Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 Khilver Doanne Sousa Soares Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) Problema 31; 5º período; “Borboletas”; 1. Estudar a fisiopatologia, manifestações clínicas, e etiologia do lúpus eritematoso sistêmico (LES); 2. Compreender o diagnóstico do LES e seus diagnósticos diferenciais; 3. Entender o prognóstico do paciente com a doença. O LES é uma doença autoimune que envolve múltiplos órgãos, caracterizada por uma grande quantidade de autoanticorpos, particularmente anticorpos antinucleares (ANAs), nos quais a lesão é causada principalmente pela deposição de complexos imunes e ligação dos anticorpos a várias células e tecidos. A doença pode ser aguda ou insidiosa em seu surgimento e é tipicamente uma doença crônica, com remissões e recaídas, frequentemente febril. Lesões na pele, articulações, rins e membranas serosas são proeminentes. Virtualmente qualquer outro órgão no corpo também pode ser afetado. A marca do LES é a produção de autoanticorpos. Independentemente do seu valor no diagnóstico e tratamento de pacientes com LES, esses anticorpos não têm grande significância patogênica, como por exemplo na glomerulonefrite mediada por imunocomplexos tão típica da doença. Anticorpos antinucleares (ANAs). Eles são dirigidos contra antígenos nucleares e podem ser agrupados em quatro categorias: (1) anticorpos contra o DNA, (2) anticorpos contra histonas, (3) anticorpos contra proteínas não histonas ligados ao RNA e (4) anticorpos contra antígenos nucleolares. Anticorpos antifosfolipídios estão presentes em 30% a 40% dos pacientes com lúpus. Eles são, na verdade, direcionados contra epítopos de proteínas plasmáticas que são reveladas quando as proteínas estão em complexos com fosfolipídios. Estão incluídas entre essas proteínas a protrombina, a anexina V, a β2- glicoproteína I, a proteína S e a proteína C. Patogenia do LES O defeito fundamental no LES é a falha dos mecanismos que mantêm a autotolerância. Embora as causas da falha na autotolerância continuem desconhecidas, como é verdade para a maioria das doenças autoimunes, fatores GENÉTICOS e ambientais desempenham um papel nesse caso. Familiares de pacientes têm um risco aumentado de desenvolver LES; Estudos de associações de HLA sustentam o conceito de que os genes do MHC regulam a produção de autoanticorpos específicos. Alelos específicos do locus HLA-DQ têm sido ligados à produção de anticorpos anti-DNA com cadeia dupla, anti-Sm e antifosfolipídios, embora o risco relativo seja pequeno. O MHC codifica um grupo de antígenos ou proteínas encontradas na superfície das células. Este complexo identifica e impede que um corpo estranho entre ou se espalhe no organismo. Isso geralmente acontece em coordenação com o sistema imunológico que desencadeia uma resposta imediata contra esses corpos estranhos. Alguns pacientes com lúpus têm deficiências hereditárias de componentes iniciais do complemento, como C2, C4 ou C1q. A falta de complemento pode comprometer a remoção de imunocomplexos circulantes pelo sistema mononuclear fagocitário, favorecendo a deposição nos tecidos. Estudos recentes em modelos animais e pacientes revelaram várias aberrações IMUNOLÓGICAS que coletivamente resultam na persistência e ativação descontrolada de linfócitos autorreativos: A falha da autotolerância nas células B resulta na eliminação defeituosa de células B autorreativas na medula óssea 2 Khilver Doanne Sousa Soares ou em defeitos nos mecanismos de tolerância periférica; As células T auxiliares CD4+ específicas para antígenos nucleossomais também escapam da tolerância e contribuem para a produção de autoanticorpos patogênicos de alta afinidade. Aumento do número de células T auxiliares foliculares foi detectado no sangue de pacientes com LES; A ocupação do TLR pelo DNA e RNA nucleares contidos nos imunocomplexos pode ativar linfócitos B. Esses TLRs funcionam normalmente na detecção de produtos microbianos, incluindo os ácidos nucleicos. Desse modo, células B específicas para antígenos nucleares podem receber sinais dos TLRs e ser ativadas, resultando no aumento da produção de autoanticorpos antinucleares; Interferons tipo I desempenham um papel na ativação linfocitária no LES. Altos níveis de interferons tipo I circulantes + uma assinatura molecular nas células sanguíneas sugerindo exposição a essas citocinas foram