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1 INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO PROFª NAIR FORTES ABU-MERHY Farmacologia Aplicada a Enfermagem Professor: Rodrigo de Barros Cezario 2º semestre 2020 2 Resolução Cofen 271/2002 Regulamenta ações do Enfermeiro na consulta, prescrição de medicamentos e requisição de exames. Revogada pela Resolução Cofen 317/2007 O Conselho Federal de Enfermagem – Cofen, no uso de suas atribuições legais e regimentais; CONSIDERANDO a Lei Federal nº 7.498/86, art. 11º, I, "e" e II, "c"; CONSIDERANDO o Decreto Presidencial nº 94.406/87, art. 8º, I, "e" e II, "c"; CONSIDERANDO a Lei Federal nº 9394/96, art. 9º, VII, § 1º; CONSIDERANDO a Resolução CNE/CES nº 03/2001, especialmente no art. 3º, I e II e art. 5º, VIII e XXII, publicada no DOU de 09/11/2001, seção 1, pág. 37; CONSIDERANDO o Deliberado na Reunião Ordinária do Plenário nº 304; R E S O L V E : Art. 1º É ação da Enfermagem, quando praticada pelo Enfermeiro, como integrante da equipe de saúde, a prescrição de medicamentos. Art. 2º Os limites legais, para a prática desta ação, são os Programas de Saúde Pública e rotinas que tenham sido aprovadas em Instituições de Saúde, pública ou privada. Art. 3º O Enfermeiro, quando no exercício da atividade capitulada no art. 1º, tem autonomia na escolha dos medicamentos e respectiva posologia, respondendo integralmente pelos atos praticados. Art. 4º Para assegurar o pleno exercício profissional, garantindo ao cliente/paciente, uma atenção isenta de risco, prudente e segura, na conduta prescricional/terapêutica, o Enfermeiro pode solicitar exames de rotina e complementares, conforme disposto na Resolução Cofen 195/97. Art. 5º O Enfermeiro pode receber o cliente/paciente, nos limites previstos do art 2º, para efetuar a consulta de Enfermagem, com o objetivo de conhecer/intervir, sobre os problemas/situações de saúde/doença. Art. 6º Em detrimento desta consulta, o Enfermeiro poderá diagnosticar e solucionar os problemas de saúde detectados, integrando às ações de Enfermagem, às ações multi-profissionais. Art. 7º Os currículos dos cursos de graduação de enfermagem devem, além de outros objetivos, preparar o acadêmico para esta realidade, já que é rotina na atualidade, a prática de tais ações, no mercado de trabalho. Art. 8º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogando disposições em contrário. Rio de Janeiro, 12 de julho de 2002. Gilberto Linhares Teixeira Coren-RJ Nº 2380 Presidente Carmem de Almeida da Silva Coren-SP Nº 2254 Primeira Secretária 3 Sumário - Capítulo 1- Historia e conceitos fundamentais ------------------------------------- 4. - Capítulo 2 - Introdução à farmacologia ---------------------------------------------- 12. - Capitulo 3 - Infecção x Inflamação ---------------------------------------------------- 35. - Capitulo 4 - AINES ---------------------------------------------------------------------- 52. - Capítulo 5 - Coticosteróides ------------------------------------------------------------ 57. - Capítulo 6 - Terapêutica das afecções respiratórias ------------------------------ 60. - Capítulo 7 - Farmacologia do aparelho digestivo --------------------------------- 71. - Capítulo 8 – Farmacologia Cardiovascular ----------------------------------------- 77. - Capitulo 9 – Farmacologias das Dislipidemias ------------------------------------ 81. - Capitulo 10- Antidiabéticos Orais --------------------------------------------------- 102. - Capítulo 11 – Drogas que alteram a motilidade Uterina ----------------------- 108. - Capítulo 12 – Hormonios Tireoidianos e drogas Antitireoidianos ---------- 112. 4 Capítulo 1 HISTÓRIA E CONCEITOS FUNDAMENTAIS A palavra farmacologia etnologicamente se origina da palavra Pharmakon, do grego que quer dizer droga, fármaco ou medicamento, mais logos que significa estudo. De uma maneira genérica e bastante simplificada poderíamos conceituar farmacologia de diversas formas, como se segue: • Estudo da interação dos compostos químicos com os organismos vivos; • Ciência experimental que lida com as propriedades das drogas e seus efeitos nos sistemas vivos; • Ciência que estuda as alterações provocadas no organismo pelas drogas ou medicamentos. A farmacologia pode, ainda, ser definida como o estudo do modo pelo qual a função dos sistemas orgânicos é afetada pelos agentes químicos. A farmacologia foi reconhecida como ciência na segunda metade do século XIX, onde os princípios científicos passaram a ser considerados no estabelecimento das práticas terapêuticas. No entanto, desde as civilizações mais antigas, remédios baseados em ervas ou outros produtos naturais de origem vegetal, animal ou mineral eram amplamente utilizados para combater as diversas enfermidades que acometiam o homem e os animais domésticos, que com ele conviviam. Até o século XIX, a terapêutica era pouco influenciada pela ciência. A partir desta fase, alguns cientistas importantes contribuíram para que esta influência fosse aumentada, dentre eles podemos citar o patologista alemão Rudolf Virchow, que naquela época comentou o fato da seguinte forma: “A terapêutica é um estágio empírico apreciado por clínicos e médicos práticos, e é através da combinação com a fisiologia que precisa ascender para ser uma ciência, o que ela não é nos dias de hoje”. 5 A falta de conhecimentos à cerca do funcionamento do organismo e o sentimento de que doença e morte eram assuntos semi-sagrados dificultavam o atendimento dos efeitos das drogas e facilitava o emprego de doutrinas autoritárias e nada científicas. Com o passar do tempo, as formas empíricas de tratar as doenças forma dando lugar aos sistemas terapêuticos mais definidos. A alopatia proposta por James Gregory no século XVIII dispunha como recursos terapêuticos somente a sangria, agentes eméticos e purgativos, cujos efeitos indesejáveis costumavam levar à morte muitos pacientes. Logo depois, no início do século XIX, Hahnemann introduziu os princípios da homeopatia. Muitos sistemas terapêuticos surgem e desaparecem ao longo do tempo, muitos deles baseados em princípios dogmáticos. Rang et al. (1997) comentam este fato de forma bastante contundente, conforme o fragmento de texto abaixo, transcrito destes autores: “Os sistemas terapêuticos cujas bases se assentam fora dos domínios da ciência estão, é claro, muito em prática hoje em dia, e vem até ganhando espaço sob o título de medicina ‘alternativa’ ou ‘holística’. Em sua maioria, rejeitam o ‘modelo médico’ que atribui a doença a um desarranjo subjacente da função normal que pode ser definido em termos bioquímicos e estruturais, detectado por meios objetivos e influenciado beneficamente por intervenções físicas ou químicas apropriadas. Dá maior importância, sobretudo ao mal- estar subjetivo, que pode estar associado ou não a doença. O abandono da objetividade na definição e na medida da doença segue junto com um afastamento similar dos princípios científicos em fixar a eficácia terapêutica. Disto resulta que princípios e práticas podem ganhar aceitação sem satisfazer a qualquer critério de validade para convencer os cientistas, validade exigida por lei antes que uma nova droga possa ser introduzida numa terapia. Como acontece com os” secadores de mãos elétricos”, a aceitação pública tem pouco a ver com a eficácia demonstrável; isso talvez seja esperado numa economia de mercado.” A indústria farmacêutica tem evoluído e se modernizado muito ao longo do século XX e graças aos avanços da química e dos métodos biotecnológicos, uma infinidade de produtos se encontram disponíveis para o uso na prática clínica. Os produtos químicos sintéticoscomeçaram a serem introduzidos na década de 20. Os primeiros fármacos efetivamente desenvolvidos em laboratório foram às sulfas, descobertas por Domagk a partir do corante prontosil. Depois vieram os antibióticos, que tornaram possível a cura de uma série de enfermidades infecciosas antes tidas como verdadeiros flagelos da humanidade. O desenvolvimento dos fármacos anti-hipertensivos representou uma vitóriana luta pela longevidade, o que reduziu significativamente a mortalidade pelas doenças vasculares. Dentre uma série de outras descobertas, podemos citar a dos neurolépticos, aos quais proporcionam melhoras significativas na qualidade de vida dos pacientes psiquiátricos e destaque deve ser dado aos 6 agentes imunossupressores que participaram e participam do grande êxito no transplante de órgãos. Os produtos naturais ainda são importantes, sobretudo na quimioterapia visando o tratamento das doenças infecciosas, mas os produtos sintéticos estão se tornando cada vez mais numerosos. Com o avanço da biotecnologia, principalmente através do domínio da técnica do DNA recombinante, hoje existe uma gama de novos agentes terapêuticos na forma de anticorpos, enzimas, hormônios, fatores de crescimento e citosinas. Mais recentemente tem se realizados ensaios visando à terapia gênica, onde se introduz novo segmento de DNA no genoma do indivíduo para adicionar, restaurar ou substituir genes ausentes ou anormais no sentido de reparar defeitos inatos do metabolismo. Diante do exposto acima, deve-se dizer que a compreensão de como as drogas ou outros compostos agem nos componentes do corpo em nível molecular deve aprimorar-se acentuadamente nos anos vindouros. Este conhecimento vai oferecer boa base para o uso racional de drogas na terapia medicamentosa, assim como fornecer uma base para o desenvolvimento de novas drogas com um mínimo de efeitos colaterais indesejáveis. Assim, podemos concluir que o estado da farmacologia reveste-se de grande importância para os profissionais que