabalho: Sua evolução, os desafios e os novos rumos. Psicologia: Ciência e Profissão, Série Diálogos, v12, n.5, p 7-27, Dez 2007. Disponível em: https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2011/01/RevistaDilogoN.5.pdf. Acesso em 04 out.2020 BASTOS, Antonio Virgínio Bittencourt. Psicologia Organizacional e do Trabalho: Que respostas estamos dando aos desafios contemporâneos da sociedade brasileira? 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