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1 Júlia Morbeck – @med.morbeck Objetivos 1- Abordar o papel do sistema imunológico nas doenças autoimunes; 2- Discutir a etiologia e a epidemiologia das doenças pericárdicas; 3- Debater sobre a fisiopatologia e as manifestações clínicas das doenças pericárdicas; 4- Explicar como é feito o diagnóstico das doenças pericárdicas. Doenças autoimunes OBS.: Em todos os indivíduos, existe um certo grau de reconhecimento do próprio. Na verdade, é necessário que as células T sejam selecionadas positivamente no timo para o reconhecimento do MHC próprio. Além disso (exceto em indivíduos com imunodeficiência profunda), as células B autorreativas e as células T reativas aos peptídios + MHC próprios são detectáveis na circulação de todos os seres humanos, assim como os autoanticorpos (ROITT, 13ª ed.). ↠ As doenças autoimunes podem ser sistêmicas ou órgão-específicas dependendo da distribuição dos autoantígenos que são reconhecidos. Por exemplo, a formação de imunocomplexos circulantes compostos de autoantígenos e anticorpos específicos tipicamente produz doenças sistêmicas, como o lúpus eritematoso sistêmico (LES). Ao contrário, respostas de autoanticorpos ou de células T contra autoantígenos com distribuição tecidual restrita levam a doenças órgão-específicas, como a miastenia grave, diabetes tipo 1 (T1D, do inglês, type 1 diabetes) e esclerose múltipla (ABBAS, 9ª ed.). ↠ Vários mecanismos efetores são responsáveis pela lesão tecidual em diferentes doenças autoimunes. Esses mecanismos incluem imunocomplexos, autoanticorpos circulantes e linfócitos T autorreativos. As características clínicas e patológicas da doença geralmente são determinadas pela natureza da resposta autoimune dominante (ABBAS, 9ª ed.). ↠ Doenças autoimunes tendem a ser crônicas, progressivas e de autoperpetuação. As razões para essas características são que os autoantígenos que desencadeiam essas reações são persistentes e, uma vez que a resposta imunológica se inicia, muitos mecanismos de amplificação são ativados e perpetuam essa resposta (ABBAS, 9ª ed.). ↠ Adicionalmente, uma resposta iniciada contra um autoantígeno que lesiona tecidos pode resultar na liberação e alteração de outros antígenos teciduais, na ativação de linfócitos específicos para esses outros antígenos e na exacerbação da doença. Esse fenômeno, conhecido como propagação do epítopo, pode explicar por que, uma vez desenvolvida a doença autoimune, esta pode se tornar prolongada e se autoperpetuar (ABBAS, 9ª ed.). FATORES QUE CONTRIBUEM PARA AS DOENÇAS AUTOIMUNES ↠ Os fatores que contribuem para o desenvolvimento da autoimunidade são a suscetibilidade genética e os desencadeadores ambientais, como infecções e lesão tecidual local (ABBAS, 9ª ed.). ↠ Genes de suscetibilidade podem quebrar os mecanismos de autotolerância, enquanto a infecção ou necrose nos tecidos promovem o influxo de linfócitos autorreativos e a ativação dessas células, resultando em lesão tecidual (ABBAS, 9ª ed.). A maioria das doenças autoimunes é decorrente de traços poligênicos complexos nos quais os indivíduos afetados herdam polimorfismos genéticos múltiplos que contribuem para a suscetibilidade à doença. Esses genes agem em conjunto com os fatores ambientais para causarem as doenças (ABBAS, 9ª ed.). ↠ Infecções e lesão tecidual também podem alterar a forma como os autoantígenos são exibidos para o sistema imune, levando à falha da autotolerância e à ativação dos linfócitos autorreativos. Outros fatores como mudanças no microbioma do hospedeiro e alterações epigenéticas nas células imunes podem desempenhar papéis importantes na patogênese, mas os estudos sobre esses tópicos estão apenas no início (ABBAS, 9ª ed.). Doenças Pericárdicas APG 09 – “PRECE MAMOMETANA” 2 Júlia Morbeck – @med.morbeck OUTROS FATORES NA AUTOIMUNIDADE ➢ Alterações anatômicas em tecidos, causadas por inflamação (possivelmente secundárias a infecções), lesão isquêmica ou trauma, podem levar à exposição de autoantígenos que normalmente são ocultos ao sistema imunológico. Tais antígenos “sequestrados” podem não ter induzido autotolerância. Portanto, se forem liberados, esses autoantígenos previamente ocultos podem interagir com linfócitos imunocompetentes e induzir respostas imunes específicas. Exemplos de antígenos anatomicamente sequestrados, nos chamados tecidos “imunoprivilegiados”, incluem proteínas intraoculares e do esperma. Acredita-se que a uveíte e a orquite pós-traumáticas, as quais podem ser bilaterais mesmo quando o trauma é unilateral, devem- se a respostas autoimunes contra antígenos próprios que são liberados de suas localizações normais pelo trauma. ➢ Influências hormonais desempenham um papel em algumas doenças autoimunes. Muitas doenças autoimunes têm uma incidência maior em mulheres do que em homens. Por exemplo, o LES afeta mulheres com uma frequência 10 vezes maior do que os homens. A doença semelhante ao lúpus em camundongos F1 (NZB × NZW) desenvolve-se apenas em fêmeas e é retardada pelo tratamento com hormônios andrógenos. Não se sabe se essa predominância em fêmeas resulta da influência dos hormônios sexuais ou de outros fatores relacionados com o gênero. ANORMALIDADES IMUNOLÓGICAS QUE LEVAM À AUTOIMUNIDADE ↠ As principais anormalidades desse tipo são: (ABBAS, 9ª ed.). ➢ Autotolerância defeituosa: Eliminação ou regulação inadequadas das células T ou B, levando ao desequilíbrio entre ativação e controle de linfócitos, é a causa subjacente a todas as doenças autoimunes. O potencial para autoimunidade existe em todos os indivíduos, porque algumas das especificidades geradas aleatoriamente nos clones de