militam no campo das ciências biomédicas, onde as drogas se constituem em ferramentas importantes, seja na prática clínica, ou seja, na experimentação biológica ou biotecnológica. Em termos gerais, de uma forma mais didática, a farmacologia, bem como as drogas, podem ser caracterizadas e a farmacologia correlacionada com as demais áreas do conhecimento conforme o fluxograma e a figura abaixo: 7 Divisões da Farmacologia A Farmacologia pode ser vista como uma vasta área do conhecimento científico e nas suas diferentes abordagens pode se subdividir em cerca de seis áreas principais. Optamos pela divisão proposta abaixo, apesar de que, consultando os diferentes autores podemos observar algumas diferentes quanto à inclusão ou não de determinadas subdivisões. As diferentes áreas da farmacologia são as seguintes: a)Farmacodinâmica (do grego dýnamis = força): Estuda o mecanismo de ação dos fármacos, as teorias e conceitos relativos ao receptor farmacológico, a interação droga-receptor, bem como os mecanismos moleculares relativos ao acoplamento entre a interação da droga com o tecido alvo e o efeito farmacológico; b)Farmacocinética (do grego knetós = móvel): Estuda o caminho percorrido pelo medicamento no organismo. A farmacocinética corresponde às fases de absorção, distribuição e eliminação (biotransformação e excreção) das drogas. Através da farmacocinética se consegue estabelecer relações entre a dose e as mudanças de concentração das drogas nos diversos tecidos em função do tempo; c)Farmacotécnica: Estuda o preparo, a manipulação e a conservação dos medicamentos, visando conseguir melhor aproveitamento dos seus efeitos benéficos no organismo; d)Farmacognosia (do grego gnósis = conhecimento): Cuida da obtenção, identificação e isolamento de princípios ativos a partir de produtos naturais de origem animal, vegetal ou mineral, passiveis de uso terapêutico; e)Farmacoterapêutica: Refere-se ao uso de medicamentos para o tratamento das enfermidades, enquanto o termo terapêutico é mais abrangente, envolvendo não só o uso de medicamentos, como também outros meios para a prevenção, diagnóstico e tratamento das enfermidades. Esses meios envolvem cirurgia, radiação e outros; 8 f)Imunofarmacologia: Área relativamente nova que tem se desenvolvido muito nos anos graças à possibilidade de se interferir, através do uso de drogas, na realização dos transplantes e de se utilizar com fins terapêuticos substâncias normalmente participantes da resposta imunológica. Além disso, se verifica uma grande inter-relação entre farmacologia e imunologia quando se considera o desenvolvimento cada vez maior de drogas capazes de interferir com as diversas fases do processo inflamatório. A Toxicologia é uma ciência muito próxima da farmacologia e alguns autores a considerarem como parte desta última pelo fato de haver sobreposição de interesses e técnicas entre elas. A Toxicologia estuda os agentes tóxicos, sendo que estes podem ser quaisquer substâncias químicas ou agentes físicos capazes de produzir efeitos nocivos a organismo vivo. Vale ressaltar que o interesse da toxicologia esta voltada para os efeitos nocivos dos diversos agentes. Conceitos e Termos Mais Usados em Farmacologia Ao se iniciar no estudo da farmacologia é necessário que se observe alguns conceitos que são bastante usados e que se faça à devida distinção entre eles para a melhor compreensão dos demais aspectos relativos ao conteúdo a ser abordado mais à frente. Abaixo listamos alguns dos conceitos mais importantes. Droga: Qualquer substância química, exceto aquelas que servem como alimento, capaz de produzir efeito farmacológico em um organismo ou tecido vivo. Vale ressaltar que as drogas não criam funções no organismo, mas simplesmente as alteram. Os efeitos provocados pelas drogas podem ser tanto benéficos quanto maléficos. Remédio: Do Latim remedium (re = inteiramente mais mederi = curar). Remédio é uma palavra normalmente usada pelo leigo como sinônimo de medicamento ou especialidade farmacêutica. Portanto, remédio pode ser tudo aquilo que cura ou evita as enfermidades. Não só as substâncias químicas podem ser consideradas como remédios, mas também alguns agentes físicos como massagens, duchas e etc. Tóxico ou veneno: Por tóxico ou veneno compreende-se uma droga ou uma preparação com drogas que produz efeito farmacológico maléfico. Iatrogenia ou Iatrogênese: Quando um medicamento é administrado a um indivíduo provoca uma lesão ou uma doença de forma não intencional, dizemos que houve uma lesão ou doença iatrogênica. Essa situação pode vir a ocorrer, por exemplo, nos dois casos abaixo: • Por administração excessiva do medicamento; • Por hipersensibilidade do indivíduo que recebe o medicamento. Terapêutica: Pode ser definida como a aplicação clínica da farmacologia, ou seja, como administrar determinado medicamento para tratamento e/ou prevenção de doenças. 9 Medicamento: Do Latim medicamentum. É uma droga devidamente preparada para ser administrada ao paciente. Destinada a prevenir, curar, diminuir e/ou diagnosticar as enfermidades, ou seja, é uma substância química empregada visando um efeito benéfico. Podemos dizer que todo medicamento é uma droga, mas nem toda droga é um medicamento. A ANVISA classifica o medicamento como um produto farmacêutico, tecnicamente obtido ou elaborado, com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico. Placebo (placeo = agradar): O que feito com intenção benéfica para aliviar o sofrimento: fármaco/medicamento/droga/remédio (em concentração pequena ou mesmo na sua ausência), a figura do médico (feiticeiro). Posologia: (do grego poso = quanto, mais logos = estudo). É o estudo da dosagem domedicamento com fins terapêuticos. Dose: É a quantidade capaz provocar uma resposta terapêutica desejada no paciente preferivelmente sem outra ações no organismo. Dosagem: A dosagem inclui, além da dose, freqüência de administração e duração do tratamento. Idiossincrasia: O termo idiossincrasia refere-se às reações particulares ou especiais do organismo às drogas, comumente chamadas reações idiossincrásicas. Essas são nocivas, às vezes fatais e ocorrem em uma pequena minoria dos indivíduos. Na maioria dos casos a causa não bem compreendida, mas acredita- se que os fatores genéticos possam ser responsáveis em algumas situações. Forma Farmacêutica: Forma farmacêutica é a maneira como os medicamentos são preparados, apresentados e conseqüentemente comercializados e utilizados, ou seja, comprimido, xarope, suspensão e outros. Na forma farmacêutica, além do medicamento principal ou princípio ativo, entram outras substâncias na composição, como veículo ou excipiente, coadjuvante, edulcorante, ligante, preservativo e etc. As formas farmacêuticas podem ser classificadas conforme se exemplifica abaixo: Preparações líquidas Soluções – Misturas homogêneas do soluto que é base farmacológica com o solvente que é o veículo. Pode se destinar ao uso sob a forma de gotas. Suspensões – Misturas heterogêneas, sendo que o soluto se deposita no fundo do recipiente necessitando de homogeneização no momento do uso. Emulsões-Substâncias oleosas dispersas em meio aquoso, apresentando separação de fases. Xaropes – Soluções aquosas onde o açúcar em altas concentrações é utilizado como corretivo. Pode conter cerca de dois terços do seu peso em sacarose. Elixires – Soluções hidroalcoólicas para uso oral, açucaradas ou glicerinadas contendo substâncias aromáticas e as bases medicamentosas. Loções – Soluções alcoólicas ou aquosas para uso tópico. 10 Linimentos - Similares aos anteriores, mas com veículo oleoso. Preparações sólidas Comprimidos – Forma farmacêutica de formato variável, em geral discóide, obtida por compressão. Na maioria dos casos contém uma ou mais drogas, aglutinante e excipiente adequados, prensados mecanicamente. Drágeas – Similares aos anteriores, mas com revestimento gelatinoso que impede a desintegração nas porções superiores do trato digestivo. O revestimento protetor apresenta várias camadas contendo substâncias ativas ou inertes. Costumam ser coloridas e polidas utilizando-se cera carnaúba no polimento. Cápsulas – Uma ou mais drogas mais excipientes não prensados e colocados em um invólucro gelatinoso ou amiláceo. Pílulas – Associação do princípio ativo com um aglutinante viscoso. Supositórios - Apresentações semi-sólidas para uso retal, que se fundem à temperatura corporal pela presença de manteiga de cacau, glicerina ou polietilenoglicol. Óvulos e Velas - Apresentações semi-sólidas para uso ginecológico, cuja diferença entre si é a forma. Preparações Pastosas São preparações semi-sólidas normalmente destinadas ao uso tópico. Como exemplos temos as seguintes: geléias, cremes, pomadas, ungüentos e pastas, em ordem crescente de viscosidades. Diferem também pelos veículos que são gelatinosos nas geléias, oleosos nas pomadas e aquosos nos demais. Dose Efetiva Mediana (DE50) é a Dose Letal (DL50) e Índice Terapêutico Dose efetiva mediana (DE50) é a base para produzir determinada intensidade de um efeito em 50% dos indivíduos. Doses outras que produzem a mesma intensidade do efeito em outras proporções percentuais são designadas DE20, DE80 e etc. Quando o efeito observado é a morte dos animais de experimentação, registra-se a dose letal. DL50 significa que morreram 50% dos animais com a dose empregada, DL20, que morreram 20% dos animais e assim por diante. Acredita-se hoje, que o teste de determinação da DL50, anteriormente considerado como parâmetro fundamental para a definição da toxicidade química, tenha perdido grande parte de sua credibilidade, especialmente em relação a fármacos destinados ao