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Laísa Dinelli Schiaveto Refluxo Gastroesofágico (RGE) DEFINIÇÃO O Refluxo Gastroesofágico (RGE) é a passagem do conteúdo gástrico para o esôfago (movimento retrógrado), com ou sem regurgitação e/ou vômito. FISIOPATOLOGIA A Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRGE) pode ser primária, quando há disfunção no nível esofagogástrico com alterações da barreira antirrefluxo, com predisposição genética OU pode ser secundária, quando é decorrente de infecções, lesões do SNC, alergia à proteína do leite de vaca (APLV), drogas, colagenoses, obesidade, hérnia de hiato e outras. Dessa forma, a fisiopatologia do DRGE é baseada em três pontos: • Quando há diminuição do tônus no nível do esfíncter inferior do esôfago (EIE); • Quando a pressão intragástrica supera a pressão do nível do EIE; • Durante o relaxamento transitório do EIE. CLASSIFICAÇÃO Fisiológico: Quando ocasiona poucos ou nenhum sintoma. - Aproximadamente, 80% dos lactentes apresentam regurgitações/vômitos nos primeiros meses de vida, geralmente entre 2 e 4 meses, com pico entre 4 e 5 meses, sem comprometimento do estado nutricional e do humor. Apresenta resolução espontânea entre 12 e 24 meses de idade. A evolução é benigna e autolimitada, não sendo necessários exames diagnósticos e uso de medicamentos. Patológico (DRGE): Quando causa sintomas ou complicações, que se associam à morbidade importante. - Ocorre devido ao desequilíbrio entre os fatores que protegem o esôfago contra o refluxo e os que lhe causam dano. - Etiopatogenia: (1) aumento da frequência dos episódios de refluxo e (2) aumento da lesividade do material refluído sobre a mucosa esofágica. - O maior problema é a lesão à mucosa esofágica, podendo evoluir para esôfago de Barrett e, posteriormente, para adenocarcinoma. GRUPOS DE RISCO • Neuropatas; • Operados de atresia de esôfago; • Hérnia hiatal; • Doenças respiratórias crônicas, principalmente fibrose cística; • Transplante pulmonar; • Quimioterapia; • Prematuros; • Obesos. QUADRO CLÍNICO Os sintomas da DRGE variam de acordo com a idade e com a presença de complicações ou de comorbidades. à Manifestações Esofageanas: • Regurgitações frequentes e/ou vômitos; • Perda de peso ou não ganho de peso; • Irritabilidade; • Choro constante; • Recusa alimentar; • Pirose; • Disfagia; • Odinofagia. à Manifestações Extraesofageanas: • Tosse crônica; • Faringite, laringite e traqueíte; • Rouquidão; • Disfonia; • Desgaste do esmalte dentário; • Halitose; • Asma; • Pneumonia; • Crises de apneia; • Síndrome de Sandifer: caracteriza-se por postura anormal da cabeça, com torcicolo, Laísa Dinelli Schiaveto em crianças neurologicamente normais, na presença de esofagite de refluxo. Destaca-se que as regurgitações e os vômitos são as manifestações clínicas mais comuns da DRGE em lactentes, sendo, em geral, pós- prandiais. No entanto, podem ocorrer horas após a alimentação e, dependendo do volume e da frequência, podem ocasionar retardo no crescimento e desnutrição. SINAIS DE ALERTA Nos lactentes portadores de DRGE, a irritabilidade e a recusa alimentar podem ser correspondentes não verbais da queimação retroesternal. Assim, é fundamental dicar atento aos sinais de alarme nas crianças com regurgitação ou vômitos, como: - Vômitos biliosos; - Sangramentos gastrointestinal (hematêmese e hematoquezia); - Diarreia; - Distensão abdominal; - Febre; - Letargia; - Vômitos frequentes e em jato; - Início dos vômitos após os 6 meses de vida; - Persistência dos vômitos após 1 ano de idade; - Perda de peso ou parada no crescimento; - Hepatoesplenomegalia; - Abaulamento da fontanela; - Macrocefalia ou microcefalia; - Convulsões; - Síndrome genético-metabólica; - Mal estado geral; - Disúria; - Aumento anormal da circunferência da cabeça. DIAGNÓSTICO É basicamente clínico, visto que nenhum exame diagnóstico é considerado padrão-ouro. Assim, a detecção do refluxo do conteúdo gástrico para o esôfago, em um exame, não significa, necessariamente, que o paciente seja portador de DRGE. Portanto, é fundamental levar em consideração a história clínica e o exame físico. Radiografia Contrastada de Esôfago, Estômago e Duodeno (RxEED): Avalia apenas o RGE pós-prandial imediato, sem a capacidade de quantificar os episódios de refluxo. Tem como função a avaliação anatômica do trato digestório alto. Assim, não deve ser usado para diagnosticar ou assessorar gravidade da DRGE, mas deve ser indicado quando há disfagia, vômitos biliosos ou suspeita de volvo, obstrução, estenose e membrana. Cintilografia Gastroesofágica: Avalia apenas o RGE pós-prandial imediato. Tem como vantagem identificar o RGE mesmo após dieta com pH neutro, avaliar o esvaziamento gástrico e detectar a aspiração