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Júlia Figueirêdo – APARECIMENTO E MANIFESTAÇÕES EXTERNAS DAS DOENÇAS E IATROGENIAS ÚLCERAS DE PERNA: As úlceras são falhas observadas na continuidade da pele patologicamente alterada, estendendo-se até a derme (mas podem acometer a hipoderme). Apresentação topográfica das úlceras de pele A avaliação do tecido adjacente à úlcera e de sua base auxilia a determinar a etiologia do quadro, porém também é necessário observar aspectos como a localização, presença ou não de secreções, características das bordas e presença de lesões associadas. CAUSAS MAIS COMUNS DE LESÕES ULCEROSAS: INSUFICIÊNCIA VENOSA: A insuficiência venosa crônica (IVC) é a causa de úlceras de perna mais comum no adulto, com incidência proporcional ao aumento da idade do paciente. Como principais fatores de risco associados, destacam-se obesidade, TVP, flebite ou fraturas do membro inferior. As úlceras venosas são encontradas principalmente no maléolo medial, região suprida por veias comunicantes incompetentes, porém também podem afetar toda a circunferência da perna. São dolorosas e apresentam limites bem demarcados, com borda em declive e formato irregular. Sua base é coberta por fibrina e exsudato amarelado, revelando colonização secundária por bactérias. O pulso arterial do membro acometido é normal, com exceção de casos nos quais há presença simultânea de lesões arteriais e venosas. Úlcera venosa em maléolo medial, destacando sua base granulosa Outros achados clínicos sugestivos de úlcera por IVC são: Telangiectasia em pés e tornozelos; Edema periférico; Veias varicosas; As úlceras sempre causam cicatrizes Há piora da dor ao final do dia, em decorrência da manutenção prolongada da posição ortostática, regredindo com a elevação do membro Júlia Figueirêdo – APARECIMENTO E MANIFESTAÇÕES EXTERNAS DAS DOENÇAS E IATROGENIAS Classificação CEAP (clínica, etiologia, anatomia, fisiopatologia) para varizes Dermatite ocre (coloração amarronzada da pele em função do depósito de hemossiderina em macrófagos); Dermatite de estase (eritema resultante do “represamento” local de sangue). Úlcera venosa extensa acompanhada por dermatite de estase, dermatite ocre e telangiectasia O diagnóstico dessa condição é clínico, porém sua confirmação pode ser feita por dois exames complementares, a saber: Índice Tornozelo-Braquial (ITB): consiste na aferição comparada da pressão sistólica entre os membros superior e inferior, importante para a identificação de etiologias arteriais (ITB < 0,9); Pacientes diabéticos ou que apresentem ITB > 1,2 (calcificação) devem realizar análise do índice hálux-braquial. Parâmetros e interpretações do índice tornozelo- braquial Mapeamento com Doppler venoso: é o exame de escolha para investigação de vasos superficiais, profundos e perfurantes, possibilitando sua avaliação funcional (presença de obstruções e/ou refluxo). A realização de procedimentos mais invasivos, como flebografia ou angiotomografia venosa, é indicada em casos específicos nos quais o mapeamento com USG é inconclusivo. O tratamento dessas lesões contempla medidas para cessar ou diminuir os efeitos da hipertensão venosa, além do controle da evolução da úlcera. As estratégias mais usadas são: Terapias compressivas: primeira linha terapêutica, baseiam-se na aplicação de pressão externa ao membro, o que estimula o retorno venoso, especialmente ao deambular. Os métodos mais usados são as bandagens compressivas (bota de Unna) e as meias elásticas de alta compressão, estas últimas em caso de lesões pequenas. Mesmo após a cicatrização da ferida, recomenda-se o uso de meias menos compressivas para prevenção de recidivas. Júlia Figueirêdo – APARECIMENTO E MANIFESTAÇÕES EXTERNAS DAS DOENÇAS E IATROGENIAS Aplicação da bota de Unna para o manejo de úlceras venosas Limpeza e debridamento da lesão; Correção cirúrgica de anomalias venosas; Medicamentos sistêmicos: o uso de diosmina (reduz a dilatação do vaso) e pentoxifilina (hemorreológico, diminui a viscosidade sanguínea) é visto como adjuvante