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Kamilla Galiza / 5º Período / APG Objetivos • Revisar a sensopercepção (conceito, estruturas envolvi- das) • Classificar as alterações da sensopercepção • Analisar os mecanismos das alterações de sensoper- cepção • Identificar as etiologias e fatores de risco para as alte- rações sensopercepção (destacando as drogas) • Explicar a semiotécnica para as alterações sensoper- cepção Sensopercepção Sensação: Fenômeno elementar gerado por estímulos físicos, químicos ou biológicos variados, originados fora ou dentro do organismo, que produzem alterações nos órgãos receptores, estimulando-os. Esses estímulos fornecem alimentação ao sistema de informação do organismo. Dimensão neuronal ainda não plenamente consciente. Fenômeno passivo. A sen- sopercepção constitui a primeira etapa da cognição, ou seja, do conhecimento do mundo externo. Este se refere aos obje- tos reais, isto é, àqueles que estão fora de nossa consciência. Percepção: A tomada de consciência de um determinado estímulo sensorial. Dimensão neuropsicológica e psicológica do processo. Fenômeno ativo. A percepção é confrontada com experiências passadas registradas na memória e com o contexto sociocultural. Produto ativo, criativo e pessoal de ex- periências. Apercepção: Perceber algo integralmente, com clareza e ple- nitude. Um novo conteúdo é articulado de tal modo a conte- údos semelhantes já dados que se pode considerar imedia- tamente claro e compreendido. Sensações: formas e cores em uma fotografia Percepções: um quadro-negro, carteiras, crianças uniformi- zadas (sentadas) e uma senhora de pé (apontando para o quadro) Apreensão (ou apercepção): uma aula. Classificação das qualidades sensoriais Exteroceptivas: visuais, auditivas, gustativas, olfativas, cutâ- neas (táteis, térmicas, dolorosas) Interoceptivas (ou cenestésicas): bem-estar, mal-estar, fome, sede, sensibilidade visceral Proprioceptivas: cinestésicas (movimentos corporais), posi- ção segmentar do corpo, equilíbrio, barestesia (sensibilidade à pressão), palestesia (sensibilidade para vibrações). Imagem perceptiva e imagem representativa Corporeidade: os objetos são tridimensionais Extrojeção: os objetos estão localizados no espaço objetivo externo, isto é, fora da consciência Nitidez: os contornos dos objetos são precisos Frescor sensorial: a percepção é vívida. Por exemplo: as cores são brilhantes Estabilidade: a imagem é constante, não desaparece nem se modifica de uma hora para outra Ausência de influência pela vontade: a imagem é aceita passivamente pelo indivíduo, que não pode evocá-la nem modificá-la arbitrariamente. Tipicamente são estas as características da imagem re- presentativa (ou mnêmica) • Ausência de corporeidade: a imagem é bidimensional • Introjeção: o objeto está localizado no espaço subjetivo interno, isto é, na mente. • Imprecisão • Falta de frescor sensorial • Instabilidade • Possibilidade de influência pela vontade. Alterações quantitativas Agnosia A agnosia constitui um distúrbio do reconhecimento de estí- mulos visuais, auditivos ou táteis, na ausência de déficits sen- soriais. As sensações continuam a ocorrer normalmente, po- rém não são associadas às representações e, assim, não se tornam significativas. Em outras palavras, há um comprome- timento específico do ato perceptivo. Na agnosia visual, o do- ente é capaz de descrever a cor e a forma de um objeto, mas não o identifica. Ele não consegue dizer, por exemplo, que se trata de um guarda-chuva, nem dizer para que ele serve. Esse distúrbio está relacionado a lesões em áreas associativas corticais. Hiperestesia A hiperestesia (ou hiperpercepção) consiste num aumento global da intensidade perceptiva: as impressões sensoriais tornam-se mais intensas, mais vívidas ou mais nítidas. Na modalidade visual, as cores ficam mais brilhantes. É obser- vada na mania; na intoxicação por anfetamina, cocaína, ma- conha e alucinógenos (LSD, mescalina etc.); em algumas cri- ses epilépticas; em quadros dissociativos; no hipertireoidismo. Alternativamente, a hiperestesia pode ser definida como uma hipersensibilidade a estímulos sensoriais comuns, que, pato- logicamente, se tornam