uso terapêuticos. Devido aos problemas relacionados abaixo, ele mede apenas a mortalidade e não a toxicidade subletal. • A DL50 varia muito entre as espécies e não pode ser extrapolada com segurança para seres humanos; 11 • Ele mede apenas a toxicidade aguda produzida por uma dose única, e não mede a toxicidade em longo prazo; • Ele não mede as reações idiossincrásicas (reações que ocorrem a uma dose baixa em uma pequena proporção dos indivíduos), embora essas reações sejam mais relevantes para a prática que a toxicidade de doses altas; • Ele requer o uso de muitos animais e acarreta um sofrimento desproporcional em relação ao conhecimento obtido. O índice terapêutico (IT) é definido pela relação DL50/DE50. Vários autores ainda transmitem a idéia de que quanto maior o índice terapêutico de uma droga, maior a sua margem de segurança, pois ele indica a distância entre a dose letal mediana e a dose efetiva mediana. Erlich definiu inicialmente o índice terapêutico como: IT = Dose máxima não tóxica/Dose mínima eficaz, infelizmente a variabilidade entre indivíduos não é levada em conta nesta definição, portanto esse conceito caiu em desuso. O conceito de IT = DL50/DE50 ainda é amplamente utilizado, apesar de hoje reconhecermos que este apresenta limitações claras. O IT é capaz de dar uma idéia da margem de segurança no uso de um fármaco, mas não é efetivamente um guia útil para a segurança de um medicamento no uso clínico. As razões para isso são as seguintes: a)O tipo de efeito adverso que limita na prática a utilidade clínica de um fármaco tende a passar despercebido no teste de DL50; b)A DE50 pode não ser definida, dependendo da media da eficácia utilizada. Por exemplo, pode ser necessário administrar os fármacos analgésicos em doses diferentes de acordo com a natureza da dor; c) Algumas formas muito importantes de toxicidade são idiossincrásicas. Em outros casos, a toxicidade depende muito do estado clínico do paciente. Assim, o propranolol, por exemplo, é perigoso para pacientes asmáticos em doses que são inofensivas para um indivíduo normal. Capitulo 2 12 Introdução à Farmacologia Clínica A industrialização do medicamento, ocorrida a partir de 1920 e aumentada depois da Segunda Guerra Mundial, é a responsável pela dramática mudança na farmácia. Não obstante, esta, mesma circunstância é a que hoje lhe devolve a grande oportunidade de recuperar um papel social protagônico. Com efeito, na enorme quantidade de medicamentos disponíveis no presente e na sua variada ação farmacológica, se manifesta à necessidade de que alguém, com sólidos conhecimentos profissionais ponha racionalidade no mercado e garanta o uso correto de medicamento. Esta tarefa é sem dúvida para o farmacêutico. Em 1960 surgiu o primeiro conceito de Farmácia Clínica, definido como a parte da farmácia que trata do cuidado do enfermo com particular ênfase na terapia farmacológica, seus efeitos adversos e interações indesejáveis. Em 1990 foi descrito o conceito de Atenção Farmacêutica, como a prestação responsável de cuidados integrais relacionados com a medicação tendo como objetivo a melhoria da qualidade de vida dos pacientes. Ambos os conceitos estabelecem novos papéis e responsabilidades para o farmacêutico, orientado ao cuidado e assessoramento do paciente em todos os aspectos relacionados com o uso dos medicamentos, ou seja, o papel do farmacêutico que no passado se orientava ao produto, na atualidade se orienta ao paciente. A farmácia Clínica supôs a introdução da prestação de serviços farmacêuticos orientados ao paciente. Houve uma evolução e os serviços não somente se orientaram ao paciente, como também os farmacêuticos passam a se conscientizar de que sua intervenção melhoraria a qualidade de vida dos pacientes. Em 1995, em uma conferênciasobre “As direções para prática clínica em farmácia”, patrocinada pela ASPH (American Society of Hospital Pharmacisitis, hoje denominada American Society of Health- System Pharmacist), na qual Hepler apontava que deveria ser estabelecido um compromisso para desenvolver a Farmácia como uma verdadeira profissão clínica. Indicava que “deveria existir um convênio ou pacto entre os farmacêuticos e seus pacientes e, por extensão, entre a profissão de Farmácia e a Sociedade”. Sem saber que Brodie havia usado o termo sete anos antes Hepler descreveu na sua idéia como atenção farmacêutica em outra reunião na Carolina do Sul, em 1987: “Proponho que os farmacêuticos clínicos mudem sua ênfase de realizar somente funções isoladas aos pacientes e aceitam uma parcela de responsabilidade na atenção ao paciente”. Em 1988, Hepler descreveu a atenção farmacêutica como “uma relação pactuada entre um farmacêutico e um paciente, na qual o farmacêutico leva a cabo as funções de controle do uso dos medicamentos, governado pela consciência e o compromisso de interesse pelo paciente”.Strand define como, “o componente da prática da farmácia que supõe a interação direta do farmacêutico com o paciente, com a 13 finalidade de atender às necessidades do mesmo relacionadas com medicamentos”. Em qualquer âmbito da prática profissional, os farmacêuticos têm diante de si um grande desafio. Ou se integram profissionalmente ao sistema, assumindo novos e protagônicos papéis na informação sobre medicamentos, o tratamento de patologias menores e racionalização dos custos sanitários, ou continuam com a deteriorização profissional onde as técnicas de comercialização cedo ou tarde, os deixarão de lado. Esta crise de identidade atravessa o farmacêutico á que justifica uma mudança rápida, enérgica e penetrante. A farmacologia clínica evoluiu com a necessidade de se comprovar a eficácia e segurança dos fármacos em seres humanos, em função das leis que regulamentam o desenvolvimento, produção e comercialização dos medicamentos. Atualmente, a Farmacologia Clínica é a expressão contemporânea do emprego do método científico para a racionalização da terapêutica medicamentosa. Os ensaios clínicos, os quais seguem princípios éticos e científicos de experimentação, são os responsáveis pelas bases da avaliação de eficácia e segurança dos fármacos. O ensino da farmacologia clínica e a pesquisa com medicamentos é uma realidade recente no país. Portanto, os profissionais da área de saúde, médicos, biomédicos, farmacêuticos e enfermeiros, que trabalham ou pretendem trabalhar nas indústrias farmacêuticas, nas empresas privadas que pesquisam e monitorizam medicamentos (contract research organizations) ou nas instituições públicas de vigilância sanitária, não recebem a devida qualificação durante a sua formação acadêmica. ESTUDO DAS PRINCIPAIS VIAS DE ADMINISTRAÇÃO ATRAVÉS DO SISTEMA DIGESTIVO VIA ORAL Na utilização por via oral, para que o medicamento atinja os locais onde possa haver absorção, é necessário que haja deglutição, o que por si, limita o emprego da via em pacientes impossibilitados de realizar tal função. No estômago ocorre à absorção de uma pequena parcela do total que é absorvido, o que seria de se esperar, pelas características estruturais da mucosa gástrica o que não lhe confere grande capacidade absortiva. Alguns medicamentos, sobretudo aqueles de características básicas, podem permanecer por algum motivo no estômago sem ser absorvido, sendo este segmento do trato digestivo responsável por modificar o tempo de latência desses fármacos. No terço inicial do intestino delgado se faz grande parte da absorção, sendo este segmento de grande relevância no processo. Como vantagem da utilização da via oral poderíamos citar a facilidade ou praticidade na administração do medicamento, o que acarreta em uma série de outras vantagens. Como desvantagens podemos incluir o fato do medicamento ser irritante para a mucosa do trato gastrointestinal ou ainda ser instável nas condições físico-químicas proporcionadas pelas secreções digestivas. Na maioria das vezes, após a absorção, a 14 passagem do fármaco dos vasos mesentéricos ao sistema porta e a posterior passagem pelo fígado resulta em remoção e metabolização de parte do mesmo pelo fígado no chamado metabolismo de primeira passagem. Deve-se relatar também a incompatibilidade da utilização da via oral em indivíduos apresentando distúrbios digestivos, tais como vômito ou diarréia. Absorção por via oral e o conceito de biodisponibilidade A absorção através do trato digestivo depende de uma série de fatores, tais como: mobilidade do trato gastrointestinal, valores de pH no local de absorção, tamanho das partículas de preparação e interação físico-química com o conteúdo (por exemplo a interação que ocorre entre os antibióticos do grupo das tetraciclinas e íons metálicos como o cálcio) O termo biodisponibilidade se refere à quantidade de uma preparação terapêutica que é absorvida e torna- se efetivamente disponível no local de ação da droga ou, ainda, pode ser considerada como a fração da dose ingerida de um fármaco que tem acesso à circulação sistêmica, a qual é afetada diretamente pelos fatores que interferem na absorção ou pela metabolização na parede intestinal ou no fígado antes de atingir a circulação sistêmica. Quando as duas preparações de um mesmo fármaco se equivalem do ponto de vista de eficácia clínica, dizemos que há bioequivalência entre as preparações e que elas são comparáveis quanto a biodisponibilidade. VIA MUCOSA ORAL (SUBLINGUAL OU ENTERAL TRANSMUCOSA) A absorção de alguns fármacos por esta via é relativamente rápida com a vantagem de atingir a circulação sistêmica sem sofrer o metabolismo de primeira passagem no fígado ou nos enterócitos. Por essa via são administradas drogas com ação vasodilatadora como o trinitrato de gliceril objetivando uma resposta rápida. Tem que se levar em conta o sabor da preparação, que não pode ser desagradável para ser administrada por esta via. VIA RETAL O uso desta via é relativamente esporádico visando o tratamento de afecções locais, bem como visando uma ação sistêmica. A absorção de drogas por via retal muitas vezes não é confiável, mas pode se constituir em uma opção para pacientes incapacitados de receber medicamentos por outras vias, como por exemplo, naqueles apresentando vômitos, crises convulsivas e pós-operatório que empeça a utilização da via oral ou desidratação grave que dificulte a utilização da via endovenosa. A via retal exige preparações ou formas farmacêuticas adequadas. 