linfócitos podem ser para autoantígenos, e muitos autoantígenos estão prontamente acessíveis aos linfócitos. A tolerância a autoantígenos é normalmente mantida por meio de processos de seleção que previnem a maturação de alguns linfócitos específicos para autoantígenos e de mecanismos que inativam ou deletam linfócitos autorreativos que amadurecem. A perda da autotolerância pode ocorrer se os linfócitos autorreativos não forem deletados ou inativados e se as APCs forem ativadas de tal maneira que autoantígenos sejam apresentados ao sistema imune de forma imunogênica (ABBAS, 9ª ed.). Modelos experimentais e estudos limitados em humanos mostram que qualquer um dos mecanismos a seguir pode contribuir para a falha da autotolerância: (ABBAS, 9ª ed.). • Defeitos na deleção (seleção negativa) de células T ou B ou na edição de receptor em células B durante a maturação dessas células nos órgãos linfoides geradores. • Defeitos nos números ou funções de linfócitos T reguladores. • Apoptose defeituosa de linfócitos autorreativos maduros. • Função inadequada de receptores de inibição. ➢ Exibição anormal de autoantígenos: Esse tipo de anormalidade pode incluir a expressão aumentada e a persistência de autoantígenos que são normalmente removidos, ou alterações estruturais nesses antígenos resultantes de modificações enzimáticas, de estresse ou lesão celular. Se essas alterações levarem à exibição de epítopos antigênicos que normalmente não estão presentes, o sistema imune pode não ser tolerante a esses “neoantígenos”, permitindo dessa forma o desenvolvimento de respostas contra o próprio. ➢ Inflamação ou uma resposta imune inata inicial: A resposta imune inata é um forte estímulo para a ativação subsequente de linfócitos e para a geração de respostas imunes adaptativas. Infecções ou danos celulares podem elicitar reações imunes inatas locais com inflamação. Essas reações podem contribuir para o desenvolvimento de doença autoimune, talvez pela ativação das APCs, a qual se sobrepõe aos mecanismos reguladores e resulta em ativação excessiva da célula T. 3 Júlia Morbeck – @med.morbeck IMPORTANTE Muitoda atenção recente tem convergido para o papel das células T na autoimunidade, por duas razões principais: (ABBAS, 9ª ed.). • Primeiro, as células T auxiliares são os reguladores-chave de todas as respostas imunes às proteínas, e muitos autoantígenos envolvidos nas doenças autoimunes são proteínas. • Segundo, diversas doenças autoimunes estão geneticamente ligadas ao MHC (o complexo HLA em humanos), e a função das moléculas do MHC é a apresentação de antígenos peptídicos para as células T. A falha da autotolerância em linfócitos T pode resultar em doenças autoimunes, nas quais o dano tecidual é causado por reações imunes mediadas por células. Anormalidades nas células T auxiliares também podem levar à produção de autoanticorpos, porque essas células são necessárias para a produção de anticorpos de alta afinidade contra antígenos proteicos (ABBAS, 9ª ed.). PAPEL DAS INFECÇÕES NA AUTOIMUNIDADE ↠ Infecções virais e bacterianas podem contribuir para o desenvolvimento e exacerbação da autoimunidade. Em pacientes e em alguns modelos animais, o surgimento das doenças autoimunes está frequentemente associado a infecções ou é precedido pelas mesmas. Na maioria desses casos, o microrganismo infeccioso não está presente em lesões nem mesmo é detectável no indivíduo quando a autoimunidade se desenvolve. Portanto, as lesões da autoimunidade não se devem ao agente infeccioso por si só, mas resultam das respostas imunes do indivíduo, que podem ser desencadeadas ou desreguladas pelo microrganismo (ABBAS, 9ª ed.). ↠ As infecções podem promover o desenvolvimento da autoimunidade por meio de dois mecanismos principais: (ABBAS, 9ª ed.). ➢ Infecções de tecidos particulares podem induzir respostas imunológicas inatas locais que recrutam leucócitos para os tecidos e resultam na ativação de APCs teciduais. Essas APCs passam a expressar coestimuladores e secretar citocinas ativadoras de células T, resultando na quebra da tolerância da célula T. Assim, a infecção resulta na ativação de células T que não são específicas para o patógeno infeccioso; esse tipo de resposta é denominada ativação bystander. A importância da expressão aberrante de coestimuladores é sugerida pela evidência experimental de que a imunização de camundongos com autoantígenos na presença de adjuvantes fortes (que mimetizam microrganismos) resulta na quebra da autotolerância e no desenvolvimento de doença autoimune. (ABBAS, 9ª ed.). ➢ Microrganismos infecciosos podem conter antígenos que reagem de maneira cruzada com autoantígenos, de modo que respostas imunológicas a esses microrganismos podem resultar em reações contra autoantígenos. Esse fenômeno chama-se mimetismo molecular, porque os antígenos do microrganismo reagem cruzadamente, ou mimetizam, os autoantígenos. Um exemplo de reatividade imunológica cruzada entre antígenos microbianos e autoantígenos é a febre reumática, que se desenvolve após infecções estreptocócicas e é causada por anticorpos antiestreptocócicos que têm reatividade cruzada com proteínas do miocárdio. Esses anticorpos são depositados no coração, causando miocardite. O sequenciamento do DNA revelou numerosos trechos curtos de homologias entre as proteínas miocárdicas e proteínas estreptocócicas. Contudo, o significado de homologias limitadas entre antígenos microbianos e autoantígenos em doenças autoimunes comuns ainda precisa ser estabelecida (ABBAS, 9ª ed.). Doenças Pericárdicas ↠ O pericárdio, também denominado saco pericárdico, é uma membrana serosa de camada dupla que isola o coração das