desagradáveis. Nesse caso, por exemplo, ruídos de pequena intensidade tornam-se extrema- mente incômodos. Isso pode ocorrer na depressão, em esta- dos de ansiedade, na enxaqueca, no autismo e na ressaca pós-intoxicação alcoólica. Hipoestesia A hipoestesia (ou hipopercepção) consiste numa diminuição global da intensidade perceptiva. O mundo parece mais es- curo e sem brilho, a comida é insossa, os sons são abafados etc. Observa-se principalmente em quadros estuporosos alterações Kamilla Galiza / 5º Período / APG (com abolição da psicomotricidade), sejam relacionados a depressão, esquizofrenia ou delirium. Anestesia A anestesia consiste numa abolição da sensibilidade. É en- contrada nas mesmas situações que a hipoestesia, e ainda em quadros conversivos (amaurose ou surdez histérica, anestesias em bota ou em luva), na intoxicação alcoólica, no coma. Alucinação negativa A alucinação negativa é definida como uma aparente ausên- cia de registro sensorial de determinado objeto presente no campo sensorial do paciente; como, por exemplo, não ver uma pessoa que está diante de seus olhos. Por definição, os órgãos sensoriais estão íntegros. Esse fenômeno está relacio- nado a um mecanismo psicogênico, sendo observado em quadros conversivos. Macropsia Na macropsia, os objetos parecem ao paciente aumentados de tamanho. Micropsia Na micropsia, os objetos parecem menores do que realmente são. Dismegalopsia Na dismegalopsia, os objetos parecem deformados, algumas partes estão aumentadas ou diminuídas. A dismegalopsia, assim como a macropsia e a micropsia, ocorre mais frequen- temente em quadros de delirium, na epilepsia temporal, na esquizofrenia e na intoxicação por alucinógenos. O distúrbio da autoimagem corporal que ocorre na anorexia nervosa – no qual o paciente, mesmo estando extremamente emagre- cido, se vê como gordo – poderia ser classificado como uma macropsia. Ilusão É a percepção deformada da realidade, de um objeto real e presente, uma inter- pretação errônea do que existe. Pode acontecer em rebaixamento do nível de consciência ou esgota- mento afetivo e fadiga grave. Alucinação É a percepção real de um objeto inexistente, ou seja, sem um estímulo externo. Dizemos que a percepção é real, tendo em vista a con- vicção inabalável que a pessoa manifesta em rela- ção ao objeto alucinado; portanto, será real para ela. As alucinações podem ser auditivas (dentre elas, po- dem ocorrer sonorização do pensamento, quando o paciente ouve os próprios pensamentos, e publicação do pensamento, quando o paciente sente que as pes- soas escutam o que ele pensa), auditivo-verbais (mais comuns), visuais, ol- fativas, gustativas, cenesté- sicas (corpórea "cabeça encolhendo"), cinestésicas (movimento "corpo vo- ando") e sinestésicas (en- volvem mais de 1 sentido). Também existem as aluci- nações hipnagógica (ao adormecer) e hipnopôm- pica (ao despertar). Pseudoalucinação Não apresentam os aspec- tos vivos e corpóreos das alucinações e são menos nítidas. Ocorrem em casos de psicoses orgânicas, into- xicações ou estados afeti- vos intensos. Alucinose São quadros alucinatórios sem perda da consciência da realidade; o paciente percebe a alucinação como estranha à sua pes- soa. Acontece em casos de alcoolismo. Despersonalização O paciente tem a sensação de que seu corpo não lhe pertence. Desrealização O ambiente ao redor pa- rece estranho e irreal. Alterações qualitativas A ilusão, a pareidolia, a alucinação e a sinestesia representam as alterações qualitativas da sensopercepção. Ilusão Trata-se de uma percepção falseada, deformada, de um ob- jeto real e presente. No lugardeste, um outro objeto é perce- bido. A deturpação da imagem perceptiva se dá em função da mescla desta com uma imagem representativa. Pode ocorrer não só em doentes mentais, mas também em pessoas normais. As ilusões são assim classificadas: por de- satenção, catatímicas e oníricas. Na ilusão por desatenção, elementos representativos são introduzidos para completar ou corrigir estímulos externos escassos ou incorretos, respec- tivamente. É o que ocorre quando, sem nos darmos conta, alterações qualitativas da sensopercepção ilusão Pareidolia alucinação alucinação verdadeira