15 As vantagens das vias parenterais se relacionam com a maior rapidez na absorção, o que proporciona um menor tempo de latência, ou seja, um intervalo menor entre o momento da administração e o início dos efeitos, maior correlação entre a dose administrada e a dose absorvida, conseqüentemente menores perdas ou maior biodisponibilidade. Deve-se considerar a possibilidade de se utilizar estas vias em indivíduos apresentando vômito ou diarréia. Como desvantagens, as vias parenterais apresentam a necessidade de assepsia nos procedimentos de aplicação além de exigir maior conhecimento técnico, maiores cuidados, além de concentrações adequadas das preparações em relação à tonicidade dos fluídos corporais. VIAS PARENTERAIS (PAR, FORA DE ENTERO, INTESTINO) CAVIDADES SEROSAS A principal via onde se utiliza uma cavidade serosa é a via intraperitoneal (I. P) a qual apresenta grande capacidade de absorção pela sua rica vascularização. Essa via, no entanto, é muito pouco utilizada na prática clinica e bastante utilizada experimentalmente em animais de laboratório devido a questões de ordem prática, tais como o risco de se atingir alguma víscera durante a aplicação ou de provocar uma peritonite. VIA INTRADÉRMICA É umavia limitada pela capacidade de receber somente pequenos volumes. Normalmente se utiliza essa via para a administração de vacinas ou para a execução de testes imunológicos como na aplicação de tuberculina ou no diagnóstico da Leishmaniose Tegumentar. INTRAMUSCULAR (I.M.) Quando a droga é administrada por via intramuscular ela entra em contato com uma grande superfície absortiva, que é particularmente proporcionada pela irrigação exuberante que o tecido muscular apresenta. A via intramuscular se caracteriza de uma maneira geral por proporcionar uma absorção rápida. É uma via que exige cuidados na sua utilização, assim como todas as parenterais devido à possibilidade de lesar nervos ou atingir vasos durante a administração. As soluções anisotônicas e irritantes para os tecidos devem ser evitadas. 16 VIA INTRAVENENOSA OU ENDOVENOSA (I.V.) A aplicação endovenosa consiste em administrar o medicamento diretamente no leito vascular, portanto nesta via considera-se que não há absorção. Utiliza-se essa via para se obter um efeito imediato, reduzindo-se o tempo de latência. A via intravenosa ou endovenosa permite a administração de grandes volumes, desde que observada a velocidade de aplicação, e permite o uso de soluções anisotônicas com o líquido extracelular. A superdosagem na via endovenosa é de fácil controle e deve se observar o risco de provocar embolias quando são utilizadas substâncias gasosas ou soluções oleosas e o risco de uma sobrecarga de volume ou hipervolemia na administração de quantidade excessiva. O veículo utilizado na preparação deve ser aquoso ou aquamiscível. VIA SUBCUTÂNEA (S.C.) A aplicação por via subcutânea nas regiões onde a pele é mais distensível permite a administração de volumes maiores de uma preparação. A aplicação em massa seja nas campanhas de vacinação em humanos ou no tratamento feito em grandes rebanhos na prática veterinária, a via subcutânea pode apresentar vantagens do ponto de vista prático. Formas de aumentar ou reduzir a absorção nas diversas vias de administração AUMENTAR A ABSORÇÃO Compressas Quentes Massagem no local de Injeção Associação com Hialuronidase REDUZIR A ABSORÇÃO Associação com Vasoconstritores Formas Farmacêuticas Especiais Comprimidos de Liberação Lenta Uso de Veículo oleoso Uso de sais pouco solúvel do fármaco Implante subcutâneo de preparações sólidas 17 ATRAVÉS DO APARELHO RESPIRATÓRIO MUCOSA BRONQUIAL E ALVÉOLOS Algumas drogas são utilizadas por inalação como os anestésicos inalatórios naforma de gases ou líquidos voláteis, onde o pulmão funciona tanto como uma via de administração como de eliminação. As trocas do sangue com o ar alveolar são rápidas em decorrência da grande superfície absortiva e a grande vascularização, o que permite ajustes rápidos na concentração plasmática. Fármacos que agem diretamente sobre os pulmões também podem ser administrados por inalação na forma de aerossóis visando uma ação mucolítica ou broncodilatadora, como por exemplo, o salbutamol ou outras drogas utilizadas nas crises de asma brônquica. O cromoglicato pode ser utilizado no tratamento da asma inalado na forma de pó e ainda, algumas drogas podem ser administradas por via endotraqueal com o auxílio de uma sonda em certas situações de emergência como é o caso da atropina ou da adrenalina. MUCOSA NASAL Quando se instila um medicamento na mucosa nasal normalmente se esta visando o tratamento de uma afecção local. OUTRAS VIAS VIA INTRA-UTERINA Utilizada para a aplicação de anti-sépticos, antibióticos e outros produtos visando o tratamento de afecções do trato geniturinário ou mais especificamente do útero. VIA INTRAMAMÁRIA A via intramamária consiste na aplicação do medicamento através do ducto da papila mamária e é utilizada normalmente na aplicação de anti-sépticos e antibióticos visando o tratamento local das mastites. É uma via também muito empregada na veterinária e pouco na medicina. 18 VIAS EPIDURAL E INTRATECAL A aplicação de drogas no canal medular ou no espaço subaracnóide é utilizada para fins específicos. Pode-se produzir anestesia regional pela administração de um anestésico local ou mais recentemente pela administração de hipnoanalgésicos. Certas formas de leucemia podem ser tratadas administrando quimioterápicos por estas vias, assim como antibióticospodem ser utilizados no tratamento das meningites. VIA INTRA-OCULAR Normalmente utilizada para o tratamento das afecções oculares com as conjuntivites ou o glaucoma, por exemplo, ou ainda na aplicação de vacinas na prática veterinária, como é o caso de algumas vacinações nas aves. Para que haja absorção pelo epitélio conjuntival é necessário que a droga apresente um certo grau de lipossolubilidade. PELE OU SUPERFÍCIES EPITELIAIS A absorção de drogas pele integra é bastante dependente da lipossolubilidade da droga e bastante difícil para certos fármacos. Utiliza-se a aplicação tópica sobre a pele visando o tratamento de afecções locais bem como a ação sistêmica daquelas drogas que podem ser absorvidas em quantidades apreciáveis. Nos dias atuais é relativamente comum a comercialização de preparações farmacológicas para serem utilizadas por via transdérmica, as quais são aderidas a regiões de pele fina. Como exemplo podemos citar o gliceritrinitrato utilizado no tratamento da angina, a hioscina que evita a cinetose no mar ou os hormônios estrogênicos utilizados na reposição hormonal pós-menopausa. A via transdérmica é importante na veterinária a qual possibilita a aplicação de medicamentos que utilizam veículos especiais nas formas de aplicação “pour on” e “spoton”. Os veículos especiais são os dimetilsulfóxidos ou DMSO, Dimetilformamida, sabões e álcoois, cuja função principal é facilitar a penetração através da camada queratinizada da pele pelo princípio ativo. As drogas normalmente aplicadas desta forma são os antiparasitários utilizados no combate aos ectoparasitas e endoparasitas que infestam ou infectam os animais. 19 -FARMACOCINÉTICA: 6.1-Farmacocinética : é o caminho que o [[medicamento]] faz no organismo. Não se trata do estudo do seu mecanismo de ação mais sim as etapas que a [[droga]] sofre desde a administração até a excreção, que são: absorção, distribuição, bio-transformação e excreção. Note também que uma vez as a droga no organismo, essas etapas ocorrem de forma simultânea sendo essa divisão apenas de caráter Didático. 6.1.1-As fases da farmacocinética são: 1- Absorção Absorção farmacológica; A absorção, é a primeira etapa que começa com a escolha da via de administração até o momento que a droga entra na corrente sanguínea. Vias de administração como intra-venosa e intra-arterial não passam por essa etapa, entram direto na circulação sangüínea. Existem fatores interferem nessa etapa, dentre estes temos : o pH do meio, forma farmacêutica e patologias (úlceras por exemplo), dose da droga a ser administrada, concentração da droga na circulação sistêmica,concentração da droga no local de ação, distribuição da droga organicamente, as drogas nos tecidos de distribuição e a eliminação metabolizada ou excretada. Temos ainda um fator a ser relevado que é a característica química da droga pois esta interfere no processo de absorção. Metabolismo de primeira passagem Muitos fármacos após alcançarem a circulação sistêmica têm uma porção significativa removida e metabolizada pelo fígado no que se convencionou chamar metabolismo de primeira passagem ou metabolismo pré-sistêmico. Esse metabolismo de primeira passagem pode reduzir a biodisponibilidade dos fármacos administrados por via oral, o que faz com as doses para a administração por via oral sejam maiores em comparação comaquelas administradas por outras vias. As variações individuais são muito grandes quanto ao metabolismo de primeira passagem produzindo uma certa imprevisibilidade de efeitos quando certos fármacos são administrados por via oral. Fármacos que sofrem eliminação pré-sistêmica significativa Aspirina Lignocaína Clotrimazol Metoprolol Clorpromazina Morfina Dextropropoxifeno Nortriptilina 20 Trinitrato de gliceril Petidina Imipramina Propranolol Dinitrato de Isossorbida Salbutamol Levodopa Verapamil 2-Distribuição farmacológica Nesta etapa a droga é distribuída no organismo através da circulação. O processamento da droga no organismo passa em primeiramente nos órgãos de maior vascularização (como SNC, pulmão, coração) e depois sofre redistribuição aos tecidos de menos irrigação (tecido adiposo por exemplo). É nessa etapa em que a droga chega ao ponto onde vai atuar. Nessa etapa poderá ocorrer : baixa concentração de proteínas plasmáticas (necessárias para a formação da fração ligada) como desnutrição, hepatite e cirrose, que destroem hepatócitos, que são células produtoras de proteínas plasmáticas,reduzindo assim o nível destas no sangue. 