terapêutico; Repouso e elevação do membro afetado. INSUFICIÊNCIA ARTERIAL: A doença arterial periférica, causada predominantemente por distúrbios ateroscleróticos e tromboembólicos, provoca cerca de 25% dos casos de úlceras de perna. Os grupos mais vulneráveis a tal condição são diabéticos, tabagistas, hipertensos, hiperlipidêmicos e idosos. O aspecto é de lesão em saca-bocado, com bordas definidas e desprendimento de tecido em sua base, geralmente situadas em região supramaleolar lateral, área pré-tibial ou nos dedos dos pés. Há pouco exsudato, com predominância para o aparecimento de necrose no leito da ferida. Essas lesões são muito dolorosas, com piora ao elevar o membro, consideradas como de maior gravidade. Outras manifestações relevantes são: Pele “brilhante” e fina; Palidez do membro após teste de Buerger (elevação da perna a 45º por 1 min); Diminuição da densidade de pelos; Espessamento das unhas; Pulsos periféricos abolidos ou diminuídos; Tempo de enchimento capilar prolongado (> 3 segundos); Gangrena seca periférica. Aspecto típico da úlcera arterial, com alteração trófica da unha Um importante sintoma é a claudicação intermitente, na qual há início da dor ao deambular, com regressão durante o repouso. A avaliação diagnóstica dessas lesões pode ser realizada, de forma simples e barata, pela palpação dos pulsos do membro ou pela determinação do ITB (pacientes com resultado <0,5 têm quadro mais avançado). A pressão parcial do oxigênio transcutâneo (tcpO2) é um bom indicador de isquemia, utilizando sensores que Júlia Figueirêdo – APARECIMENTO E MANIFESTAÇÕES EXTERNAS DAS DOENÇAS E IATROGENIAS causam hiperemia na pele para estimular a difusão local de oxigênio. Valores > 50 mmHg são considerados normais. Abaixo de 40 mmHg, podem ocorrer danos funcionais e prejuízo à cicatrização de feridas. O ecodoppler arterial é um meio pouco invasivo e de baixo custo que permite a confirmação do diagnóstico de doença arterial. A angiografia, por sua vez, é reservada a casos mais extensos, úteis na determinação do ponto exato de oclusão vascular. Para o tratamento dessas úlceras, objetiva- se a correção do fluxo sanguíneo arterial, que pode ser mediada por fármacos sistêmicos ou intervenções cirúrgicas. O cilostazol (100 mg VO, 12//12h) com efeito vasodilatador, é indicado para o manejo da claudicação intermitente em estágios iniciais da doença arterial periférica. Em pacientes com dano extenso, o foco deve se direcionar ao controle da dor e à preservação da perna, se valendo de técnicas de revascularização endovascular ou por cirurgia aberta. Para indivíduos submetidos sem sucesso a essas intervenções, a oxigenoterapia hiperbárica pode ser empregada como tratamento adjuvante, de modo a evitar amputações. Úlcera arterial antes (esq.) e depois (dir.) de tratamento com oxigênio hiperbárico NEUROPATIAS: As causas mais comuns de úlceras neuropáticas são a diabetes (pé diabético), hanseníase e a neuropatia alcoólica, promovendo o surgimento de lesões não dolorosas nos calcanhares e plantas does pés. As manifestações clínicas associadas a neuropatias são diversas, podendo preceder a úlcera, a saber: Espessamento e ressecamento da pele; Fissuras em região plantar; Perda de sensibilidade tátil, dolorosa e proprioceptiva; Alterações de marcha; Dedos em garra e artropatia de Charcot (deformidades ósseas). A ulceração é sempre precedida por calos indolores, que podem desenvolver pontos arroxeados ou enegrecidos, sugestivos de sofrimento e necrose tecidual.Comparando o quadro com aquele visto em isquemias, nota-se que o membro tem pulso preservado e cheio, com coloração normal ou até mesmo eritematosa. As lesões são margeadas por um anel hiperqueratótico, tendo leito profundo e granuloso. Podem ser observados focos hemorrágicos, indicativos de trauma por fricção. Não há evidências de que agentes tópicos ou curativos possam influenciar na cicatrização de úlceras arteriais O debridamento das úlceras arteriais deve ser evitado, pois leva a aumento da demanda de oxigênio em áreas adjacentes, agravando