pseudoalucinação alucinosesinestesia Kamilla Galiza / 5º Período / APG completamos uma frase ouvida apenas de forma fragmen- tária, ou corrigimos as falhas de impressão na leitura de um livro. Quando se presta mais atenção, num segundo mo- mento, a ilusão desaparece. Na ilusão catatímica, a deformação do objeto tem origem em um afeto intenso, relacionado a desejo ou a temor. Um exem- plo seria o de um indivíduo apaixonado falsamente reconhe- cer a pessoa amada nos diversos estranhos com os quais cruza rapidamente andando pela rua. Essa forma de ilusão também desaparece com a atenção. A ilusão onírica está relacionada a um quadro de rebaixa- mento do nível de consciência. No delirium, as ilusões são pre- dominantemente visuais e se associam, com frequência, a fenômenos alucinatórios. Pode acontecer, por exemplo, de um paciente obnubilado, internado em uma unidade de tra- tamento intensivo, ao olhar para um médico que se aproxima, veja no pescoço deste uma cobra, quando na verdade trata- se de um estetoscópio. Pareidolia Esse fenômeno consiste numa imagem (fantástica e extroje- tada) criada intencionalmente a partir de percepções reais de elementos sensoriais incompletos ou imprecisos. Por exemplo: ver figuras humanas, cenas, animais, objetos etc., em nuvens, em manchas ou relevos de paredes, no fogo, na Lua etc.; ou “ouvir” sons musicais com base em ruídos monó- tonos. Nesses casos, o objeto real passa para um segundo plano. A pareidolia não é patológica; ocorre em pessoas nor- mais. Trata-se de um fenômeno bastante relacionado à atividade imaginativa. Apesar de a pareidolia ser incluída por diversos autores, como Jaspers (1987), entre as formas de ilusão, dife- rencia-se desta pelo fato de o indivíduo estar todo o tempo consciente da irrealidade da imagem e de sua influência so- bre esta. Exceto por ser projetada para o espaço objetivo ex- terno, a pareidolia possui as características da imagem re- presentativa, como a possibilidade de influenciamento volun- tário. Alucinação As alucinações não se originam de transformações de per- cepções reais, o que as distinguem das ilusões. Todavia a dis- tinção teórica entre alucinações e ilusões não é tão simples, já que, em condições naturais, os órgãos sensoriais recebem o tempo todo estímulos externos. A atenção não remove as alucinações, ao contrário do que acontece com as ilusões por desatenção e catatímicas. As alucinações ocorrem simultâ- nea e paralelamente às percepções reais, diferentemente das imagens do sonho. As alucinações podem levar secundariamente ao desenvol- vimento de ideias deliroides, criadas como uma explicação para aquelas. Existem três espécies de vivências alucinató- rias: as alucinações verdadeiras, as pseudoalucinações e as alucinoses. Alucinações verdadeiras: As alucinações verdadeiras apre- sentam todas as características de uma imagem perceptiva real, incluindo a corporeidade e a localização no espaço ob- jetivo externo. Possuem uma irresistível força de convencimento, ou seja, são aceitas pelo juízo de realidade, por mais que pareçam para o próprio paciente estranhas ou especiais. Pseudoalucinações: Diferenciam-se das alucinações verda- deiras pela ausência de corporeidade e localização no es- paço subjetivo interno. Quanto aos demais aspectos (niti- dez/imprecisão, presença ou ausência de frescor sensorial, constância/instabilidade e possibilidade ou impossibilidade de influenciamento pela vontade), podem se parecer tanto com a imagem perceptiva quanto com a imagem represen- tativa. Assim como nas alucinações verdadeiras, há plena convicção quanto à realidade do fenômeno. As pseudoaluci- nações parecem ser especialmente frequentes na esquizo- frenia, mas podem ocorrer também nos quadros em que há alteração do estado da consciência, como no delirium (re- baixamento) e nos estados crepusculares histéricos e epilép- ticos (estreitamento). Alucinoses: Assim como nas alucinações verdadeiras, nas alucinoses o objeto percebido é localizado no espaço obje- tivo externo. Mas, segundo Claude e Ey, diferenciam-se das alucinações verdadeiras por serem adequada e imediata- mente criticadas pelo indivíduo, que reconhece o fenômeno como algo patológico. As