3- Bio-transformação Fase onde a droga é transformada em um composto mais hidrossolúvel para a posterior excreção. A Bio - transformação dá em duas fases: Fase 1: etapas de oxidação, redução e hidrólise; Fase 2: conjugação com o ácido glicurônico. A fase 1 não é um processo obrigatório, variando de droga para droga e diferente da fase 2, obrigatória a todas as drogas. O fígado é o órgão que prepara a droga para a excreção. Essa é a fase que prepara a droga para a excreção. 4- Excreção Pela excreção, os compostos são removidos do organismo para o meio externo. Fármacos hidrossolúveis, carregados ionicamente, são filtrados nos glomérulos ou secretados nos túbulos renais, não sofrendo reabsorção tubular, pois têm dificuldade em atravessar membranas. Excretam-se, portanto, na forma ativa do fármaco. Os sítios de excreção denominam-se emunctórios e, além do rim, incluem: ▪ pulmões, ▪ fezes; ▪ secreção biliar, 21 ▪ suor, ▪ lágrimas, ▪ saliva, ▪ leite materno. Retirando desta lista os pulmões para os fármacos gasosos ou voláteis, os demais sítios são quantitativamente menos importantes. FARMACODINÂMICA Interação Droga/Receptor Os fármacos ou seus metabólitos ativos, para produzirem efeitos devem atingir o local de ação em concentrações adequadas. As drogas normalmente produzem alterações no organismo através de alterações das propriedades físicas, físico-químicas e ou bioquímicas da estrutura celular. Por exemplo, acredita-se que os anestésicos gerais inalatórios, devido à alta lipossolubilidade, se dissolvem na estrutura da membrana das células nervosas. Também certos antimicrobianos devido as suas propriedades tensoativas alteram a tensão superficial das membranas e, conseqüentemente alteram a permeabilidade seletiva da membrana o que leva à morte os microrganismos. Outras vezes, os medicamentos agem através de reações químicas simples, combina-se com componentes do organismo e alteram então, a participação destes componentes nos processos fisiológicos normais. Na maioria das vezes os medicamentos agem em quantidades tão mínimas e tão seletivas que é fácil de se enxergar uma correlação entre as estruturas químicas dos mesmos e os locais de ação ou de ligação. Assim atuam anti-histamínicos, anestésicos locais e etc, que sempre apresentam uma semelhança estrutural com todos os medicamentos do mesmo grupo farmacológico. Além disto tais medicamentos podem ser antagonizados por outras substâncias que devem ter semelhança estrutural. Para explicar os mecanismos de ação destes medicamentos surgiram várias teorias, todas elas baseadas na existência de macromoléculas as quais se ligam os fármacos formando um complexo, reversível, que na maioria dos casos é responsável pelo efeito farmacológico. Estas macromoléculas são denominadas receptores. Em um exemplo hipotético, suponhamos que um fármaco tenha sido adicionado a diferentes preparações de músculo liso. Em uma das preparações o músculo contraiu, em outra houve relaxamento e a terceira não respondeu. Podemos dizer que o músculo da primeira preparação apresenta receptores para contração, o segundo para relaxamento e o terceiro não possui receptores para aquele fármaco. 22 Outro exemplo interessante é o que ocorre com os hormônios, que após serem secretados são lançados na circulação sangüínea e, desta maneira, todo o tecido do organismo estão expostos a estes hormônios. Alguns tecidos respondem a um dado hormônio e outros não. Os hormônios ligam-se aos receptores presentes em alguns tecidos e, de alguma forma, produzem alterações que resultam em efeitos fisiológicos característicos. O conceito de receptores vem desde Langley que 1907 propôs o conceito de “substâncias receptivas” e Erlich em 1913 que notou a alta especificidade da ligação entre protozoários e certos quimioterápicos, no entanto o mais aceito é o proposto por Ariens, muitos anos mais tarde e, corresponde ao local de interação da droga com o componente celular que pode resultar em um estímulo que poderá ser traduzido a um efeito. Segundo Ariens são receptores: 23 a) Enzimas, com os quais alguns medicamentos se ligam levando ao aparecimento de seu efeito farmacológico. Exemplo: Inibidores da acetilcolinesterase que se ligam na enzima e a inibem; b) Ácidos nucléico, que podem ter a estrutura alterada pela ação de certas drogas como os antibióticos, antimaláricos e etc; c) Sítios moleculares específicos, localizados em células, com as quais determinados fármacos reagem provocando uma resposta característica. Exemplo: colinérgicos de ação direta, que se ligam aos receptores muscarínicos da acetilcolina. Formação do complexo droga-receptor ou fármaco-receptor A natureza da interação fármaco-receptor tem sido, desde muitos anos, um tema muito estudado na farmacologia básica. Quando droga e receptor se interagem, surge um complexo droga-receptor ou fármaco-receptor. A formação deste complexo geralmente leva a alteração do funcionamento celular. F+R ↔ FR → Efeito A maioria dos fármacos se liga através de ligações fracas com os receptores de modo que a velocidade de dissociação do complexo é grande. Quando a ligação é forte, covalente, os complexos são mais estáveis e o efeito pode ser mais duradouro ou até irreversível. A ligação fármaco-receptor se faz por ligação iônica, pontes de hidrogênio, forças de Van der Waals ou interações hidrofóbicas. Nem todos os fármacos, porém, agem através de receptores, substâncias como o manitol (um diurético osmótico) vão agir sobre a água, a carboximetilcelulose (um laxante) apenas aumenta o volume fecal pela incorporação de água. Nestes casos alguns autores consideram a água como um receptor inespecífico uma vez que ela poderia ser substituída por qualquer outro solvente polar. Algumas substâncias de efeito quelante se ligam a íons metálicos divalentes tendo a predileção por alguns deles como o cálcio e magnésio. Neste caso podemos considerar estes íons como receptores semi- específicos. Ao contrário do que ocorre nestes exemplos os receptores específicos apresentam organização química complexa, na qual o fármaco deve se encaixar para produzir ação farmacológica. No caso de receptores específicos, pequenas modificações químicas na estrutura do fármaco podem resultar em grandes alterações em termos de efeitos. Para exemplificação veja a Tabela abaixo: 24 Potência relativa de alguns análogos da acetilcolina sobre a contração do músculo liso do íleo de cobaia Droga Potência Relativa (%) Acetilcolina 10025 Formicolina 5 Propionicolina Interação Entre Drogas A administração simultânea de duas drogas pode fazer com que o efeito de uma delas seja quantitativamente alterado. A presença em uma mesma preparação de mais de uma substância geralmente tem a finalidade de aumentar ou reduzir os efeitos de uma delas, facilitar a dissolução, a conservação ou melhorar as propriedades organolépticas. A associação entre drogas pode fazer com que obtenhamos o efeito desejado de um dado fármaco utilizando doses menores e conseqüentemente com a possibilidade de menores efeitos colaterais. O uso de drogas associadas pode resultar em uma série de interações que são classificadas em sinergismo e antagonismo. Sinergismo Diz-se que há sinergismo, entre dois fármacos A e B quando, devido à presença da droga B, houve menor necessidade de A, para se obter o efeito desejado. O sinergismo pode ser dividido em sinergismo por potenciação e sinergismo por adição. No sinergismo por adição o efeito da droga A soma-se ao efeito da droga B, ou seja, se tivermos um anestésico A, que em uma dose X, produza efeito por uma hora e um outro anestésico B, que na dose Y, produza efeito por 30 minutos, ao associarmos os dois anestésicos obteremos efeito por 1 hora e 30 minutos. O gráfico abaixo ilustra o efeito de A em função da dose com doses crescentes de B (B=0, B=4 e B=8). O sinergismo por potenciação ocorre quando o efeito obtido na associação é maior que o efeito de cada uma das drogas isoladamente, mas é diferente da somatória dos efeitos isolados. Suponhamos que o efeito desejado seja a redução da pressão arterial. Esse efeito poderia ser obtido pela utilização de uma droga A com ação vasodilatadora ou pela utilização de uma droga B com ação diurética A utilização das drogas A e B em conjunto propicia um efeito maior que cada uma delas isoladamente. 