a hipóxia tecidual Júlia Figueirêdo – APARECIMENTO E MANIFESTAÇÕES EXTERNAS DAS DOENÇAS E IATROGENIAS Úlcera neuropática plantar A anamnese e o exame físico neurodermatológico são os maiores aliados para o diagnóstico dessas lesões, de forma a determinar a cronologia do quadro (agudo, crônico) e o tipo de neuropatia associada. A avaliação da sensibilidade pode ser feita com monofilamentos de nylon, agulhas, diapasão ou tubos de ensaio com água. Classificação de Wegner para o pé diabético No que se refere a exames complementares, os mais úteis são aqueles associados à detecção e monitoramento da diabetes, além da avaliação ultrassonográfica de nervos periféricos, capaz de identificar espessamentos por hanseníase. A eletroneuromiografia pode ser empregada para discriminar essas duas etiologias, revelando padrão simétrico e difuso nos diabéticos, ao passo que pacientes hansênicos cursam com mononeuropatia focal e assimétrica. O tratamento deve ser iniciado com medidas profiláticas, como a inspeção diária dos pés, corte das unhas, hidratação e uso de calçados adequados, de modo a evitar a formação de pontos de pressão. Em indivíduos com neuropatia já instalada, a abordagem de escolha é multidisciplinar, com controle da causa base (controle glicêmico estrito, poliquimioterapia) e reabilitação fisioterápica. Para o manejo direto das úlceras, recomenda-se a remoção “de dentro para fora” das áreas calejadas, bem como o debridamento de tecido desvitalizado na lesão. Curativos com alginato de cálcio, hidrocoloide ou colágeno também podem ser realizados, assegurando que a ferida seja avaliada diariamente. Critérios para o diagnóstico diferencial entre as principais causas de úlceras de perna As principais complicações de úlceras neuropáticas são osteomielite e infecções de pele, apontadas pela presença de exsudato amarelo-esverdeado e dor local, com dificuldade de cicatrização Júlia Figueirêdo – APARECIMENTO E MANIFESTAÇÕES EXTERNAS DAS DOENÇAS E IATROGENIAS DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS: Diversas etiologias menos comuns também estão associadas à ocorrência de úlceras de pele, a saber: Lesão física: diversas condições, como radiação, temperatura, traumas auto- infligidos e pressão, podem levar a ulcerações de aspecto variado; Estágios evolutivos de úlceras de pressão (escaras) Infecção: o acometimento da pele por estafilococos e estreptococos, além de outras bactérias e fungos, desencadeiam a formação de abcessos, crostas purulento-necróticas e eritema (apresentação da ectima, mediada por S. pyogenes); Ulcerações causadas por ectima Vasculite: a principal característica da inflamação de pequenos vasos cutâneos é a púrpura palpável, ao passo que o acometimento de redes maiores promove o desenvolvimento de ulcerações necróticas; Púrpuras palpáveis com úlceras em fase inicial Piodermite gangrenosa: condição rara associada à doença inflamatória intestinal, cursa com indisposição geral, febre e úlceras escuras/arroxeadas de bordas salientes e leito granuloso; Úlcera em face anterior da perna causada por piodermite granulosa Paniculite: é a inflamação do tecido subcutâneo, marcada pela identificação de nódulos vermelhos sob a pele (especialmente panturrilha, coxa e glúteos), que liberam exsudato oleoso ao se romper; Em caso de dor neuropática, são empregados medicamentos como amitriptilina (1ª linha, 25—75 mg/dia), tramadol (para episódios agudos, com máximo de 400 mg/dia) ou citalopram (20 a 40 mg/dia) Júlia Figueirêdo – APARECIMENTO E MANIFESTAÇÕES EXTERNAS DAS DOENÇAS E IATROGENIAS Quadro severo de paniculite ulcerativa associado a deficiência de alfa-1-antitripsina Picada de aranha marrom (Loxosceles reclusa): acidentes com esse animal causam lesão inicialmente pouco dolorosa e acompanhada por placa eritematosa sensível ao toque, evoluindo após 7 dias para necrose dolorosa, que, ao se destacar (depois de 1 mês), gera úlceras de difícil cicatrização. Evolução cronológica de lesão por aranha marrom
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