alucinoses ocorrem sob lucidez de consciência. São também chamadas alucinações neurológi- cas, já que estão relacionadas a distúrbios de origem orgâ- nica: são observadas em lesões do pedúnculo cerebral, assim como em áreas específicas do tronco cerebral e nos lobos occipital e temporal; em intoxicações por alucinógenos (LSD, mescalina); na estimulação elétrica cortical em neurocirur- gias; em focos epilépticos; na enxaqueca (os escotomas cin- tilantes); e no fenômeno do membro fantasma em amputa- dos. Vivências alucinatórias nas diversas modalidades sensori- ais: As alucinações visuais podem ser elementares (ou sim- ples), quando contêm elementos de uma única forma de sensação, sendo então denominadas fotopsias: clarões, cha- mas, pontos brilhantes. Podem ser também complexas (ou elaboradas): figuras, objetos, pessoas, cenas estáticas ou emmovimento. As alucinações visuais são típicas dos qua- dros de delirium e na intoxicação por alucinógenos (LSD, mes- calina etc.), sendo incomuns na esquizofrenia e nas psicoses afetivas. As alucinações auditivas são consideradas as mais comuns. Elas podem ser elementares, sendo chamadas de acoasmas: zumbidos, estalidos, silvos, sinos, campainhas. Po- dem ser ainda complexas, chamadas de fonemas: palavras, frases (alucinações auditivo-verbais). As alucinações musi- cais também deveriam ser incluídas entre as complexas. En- tre as alucinações auditivas, as auditivo-verbais são as mais comuns. As vozes podem ser bem claras ou ininteligíveis para o paciente; podem dirigir-se diretamente ao paciente, ou di- alogar entre si, referindo-se a ele na terceira pessoa. Algumas vozes ofendem, criticam, ameaçam o paciente ou lhe dão or- dens. Estas últimas são chamadas de alucinações imperati- vas. Alucinações auditivas são especialmente comuns na es- quizofrenia e na alucinose alcoólica, podendo ser encontra- das também em psicoses afetivas e em outros quadros psi- cóticos. Alucinações olfativas e gustativas são raras e, em geral, estão associadas, podendo ser difícil, na prática, a dis- tinção entre elas. Na maioria das vezes, o paciente experi- menta um odor ou gosto bastante desagradável, como de fezes, lixo, animais mortos, veneno etc. Essas alucinações po- dem estar relacionadas a uma recusa sistemática de alimen- tos (sitiofobia). Parecem ser mais comuns na esquizofrenia e Kamilla Galiza / 5º Período / APG em crises parciais epilépticas. Entre as alucinações cutâneas estão incluídas, além das sensações táteis (de toque), sensa- ções térmicas, dolorosas e hídricas (de umidade). Os pacien- tes queixam-se de queimaduras, espetadas, choques, ou de que pequenos animais (em geral insetos) movem-se sobre ou sob a sua pele. As alucinações cutâneas ocorrem com es- pecial frequência no delirium tremens e na intoxicação por cocaína ou anfetamina. Nas alucinações cenestésicas (ou viscerais), as sensações são localizadas nos órgãos internos. Os pacientes queixam-se de que seus corpos estão sendo atingidos por misteriosas irradiações ou descargas elétricas; de que seus órgãos genitais estão sendo tocados – experi- mentam o orgasmo ou sentem-se violentados –; de que o cérebroestá encolhendo, o fígado está destruído, há um bi- cho dentro do abdômen. Essas alucinações são comuns na esquizofrenia e, com frequência, estão associadas a delírios de influência e à síndrome de Cotard. Alucinações cinestési- cas são falsas percepções de movimento, ativos ou passivos, de todo o corpo ou só de um segmento. Apesar de estar na verdade imóvel, o paciente tem a sensação de que está afundando no leito, girando, voando, dobrando as pernas, elevando um braço etc. Uma forma especial de alucinações cinestésicas são as alucinações psicomotoras verbais: em- bora calado, o paciente sente os músculos do aparelho fona- dor animados de movimento, dando-lhe a impressão de que alguém está falando por ele. As alucinações cinestésicas po- dem ser encontradas na esquizofrenia catatônica, no delirium tremens e em outros quadros de etiologia orgânica. Formas especiais de vivências alucinatórias: A alucinação liliputiana consiste na visão de personagens ou animais mi- núsculos. Está relacionada à intoxicação por