outras estruturas torácicas e mantém sua posição no tórax, bem como previne o seu enchimento excessivo, além de servir de barreira contra infecções (PORTH, 10ª ed.) ↠ O pericárdio é composto por duas camadas: uma camada interna fina, denominada pericárdio visceral, que está aderida ao epicárdio; e uma camada fibrosa externa, denominada pericárdio parietal, que está unida aos A, Normalmente, o encontro de uma célula T autorreativa madura com um autoantígeno apresentado por uma APC em repouso com deficiência de coestimuladores resulta em tolerância periférica por anergia. (Outros mecanismos possíveis de autotolerância não são mostrados.) B, Microrganismos podem ativar as APCs para que expressem coestimuladores e quando essas APCs apresentam autoantígenos, as células T autorreativas são ativadas em vez de se tornarem tolerantes. C, Alguns antígenos microbianos podem apresentar reação cruzada com autoantígenos (mimetismo molecular). Portanto, as respostas imunológicas iniciadas por microrganismos podem ativar células T específicas para autoantígenos. 4 Júlia Morbeck – @med.morbeck grandes vasos que entram e saem do coração, do esterno e do diafragma (PORTH, 10ª ed.) O pericárdio visceral está intimamente ligado ao coração, à aorta, à artéria pulmonar e às veias cavas e permite a fixação do tecido adiposo (cujo interior é onde se localizam vasos epicárdicos e fibras nervosas autonômicas) ao miocárdio. O pericárdio parietal é constituído de colágenos tipos I e III e elastina, de espessura que varia de 1 a 2 mm, portanto mais resistente, e tem importante função de fixar o coração à cavidade torácica (SOCESP, 5ª ed.). ↠ Essas duas camadas do pericárdio são separadas por um espaço virtual, a cavidade pericárdica, que contém aproximadamente 50 mℓ de líquido seroso. Esse líquido atua como um lubrificante, que evita o desenvolvimento de forças de atrito conforme o coração contrai e relaxa. Embora conte com um suprimento sanguíneo reduzido, o pericárdio é bem inervado e sua inflamação pode causar dor intensa (PORTH, 10ª ed.) Além disso, o líquido pericárdico teria a função de reservatório de moduladores parácrinos como prostanoides, peptídeos natriuréticos e endotelinas, que podem regular os tônus simpático e coronário, a frequência cardíaca e a pressão arterial (PA), além do possível papel imunológico (SOCESP, 5ª ed.). OBS.: O pericárdio não é essencial para a função cardíaca, no entanto grande acúmulo de líquido pericárdico ou espessamento dessa membrana pode causar consequências clínicas significativas (SOCESP, 5ª ed.). ↠ Os distúrbios pericárdicos com frequência estão associados a ou resultam de outra doença no coração ou em estruturas adjacentes (PORTH, 10ª ed.) CLASSIFICAÇÃO DOS DISTÚRBIOS DO PERICÁRDIO INFLAMAÇÃO Pericardite inflamatória aguda; Infecciosa; Distúrbios imunes e do colágeno; Febre reumática; Infarto do miocárdio; Cirurgia cardíaca; Agentes físicos e químicos; Traumatismo torácico; Reações colaterais a medicamentos, como hidralazina, procainamida e anticoagulantes. DOENÇA NEOPLÁSICA Primária; Secundária (p. ex., carcinoma pulmonar ou mamário, linfoma). DISTÚRBIOS CONGÊNITOS Ausência completa ou parcial do pericárdio; Cistos pericárdicos congênitos. PORTH, 10ª edição ANOMALIAS CONGÊNITAS Ausência parcial ou total do pericárdio parietal é anomalia muito rara e geralmente assintomática. Quando o defeito é pequeno, pode levar à herniação de uma aurícula ou de parte de um ventrículo. Divertículos do pericárdio são herniações do folheto visceral ou seroso através de um defeito no folheto parietal (BOGLIOGO, 10ª ed.). OBS.: A doença pericárdica pode incluir inflamação do pericárdio (pericardite) ou quantidades anormais de liquido no espaço entre o pericárdio visceral e parietal (derrame pericárdico) (HAMMER; MCPHEE). Pericardite ↠ A pericardite consiste em um processo inflamatório no pericárdio. A pericardite aguda, definida por sinais e sintomas que resultam de uma inflamação pericárdica com duração inferior a 2 semanas, pode ocorrer como uma doença isolada ou como resultado de uma doença sistêmica (SOCESP, 5ª ed.). OBS.: O termo pericardite aguda é geralmente utilizado para o primeiro episódio da doença, ao passo que pericardite recorrente refere-seliteralmente à recorrência após a remissão inicial, independentemente do intervalo de tempo de reaparecimento. Já o termo pericardite crônica é muito usado para aqueles casos de pericardite de curso prolongado, arbitrariamente definido como superior a 3 meses (SOCESP, 5ª ed.). Etiologia da pericardite ↠ Em geral, as causas de pericardite aguda podem ser subdivididas em infecciosas e não infecciosas. As de origem não infecciosa incluem etiologias autoimunes (relacionadas à lesão do pericárdio, doença do tecido conectivo e formas autorreativas), neoplásicas, desordens metabólicas e pericardites traumáticas. Os agentes infecciosos capazes de causar pericardite incluem vírus, bactérias, fungos e parasitas (SOCESP, 5ª ed.). ETIOLOGIA DAS PERICARDITES PERICARDITE INFECCIOSA Viral: echovírus e coxsackievírus (mais comuns), influenza, Epsteins-Barr; Bacteriana: tuberculose (mais comum); Fúngica (muito rara): cândida, histoplasma, aspergillus; Parasitária (muito rara): toxoplasma, entamoeba histolytica. PERICARDITE NÃO INFECCIOSA Autoimune Doenças autoimunes: lúpus eritematoso (mais comum), artrite reumatóide; Outras doenças inflamatórias sistêmicas: sarcoidose, doença inflamatória intestinal; Doença autoinflamatória: febre familiar do mediterrâneo. Neoplásica Tumores primários (raros): quase todo mesoteliomas do pericárdio; Tumores metastásicos (comuns): quase todos os do pulmão, mama e linfomas. 