25 Dizemos então que houve um sinergismo por potenciação, Ocorre também potenciação quando as drogas atuam de forma qualitativamente diferente, uma interferindo nas características farmacocinéticas da outra, por exemplo, a interação entre os inibidores de aceiticolinesterase e a acetilcolina, a qual tem os níveis aumentados pela presença do inibidor. Efeito da droga A com diferentes concentrações de uma droga b Podemos observar que a curva se desloca para a esquerda à medida que aumentamos a concentração de B, isto significa que para obtermos um dado efeito, em presença de B, necessitamos de doses menores de A. Antagonismo Há antagonismo entre duas drogas quando a intensidade do efeito de uma é reduzido pela presença da outra. Quando duas drogas competem pelo mesmo receptor, com afinidades semelhantes pelo receptor, tendo uma delas atividade intrínseca igual a um (agonista total) e a outra igual a zero (antagonista), dizemos que há antagonismo competitivo reversível. A interação é competitiva porque as drogas competem pelo mesmo receptor e reversível, porque as ligações sendo fracas uma das drogas se desloca a outra do receptor e com isso, aumentando-se concentração do agonista consegue-se reverter o bloqueio feito pelo antagonista. Neste caso as curvas são paralelas e aumentando-se a dose do agonista sempre se alcança o efeito máximo. Uma droga neste caso modifica a afinidade da outra pelo receptor, ou seja, a constante de afinidade se altera, já as curvas se deslocam para a direita à medida que se aumenta concentração do antagonista. O antagonismo competitivo reversível é mostrado na Figura abaixo: 26 Antagonismo competitivo reversível Para medir-se o grau de antagonismo competitivo usa-se o parâmetro PA2 (Schild, 1949) que representa o logaritmo negativo da concentração molar do antagonista necessária para que a concentração do agonista seja o dobro para obter o mesmo efeito. Como exemplo deste tipo de antagonismo podemos citar a reação entre a histamina e os anti-histamínicos e a acetilcolina e a atropina. Pode haver uma situação onde o antagonista se liga ao receptor de maneira irreversível. Neste caso o agonista não consegue remover o antagonista do receptor. Então chamamos esta forma de antagonismo competitivo irreversível como pode ser visto na Figura abaixo. Efeito de uma droga A em presença de diferentes concentrações de uma droga B 27 Podemos ver neste caso que o efeito máximo pode ser alcançado até certo limite, o que podemos atribuir aos receptores de reserva ou suplementares e da mesma forma que no caso anterior, as curvas se deslocam para a direita e a constante de afinidade se altera, O logaritmo negativo da concentração do antagonista necessária para reduzir em 50% o efeito do agonista é conhecido como pD2. Alguns bloqueadores neuromusculares despolarizantes podem agir como antagonistas competitivos irreversíveis da acetilcolina. Outra forma de antagonismo é o antagonismo não competitivo onde o antagonista bloqueia alguma etapa da cadeia de eventos que liga a ativação do receptor a resposta farmacológica reduzindo a resposta ao agonista. O verapamil é um antagonista de drogas que promovem contração da musculatura lisa impedindo a entrada de cálcio e não bloqueando o receptor onde estas drogas atuam. Representando graficamente, na figura abaixo, temos curvas com inclinações diferentes, com efeitos cada vez mais aquém do efeito máximo à medida que aumentamos a dose do antagonista. Podemos observar também que a constante de afinidade não muda em virtude das drogas não ocuparem o mesmo receptor. Antagonismo não competitivo ou fisiológico. Outra forma de antagonismo que graficamente se assemelha ao anterior é o antagonismo fisiológico onde duas drogas originalmente agonistas produzem ações farmacológicas contrárias agindo em receptores diferentes e por mecanismos diferentes, como é o caso da interação entre a adrenalina e a histamina na modificação da pressão arterial. A adrenalina promove aumento da pressão arterial por vaso-constrição e aumento da freqüência cardíaca, enquanto a histamina promove uma redução da pressão por promover vaso-dilatação e reduzir a resistência vascular periférica. Temos também o antagonismo por agonista parcial ou dualismo onde duas drogas que apresentam afinidades semelhantes pelos mesmos receptores, porém com atividades intrínsecas diferentes são associadas. Quando isso ocorre, elas inicialmente atuam de forma sinérgica, devido a grande 28 disponibilidade de receptores. Porém, quando se esgotam os receptores elas passam a atuar de forma antagônica, ou seja, a que apresenta atividade intrínseca mais baixa (agonista parcial) ocupa receptores e não atuam de forma muito eficaz atrapalhando a ação do agonista total (atividade intrínseca mais alta). Para isso observe a figura abaixo: Antagonismo por agonista parcial ou dualismo Existe o chamado antagonismo químico onde as substâncias interagem em solução, ou seja, os metais pesados podem ser antagonizados por substâncias quelantes. Outro exemplo é a neutralização química do cianeto pela administração de tiossulfatos. No antagonismo farmacocinético o que ocorre é a redução da concentração do agonista no local de ação seja por redução da absorção, aumento da velocidade de degradação ou aumento da velocidade de excreção. Por exemplo, o fenobarbital induz o metabolismo de uma série de drogas como os anticoagulantes cumarínicos. Mecanismos Moleculares de Ação das Drogas Avanço no conhecimento dos mecanismos de ação e desenvolvimento de novas drogas Os mais recentes avanços com relação ao desenvolvimento de novas drogas têm sido possíveis graças ao conhecimento que se tem acumulado, basicamente nessa última década, a cerca da estrutura moleculardos receptores, bem como dos mecanismos moleculares envolvidos na ação das substâncias químicas capazes de modificar as funções fisiológicas. Relação entre estruturas de receptores e doenças O progresso no entendimento da função do receptor em termos moleculares tem revelado um grande número de doenças ligadas ao mau funcionamento do receptor, como é o caso da myasthenia gravis em que ocorre um ataque auto-imune aos receptores nicotínicos da acetilcolina na junção neuromuscular 29 impedindo a ação desta nas contrações musculares. Outros exemplos podem ser citados, tais como os defeitos nos receptores de hormônio luteinizante que levam à puberdade precoce, além de uma forma rara de hipoparatireoidismo, que parece resultar de uma ligação defeituosa da proteína G a adenilato ciclase, portanto um mecanismo de acoplamento no funcionamento do hormônio das paratireóides. Alvos protéicos para a ação das drogas Os alvos protéicos para a ação das drogas nas células dos mamíferos podem ser classificados em receptores, canais iônicos, enzimas e moléculas transportadoras. Para um maior entendimento, cada alvo será explicado detalhadamente em função de seus mecanismos de ação além de seus efeitos resultantes. Receptores Os receptores funcionam como elementos de percepção do sistema de comunicação química que coordenam a função de todas as diferentes células do corpo. Toda substância química que atua no processo de coordenação ou modificação das atividades celulares, tais como as drogas, hormônios e outras, podem potencialmente utilizar um receptor. Na maioria dos casos, o mediador endógeno foi descoberto antes do receptor ser farmacologicamente caracterizado. Exceção a isso são os benzodiazepínicos e os canabinóides, cujos receptores não apresentam ligantes endógenos bem caracterizados. Os mediadores endógenos atuam nos receptores obtendo um efeito direto, como por exemplo, a abertura do canal iônico que despolariza a membrana celular, produzindo um efeito. Podem atuar também se combinando aos receptores e desencadeando mecanismos de transdução que resultam, em ativação ou inibição de enzimas, regulação da transcrição do DNA ou modulação da função dos canais iônicos. No caso de drogas antagonistas, estas geralmente ligam-se a receptores resultando no bloqueio mecânico de efeitos dos mediadores endógenos. Os receptores são classificados em função de sua estrutura molecular e/ou natureza de associação receptor-efetor. Canais iônicos Nós sabemos que os canais que atuam seletivamente na permeabilidade de certos íons, controlando a condutância iônica através da membrana, são de suma importância para as atividades celulares, principalmente nas células excitáveis como neurônios e células musculares onde o potencial bioeletrogénico da membrana é o carro chefe da atividade fisiológica. Os canais apresentam a permeabilidade bloqueada ou a abertura controlada pela ligação a moduladores. Esses canais iônicos são alvos protéicos para a ação de mediadores endógenos que podem sofrer interferência direta do mediador ou através de intermediários como a proteína G. No primeiro caso, pode ocorrer um bloqueio físico do canal pela molécula da droga, melhor exemplificado pela ação dos anestésicos locais que bloqueiam os canais de sódio dependentes de voltagem, obtendo como resultado final o bloqueio temporário do impulso nervoso. Outro bom exemplo é o do diurético 30 amilorida que atua no bloqueio dos canais de sódio das células tubulares renais impedindo a entrada de sódio nas células. A diidropiridina é uma droga vasodilatadora que influencia o mecanismo de portão ou comporta do canal, já que o processo de abertura do canal, que normalmente ocorre em resposta à despolarização da membrana, pode ser inibido ou facilitado de acordo com a estrutura do fármaco. Os benzodiazepínicos facilitam a abertura dos canais de cloreto pelo GABA, e as sulfaniluréias que são utilizadas para o tratamento da diabete, uma vez que atua nas células do pâncreas (responsáveis pela secreção de insulina quando a concentração plasmática de glicose aumenta) bloqueando os canais de potássio. Este bloqueio leva à despolarização da membrana estimulando a secreção