cocaína. A alu- cinação guliveriana representa uma alucinação visual gi- gantesca. Essa forma de alucinação ocorre na esquizofrenia e em algumas psicoses de origem orgânica. A alucinação funcional, por definição, é desencadeada por estímulos sen- soriais reais, que são da mesma modalidade. Por exemplo: o paciente, ao ouvir o som de um jorro de água, apresenta alu- cinações auditivo-verbais, as quais desaparecem assim que a torneira é fechada. Não se trata de ilusão, já que as vozes e o correr da água são ouvidos simultânea e distintamente. Na sonorização do pensamento, o paciente ouve o próprio pen- samento, reconhecido como tal, no espaço objetivo externo. Esse fenômeno pode se dar antes, no momento ou depois do ato de pensar (só neste último caso caberia o termo eco do pensamento). A sonorização do pensamento ocorre na es- quizofrenia. A autoscopia (ou heautoscopia) consiste na vi- são da imagem do próprio corpo projetada no espaço ex- terno. Em geral, essa experiência se acompanha de sofri- mento ou medo. Ocorre na esquizofrenia, na epilepsia do lobo temporal, no delirium e na intoxicação por alucinógenos (psi- codislépticos). As alucinações hipnagógica e hipnopômpica são em geral visuais, mas também podem ser auditivas ou táteis. Estão relacionadas à transição sono–vigília: a primeira ocorre no momento em que se está adormecendo; a se- gunda, no despertar. O indivíduo mantém a crítica quanto à irrealidade das imagens, as quais possuem mais caracterís- ticas das representações do que das percepções. Esses fenô- menos, que a rigor deveriam ser considerados sonhos, e não alucinações, ocorrem em pessoas normais e na narcolepsia. Na alucinação reflexa, um estímulo sensorial real em uma modalidade desencadeia uma alucinação em outra. Sinestesia Na sinestesia, um estímulo sensorial em uma modalidade é percebido como uma sensação em outra modalidade. Por exemplo: ver sons, ouvir cores etc. Isso ocorre na intoxicação por alucinógenos (LSD, mescalina etc.). Hiperestesia Intoxicação por alucinóge- nos, epilepsia Aumento das formas de sensibilidade Hipoestesia Quadros depressivos Diminuição das formas de sensibilidade Anestesia Abolição de todas as for- mas de sensibilidade Etiologia A causa da alteração sensório-perceptiva depende da con- dição subjacente e dos fatores de risco. Fatores que podem aumentar o risco de alterações perceptivas sensoriais in- cluem: • Condições psiquiátricas: Transtorno do espectro do au- tismo (TEA), Transtorno de déficit de atenção e hiperati- vidade (TDAH), Esquizofrenia e Transtorno de processa- mento sensorial (SPD) • Distúrbios do sono • Delirium em Terapia Intensiva • Problemas neurológicos: doença de Alzheimer, doença de Parkinson, distúrbio convulsivo. • Disfunção visual: idade na ótica do olho, retinopatia, glaucoma, catarata, maculopatia. • Problemas de audição • Desequilibro eletrolítico • Uso de álcool ou drogas ilícitas • Problemas médicos crônicos Fisiopatologia O mecanismo pelo qual a alteração sensorial e perceptiva pode ocorrer pode ser devido a um insulto direto ao cérebro ou devido a respostas aberrantes ao estresse. [31] O desar- ranjo bioquímico, devido ao aumento da liberação de dopa- mina, cortisol, glutamato e norepinefrina, juntamente com a diminuição das funções colinérgicas, pode causar tais altera- ções. Além disso, alterações na atividade aumentada ou di- minuída da serotonina ou do ácido gama-aminobutírico po- dem se manifestar como diferentes apresentações clíni- cas. Alterações relacionadas à idade na neurotransmissão e na sinalização intracelular também podem ocorrer e causar alterações. Respostas de estresse aberrantes como mudan- ças agudas no ambiente, trauma, doença grave e cirurgia podem causar anormalidades e podem alterar a liberação de neurotransmissores levando a alterações sensoriais e per- ceptivas. A diminuição do metabolismo oxidativo cerebral pode causar a liberação anormal de neurotransmissores le- vando à disfunção cerebral. A hipótese da sinalização celular especula que a transdução do sinal intraneuronal é afetada, causando uma mudança na produção e liberação do neuro- transmissor levando a uma sensação alterada. Exame da sensopercepção