5 Júlia Morbeck – @med.morbeck Metabólica: mais comuns são uremia e misedema. Traumática Início tardio Síndrome de lesão do pericárdio (comum): síndrome pós-infarto do miocárdio, síndrome pós-pericardiectomia. Outras: relacionadas a drogas (raras) Síndrome lúpus-like: hidralazina, isoniazidaa, fenitoína; Drogas antineoplásicas: doxorrubicina; Hipersensibilidade com eosinofilia: penicilina, amiodarona, minoxidil. ↠ As infecções virais (especialmente infecções por vírus Coxsackie e ecovírus) são a causa mais comum de pericardite e, provavelmente, são responsáveis por muitos casos classificados como idiopáticos (PORTH, 10ª ed.). OBS.: A pericardite idiopática é a forma mais comum de apresentação da pericardite aguda, podendo chegar a 85% dos casos. Sabe-se que na grande maioria desses casos a etiologia é viral e, habitualmente, não se faz pesquisa viral de rotina na prática clínica devido à relação custo- benefício (SOCESP, 5ª ed.). ARTIGO: Incidência de pericardite pós COVID-19 em pacientes de uma clínica cardiológica, no período de março a junho de 2020. O acometimento cardíaco é uma característica proeminente na infecção por SARS-CoV-2 sendo associada a pior prognóstico. Até 30% dos pacientes internados infectados pelo vírus podem apresentar manifestações miocárdicas, representadas principalmente por níveis elevados de troponina I. A fisiopatogenia da lesão provocada pelo SARS-CoV-2 no miocárdio ainda não é completamente conhecida, contudo sabe-se que as células cardíacas expressam altos níveis de receptor de ECA II, podendo explicar o dano tecidual ao miocárdio. Nesse contexto, a ocorrência de pericardite em 4 pacientes com diagnóstico prévio de COVID-19, em um período de 3 meses, determinando a incidência de 11,8%, representa importante achado no contexto da pandemia No presente estudo foi observado, maior frequência de pericardite no sexo feminino A média de tempo decorrido entre a COVID-19 e o diagnóstico de pericardite, em nosso estudo, foi de aproximadamente 30 dias. CONCLUSÃO: Resultado de incidência de pericardite, como complicação tardia relacionada à COVID-19. ARTIGO: Reações adversas graves das vacinas COVID-19 em Portugal até julho de 2021: síndrome de trombose com trombocitopenia, miocardite/pericardite e síndrome de Guillain-Barré No geral, a vacinação contra a COVID-19 reduz o risco relativo de miocardite e arritmia múltipla. No entanto, existe uma associação entre miocardite/pericardite e as vacinas de mRNA COVID-19 em crianças e adultos jovens (com os homens a serem aproximadamente 5-10 vezes mais afetados do que as mulheres), que deve ser cuidadosamente monitorizadas pelos profissionais de saúde. Com a segunda dose de vacina contra mRNA, foram notificados 12,6 casos de miocardite/pericardite por milhão no prazo de 21 dias após a vacinação em indivíduos com idades compreendidas entre os 12 e 39 anos. O mecanismo fisiopatológico da reação adversa miocardite/pericardite também não é totalmente conhecido. Entre os mecanismos propostos estão: ➢ o mRNA da vacina pode ser detectado como um antígeno pelo sistema imunológico, o que pode promover a ativação de células pró-inflamatórias. cascatas e vias imunológicas no coração; ➢ reações cruzadas entre anticorpos direcionados a glicoproteínas spike do SARS-CoV-2 e sequências de proteínas humanas estruturalmente semelhantes (por exemplo, cadeia pesada de α-miosina do miocárdio); ➢ a testosterona pode estar associada à inibição de células imunes anti-inflamatórias e à promoção de respostas imunes do tipo célula T helper 1 mais agressivas. A miocardite e a pericardite ocorreram até 10 dias após a vacinação, particularmente após a segunda dose de Comirnaty (Pfizer-BioNTech), e mais frequentemente em homens mais jovens. De um modo positivo, essas reações adversas cardíacas foram em geral transitórios e desaparecem após o repouso, com apenas alguns doentes a necessitar de tratamento hospitalar. ↠ No Brasil, certamente a etiologia tuberculosa é muito superior em relação aos países desenvolvidos, principalmente em portadores de imunodeficiência (SOCESP, 5ª ed.). ↠ As pericardites bacterianas são raras em adultos e exibem taxa elevada de mortalidade, em torno de 40%. O acometimento do pericárdio, mais comumente, ocorre por extensão direta de uma pneumonia ou empiema. Além disso, a via hematogênica durante uma bacteremia e contaminação após cirurgia torácica ou trauma também são importantes. Os agentes etiológicos mais comuns são os estafilococos, pneumococos e estreptococos (SOCESP, 5ª ed.). ↠ Pacientes com infarto agudo do miocárdio (IAM) transmural frequentemente são acometidos por diferentes formas de pericardite. Em geral, entre o terceiro e o sétimo dia de evolução, quase metade dos pacientes apresentam inflamação do pericárdio subjacente à área infartada, podendo se traduzir por dor pleurítica ou surgimento de atrito pericárdico, mesmo em indivíduos assintomáticos (SOCESP, 5ª ed.). ↠ Em pacientes com insuficiência renal, são descritas duas formas de pericardite: a urêmica e a dialítica. O termo pericardite urêmica é utilizado para pericardite que ocorre antes do início da diálise e até 8 semanas após. A incidência é de 6 a 10% em pacientes com insuficiência renal avançada, aguda ou crônica; sua ocorrência está 6 Júlia Morbeck – @med.morbeck correlacionada com os níveis de ureia e creatinina. Metabólitos tóxicos, hipercalcemia, hiperuricemia e mecanismos hemorrágicos, virais e autoimunes têm sido propostos como fatores etiológicos (SOCESP, 5ª ed.). Epidemiologia da pericardite ↠ Não existem dados epidemiológicos oficiais no Brasil referentes ao comprometimento pericárdico. Mesmo os