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1 ANA PAULA – MED UNIMES XXII INFECTOLOGIA pneumonia bacteriana Caso clínico Identificação: paciente do sexo feminino, 70 anos, natural e procedente de Santos – SP, aposentada. QD: tosse há 5 dias HPMA: paciente refere que há 5 dias iniciou com mialgia, tosse produtiva e dor em região de arcos costais à direita. Nos últimos dois dias evoluiu com dispneia e febre. AP: HAS, DM2, Insuficiência cardíaca sem tra- tamento Medicações em uso: Losartana 50mg 2x/dia, Metformina 850mg após almoço Sinais vitais: FC 100 bpm, FR 27 rpm, PA 100x70, Saturação de O2 90%, temperatura 38°C EF: REG, descorada 1+/4, desidratada 2+/4, dispneica, consciente e orientada em tempo e espaço; BRNF em 2T s/sa; MV+ com esterto- res subcreptantes em base direita; Abdome flácido, indolor, RH+, s/ visceromegalias, DB –; extremidades quentes, tempo de enchi- mento capilar > 2 segundos, sem edema. Qual é a principal hipótese diagnóstica? ✓ Tuberculose (na tb a tosse pode ser seca e produtiva, com febre) ✓ Pneumonia bacteriana O Brasil tem um número muito grande de ca- sos de tuberculose, portanto, qualquer situa- ção com esses sinais e sintomas deve-se pen- sar em tuberculose. A principal hipótese diagnóstica nesse caso é uma pneumonia, porque possui rápida evolu- ção (5 dias). As pneumonias são doenças agudas. Já a tu- berculose é uma doença subaguda ou crô- nica (pelo menos mais de 3 semanas de sinto- mas). Essa é uma forma de diferenciar as duas doenças. Pneumonia bacteriana • DEFINIÇÃO: Distúrbios inflamatórios agudos ao nível de al- véolos, interstícios e brônquios distais com in- vasão dos espaços aéreos e microrganismos patogênicos e polimorfonucleares (neutrófi- los, linfócitos, macrófagos, citocinas e outras células e substâncias inflamatórias). Segundo a OMS, a pneumonia é a principal causa infecciosa de morte no mundo. Se con- tabilizar todas as doenças, é a 3ª maior causa de morte. o No Brasil está entre 3 - 7ª causa de morte. o Maior incidência nos extremos de idade (ou idoso acima de 60 anos, ou criança pequena abaixo dos 5 anos) – entre essas idades é possível ter pneumonia, mas não é comum. A pneumonia bacteriana pode ser dividida em dois tipos: ✓ Pneumonia adquirida na comunidade (PAC): acomete pacientes em ambiente ambulatorial (não internados) ou quando o paciente está internado por menos de 48 horas. ✓ Pneumonia hospitalar: adquirida após 48 horas de internação hospitalar. Quadro clínico Sinais é o que se observa no paciente, e sinto- mas é o que o paciente sente. • SINTOMAS: ✓ Tosse (seca ou produtiva) – tanto para tb ou pneumonia ✓ Dispneia ✓ Dor pleurítica (quando o parênquima pul- monar está inflamado, essa inflamação pode chegar na pleura e causar dor nos arcos costais) • SINAIS: ✓ Taquipneia 2 ANA PAULA – MED UNIMES XXII INFECTOLOGIA ✓ Esforço respiratório ✓ Ausculta pulmonar com roncos e esterto- res (por líquido no parênquima) • SINAIS E SINTOMAS SISTÊMICOS: Febre, calafrios, mal-estar, fadiga e anorexia. Quadro laboratorial ✓ Leucocitose com desvio à esquerda Conceito de desvio à esquerda: au- mento dos leucócitos com aumento de acima de 10% dos bastões ✓ Leucopenia ✓ PCR elevado (marcador inflamatório) ✓ Pró-calcitonina elevada (marcador infla- matório) A pneumonia é a principal causa de sepse. Na sepse mais grave pode levar a hipoten- são, alteração do nível de consciência, dis- funções orgânicas. Fatores de risco para pneumonia ✓ Imunossupressão ✓ Idade (idosos ou crianças) ✓ Comorbidades prévias (principal: DPOC) ✓ Infecção viral do trato respiratório → paci- ente tem uma pneumonia viral (COVID-19 e Influenza) e pode fazer uma pneumonia bacteriana secundária (em cima do qua- dro viral) ✓ Dificuldade de proteger a via aérea (pa- ciente que tem dificuldade de engolir a saliva. Essa saliva, ao invés de ir para o esôfago e estomago, vai parar no pul- mão e pode causar