Entrevista psiquiátrica Kamilla Galiza / 5º Período / APG Perguntas diretas ao paciente quanto a ouvir vozes ou ter vi- sões têm valor limitado. O paciente pode responder afirmati- vamente, por não compreender bem a pergunta, acredi- tando que esta se refere a vozes ou visões reais do ambiente, que todos ouvem ou veem. Um indivíduo normal pode ter o interesse em se passar por doente mental – para obter be- nefícios previdenciários ou se eximir de responsabilidade pe- nal –, e assim dar uma resposta mentirosa. Além disso, doen- tes que estão experimentando alucinações podem negar a presença delas por diversas razões: para receber alta hospi- talar, em função de uma proibição nesse sentido por parte das vozes etc. Assim, é muito mais fidedigna a observação do comportamento do paciente. Observação do comportamento do paciente São indícios de atividade alucinatória: • Atenção comprometida (o paciente parece estar pres- tando atenção em outra coisa que não as perguntas do examinador); mudanças súbitas da posição da cabeça; fisionomia de terror ou de beatitude; proteção dos ouvi- dos, olhos, narinas ou órgãos genitais com as mãos, al- godão ou outro material • Falar sozinho, dar respostas incoerentes em relação às perguntas, risos imotivados (alucinações auditivas) • O olhar fixo em determinada direção, desvios súbitos do olhar, movimentos defensivos com as mãos (visuais) • A recusa sistemática de alimentos (gustativas e olfati- vas) • Movimentos das mãos como que afastando algo da su- perfície do corpo (cutâneas) • Peças metálicas ou outros dispositivos junto à indumen- tária, para deter irradiações ou descargas elétricas no corpo (cenestésicas). A sensopercepção nos principais transtornos mentais Esquizofrenia A esquizofrenia apresenta grande riqueza alucinatória, espe- cialmente na forma paranoide. Predominam as alucinações cenestésicas e auditivas. As alucinações visuais são raras. As pseudoalucinações parecem ser mais frequentes que as alu- cinações verdadeiras, mas, na prática, a distinção pode ser difícil. A sonorização do pensamento, vozes que dialogam en- tre si, vozes que tecem comentários sobre o comportamento do doente e sensações corporais (cenestésicas) impostas fo- ram os sintomas sensoperceptivos incluídos por K. Schneider entre os de primeira ordem para o diagnóstico de esquizofre- nia. Os quadros apático-abúlicos cursam com hipoestesia. Transtornos do humor Nos transtornos do humor podem ocorrer hiperestesia (na mania) ou hipoestesia (na depressão) e ilusões catatímicas. Nos quadros afetivos com sintomas psicóticos, as alucina- ções auditivas são as mais frequentes. Delirium No delirium predominamas ilusões e alucinações visuais, sendo difícil, na prática, diferenciar umas das outras. Alucina- ções auditivas e táteis não são raras. Na conceituação de Jaspers, seriam na verdade pseudoalucinações, em função da perda da lucidez de consciência. Pode haver hipoestesia, micropsia, macropsia e dismegalopsia. No delirium tremens, são comuns as zoopsias (visões de pequenos animais) e as alucinações liliputianas, além de alucinações táteis. Alucinose alcoólica Na alucinose alcoólica, predominam as alucinações auditi- vas, que possuem as características de uma alucinação ver- dadeira, e não de alucinose. Intoxicação por alucinógenos Durante o uso de mescalina, LSD etc., ocorrem hiperestesia, micropsia, macropsia e sinestesia. As alucinações são basi- camente visuais, com um conteúdo muitas vezes de formas geométricas. Essas vivências alucinatórias poderiam ser clas- sificadas como alucinoses, em função da preservação da crí- tica Epilepsia Nas crises parciais, como na aura epiléptica, podem ocorrer alucinoses. Nas crises parciais complexas, em que há estrei- tamento da consciência, muitas vezes são vivenciadas pseu- doalucinações. Demência A demência cortical pode cursar com agnosia. Transtorno conversivo e transtornos dissociativos Nos quadros conversivos, podem ocorrer hiperestesia, anes- tesia e alucinações negativas. Já nos quadros dissociativos, podem ser encontradas pseudoalucinações. Nestas costu- mam estar combinadas mais de uma modalidade sensorial ao mesmo tempo. Por exemplo, o paciente “vê” uma