disponíveis na literatura internacional são escassos e certamente sofrem a influência das características de cada centro. Os dados referentes a serviços de emergência mostram que 5% dos pacientes com queixa de dor torácica nos quais foi afastada insuficiência coronariana aguda e 1% daqueles com supradesnível de segmento ST tinham pericardite aguda (DIRETRIZ, 2014). ↠ Quanto ao derrame pericárdico, é mais frequente quando o comprometimento é por tuberculose ou neoplasia, e o mesmo acontece em relação ao tamponamento cardíaco. Já nos casos em que outras etiologias são responsáveis pelo quadro clínico, a frequência é menor (DIRETRIZ, 2014). Fisiopatologia da pericardite ↠ Assim comooutras condições inflamatórias, a pericardite aguda frequentemente está associada ao aumento da permeabilidade capilar. Os capilares que suprem o pericárdio seroso tornam-se permeáveis, possibilitando que proteínas plasmáticas, incluindo o fibrinogênio, saiam dos capilares e entrem no espaço pericárdico. Isso resulta em um exsudato que varia em tipo e quantidade, de acordo com o agente causal (PORTH, 10ª ed.). ↠ A pericardite aguda com frequência está associada a um exsudato fibrinoso, o qual cicatriza por resolução ou progride para deposição de tecido cicatricial e formação de aderências entre as camadas do pericárdio seroso. A inflamação também pode envolver o miocárdio superficial e a pleura adjacente (PORTH, 10ª ed.). ↠ O quadro morfológico das pericardites varia de acordo com a causa, mas pode ser agrupado segundo categorias etiológicas (BOGLIOGO, 10ª ed.) Pericardite fibrinosa ou serofibrinosa É a forma mais frequente de pericardite. Pericardite fibrinosa é causada sobretudo por infarto do miocárdio, uremia, radiação no tórax, doença reumática, colagenoses e traumatismos; além dessas, uma forma muito comum de pericardite fibrinosa é a idiopática, provavelmente de origem viral (BOGLIOGO, 10ª ed.) Infecções bacterianas podem se iniciar como pericardite fibrinosa, transformando-se posteriormente em purulentas. O líquido presente no saco pericárdico é turvo e contém fibrina, células inflamatórias e células mesoteliais. Em geral, não se identifica o agente etiológico (BOGLIOGO, 10ª ed.) Macroscopicamente, o coração fica recoberto por material fibrinoso, branco-amarelado e friável, que confere à superfície o aspecto de “pão com manteiga” (BOGLIOGO, 10ª ed.) Histologicamente, o pericárdio apresenta graus variados de espessamento por edema, discreto infiltrado inflamatório e acúmulo de fibrina na superfície. Dependendo da duração do processo, pode haver reparação com deposição de colágeno a partir de tecido de granulação. Muitas vezes, há proliferação exuberante de células mesoteliais reativas. A organização da pericardite pode levar a aderências entre os dois folhetos; quando a fibrose é muito desenvolvida, origina a pericardite constritiva (BOGLIOGO, 10ª ed.) Clinicamente, pericardite fibrinosa manifesta-se por dor torácica, febre, atrito pericárdico característico à ausculta e, às vezes, sinais de insuficiência cardíaca (BOGLIOGO, 10ª ed.) Pericardite fibrinopurulenta ou purulentA É causada por microrganismos piogênicos, como estafilococos, estreptococos, pneumococos, meningococos e, mais raramente, fungos (BOGLIOGO, 10ª ed.) Os agentes atingem o pericárdio por meio de: (BOGLIOGO, 10ª ed.) ➢ propagação de infecções adjacentes (pneumonias, endocardite infecciosa etc.); ➢ septicemia; ➢ inoculação direta por meio de manipulação cardíaca. Pericardite fibrinopurulenta. Pericárdio recoberto difusamente por exsudato branco-amarelado. 7 Júlia Morbeck – @med.morbeck Macroscopicamente, o pericárdio fica recoberto por camada de material purulento, de aspecto granular. Microscopicamente, há infiltrado de neutrófilos, por vezes formando abscessos, em meio a fibrina e restos celulares na superfície serosa. O encontro do agente etiológico é frequente (BOGLIOGO, 10ª ed.) PERICARDITE HEMORRÁGICA Encontrada em associação com as pericardites agudas descritas anteriormente, é aquela caracterizada por componente hemorrágico expressivo. As principais causas são tuberculose e infiltração neoplásica. Pode, também, ser complicação de cirurgia cardíaca (BOGLIOGO, 10ª ed.) Pericardite granulomatosa Sua causa principal é a tuberculose, mas pode ser provocada também por micobactérias atípicas e fungos, como Histoplasma e Candida. Na tuberculose, são comuns granulomas com necrose caseosa; material caseoso pode recobrir todo o pericárdio. Também é comum o encontro do agente infeccioso. Com frequência, evolui para pericardite constritiva (BOGLIOGO, 10ª ed.) Pericardite constritiva Pericardite constritiva resulta da cicatrização de uma pericardite prévia. Caracteriza-se por espessamento fibroso acentuado e aderências entre os folhetos visceral e parietal, que restringem os movimentos cardíacos, principalmente o relaxamento diastólico ventricular e o esvaziamento das veias cavas nos átrios. Às vezes, coexiste calcificação extensa ou em placas. Em alguns casos, essa forma de pericardite simula clinicamente a endomiocardiofibrose por comprometer o enchimento diastólico dos ventrículos e provocar dilatação atrial. Praticamente todas as pericardites podem evoluir para pericardite constritiva, mas sua causa mais comum é a tuberculose (BOGLIOGO, 10ª ed.) PERICARDITE PÓS-INFARTO DO MIOCÁRDIO E SÍNDROME DE DRESSLER A proximidade com o miocárdio necrótico pode causar inflamação fibrinosa no pericárdio logo nos primeiros dias após o infarto do miocárdio. O desenvolvimento de pericardite com derrame e febre tardiamente, cerca de 2 a 3 semanas após infarto do miocárdio, constitui a síndrome de Dressler. Sua