pneumonia) Exemplo: idoso que teve AVC e preju- dicou o reflexo da deglutição ✓ Abuso de álcool e tabaco Principais patógenos envolvidos Pneumococo (Streptococo pneumoniae) → é o principal agente, mas tem muitos outros. Além do pneumococo, há outros patógenos que podem ser divididos em bactérias típicas e atípicas. • BACTÉRIAS TÍPICAS: ✓ Streptococo pneumoniae (principal) ✓ Haemophilus influenzae ✓ Moraxella catarrhalis ✓ Staphylococcus aureus (causa pneumo- matocele – pneumonia com bolhas de ar) ✓ Group A streptococci ✓ Bactérias gram – (enterobactérias como Klebsiella spp ou Escherichia coli) ✓ Bactérias anaeróbias (associada a bron- coaspiração, porque são bactérias que estão presentes em nossa boca – comum nos casos de dificuldade de proteção da via aérea) • BACTÉRIAS ATÍPICAS (são resistentes aos beta-lactâmicos, não visualizadas pelo gram): ✓ Legionella spp ✓ Mycoplasma pneumoniae ✓ Chlamydia pneumoniae ✓ Chlamydia psittaci ✓ Coxiella burnetti • ANÁLISE MICROBIOLÓGICA: Em pacientes ambulatoriais não é necessário fazer essa análise, trata-se como se fosse pneumococo. Mas em bactérias com pneumonia hospitalar, é necessário realizar essa análise. Hemoculturas, cultura e gram de escarro, Ag urinário para pneumococo e para Legionella, PCR (reação em cadeia polimerase, pega o DNA) para Legionella. Exames complementares O primeiro exame a solicitar diante de uma suspeita de pneumonia bacteriana é um he- mograma. Resultado dos exames da paciente do caso: ✓ Hemograma: Hb 12 / Ht 34 Leucócitos 18.000 com 10% de basto- netes (desvio à esquerda) Plaquetas 490.000 (paquetose, comum em quadros infecciosos) ✓ Na 128 (VR: 135 – 145) – hiponatremia por causa da desidratação (desidratação pode causar hiper ou hiponatremia) ✓ K 3,5 ✓ Creatinina 1,1 (normal, tendendo a subir) ✓ Ureia 120 (alta) ✓ Proteína C reativa 43 ✓ Gasometria arterial: A gasometria arterial é solicitada sempre que houver alteração na saturação (queda < 90). 3 ANA PAULA – MED UNIMES XXII INFECTOLOGIA A gasometria da paciente do caso ainda não está alterada. pH 7,35; PO2 80; PCO2 45; HCO3 22; BE -2; Lac- tato 14 (acidose respiratória, apesar do pH es- tar normal, tendendo a compensar, porque o PCO2 está aumentado; lactato alto porque ela está infectada e desidratada) • EXAMES DE IMAGEM: Para fechar o diagnóstico de pneumonia é necessário ter todas as alterações laboratori- ais descritas + alteração na radiografia do tó- rax (PA e perfil). Pode ser visualizado no RX opacidade na base do pulmão. Para alguns pacientes, o RX de tórax não é su- ficiente para fechar o diagnóstico de pneu- monia. Nesses casos de dúvida diagnóstica, é realizado uma TC de tórax (exame muito me- lhor para visualizar o tórax). Além disso, a TC deve ser realizada também para imunocomprometidos e quando há sus- peita de outros patógenos epidêmicos como Legionella. Para onde esse paciente deveria ser en- caminhado (tratamento ambulatorial, UTI, internação na enfermaria ou UTI?) Existem scores de gravidade para ajudar a decidir para onde o paciente deve ser enca- minhado. • 2 SCORES: ✓ PSI: É realizado por calculadoras (ninguém sabe de cabeça) Leva em consideração a caracterís- tica clínica e laboratorial Esse score vai de 0 a 6 (paciente score 6 apresenta maior risco de morte). ✓ CURB-65: Também leva em consideração a ca- racterística clínica e laboratorial C: confusão mental U: ureia R: respiração (frequência respiratória) B: blood pressure (pressão arterial) 65: idade (>65 anos) É mais utilizado porque não precisa de calculadora, portanto, é mais fácil. Cada fator é 1 ponto. Tratamento ambulatorial: ✓ Pacientes com sinais vitais normais ✓ PSI score de I a II ✓ CURB-65scores de 0 (ou CURB-65 score de 1 se idade > 65 anos) Internação hospitalar: ✓ Pacientes com SatO2 <92% ✓ Pacientes com PSI score > III ✓ CURB-65 score >1 Terapia intensiva: ✓ Insuficiência respiratória com necessi- dade de ventilação