relatados em pacientes com LES e correlacionam-se com a gravidade da doença. Os interferons tipo I são citocinas antivirais normalmente produzidas durante as respostas imunológicas inatas aos vírus - pode ser que os ácidos nucleicos se liguem aos TLRs em células dendríticas e estimulem a produção de interferons. Em outras palavras, ácidos nucleicos próprios simulam seus correlatos microbianos. Como os interferons contribuem para o desenvolvimento do LES ainda não está claro; essas citocinas podem ativar células dendríticas e células B e promover respostas de TH1, que estimulam a produção de autoanticorpos patogênicos; Outras citocinas que desempenham um papel na ativação desregulada de linfócitos B incluem o membro da família TNF, BAFF, que promove a sobrevivência das células B. Em alguns pacientes e modelos de animais, foi descrita a produção aumentada de BAFF, levando a tentativas de bloquear a citocina ou seu receptor como terapia para o LES. Há muitas indicações de que FATORES AMBIENTAIS também devem estar envolvidos na patogenia do LES: A exposição à luz ultravioleta (UV) exacerba a doença em muitos indivíduos. A radiação UV pode induzir a apoptose nas células e alterar o DNA de tal forma que ele se torne imunogênico, talvez devido ao aumento do seu reconhecimento pelos TLRs. Além disso, a luz UV pode modular a resposta imunológica, por exemplo, estimulando queratinócitos a produzir IL-1, uma citocina conhecida por promover a inflamação; O viés de gênero do LES é parcialmente atribuído a ações dos hormônios sexuais e parcialmente relacionado aos genes do cromossomo X, independentemente dos efeitos hormonais; Medicamentos como a hidralazina, a procainamida e a D-penicilamina podem induzir uma resposta LES-like nos humanos. A irradiação UV e outras insultos ambientais levam à apoptose de células. A remoção inadequada dos núcleos dessas células resulta em uma grande carga de antígenos nucleares. Anormalidades subjacentes nos linfócitos B e T são responsáveis pela tolerância defeituosa, devido ao fato de que os linfócitos autorreativos sobrevivem e continuam funcionais. Esses linfócitos são estimulados por autoantígenos nucleares e os anticorpos são produzidos contra os antígenos. Complexos dos antígenos e anticorpos ligam-se a receptores Fc nas células B e nas células dendríticas e são internalizados. Os componentes do ácido nucleico ocupam os TLRs e estimulam as células B a produzirem mais autoanticorpos. Os estímulos do TLR também ativam as células dendríticas a produzirem inferferons e outras citocinas, que aumentam ainda mais a resposta imunológica e causam mais apoptose. A resultante é um ciclo de liberação de 3 Khilver Doanne Sousa Soares antígeno e ativação imunológica, resultando na produção de autoanticorpos de alta afinidade. Fonte: KUMAR, V.; ABBAS, A.K.; FAUSTO, N.; ASTER, J.C. Bases Patológicas das Doenças. 9. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016. Modelo para a patogenia do lúpus eritematoso sistêmico. Nesse modelo hipotético, os genes de suscetibilidade interferem na manutenção da autotolerância e desencadeadores externos levam à persistência dos antígenos nucleares. O resultado é uma resposta de anticorpos contra autoantígenos nucleares, que é amplificada pela ação dos ácidos nucleicos nas células dendríticas (DCs) e células B, e a produção de interferons tipo 1. TLRs, Receptores Toll-like. 4 Khilver Doanne Sousa Soares Mecanismo da Lesão Tecidual Diferentes autoanticorpos são a causa da maioriadas lesões do LES. A maioria das lesões sistêmicas é causada por imunocomplexos (hipersensibilidade tipo III). Complexos de DNA-anti-DNA podem ser detectados nos glomérulos e pequenos vasos sanguíneos. Baixos níveis de complemento no sangue (secundários ao consumo das proteínas do complemento) e depósitos granulares de complemento e imunoglobulinas nos glomérulos respaldam ainda mais a natureza de imunocomplexos da doença; Autoanticorpos específicos para hemácias, leucócitos e plaquetas opsonizam essas células e promovem sua fagocitose e lise. Não há evidência de que os ANAs, que estão envolvidos na formação de imunocomplexos, penetrem em células intactas. Contudo, se os núcleos das células estiverem expostos, os ANAs podem ligar-se a eles. Nos tecidos, núcleos de células lesadas reagem com os ANAs, perdem seu padrão de cromatina e tornam-se homogêneos, produzindo os chamados corpos