de insulina. Enzimas Muitos fármacos atuam em enzimas, sendo que freqüentemente a droga atua como um análogo do substrato que age como um inibidor competitivo da enzima de forma reversível, como é o caso da neostigmina que atua na enzima acetilcolinesterase, ou de forma irreversível, como é o caso da aspirina que atua na cíclooxigenase, resultando em bloqueio da produção de prostaglandinas. Um outro tipo de interação envolve a droga como um substrato falso, levando à transformação química da droga, com a formação de um produto anormal que subverte a via metabólica normal. Exemplo disso é a metildopa que imita a dopa, precursora da noradrenalina, que quando utilizada, leva á substituição parcial desta pela metilnoradrenalina afetando a função do sistema nervoso simpático, com efeito, final de anti-hipertensivo. Por fim, deve ser mencionado que as drogas podem exigir degradação enzimática para que ocorra a conversão de uma forma inativa, pró-droga, para uma forma ativa. Certos tipos de toxicidade de drogas decorrem da conversão enzimática a um metabólico reativo. Moléculas transportadoras As moléculas transportadoras atuam no transporte de íons e pequenas moléculas orgânicas através de membranas celulares, já que com freqüência, moléculas polares são insuficientemente lipossolúveis para penetrar por si só nas membranas lipídicas. Entre exemplos variados, encontramos as moléculas responsáveis pelo transporte de glicose e aminoácidos, transporte de íons e muitas moléculas orgânicas pelo túbulo renal, e o transporte de outras substâncias hidrofílicas pelas membranas celulares. 31 Proteínas receptoras Isolamento e caracterização dos receptores. Iniciou-se na década de 70, quando os receptores, antes tratados como entidades teóricas, começaram a surgir como uma realidade bioquímica. Ao se disponibilizar um ligante radioativo que se combina fortemente á um receptor, torna-se possível extrair e purificar o material marcado radioativamente (receptor-ligante). Como exemplo do uso de ligantes radioativos para a identificação de receptores citam- se os receptores nicotínicos da acetilcolina. Receptores para neurotransmissores rápidos Os receptores nicotínicos da acetilcolina são exemplos clássicos desta modalidade de receptores, pois tem sido estudado com maiores detalhes se comparados a outros tipos de receptores. São constituídos por quatro tipos diferentes de subunidades chamadas alfa, beta, gama e delta com dois sítios que se ligam a acetilcolina. Para que o receptor seja ativado, as subunidades alfa onde estão presentes os sítios de ligação têm que se ligar a acetilcolina. A figura abaixo mostra a estrutura do receptor da Acetilcolina. * O desenho é baseado na microscopia eletrônica e dados de nêutrons das membranas orgânicas elétricas do peixe Torpedo. O receptor e o canal iônico associado consistem em 5 subunidades protéicas (α2, β, γ, δ), e todas elas atravessam a membrana e cercam um poro central. A Ach se liga às subunidades a, e duas moléculas de Ach tem que se ligar para que o canal seja aberto. (De Lindstrom et al. 1983 Cold Spring Harbour on Quantitative Biology 48:89). 32 O Mecanismo de portão ou comporta nos receptores ligados a canais iônicos Este tipo de receptor controla os eventos sinápticos mais rápidos do sistema nervoso, alcançando um pico em uma fração de tempo da ordem de milissegundos, normalmente decaindo dentro de poucos milissegundos. A resposta inicia-se com a ação de neurotransmissores na membrana pós-sináptica de uma célula nervosa ou muscular, mudando transitoriamentea sua permeabilidade aos íons. Neurotransmissores excitatórios, como a acetilcolina na junção neuromuscular ou o glutamato no SNC, causam aumento na permeabilidade ao sódio e ao potássio, resultando na despolarização celular com posterior geração do potencial de ação. Como os eventos sinápticos ocorrem em milissegundos, implica- se que a ligação entre os receptores e o canal iônico é direta. Receptores ligados à proteína G Neste grupo inclui-se uma série de receptores que são cada vez mais familiares aos farmacologistas, dentre estes os muscarinicos da acetilcolina, adrenorreceptores, receptores da dopamina, receptores da serotonina (5-HT), de opióides, receptores para muitos peptídeos, de purinas, quimiorreceptores envolvidos na olfação e etc. Existe ainda uma subdivisão destes receptores uma vez que a maioria destes possuem subtipos de receptores, como é o caso dos receptores muscarínicos, subdivididos em M1 M2, M3. Sistema adenilato-ciclase O papel do AMPc como segundo mensageiro foi revelado no fim da década de 50, eliminando definitivamente a barreira que existia entre a farmacologia e a bioquímica. Esta molécula consiste de um nucleotídeo sintetizado continuamente dentro da célula a partir do ATP pela ação da adenilatociclase e inativado por hidrólise em 5’-AMP, através de uma família de enzimas conhecidas como fosfodiesterases Os efeitos regulatórios do AMPc na função celular são muito variados, porém estes são todos originados através de um mecanismo comum representado pela ativação de várias proteínas-quinases (proteínas capazes de fosforilar outras moléculas). Exemplos de efeitos regulatórios que envolvem a participação do AMPc: • Enzimas envolvidas no metabolismo energético (metabolismo de carboidratos e lipídeos) • Divisão e diferenciação celular; • Transporte de íons; • Funções de canais de cálcio; • Mudanças na excitabilidade neuronal; • Proteínas contráteis no músculo liso; • Ativação ou inativação de fatores de transcrição que modulam a transcrição gênica 33 As proteínas quinase catalisam a fosforilação dos resíduos de serina e treonina em proteínas celulares diferentes através da utilização de ATP. Exemplos são a fosforilação de canais de cálcio no músculo cardíaco, aumentando a quantidade de cálcio incorporado na célula durante o potencial de ação, aumentando a força de contração do miocárdio. No músculo liso a proteína quinase fosforila a miosina- quinase de cadeia leve, resultando em inativação. A miosina-quinase é necessária para a contração muscular e a sua inativação leva a relaxamento da musculatura lisa. O sistema da fosfolipase C fosfatidilinositol Este sistema envolve vários segundos mensageiros relacionados á inúmeras alterações celulares determinadas pela ativação de diferentes receptores. Agonistas muscarínicos, agonistas α-adrenérgicos que agem no músculo liso e glândulas salivares, e vasopressina quando age nas células hepáticas, produzem um aumento do cálcio intracelular livre, com aumento paralelo da taxa de degradação do fosfatidilinositol (PI) componente dos fosfolipídios de membrana. Verificou-se então que um determinado membro à família do PI, o fosfatidilinositol 4,5-bisfosfato (PIP2) realiza a função de substrato para uma enzima ligada à membrana chamada de fosfolipase C (PLC), que o divide em diacilglicerol (DAG) e inositol-1 4,5-trifosfato (IP3), que funcionam como segundo mensageiro. O DAG é fosforilado para formar ácido fosfatídico enquanto o inositol fosfato é desfosforilado e então religado com o ácido fosfatídico para formar o fosfatidilinositol mais uma vez. A ativação da fosfolipase A2, mediada por receptor levando à produção de metabólitos como o ácido araquidônico, parece ser basicamente igual à ativação da fosfolipase. Recentemente tem sido demonstrado que o ácido araquidônico e seus metabólitos funcionam como mensageiros intracelulares, controlando a função do canal de potássio em certos neurônios. PI ======> PIP2 ==> PLC =====> DAG+ IP3 Esquema mostrando a produção de segundos mensageiros pela ação da fosfolipase C sobre os fosfolipídios de membrana na via do inositolfosfato, também chamada cascata fosfoinositídica. PI Fosfatidilinositol; PIP2 Fosfatidilinositol-4,5-bisfosfato; PLC = Fosfolipase O; DAG = Diacilglicerol e IP3 = lnositol-1 ,4,5-trifosfato. O lP3 age muito eficazmente para liberar cálcio dos depósitos intracelulares, aparentemente por ligação a um receptor na membrana do retículo endoplasmático, um sistema de vesículas responsáveis pelo seqüestro e armazenamento de cálcio mantendo a concentração celular livre muito baixa. A IP3 ativa o canal de cálcio no retículo endoplasmático liberando um fluxo de cálcio para dentro da célula e elevando a concentração livre de lOa 100 vezes. Portanto, o lnositol-1 4, 5-trifosfato é considerado o principal mensageiro liberador de cálcio, sendo este talvez o caminho mais importante pelo qual os efeitos celulares são produzidos podendo-se citar como exemplos à contração do músculo liso, força de contração do músculo cardíaco aumentada, secreção das 34 glândulas exócrinas e liberação de transmissores dos neurônios, liberação hormonal e citotoxicidade. Existe um envolvimento do fosfatidilinositol em outras vias além da regulação do cálcio já que o DAG, com a participação do cálcio afeta a atividade de uma proteína quinase ligada á membrana, a proteína quinase C, pois se liga a um sítio específico desta molécula ativando-a. Os efeitos fisiológicos atribuídos á ativação da fosfolipase C são muito variados demonstrando a importância da fosforilação e da desfosforilação das proteínas na regulação da função celular, incluindo a liberação de hormônios de muitas glândulas endócrinas, aumentos ou diminuições na liberação do neurotransmissor na excitabilidade neuronal, contração ou relaxamento do músculo liso, respostas inflamatórias, indução tumoral, diminuição da sensibilidade do receptor aos agonistas e estimulação do transporte de íons pelo epitélio. A regulação dos canais iônicos dependentes de proteína G Receptores ligados à proteína G podem controlar a função dos canais