patogênese não está completamente esclarecida, mas um dos mecanismos inclui reação autoimune contra antígenos miocárdicos (BOGLIOGO, 10ª ed.) Manifestações clínicas da pericardite ↠ As manifestações da pericardite aguda incluem a tríade de dor torácica, atrito pericárdico e alterações ao eletrocardiograma (ECG) (PORTH, 10ª ed.). DOR TORÁCICA ↠ A dor torácica provavelmente deve-se à inflamação do pericárdio. A inflamação da pleura adjacente pode ser responsável pela piora característica da dor com inspiração profunda e tosse (HAMMER; MCPHEE). ↠ A dor está quase sempre presente (em mais de 85% dos casos) com intensidade e duração variáveis e normalmente é precedida de pródromos infecciosos, como febre e mal-estar (SOCESP, 5ª ed.). ↠ A dor é ventilatório-dependente podendo ser retroesternal, precordial ou epigástrica; piora em decúbito dorsal, e melhora quando está em pé ou em posição reclinada para a frente (SOCESP, 5ª ed.). OBS.: A dor tipicamente piora com a respiração profunda, tosse, deglutição e alterações posturais, devido às alterações no retorno venoso e ao enchimento cardíaco (PORTH, 10ª ed.). ↠ Em razão da relação com o nervo frênico, a dor irradia caracteristicamente para a região inferior do músculo trapézio. Outros locais de irradiação são ombros, braços e mandíbula, podendo ser confundida com dor de isquemia miocárdica (SOCESP, 5ª ed.). ATRITO PERICÁRDICO ↠ Ao exame físico, o ruído de atrito pericárdico é patognomônico de pericardite (HAMMER; MCPHEE). ↠ O atrito pericárdico é o achado clássico da pericardite aguda, no entanto está presente somente em cerca de um terço dos casos; é decorrente da fricção dos pericárdios visceral e parietal. Trata-se de um rangido de alta frequência, mais audível ao final da expiração (SOCESP, 5ª ed.). O atrito é descrito tradicionalmente como tendo três componentes, cada um associado com movimento rápido de uma câmara cardíaca. O componente sistólico, que provavelmente está relacionado com a contração ventricular, é o mais comum e mais facilmente audível. Durante a diástole, há dois componentes: um durante o início da diástole, resultante do enchimento rápido do ventrículo, e outro componente mais silencioso que corre no fim da diástole, podendo ser consequência da contração atrial (HAMMER; MCPHEE). Os componentes diastólicos frequentemente se mesclam, de modo que um atrito com dois componentes, ou de “vai e vem”, é ouvido mais comumente (HAMMER; MCPHEE). PERICARDITE CONSTRITIVA Ocasionalmente, a inflamação continua do pericárdio leva à fibrose e ao desenvolvimento de pericardite constritiva (HAMMER; MCPHEE). No paciente com pericardite constritiva, o enchimento diastólico inicial do ventrículo ocorre normalmente, mas é interrompido subitamente pelo pericárdio espesso inelástico. A pressão venosa sistêmica estáelevada, porque o fluxo de entrada no coração é limitado. Geralmente, com a inspiração, a diminuição da pressão intratorácica é transmitida ao coração, e o enchimento do lado direito do coração aumenta com uma queda acompanhante na pressão venosa sistêmica. Em pacientes com pericardite constritiva, essa resposta normal é impedida e o paciente desenvolve o sinal de Kussmaul (HAMMER; MCPHEE). O exame da pulsação venosa jugular é essencial no paciente que pode ter pericardite constritiva. A pressão venosa jugular está elevada 8 Júlia Morbeck – @med.morbeck (turgência jugular), e as formas de onda individuais com frequência são bastante proeminentes (HAMMER; MCPHEE). A pressão venosa sistêmica elevada pode causar acúmulo de líquido no fígado e espaço intraperitoneal, levando à hepatomegalia e ascite (HAMMER; MCPHEE). À ausculta do coração, um som de timbre alto chamado batida pericárdica pode ser ouvido logo depois da segunda bulha cardíaca, frequentemente imitando uma terceira bulha cardíaca (HAMMER; MCPHEE). Derrame Pericárdico e Tamponamento Cardíaco Normalmente, o saco pericárdico contém 20 a 50 mL de líquido límpido e claro (BOGLIOGO, 10ª ed.). CONCEITOS Hidropericárdio ou derrame seroso é o acúmulo de líquido claro, seroso e rico em albumina provocado por condições que causam edema; a mais comum é a insuficiência cardíaca. Quando o acúmulo é rápido, pode haver tamponamento cardíaco. Contudo, quase sempre o derrame seroso se forma lentamente, levando à distensão gradual do saco pericárdico (BOGLIOGO, 10ª ed.). Efusão quilosa ocorre por obstrução dos vasos linfáticos, geralmente secundária à invasão neoplásica, resultando em acúmulo de líquido rico em gotículas de lipídeos. A efusão de colesterol é rara e associa-se geralmente a mixedema (BOGLIOGO, 10ª ed.). Hemopericárdio é a coleção de sangue no saco pericárdico. As principais causas são ruptura da parede ventricular após infarto agudo do miocárdio, ruptura da aorta com dissecção para o espaço pericárdico ou ruptura do coração ou da aorta por traumatismos torácicos abertos ou fechados; todas essas condições podem levar ao tamponamento cardíaco e, na grande maioria das vezes, ao óbito. Nesses casos, drenagem rápida e cirurgia se fazem necessárias. Quantidades menores de líquido hemorrágico podem acumular-se no saco pericárdico em diátese hemorrágica ou pericardites (BOGLIOGO, 10ª ed.). Pneumopericárdio é o acúmulo de ar no saco pericárdico. Trata-se de complicação de pneumotórax, caverna tuberculosa ou fístula esofágica que se abrem no saco pericárdico (BOGLIOGO, 10ª ed.). ↠ O derrame pericárdico se refere ao acúmulo de líquido na cavidade pericárdica, normalmente como resultado de um processo inflamatório ou infeccioso (PORTH, 10ª ed.). ↠ O derrame pericárdico pode ocorrer em resposta a qualquer causa de pericardite (HAMMER; MCPHEE). O seu