do LE ou corpos de hematoxilina. Relacionada com esse fenômeno, está a célula LE, facilmente vista quando o sangue é agitado in vitro. A célula LE é qualquer leucócito fagocitário (neutrófilo do sangue ou macrófago) que tenha englobado o núcleo desnaturado de uma célula lesada; Síndrome do anticorpo antifosfolipídio. Pacientes com anticorpos antifosfolipídio podem desenvolver tromboses venosas e arteriais, as quais podem estar associadas a abortos espontâneos recorrentes e isquemia focal cerebral ou ocular. Essa constelação de características clínicas associadas ao lúpus é denominada síndrome do anticorpo antifosfolipídio secundária. Tipicamente, o paciente é uma mulher jovem com algumas das característica a seguir (mas não necessariamente todas): Erupção em forma de asa de borboleta na face; Febre; Dor mas sem deformidade em uma ou mais articulações periféricas (pés, tornozelos, joelhos, quadril, dedos, punhos, cotovelos e ombros); Dor torácica pleurítica; Fotossensibilidade. Entretanto, em muitas pacientes a apresentação do LES é sutil e intrincada, assumindo formas como uma doença febril de origem desconhecida, achados urinários anormais ou doença articular disfarçando-se como artrite reumatoide ou febre reumática. ANAs “genéricos” detectados por testes de imunofluorescência são encontrados em quase 100% dos pacientes, mas não são específicos do LES. Vários achados clínicos podem apontar para o envolvimento renal, incluindo hematúria, cilindros hemáticos, proteinúria e, em alguns casos, a clássica síndrome nefrótica. PROGNÓSTICO. O lúpus continua sendo uma doença potencialmente fatal. O LES apresenta um padrão bimodal de mortalidade, onde os óbitos no primeiro ano são atribuíveis à atividade de doença e a infecções, e a mortalidade tardia é atribuída à doença cardiovascular aterosclerótica. após o diagnóstico de LES, é raro se observar uma remissão prolongada. De um total de 702 pacientes registrados na clínica de lúpus de um grupo no Canadá, apenas 6,5% tiveram remissão completa (escore de 0 no SLE Disease Activity Index) e somente 1,7% tiveram remissão mantida por pelo menos cinco anos sem nenhum tratamento. A presença de qualquer dano permanente a órgãos no primeiro ano após o diagnóstico de LES está associada a uma menor sobrevida em 10 anos (75% versus 95% daqueles sem danos permanentes a órgãos). Com relação à evolução renal, um nível elevado de 5 Khilver Doanne Sousa Soares creatinina sérica por ocasião do diagnóstico está relacionado a uma pior evolução final. Diagnósticos Diferenciais É importante lembrar que a linfadenopatia no LES é encontrada em 30% a 80% dos pacientes com certo predomínio das cadeias cervical e axilar. Nesses casos, deve ser considerada a doença de Kikuchi devido à semelhança das manifestações clínicas, e a histopatologia do linfonodo examinado por patologista experiente é de grande auxílio na diferenciação. A evolução das lesões fotossensíveis para hiperpigmentação deve ser sempre diferenciada de cloasma. Fonte: Site Cosmetólogas. Acesso em: 21/11/2021. Disponível em: http://cosmetologas.com.br/noticias/val/2855- 26/cloasmas-uma-rea%C3%A7%C3%A3o-aos- horm%C3%B4nios.html. A rigidez matinal da Artrite no lúpus é bastante proeminente e pode ser facilmente confundida com a da Artrite reumatóide, visto que também compromete pequenas e grandes articulações, na maioria de vezes de forma simétrica. A presença de fator reumatoide em aproximadamente 25% dos pacientes com LES também contribui para essa dificuldade diagnóstica, o que determina uma atenção especial às pacientes femininas jovens que iniciam poliartrite com características clínicas de doença reumatóide. Na fase tardia da doença, o quadro articular crônico com deformidades reversíveis pode ser confundido ao exame físico com o da Artrite reumatóide, cuja diferenciação está na possibilidade de redução e alinhamento ao exame clínico nos pacientes com LES. O quadro de miosite associada ao LES deve ser diferenciado da miosite inflamatória, em que o acometimento será intenso, com recidivas freqüentes e com refratariedade ao tratamento farmacológico. As manifestações cardíacas que devem ser consideradas no diagnóstico diferencial incluem principalmente outras causas de miocardite, Serosite, distúrbios de condução e causas atero- embólicas. A biópsia é de grande valia para a análise de outros fatores que podem interferir na