pessoa que na verdade não está presente e ainda “ouve” a voz dela. Na histeria de conversão, podem ocorrer hiperestesia, anes- tesia e alucinações negativas. Contribuições da psicanálise Alucinação como realização de desejo Para Freud, a alucinação constitui o primeiro mecanismo de realização de desejo do recém nascido – a criança alucina o seio da mãe quando tem fome, revivenciando a experiência de satisfação anterior com o seio real –, seguindo assim o princípio do prazer. Mais tarde, com a inibição desse meca- nismo, que se mostra pouco eficaz, podem se desenvolver a fantasia e o pensamento. Rejeição O mecanismo de defesa conhecido como rejeição ou repúdio (forclusion, em francês) ocorre no esquizofrênico. Este retira a libido dos objetos e a reinveste no próprio ego. Mais tarde tenta investi-la novamente nos objetos, mas o faz de forma patológica: os objetos internos que foram rejeitados retornam como se estivessem vindo do mundo externo – não são mais reconhecidos como pertencentes ao self –, sendo assim for- madas as alucinações. Contribuições das neurociências Percepção normal A especificidade é uma característica dos receptores senso- riais. Cada receptor, que está em contato com o mundo ex- terno, é sensível apenas a um tipo de energia: luminosa, me- cânica, térmica ou química. Por exemplo, os receptores sen- soriais auditivos não captam informações sensoriais visuais. Todas as formas de energia que chegam ao receptor são Kamilla Galiza / 5º Período / APG convertidas em energia eletroquímica (potenciais de ação). Isso é o que se chama de transdução do estímulo. Após a transdução do estímulo ocorre a codificação neural: o pa- drão de descargas dos potenciais de ação representa a in- formação do estímulo. Quanto maior a intensidade do estí- mulo, maiores a frequência de descarga e o número de re- ceptores ativados. A modalidade da informação (visual, tátil etc.) está relacionada à especificidade do receptor. A dura- ção, por sua vez, está relacionada ao tempo necessário para haver adaptação dos receptores, que ocorre quando o estí- mulo é constante. Já a localização do estímulo está represen- tada nos mapas neurais corticais, que mantêm a mesma or- ganização espacial encontrada nas superfícies receptivas. Pelo tálamo passam as informações sensoriais (exceto as da olfação) antes de chegarem às áreas sensoriais primárias, no córtex. O tálamo é considerado um retransmissor, pois modi- fica as informações sensoriais: realiza uma inibição lateral, que propicia uma maior acuidade no processo sensorial. Do tálamo, essas informações atingem as regiões corticais pri- márias, relacionadas com as modalidades sensoriais especí- ficas. Em seguida, as áreas corticais secundárias começam a dar sentido aos sinais sensoriais específicos, cabendo a elas a interpretação da cor, da forma etc. A área de associação parieto-occipitotemporal tem um papel importante no reco- nhecimento dos objetos. As características sensoriais ele- mentares (cor, forma etc.) são processadas separada e pa- ralelamente: as informações relativas a cada uma delas se- guem vias neurais diferentes e chegam a regiões corticais di- ferentes. Quanto à integração das informações sensoriais, o seu mecanismo ainda é pouco conhecido, mas sabe-se que está relacionada a circuitos associativos corticocorticais. É necessário que haja sincronia quanto às descargas das dife- rentes vias sensoriais para que as informações sensoriais se- jam associadas a um mesmo objeto. Para que se dê o reco- nhecimento do objeto, o padrão dos estímulos sensoriais atu- ais é comparado aos padrões armazenados na memória. Se- gundo a psicologia de gestalt, a imagem perceptiva é mais do que a soma dos elementos sensoriais: é construída tam- bém a partir das representações. Isso se evidencia nas ilusões por desatenção, nas pareidolias e na constatação de que as mesmas áreas cerebrais são ativadas quando se vê um ob- jeto e quando se imagina visualmente o mesmo objeto. Além disso, a imagem perceptiva é bastante influenciada pela atenção seletiva – que determina o que será o foco e o que será o fundo –, pela motivação e pelas emoções. Na maior parte das vezes, os estímulos são