desenvolvimento também pode resultar de neoplasias, cirurgia cardíaca, traumatismo, ruptura cardíaca por infarto do miocárdio e aneurisma aórtico dissecante (PORTH, 10ª ed.). ↠ A cavidade pericárdica tem pouco volume de reserva. A relação pressão-volume entre os volumes pericárdico e cardíaco normais pode ser drasticamente afetada até por pequenas quantidades de líquido, na presença de níveis críticos de derrame. Como as pressões de enchimento do coração direito são inferiores àquelas do coração esquerdo, os aumentos na pressão normalmente se refletem em sinais e sintomas de insuficiência cardíaca direita que antecedem a equalização das pressões (PORTH, 10ª ed.). Fisiopatologia do Derrame Pericárdico e do Tamponamento Cardíaco ↠ A quantidade de líquido, a rapidez com que ele se acumula e a elasticidade do pericárdio determinam o efeito do derrame sobre a função cardíaca (PORTH, 10ª ed.). Pequenos derrames pericárdicos podem não produzir sintomas, ou produzir achados clínicos anormais. Até mesmo um grande derrame que se desenvolve lentamente pode causar poucos ou nenhum sintoma, desde que o pericárdio consiga se distender e evitar a compressão do coração (PORTH, 10ª ed.). ↠ Contudo, um acúmulo súbito de até mesmo 200 mℓ de líquido pode elevar a pressão intracardíaca a níveis que limitam seriamente o retorno venoso para o coração. Os sintomas de compressão cardíaca também podem ocorrer com acúmulos relativamente pequenos de líquido em um pericárdio que tenha sofrido espessamento resultante de formação de tecido cicatricial ou infiltração neoplásica (PORTH, 10ª ed.). ↠ O derrame pericárdico pode levar a uma condição denominada tamponamento cardíaco, no qual ocorre compressão do coração em consequência do acúmulo de líquido, pus ou sangue no saco pericárdico (PORTH, 10ª ed.). ↠ Quando uma quantidade significativa de líquido se acumula e ultrapassa a capacidade de distensão do tecido fibroelástico pericárdico, ocorre progressiva compressão de todas as câmaras cardíacas decorrente do aumento da pressão intrapericárdica, redução do volume de enchimento cardíaco e maior interdependência ventricular (DIRETRIZ, 2014). Pressões na artéria braquial e no átrio direito mostrando pulso paradoxal em um paciente com pericardite constritiva e um aumento na pressão atrial direita à inspiração (sinal de Kussmaul). Tanto a pressão atrial sistólica quanto a diastólica se eleva com a inspiração. 9 Júlia Morbeck – @med.morbeck ↠ O desenvolvimento do tamponamento depende da velocidade de instalação e do fator causal: (DIRETRIZ, 2014). ➢ o tamponamento cardíaco agudo ocorre em minutos, devido ao trauma, ruptura do coração e aorta, ou como complicação de procedimentos diagnósticos e terapêuticos (biópsias cardíacas, estudo eletrofisiológico, oclusão de apêndice atrial, oclusores de septo interatrial etc.), resultando num quadro de choque; ➢ o tamponamento cardíaco subagudo ocorre entre dias e semanas e poder estar associado com dispneia e fadiga. ➢ tamponamento de baixa pressão (oculto) ocorre em pacientes que estão hipovolêmicos, com consequente redução da pressão intracardíaca, favorecendo a compressão extrínseca do derrame pericárdico. ➢ tamponamento cardíaco regional ocorre quando um derrame localizado ou um hematoma produz compressão regional em uma única câmara. ↠ A gravidade da condição depende da quantidade de líquido presente e da velocidade com que ele se acumula (PORTH, 10ª ed.). Manifestações Clínicas ↠ Um acúmulo significativo de líquido no pericárdio resulta em aumento do estímulo adrenérgico, que leva à taquicardia e ao aumento da contratilidade cardíaca (PORTH, 10ª ed.). ↠ Ocorre elevação da pressão venosa central (PVC), distensão das veias jugulares, queda da pressão arterial sistólica, estreitamento da pressão de pulso, abafamento das bulhas cardíacas e sinais de choque circulatório (PORTH, 10ª ed.). Normalmente, a diminuição na pressão intratorácica durante a inspiração acelera o fluxo venoso, aumentando o enchimento atrial e ventricular direito. Isso ocasiona um abaulamento do septo interventricular à esquerda, produzindo uma discreta diminuição no enchimento ventricular esquerdo, na saída do volume sistólico e na pressão arterial sistólica (PORTH, 10ª ed.). No tamponamento cardíaco, o ventrículo esquerdo (VE) é comprimido a partir do seu interior, pelo movimento do septo interventricular, e do seu exterior, pelo líquido no pericárdio. Isso produz uma diminuição acentuada no enchimento ventricular esquerdo e no volume sistólico ventricular esquerdo (PORTH, 10ª ed.). ↠ Um achado diagnóstico importante é o pulso paradoxal, ou uma intensificação na variação normal do volume do pulso arterial sistêmico com a respiração. Com o pulso paradoxal, o pulso arterial palpado na artéria carótida ou femoral é fraco ou ausente durante a inspiração e se torna mais forte durante a expiração. (PORTH, 10ª ed.). ↠ Essaestimativa é mais sensível com o uso de um manguito de pressão arterial para comparar os sons de Korotkoff durante a inspiração e a expiração – um declínio superior a 10 mmHg na pressão sistólica durante a inspiração é sugestivo de tamponamento. O monitoramento da pressão arterial possibilita a visualização da forma da onda da pressão arterial e a aferição da queda da pressão arterial durante a inspiração (PORTH, 10ª ed.). ↠ O tamponamento pericárdico é acompanhado por sinais físicos característicos que surgem do enchimento limitado do ventrículo. Os três sinais clássicos de tamponamento pericárdico são chamados de tríade de Beck, em homenagem ao cirurgião que os descreveu em 1935: (HAMMER; MCPHEE). 