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UCS – Universidade de Caxias do Sul Curso de bacharelado em Direito Disciplina: Direito Civil – Responsabilidade Civil Modalidade: EaD Profª. Ma. Michele Amaral Dill GABARITO TAREFA SEMANA 03 O dano é pressuposto da responsabilidade civil. Segundo Agostinho Alvim, “a inexistência de dano é óbice à pretensão de uma reparação, aliás, sem objeto” (ALVIM apud GONÇALVES, 2015, p.54). Na dicção do art. 186 do Código Civil, a obrigação de indenizar decorre da existência concomitante de violação a norma jurídica e de dano. Ainda que se tome a responsabilidade objetiva como fundada na Teoria do Risco, o único elemento da responsabilidade civil que é excluído da responsabilidade objetiva é a culpa, persistindo o dever de comprovar a conduta, o nexo de causalidade e o dano. Na ótica da referida teoria do risco, toda pessoa que exerce uma atividade e cria um risco de dano para terceiros será obrigada a reparar, caso tal dano se materialize. Contudo, não se pode responsabilizar um sujeito apenas pela atividade de risco, sob pena de inviabilizar diversas atividades essenciais cujo risco é inerente, por exemplo, cite-se o caso das companhias de energia elétrica, elas exercem atividade de risco e responderão caso alguém seja lesado, do contrário, continuarão a exercer sua atividade. Nesse sentido, observe-se o acórdão do TJRS: Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FALHA NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO POR VÁRIOS DIAS. DANO MORAL. OCORRÊNCIA. QUANTUM MANTIDO. [...] 3. A responsabilidade no caso em tela é objetiva, não dependendo de prova de culpa, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, exigindo apenas a existência do prejuízo, a autoria da conduta ilícita praticada e o nexo causal para a configuração do dever de indenizar, pois a demandada se trata de concessionário de serviço público. 4. O texto constitucional consagrou a teoria do risco administrativo, e não a teoria do risco integral, condicionando a responsabilidade do ente estatal ao dano decorrente da sua atividade, qual seja, a existência de causa e efeito entre a atividade do agente público e o prejuízo causado. 5. A agência reguladora dos serviços de energia elétrica estabelece no art. 176 da Resolução n. 414 de 2010, prazos para restabelecimento dos serviços de energia elétrica, os quais podem ser analogicamente aplicados ao caso em exame. Em tais situações, em que é extrapolado o prazo previsto na norma anteriormente citada, o dano moral é presumido, in re ipsa, porquanto não importa em unicamente extrapolar um indicativo de qualidade do serviço, mas indica o descumprimento de prazos máximos estabelecidos pela ANEEL. 6. A parte autora logrou comprovar os fatos articulados na exordial, ônus que lhe cabia e do qual se desincumbiu, a teor do que estabelece o artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil, no sentido de que houve falha na prestação do serviço prestado, consubstanciada na interrupção do fornecimento de energia elétrica sem razão jurídica e por tempo desarrazoado. 7. Não logrou êxito a ré em demonstrar que a interrupção da energia elétrica se deu em razão de força maior, ônus que lhe cabia e do qual não se desincumbiu, a teor do que estabelece o art. 373, II do CPC. A demandada poderia evitar tais intercorrências, com a melhoria da rede de fornecimento. Ademais, as intempéries climáticas podem ter suas consequências minimizadas com um sistema adequado de resolução de tais intercorrências, impedindo a suspensão do serviço por um largo período de tempo. 8. No que tange à prova do dano moral, por se tratar de lesão imaterial, desnecessária a demonstração do prejuízo, na medida em que possui natureza compensatória, minimizando de forma indireta as consequências da conduta da ré, decorrendo aquele do próprio fato. Conduta ilícita da demandada que faz presumir os prejuízos alegados pela parte autora, é o denominado dano moral puro. 9. É perfeitamente passível de ressarcimento o dano moral causado no caso em exame, decorrente de terem sido atingidos direitos inerentes a personalidade da parte autora, quais seja, os atinentes ao seu equilíbrio psicológico e tranquilidade, tendo em vista o desassossego causado por não poder utilizar o serviço essencial que lhe foi sonegado indevidamente. Isso em razão de ter sido interrompido o fornecimento de energia por diversos dias, sem qualquer razão jurídica e por tempo desarrazoado, privando aquela de serviço essencial para manutenção de uma vida digna. 