subliminares e não são per- cebidos. Mas na memória de longo prazo podem ser arma- zenadas informações que nunca chegaram à consciência. A conscientização da percepção está relacionada ao hemisfé- rio cerebral esquerdo: estímulos visuais de objetos projetados na metade esquerda do campo visual vão chegar inicial- mente ao hemisfério direito, mas só vão ser representados na consciência quando a informação chegar ao hemisfério es- querdo. Isso é demonstrado em estudos com pacientes que sofreram secção do corpo caloso, comissura que conecta os dois hemisférios. Alucinações e privação sensorial A privação sensorial experimental em animais leva a distúr- bios neuronais. Observa-se uma associação entre déficit vi- sual e o surgimento de alucinações visuais, e entre surdez e alucinações musicais. Estudos recentes de neuroimagem funcional indicam que as mesmas áreas corticais são ativadas na percepção normal da fala e durante a experiên- cia de alucinações auditivas (David, 1999; Hoffman, 1999). A hi- pótese formulada foi a de que a privação de estímulos exter- nos levaria a um estado de liberação neuronal, no qual o pró- prio sistema nervoso produziria o fenômeno sensorial. Um es- tado semelhante ao de uma privação sensorial poderia surgir em função de distúrbios em estruturas subcorticais, que, atu- ando como um mecanismo de portão, estariam inibindo a chegada de estímulos sensoriais ao córtex. Alucinações e neuroquímica Alucinações podem ser causadas por substâncias que au- mentam a atividade da dopamina, como a cocaína, a anfe- tamina, a l-dopa e a bromocriptina. Os antipsicóticos anta- gonizam a atividade da dopamina no sistema nervoso cen- tral e são eficazes na redução de sintomas como as alucina- ções. Já as substâncias alucinógenas, como LSD, mescalina, psilocibina etc., que provocam um quadro alucinatório bas- tante rico, predominantemente visual, possuem um efeito agonista serotoninérgico. Diante dessas informações, formu- lou-se a hipótese de que as alucinações estariam relaciona- das a uma hiperatividade nas vias dopaminérgicas e seroto- ninérgicas. Alucinações | Abordagem cognitivista Foi levantada a seguinte hipótese: as alucinações constitui- riam imagens derivadasde fontes internas de informações que seriam erroneamente avaliadas como oriundas do mundo externo. Estudos de ressonância magnética funcional indicam que a fala interna – conversar consigo próprio em silêncio – e as alucinações auditivo-verbais estariam relacio- nadas à ativação da mesma região cortical (David, 1999). Tratamento / Gestão A principal prioridade é a segurança dos pacientes. Tais alte- rações não apenas aumentam o estresse sobre o paciente, mas os pacientes podem estar em risco de quedas, lesões e talvez possam ser um perigo para si mesmos ou para os ou- tros devido a seus comportamentos violentos. O manejo e as intervenções dependem da causa dos distúrbios sensoriais e perceptivos. Portanto, é necessária uma avaliação cuidadosa para determinar a causa enquanto assiste o paciente e evita que ele sofra mais sofrimento ou lesões. O paciente pode ser apoiado para ser reorientado para o tempo, lugar e pessoa. Isso pode ser feito envolvendo o paci- ente em uma conversa sobre as notícias atuais, o clima ou perguntando sobre seus hobbies ou experiências. Devem ser monitorados com frequência e acomodados em ambiente confortável e desprovido de estímulos excessivos (luzes fortes, ruídos dentro da UTI). Complicações A principal complicação é o estresse e possíveis danos ao pa- ciente devido a um ambiente inseguro. As alterações não apenas aumentam o estresse sobre o paciente, mas os pa- cientes podem estar em risco de quedas, lesões e talvez pos- sam ser um perigo para si mesmos ou para os outros devido a seus comportamentos violentos. Uma avaliação cuidadosa é necessária para determinar a causa enquanto assiste o pa- ciente e previne-o de qualquer sofrimento ou lesão adicional. Kamilla Galiza / 5º Período / APG Referencias: Manual de psicopatologia / Elie Cheniaux. - 5. ed. - Rio de Ja- neiro: Guanabara Koogan, 2015. KHAN, Isra; KHAN, Moien AB. Sensory and Perceptual Alterations. 2020.
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