mecânica ✓ Sepse com necessidade de droga vaso- ativa (DVA) A presença de 3 desses critérios indica ne- cessidade de UTI: ✓ Alteração no nível de consciência ✓ Hipotensão com necessidade de reposi- ção de fluidos ✓ Temperatura < 36ºC ✓ Frequência respiratória > 30 rpm ✓ PaO2/FiO2 < 250 (PaO2 obtemos pela gasometria/fração inspiratória de O2 no ar ambiente é de 21%, e essa relação ajuda a perceber se o paciente está tendo sofrimento ventilatório) – a nossa paciente 80/0,21= 296) ✓ Contagem de leucócitos < 4000 célu- las/microL ✓ Contagem de plaquetas < 100.000/Ml ✓ Infiltrados multilobares 4 ANA PAULA – MED UNIMES XXII INFECTOLOGIA Diagnósticos diferenciais ✓ Insuficiência cardíaca com edema pul- monar Para diferenciar IC e pneumonia bac- terina: a IC não causa febre, leucoci- tose com desvio à esquerda, dor nos arcos costais, não apresentará PCR elevado. A IC causa edema, turgên- cia de jugular (portanto, até no exame físico e laboratorial é possível diagnosticar). ✓ Tuberculose ✓ Embolia pulmonar ✓ Hemorragia alveolar ✓ Atelectasia ✓ Pneumonia química ✓ Reação a droga ✓ Neoplasias pulmonares ✓ Vasculites ✓ Pneumoconioses (inalação ocupacional de alguma substância que cause lesão pulmonar). Terapia para pneumonia Para a escolha do antibiótico, é necessário saber onde esse paciente será tratado (am- bulatorialmente, UTI ou enfermaria). • PACIENTES AMBULATORIAIS: ✓ < 65 anos sem uso recente de ATB: Amoxicilina + macrolídeo (azitromicina ou claritromicina) OBS: Amoxicilina é para pneumococo e Macrolídeo é para as bactérias atípicas. ✓ >65 anos, comorbidades, uso de ATB nos últimos 3 meses: Amoxicilina e clavulanato. • PACIENTES INTERNADOS: Temos que nos atentar para o risco de infec- ção por pseudomonas ou S. aureus resistente à meticilina (MRSA). São os pacientes que so- freram hospitalização recente com uso de TB endovenoso nos últimos 3 meses. ✓ Pacientes sem risco de infecção por Pseudomonas ou S. aureus resistente à meticilina: ß-lactâmicos (ceftriaxona) + macrolídeo (claritromicina ou azitromicina) OU Monoterapia com quinolona (levofloxacino, moxifloxacino) ✓ Com risco de infecção por Pseudomonas ou S. aureus resistente à meticilina (MRSA): ß-lactâmicos anti-pseudomonas (piperaci- lina/ tazobactan, Cefepime, Ceftazidima) ✓ Paciente com colonização documen- tada ou infecção prévia ou grande sus- peita de infecção por S. aureus resistente à meticilina (MRSA): Adicionar Vancomicina ou Linezolida Tempo de tratamento Não existe um tempo fechado/determinado (mínimo e máximo). É preciso tratar o paciente até a estabilidade clínica e ausência de febre por 48 horas. Tempo mínimo de 5 dias. Em casos de infecção grave ou comorbida- des o tempo de tratamento é estendido para 7 a 10 dias. Não adiantar ficar tratando por mais de 10 dias – caso no 7º-8º dia o paciente ainda não tenha melhorado, provavelmente o antibió- tico escolhido está errado (não está cobrindo o agente). Uso de corticoides Não é recomendado de rotina Possível em pacientes demostrando grande resposta inflamatória (como choque séptico refratário a volume) – nesse caso NÃO é para tratar a pneumonia, apenas para agir na sepse. Voltando para o caso clínico Foi realizado o diagnóstico da paciente. Essa paciente possui alteração de pressão ar- terial, ureia e na saturação. Portanto, essa pa- ciente não pode ser tratada ambulatorial- mente, mas também não precisa ser inter- nada na UTI, pode ser tratada com interna- ção na enfermaria. Para tratar essa paciente: Como não tem risco de infecção por Pseudo- monas ou S. aureus resistente à meticilina o tratamento deve ser: ß-lactâmicos (ceftriaxona) + macrolídeo (cla- ritro) ou monoterapia com quinolona (levo- floxacino) O tempo de tratamento deve ser de no mí- nimo 5 dias, até a estabilidade clínica e au- sência de febre por mais de 48 horas. No má- ximo 10 dias.
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