10 Júlia Morbeck – @med.morbeck ➢ hipotensão, ➢ pressão venosa jugular elevada; ➢ bulhas cardíacas hipofonéticas. Diagnóstico das Doenças Pericárdicas ↠ Baseia-se nas manifestações clínicas, no ECG, na radiografia torácica e no ecocardiograma (PORTH, 10ª ed.). ELETROCARDIOGRAMA ↠ Os pacientes com pericardite aguda frequentemente exibem alterações eletrocardiográficas compatíveis com inflamação do tecido epicárdico (SOCESP, 5ª ed.). ↠ A intensidade dessas alterações depende de características próprias do paciente, do agente etiológico, do miocárdico associado e da resposta ao tratamento efetuado (SOCESP, 5ª ed.). ↠ As arritmias cardíacas, principalmente atriais, podem ocorrer em qualquer momento do curso da doença ↠ A presença de complexos QRS de baixa amplitude sugere DP, ao passo que a alternância elétrica de morfologia e amplitude do QRS sinaliza DP volumoso e está associada a tamponamento cardíaco (SOCESP, 5ª ed.). ↠ As alterações eletrocardiográficas (difusas) podem ser caracterizadas em estágios de evolução de acordo com o tempo de apresentação: (SOCESP, 5ª ed.). ➢ Estágio I (primeiras horas a dias): caracteriza-se por supradesnivelamento côncavo difuso do segmento ST e por infradesnivelamento do segmento PR. Diferencia-se do padrão isquêmico que apresenta supradesnivelamento convexo, de maior magnitude, limitado às derivações correspondentes a área do infarto, sem surgimento de ondas Q . ➢ Estágio II (primeira semana): retorno dos segmentos ST e PR aos padrões normais. ➢ Estágio III (após normalização do segmento ST): ocorre inversão difusa da onda T. ➢ Estágio IV: retorno da onda T ao padrão normal. ECOCARDIOGRAMA ↠ Trata-se de um exame indicado como parte da avaliação diagnóstica de rotina. Quando ocorre acometimento concomitante do miocárdio, pode revelar alterações de função e contratilidade cardíacas. Possibilita a avaliação de comorbidades, como doença isquêmica cardíaca, derrame pleural, dissecção de aorta e pericardite constritiva (SOCESP, 5ª ed.). ↠ O ecocardiograma permite avaliar características do pericárdio como a presença de espessamento (maior que 3 mm) ou aumento de ecogenicidade, que pode ser 11 Júlia Morbeck – @med.morbeck relacionada a fibrose ou depósito de cálcio (SOCESP, 5ª ed.). ↠ A detecção do DP por ecocardiografia é relativamente simples e permite a confirmação diagnóstica na suspeita de pericardite. Sua ausência, entretanto, não permite excluir o diagnóstico. O derrame, geralmente leve, está presente em cerca de 60% dos casos (SOCESP, 5ª ed.). ↠ O derrame pode ser classificado como leve (espaço livre de eco na diástole menor que 10 mm), moderado (10 a 20 mm) e grande (maior que 20 mm). As características do derrame podem denunciar possível etiologia como a presença de fibrina na tuberculose ou coágulos no hemopericárdio (SOCESP, 5ª ed.). ↠ A avaliação de comprometimento hemodinâmico ou tamponamento cardíaco associado ao DP constitui outra importante ferramenta da ecocardiografia. Desta forma, o colapso do átrio direito é sinal sensível de tamponamento cardíaco, ao passo que o colapso do ventrículo direito por tempo maior que um terço da diástole constitui um sinal mais específico (SOCESP, 5ª ed.). RADIOGRAFIA DE TÓRAX ↠ O aumento da silhueta cardíaca na radiografia de tórax pode indicar a presença de DP e colaborar com a suspeita de pericardite (SOCESP, 5ª ed.). ↠ Entretanto, apenas derrames com volume acima de 200 mL são geralmente identificados pela radiografia. A presença de derrame pleural, alterações concomitantes nos campos pulmonares ou no mediastino podem ser auxiliar no diagnóstico etiológico, como, por exemplo, a observação de cavitações tuberculosas (SOCESP, 5ª ed.). ↠ De outro modo, a radiografia de tórax na maioria dos casos de pericardite viral não exibe alterações (SOCESP, 5ª ed.). EXAMES LABORATORIAIS ↠ O hemograma pode revelar leucocitose com predomínio de linfócitos. Elevações acentuadas podem indicar infecção bacteriana ou malignidade, ao passo que leucopenia indica a necessidade de pesquisar doenças autoimunes (SOCESP, 5ª ed.). ↠ A elevação da velocidade de hemossedimentação e da proteína C-reativa é achado comum na pericardite, embora não seja sensível ou específico. Essas alterações podem ser identificadas no acompanhamento do paciente para predizer o risco de recorrência e avaliar a remissão da doença e orientar o tratamento (SOCESP, 5ª ed.). A elevação discreta de biomarcadores cardíacos, como a fração MB da creatinoquinase e da troponina, é comum e não parece apresentar correlação prognóstica. Nesta situação, deve-se suspeitar da presença de miopericardite (SOCESP, 5ª ed.). Referências MONTERA et. al. I Diretriz Brasileira de Miocardites e Pericardites. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, 2014. HAMMER, Gary D.; MCPHEE, Stephen J. Fisiopatologia da doença. Grupo A, 2015. FILHO, Geraldo B. Bogliolo – Patologia, 10ª edição. Grupo GEN, 2021. NORRIS, Tommie L. Porth - Fisiopatologia, 10ª edição. Grupo GEN, 202. JATENE, Ieda B.; FERREIRA, João Fernando M.; DRAGER, Luciano F.; et al. Tratado de cardiologia SOCESP, 5ª edição. Editora Manole, 2022 ABBAS, Abul K. Imunologia Celular e Molecular. Grupo GEN, 2019. DELVES, Peter J. ROITT - Fundamentos de Imunologia, 13ª edição. Grupo GEN, 2018. PIRES, C. Reações adversas graves das vacinas COVID-19 em Portugal até julho de 2021: síndrome de trombose com trombocitopenia, miocardite/pericardite e síndrome de Guillain-Barré. Biopharmaceutical Sciences, 2022. BENTES et. al. Incidência de pericardite pós COVID-19 em pacientes de uma clínica cardiológica, no período de março a junho de 2020. Revista Eletrônica Acervo Saúde, 2021.
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