pulmonar. Dessa forma, não é recomendado como exame de rotina. Ultrassonografia Esofagogástrica: Não é recomendada para avaliação clínica de rotina da DRGE, apresentando uma sensibilidade variável e especificidade baixa. Tem papel importante no diagnóstico diferencial com a estenose hipertrófica de piloro. pHmetria Esofágica: Avalia o paciente em condições mais fisiológicas e por longos períodos, quantifica o RGE e correlaciona os episódios de refluxo com os sinais e sintomas. Assim, realiza a monitorização do pH intraesofágico por período prolongado. Tem como principal limitação a não detecção de refluxos não ácidos ou fracamente ácidos. Ou seja, especialmente em lactentes, com dieta exclusivamente ou predominantemente láctea, o RGE pós-prandial pode não ser detectado, pela neutralização do refluxo ácido provocado pelo ácido. Deve ser realizado apenas nas situações em que proporciona alterações no diagnóstico, no tratamento o no prognóstico do paciente. Nesse contexto, as principais indicações da pesquisa de RGE por meio da pHmetria continuam sendo: avaliação de sintomas atípicos ou extradigestivos da DRGE, pesquisa de RGE oculto, avaliação da resposta ao tratamento clínico em pacientes portadores de esôfago de Barrett ou de DRGE de difícil controle, além de avaliação pré e pós-operatória do paciente com DRGE. Laísa Dinelli Schiaveto Impedanciometria Esofágica Intraluminal: Novo método que detecta movimento retrógrado de fluidos, sólidos e ar no esôfago, para qualquer nível, em qualquer quantidade, independentemente do pH, ou seja, das características físicas ou químicas, pois mede as alterações de resistência elétrica e é realizado com múltiplos canais. Tem como vantagem a detecção de refluxos ácidos e não ácidos. Endoscopia Digestiva Alta com Biópsia: Permite a avaliação macroscópica da mucosa esofágica e a coleta de material para estudo histopatológico, possibilitando o diagnóstico das complicações esofágicas da DRGE (esofagite, estenose péptica ou esôfago de Barrett). Tem papel fundamental no diagnóstico diferencial cm outras doenças pépticas e não pépticas, como a esofagite eosinofílica, esofagite fúngica, úlcera duodenal, gastrite por H. pylori, gastroenteropatia eosinofílica, malformações e neoplasias. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL • Alergia à proteína do leite de vaca; • Anomalias anatômicas congênitas (ex.: estenose hipertrófica de piloro e má rotação intestinal). TRATAMENTO Os principais objetivos do tratamento da DRGE são a promoção do crescimento e do ganho de peso adequados, o alívio dos sintomas, a cicatrização das lesões teciduais, a prevenção da recorrências destas e das complicações associadas à DRGE. Tratamento Não Medicamentoso • Orientações aos pais e suporte à família; • Orientações dietéticas e posturais - Evitar alimentação volumosa e altamente calórica e gordurosa; - Não comer algumas horas antes de dormir; - Posição supina para dormir em lactentes, pois o risco de morte súbita é mais importante do que o benefício ocasionado pela posição anti-RGE;- Posição em decúbito lateral esquerdo com cabeceira elevada; - Redução de peso em obesos. • Mudanças dos hábitos de vida - Não usar roupas apertadas; - Troca das fraldas antes das mamadas; - Evitar o uso de fármacos que exacerbam o refluxo; - Orientar infusões lentas em crianças com sondas nasogástricas; - Evitar o tabagismo (ativo ou passivo), pois a exposição ao tabaco induz o relaxamento do EEI, aumentando os índices de asma, pneumonia, apneia e síndrome da morte súbita. Obs.: As fórmulas AR (antirregurgitação e não anti-RGE) podem diminuir a regurgitação visível, mas não resultam em diminuição mensurável na frequência dos episódios de refluxo. Tratamento Medicamentoso 1. Antiácidos de Contato: São recomendados apenas como sintomáticos, para sintomas esporádicos ou diminuição da acidez noturna. 2. Procinéticos: Ajudam a controlar os sintomas, principalmente de vômitos e regurgitações. No entanto, não apresentam eficácia esclarecida. 3. Inibidores da Secreção Ácida (antagonistas do receptor H2 de histamina ou inibidores da bomba de prótons): São recomendados quando os sintomas, como dor retroesternal e azia, e/ou complicações, como a esofagite, estão associados à ação do ácido no Laísa Dinelli Schiaveto esôfago ou em outros órgãos, como os sintomas respiratórios. Obs.: O uso prolongado predispõe a infecções como pneumonias e gastroenterites. Tratamento Cirúrgico Pode ser necessário nos casos mais graves e que não respondem ao tratamento clínico, naqueles que necessitam de tratamento medicamentoso contínuo com baixa adesão e em casos de grande hérnia hiatal ou esôfago de Barrett, que apresentam manifestações com risco de morte, como sangramento intenso e crises de apneia.