iônicos diretamente, sem envolver quaisquer segundos mensageiros, como o AMPc ou os fosfatos de inositol. A proteína G interage diretamente com o canal provavelmente do mesmo modo como interage com as enzimas na membrana responsáveis pela síntese do segundo mensageiro. Exemplos deste tipo de interação incluem os receptores muscarínicos da acetilcolina no músculo cardíaco que aumentam a permeabilidade ao potássio, hiperpolarizando as células e inibindo a atividade elétrica. Este efeito requer proteínas G funcionais que passam adiante o sinal do receptor para o canal. Ainda existem algumas controvérsias quanto ao mecanismo de ação em que não se sabe ao certo se a subunidade a livre controla o canal ou se é o conjunto βy. Receptores ligados à atividade de tirosina-quinase e guanilatociclase Os receptores ligados á tirosina quinase, já citados anteriormente estão envolvidos com a regulação da ação de uma variedade de fatores de crescimento, mediadores de peptídeos que estimulam a mitogênese e também da insulina. O mecanismo pelo qual a atividade da quinase responde à ligação do ligante envolve a dimerização dos pares de receptores, seguida de autofosforilação dos resíduos da tirosina, que servirão como sítios de ligação de alta afinidade para várias proteínas intracelulares que permitem o controle de muitas funções celulares. Entre as diversas funções atribuídas a estes receptores, incluem-se os eventos que controlam o crescimento, diferenciação celular, metabolismo intermediário e a regulação da transcrição de genes. Receptores que regulam a transcrição do DNA 35 Este tipo de receptor é característico para a atuação de hormônios esteróides, tireoideanos, vitamina D e ácido retinóico.Apesar dos efeitos altamente variados de diferentes drogas e hormônios esteróides (efeito no sistema reprodutivo; no sistema renal causando retenção de sal e água e ação de atuação básica através da estimulação da transcrição de genes, levando à síntese de proteínas com conseqüente efeito celular. Por ser altamente lipossolúvel, a molécula de esteróide atravessa a membrana celular rapidamente sem a necessidade da utilização de moléculas transportadoras, ligando-se a receptores no núcleo que parece desdobrar-se (atuação sobre o genoma), encontrando o domínio de ligação no DNA que se compõe de seqüências específicas de cerca de 300 pares de base. Como resultado final desta síntese protéica, tem-se um efeito fisiológico produzido no organismo animal. Em razão de seu mecanismo de ação, com síntese protéica resultando em necessidade de atuação no genoma, estes tipos de receptores são de ação lenta. Capitulo 3 Infecção X Inflamação Infecção (AO 1990: infecção ou infeção) é a colonização de um organismo hospedeiro por uma espécie estranha. Numa infecção, o organismo infectante procura utilizar os recursos do hospedeiro para se multiplicar (com evidentes prejuízos para o hospedeiro). O organismo infectante, ou patogénico, interfere na fisiologia normal do hospedeiro e pode levar a diversas consequências. A resposta do hospedeiro é a inflamação. A inflamação (do Latim inflammatio, atear fogo) ou processo inflamatório é uma reação do organismo a uma infecção ou lesão dos tecidos. Em um processo inflamatório a região atingida fica avermelhada e quente, isto ocorre devido a um aumento do fluxo do sangue e demais líquidos corporais migrados para o local,na área inflamada também ocorre o acúmulo de células provenientes do sistema imunológico (leucócitos, macrófagos e linfócitos),com dor localizada mediada por certas substâncias químicas produzidas pelo organismo. No processo os leucócitos destroem o tecido danificado e enviam sinais aos macrófagos, que ingerem e digerem os antígenos e o tecido morto. Em algumas doenças este processo pode apresentar caráter destrutivo. A inflamação pode também ser considerada como parte do sistema imunitário, o chamado sistema imune inato, assim denominado por sua capacidade para deflagar uma resposta inespecífica contra padrões de agressão previamente e geneticamente definidos pelo organismo agredido. Esta definição se contrapõe à da imunidade adquirida, ou aquela onde o sistema imune identifica agentes agressores específicos segundo seu potencial antigênico. Neste último caso o organismo precisa entrar em contato com o agressor, identificá-lo como estranho e potencialmente nocivo e só então produzir uma resposta. Fisiopatologia 36 Os neutrófilos migram dos vasos sangüíneos para o tecido inflamado via quimiotaxia, e então removem os agentes patológicos através da fagocitose e da degranulação. À agressão tecidual se seguem imediatamente fenômenos vasculares mediados principalmente pela histamina. O resultado é um aumento localizado e imediato da irrigação sangüínea, que se traduz em um halo avermelhado em torno da lesão (hiperemia ou rubor). Em seguida tem início a produção local de mediadores inflamatórios que promovem um aumento da permeabilidade capilar e também quimiotaxia, processo químico pelo qual células polimorfonucleares, neutrófilos e macrófagos são atraídos para o foco da lesão. Estas células, por sua vez, realizam a fagocitose dos elementos que estão na origem da inflamação e produzem mais mediadores químicos, dentre os quais estão as citocinas (como, por exemplo, o fator de necrose tumoral e as interleucinas), quimiocinas, bradicinina, prostaglandinas e leucotrienos. Também as plaquetas e o sistema de coagulação do sangue são ativados visando conter possíveis sangramentos. Fatores de adesão são expressos na superfície das células endoteliais que revestem os vasos sanguíneos internamente. Estes fatores irão mediar a adesão e a diapedese de monócitos circulantes e outras células inflamatórias para o local da lesão. Em resumo, todos estes fatores atuam em conjunto, levando aos eventos celulares e vasculares da inflamação. Resulta em um aumento do calibre de capilares responsáveis pela irrigação sanguínea local, produzindo mais hiperemia e aumento da temperatura local (calor). O edema ou inchaço ocorre a partir do aumento da permeabilidade vascular aos componentes do sangue, o que leva ao extravassamento do líquido intravascular para o espaço intersticial extra-celular. A dor, outro sintoma característico da inflamação, é causada primariamente pela estimulação das terminações nervosas por algumas destas substâncias liberadas durante o processo inflamatório, por hiperalgesia (aumento da sensibilidade dolorosa) promovida pelas prostaglandinas e pela bradicinina, mas também em parte por compressão relacionada ao edema. Doenças auto-imunes A inflamação é um dos principais componentes das doenças auto-imunes. Este grupo de doenças se caracteriza por uma resposta imunológica do organismo contra componentes próprios identificados como estranhos pelo sistema imune. Disto resulta uma agressão inflamatória que assume características clínicas diversas, de acordo com o tecido ou sistema afetado. Dentre as mais conhecidas doenças deste grupo estão o lupus eritematoso sistêmico e a artrite reumatóide em adultos. Em crianças podem ser citadas a artrite reumatóide juvenil e a febre reumática entre as mais importantes e prevalentes. 37 Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica O termo Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica (SRIS ou SIRS em língua inglesa) foi proposto para descrever a reação inflamatória desencadeada pelo organismo frente a qualquer agressão seja ela de natureza infecciosa ou não-infecciosa. Caracteriza-se pela presença de ao menos dois dos seguintes critérios clínicos: 1. Temperatura corporal > 38,5 °C (febre) ou <35 °C (hipotermia) 2. Frequência respiratória > 20 incursões respiratórias/minuto (hiperpnéia ou taquipnéia) ou uma pressão parcial de CO2 no sangue arterial < 32mmHg. 3. Frequência cardíaca > 90 batimentos cardíacos/minuto. 4. Aumento ou redução significativos do número de células brancas (leucócitos) no sangue periférico (>12.000 ou <4.000 células/mm3) É fácil concluir que a ocorrência de SIRS isoladamente não é em si mesma de extrema gravidade, pois surge eventualmente em condições clínicas benignas, como por exemplo em infecções localizadas ou após cirurgias. Entretanto, em unidades de terapia intensiva e entre pacientes cujos sistemas de defesa do organismo encontram-se comprometidos, a SIRS pode tornar-se de fato ameaçadora à vida especialmente quando vem associada a outros fatores de gravidade. Quando associada a comprovação clínica ou laboratorial de infecção, tem-se a definição de sepse ou sepsis. Sepse associada a hipotensão arterial refratária é definida como choque séptico. Quando se verificam sinais de ao menos uma insuficiência orgânica concomitante, tem-se então a sepse severa. Antibióticos Introdução Os antibióticos são produtos de enorme importância não apenas na área de saúde, como também na economia, visto que apenas nos Estados Unidos, cerca de 100.000 toneladas são produzidas anualmente. Embora aproximadamente 8000 substâncias com atividade antimicrobiana sejam conhecidas e, a cada ano, centenas de novas substâncias sejam descobertas, pouquíssimas são efetivamente aproveitadas e utilizadas como agentes antimicrobianos, visto que muitas destas não atendem aos requisitos mínimos para seu emprego terapêutico. Paralelamente, não podemos deixar de mencionar o crescente problema em relação ao surgimento de espécies bacterianas resistentes aos diferentes antibióticos. Este talvez corresponda ao principal desafio dos pesquisadores, visto que a multirresistência vem se tornando diariamente mais disseminada nas populações microbianas,
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