10. O valor a ser arbitrado a título de indenização por dano imaterial deve levar em conta o princípio da proporcionalidade, bem como as condições da ofendida, a capacidade econômica do ofensor, além da reprovabilidade da conduta ilícita praticada. Por fim, há que se ter presente que o ressarcimento do dano não se transforme em ganho desmesurado, importando em enriquecimento ilícito. 11. Honorários recursais devidos a parte que obteve êxito neste grau de jurisdição, independente de pedido a esse respeito, devido ao trabalho adicional nesta instância, de acordo com os limites fixados em lei. Inteligência do art. 85 e seus parágrafos do novel Código de Processo Civil. Rejeitadas as preliminares suscitadas e negado provimento ao apelo. (Apelação Cível Nº 70080342488, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 27/03/2019). Sendo assim, não há responsabilidade sem dano. 1) Felipe, atrasado para um compromisso profissional, guia seu veículo particular de passeio acima da velocidade permitida e, falando ao celular, desatento, não observa a sinalização de trânsito para redução da velocidade em razão da proximidade da creche Arca de Noé. Pedro, divorciado, pai de Júlia e Bruno, com cinco e sete anos de idade respectivamente, alunos da creche, atravessava a faixa de pedestres para buscar os filhos, quando é atropelado pelo carro de Felipe. Pedro fica gravemente ferido e vem a falecer, em decorrência das lesões, um mês depois. Maria, mãe de Júlia e Bruno, agora privados do sustento antes pago pelo genitor falecido, ajuíza demanda reparatória em face de Felipe, que está sendo processado no âmbito criminal por homicídio culposo no trânsito. Com base no caso em questão: a) Maria tem legitimidade para propor a ação de reparação? Sim, Maria tem legitimidade ativa (autora) para propor uma ação indenizatória contra Felipe, agente causador do dano, como representante da prole que é menor (art. 71, CPC). A legitimidade está prevista no art. 12, parágrafo único, Código Civil: Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau. A família de Pedro sofreu o que se chama “dano em ricochete”, o qual atinge além da vítima, terceiros, outro motivo pelo qual se atribui legitimidade à Maria, haja vista que os dois filhos são menores. Isso é reforçado pelo art. 943 também do diploma civil, que trata da transmissibilidade do direito à reparação: “o direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança.” Por fim, a súmula 642 do STJ estabelece que: “ o direito à indenização por danos morais transmite-se com o falecimento do titular, possuindo os herdeiros da vítima legitimidade ativa para ajuizar ou prosseguir a ação indenizatória.” b) Quais danos poderiam ser indenizados? Deve ser requerido no presente caso o dano moral e as verbas às quais os familiares têm direito são aquelas previstas no art. 948 do Código Civil: Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, semexcluir outras reparações: I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família; II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima. c) Se Felipe for absolvido na esfera criminal, necessariamente, será também no âmbito civil? Não necessariamente, se Felipe for absolvido na esfera criminal por falta de provas, isso não vincula o juízo cível, sendo uma exceção à regra de que a sentença penal faz coisa julgada no cível. Contudo, se na esfera penal restarem comprovadas a autoria e a materialidade do fato, esses dados não serão novamente questionados na esfera cível, restando para esta a apuração do dano devido à família de Pedro, em razão do ilícito perpetrado. Esta previsão está no art. 935 do Código Civil: a responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal. 2) José é dono do restaurante Bella Gulla LTDA. Numa matéria jornalística, Pedro expõe tal restaurante ao ridículo, afirmando seus péssimos serviços, a má qualidade da comida e a falta de higiene. Em relação a esse caso hipotético, o restaurante Bella Gulla LTDA., sendo pessoa jurídica, tem direito a indenização por dano moral? Por quê? Sim, embora por muito tempo os Tribunais não admitissem essa possibilidade, está agora consagrado na Súmula 227 do STJ que a pessoa jurídica pode sofrer dano moral. A pessoa jurídica não tem a honra subjetiva como o tem a pessoa física (dignidade, autoestima...), entretanto, deve a pessoa jurídica tutelar sua honra objetiva (art. 52, C.C/2002), isto é, sua reputação perante o mercado, protegendo tal ente de difamações e calúnias indevidas, razão pela qual o Superior Tribunal de Justiça sumulou a matéria, pondo fim à celeuma que questionava tal aplicação. No caso em questão houve clara intenção de difamar a empresa, prejudicando sua reputação no mercado e perante os clientes cativos, razão pela qual é cabível o dano moral. 