análise da provável lesão histológica, como diabetes melito, hipertensão arterial, síndrome do anticorpo antifosfolípide, levando a trombose de artérias renais e uso de drogas nefrotóxicas. Uma vez que também pode ocorrer de forma isolada, a trombocitopenia do lúpus pode ser diagnosticada como púrpura trombocitopênica imunológica (PTI) quando não são pesquisados fatores antinucleares (FAN) e demais auto-anticorpos próprios do LES. Diagnóstico do LES As provas inflamatórias de fase aguda, como a velocidade de hemossedimentação (VHS) e a proteína C reativa (PCR), são úteis para o diagnóstico. A VHS geralmente está aumentada na atividade da doença, refletindo a fase aguda dos processos inflamatórios, porém pode persistir elevada mesmo após o controle da doença, não se correlacionando com sua atividade inflamatória. Entretanto, a PCR é geralmente baixa no LES e aumenta nos processos http://cosmetologas.com.br/noticias/val/2855-26/cloasmas-uma-rea%C3%A7%C3%A3o-aos-horm%C3%B4nios.html http://cosmetologas.com.br/noticias/val/2855-26/cloasmas-uma-rea%C3%A7%C3%A3o-aos-horm%C3%B4nios.html http://cosmetologas.com.br/noticias/val/2855-26/cloasmas-uma-rea%C3%A7%C3%A3o-aos-horm%C3%B4nios.html 6 Khilver Doanne Sousa Soares infecciosos, auxiliando por vezes no diagnóstico diferencial dessas duas condições. Fonte: Site Medicina NET. Acesso em: 21/11/2021. Disponível em: https://www.medicinanet.com.br/conteudos/revisoes/65/lu pus_eritematoso_sistemico.htm. A avaliação imunológica é fundamental para a caracterização da doença auto-imune. Os FANs detectados pela imunofluorescência indireta utilizando a célula HEp-2 é o primeiro teste a ser realizado, pois é positivo em mais de 98% dos casos e um dos critérios diagnósticos. Ressalta- se que a alta sensibilidade desse exame não reflete a sua especificidade, pois o FAN ocorre em um grande número de doenças crônicas (infecciosas, neoplásicas), auto-imunes e mesmo em indivíduos sadios (particularmente idosos). Fonte: GOLDMAN, Lee; SCHAFER, Andrew I. Goldman Cecil Medicina. 24. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015. A classificação proposta se baseia em onze critérios. Com o propósito de identificar pacientes em estudos clínicos, uma pessoa deve ser apontada com lúpus eritematoso sistêmico se quatro ou mais dos onze critérios estiverem https://www.medicinanet.com.br/conteudos/revisoes/65/lupus_eritematoso_sistemico.htm https://www.medicinanet.com.br/conteudos/revisoes/65/lupus_eritematoso_sistemico.htm 7 Khilver Doanne Sousa Soares presentes, de maneiraseriada ou simultanea, durante qualquer período de observação. De Tan EM, Cohen AS, Fries JF, et al. The 1982 revised criteria for the classification of systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 1982;25:1271. Diante da suspeita de LES e a positividade do FAN, é fundamental tentar caracterizar os auto-anticorpos específicos da doença, particularmente o anti-DNA nativo (anti-dsDNA) e anti-SM, que são marcadores e suas detecções corroboram o diagnóstico. A positividade do anti- dsDNA chega a 40% e a determinação de seus títulos é útil no acompanhamento da atividade inflamatória da doença, particularmente na nefrite. Da mesma forma, os anticorpos antiproteína P ribossômica, presentes em apenas 10% dos casos de LES, podem, em alguns casos, ser os únicos marcadores de doença e também auxiliam no acompanhamento de pacientes com quadros graves de distúrbios psiquiátricos associados a essa doença. Os anticorpos anti-SM são identificados em aproximadamente 30% dos casos e auxiliam no diagnóstico por serem marcadores específicos. Outros anticorpos também são detectados e caracterizam o padrão de resposta imune do LES, sendo frequentes os anticorpos anti-RNP, anti-Ro/SS-A, anti-La/SS-B e os anticorpos antifosfolípide, que estão relacionados com trombose e/ou abortos de repetição, caracterizando a síndrome antifosfolípide (SAF) secundária. Aproximadamente 25% dos casos de LES apresentam positividade do fator reumatóide. REFERÊNCIAS KUMAR, V.; ABBAS, A.K.; FAUSTO, N.; ASTER, J.C. Bases Patológicas das Doenças. 9. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016. GOLDMAN, Lee; SCHAFER, Andrew I. Goldman Cecil Medicina. 24. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015. _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________ _____________________________________________________
Compartilhar