3) Caso um candidato ao cargo de juiz de direito fosse atropelado quando se dirigia para a realização da prova oral, tendo sido aprovado, e bem classificado, nas outras fases do concurso, seria possível que fosse atribuída ao ofensor a obrigação de indenizar pela perda de uma chance? Por quê? É possível. Não necessariamente teria de estar comprovada a aprovação na fase oral (impossível), nem mesmo seria necessário pautar a reparação pelo sucesso em outros concursos. Porém, o que deveria restar evidenciado é uma “chance real e séria que proporcionasse ao lesado efetivas condições pessoais de concorrer à situação futura esperada” (CAVALIERI FILHO, 2014, p. 98). Portanto, a perda seria não do benefício, mas da chance de alcançá-lo, haja vista que não se tem certeza de que o resultado almejado seria atingido, mas há alta probabilidade disso. Ressalte-se que nesta modalidade de reparação é indispensável a aplicação da razoabilidade. Então, entende-se que é possível atribuir ao agente causador do dano a responsabilidade de indenizar o candidato pela perda de uma chance real e séria de ser aprovado no concurso da magistratura e melhorar sua qualidade de vida. A título de ilustração, colaciona-se a ementa do emblemático REsp (recurso especial) nº 788.459, que inaugurou a teoria da perda da chance no Brasil: RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO. IMPROPRIEDADE DE PERGUNTA FORMULADA EM PROGRAMA DE TELEVISÃO. PERDA DA OPORTUNIDADE. 1. O questionamento, em programa de perguntas e respostas, pela televisão, sem viabilidade lógica, uma vez que a Constituição Federal não indica percentual relativo às terras reservadas aos índios, acarreta, como decidido pelas instâncias ordinárias, a impossibilidade da prestação por culpa do devedor, impondo o dever de ressarcir o participante pelo que razoavelmente haja deixado de lucrar, pela perda da oportunidade. 2. Recurso conhecido e, em parte, provido. Colaciona-se também um acórdão que reconheceu a teoria da perda da chance para um candidato que perdeu o certame em razão de fatos que fugiam a sua esfera de controle: CONSTITUCIONAL, CIVIL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL CONCURSO PÚBLICO. PETROBRAS. CANDIDATO QUE RESTOU IMPOSSBILITADO DE REALIZAR AS PROVAS DO CERTAME EM RAZÃO DESTAS TERM SIDO INICIADAS TOMANDO POR BASE O HORÁRIO DE BRASÍLIA E NÃO O HORÁRIO LOCAL. “CONFIRMAÇÃO DE INSCRIÇÃO” IMPRESSA PELO CANDIDATO, ATRAVÉS DO PRÓPRIO SITE DA CESGRANRIO, TRÊS DIAS ANTES DA DATA PREVISTA NO EDITAL. POSTERIOR RETIFICAÇÃO. APLICAÇÃO DA TEORIA DA “PERDA DE UMA CHANCE”. INDENIZAÇÃO QUE NÃO SE CONFUNDE COM A DECORRENTE DE DANO EVENTUAL OU HIPOTÉTICO. SUBTRAÇÃO DE UMA OPORTUNIDADE FUTURA. QUANTUM CALCULADO COM BASE NA CHANCE EM SI QUE FOI DESPERDIÇADA, E NÃO SOBRE O VALOR DO BENEFÍCIO ESPERADO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I – Com a aplicação da teoria da perda da chance, o que se indeniza não é a vantagem esperada, mas a frustração de obter a vantagem, no futuro, ou mesmo de evitar um prejuízo. II – Se a instituição organizadora do concurso público oportunizou o acesso ao cartão de inscrição três dias antes do prazo previsto no edital, especificando, inclusive, o horário de realização das provas, não parece justo, nem muito menos razoável, imputar ao próprio candidato o equívoco na antecipação de tais dados. (TJRN, AC 20100002524 RN, Relator: Des. Vivaldo Pinheiro, 3ª Câmara Cível, Data de Julgamento: 18/05/2010). 4) João trafegava com seu veículo com velocidade incompatível para o local e avançou o sinal vermelho. José, que atravessava normalmente na faixa de pedestre, foi atropelado por João, sofrendo vários ferimentos. Para se recuperar, José, trabalhador autônomo, teve que ficar internado por 10 dias, sem possibilidade de trabalhar, além de ter ficado com várias cicatrizes no corpo. Em virtude do ocorrido, José ajuizou ação, pleiteando danos morais, estéticos e materiais. José sofreu danos morais, estéticos e materiais? Justifique a sua resposta. Sim, José foi vítima de danos: moral, material e estético; e, por isso, terá direito a receber a indenização na forma pleiteada. O dano moral fica caracterizado pelas lesões e pelo sofrimento por ele sentido. O dano material configura-se em virtude do tempo que José ficou sem trabalhar. Já o dano estético é evidenciado nas cicatrizes com que ficou. Há a possibilidade de cumulação dos danos moral, material (dano emergente e lucros cessantes) e estético, uma vez que o objeto de cada uma dessas modalidades de dano se faz presente no caso em questão. Art. 5º, V e X, CF/88; art. 186, C.C/2002; súmula 387 do STJ; arts. 6º e 196, CF/88; arts. 4º e 6º, I, CDC; Lei nº 8.080/90, art. 1º; arts. 949 e 950, C.C/2002; enunciado 192 da III Jornada de Direito Civil.
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