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APOIO MATRICIAL
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Sumário
NOSSA HISTÓRIA .......................................................................................... 2
INTRODUÇÃO ................................................................................................. 3
APOIO MATRICIAL ......................................................................................... 7
ASPECTOS QUE DIFICULTAM O MATRICIAMENTO ................................. 10
A DIMENSÃO PEDAGÓGICA DO APOIO MATRICIAL ................................ 12
ESPAÇO DE RELAÇÕES E DE PRODUÇÃO DE SUBJETIVIDADE ........... 15
CONCEPÇÕES SOBRE O APOIO MATRICIAL ............................................ 18
NÚCLEOS DE APOIO A SAÚDE DA FAMÍLIA ............................................. 20
OBSTÁCULOS .............................................................................................. 23
Obstáculo Estrutural ................................................................................... 23
Obstáculos decorrentes do excesso de demanda e da carência de recursos
.............................................................................................................................. 27
Obstáculo político e de comunicação ......................................................... 28
Obstáculo Subjetivo e Cultural ................................................................... 29
Obstáculo Ético .......................................................................................... 30
Obstáculo Epistemológico .......................................................................... 30
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 32
REFERÊNCIAS ............................................................................................. 33
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NOSSA HISTÓRIA
A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários,
em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-
Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo
serviços educacionais em nível superior.
A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de
conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação
no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua.
Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que
constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de
publicação ou outras normas de comunicação.
A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma
confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.
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INTRODUÇÃO
O Ministério da Saúde conceitua: “O matriciamento ou apoio matricial é um
modo de produzir saúde em que duas ou mais equipes, num processo de construção
compartilhada, criam uma proposta de intervenção pedagógico-terapêutica” (MS,
2011).
Os casos do matriciamento podem ser elencados a partir da prevalência ou da
demanda apontada pelas equipes de Saúde da Família e pelas Unidades de
Referência (UR); que será ajustado, durante os encontros, ao interesse e à
necessidade da equipe do CS. Serão selecionados casos pela equipe do CS, com
quantitativo a ser pactuado entre as equipes de Saúde da Família e UR, para serem
discutidos em ambiente multidisciplinar na Unidade Básica de Saúde ou na UR, em
dias e horários determinados.
Nessa oportunidade, serão discutidos os aspectos clínicos, protocolos, fluxos
e orientações para condução dos casos no contexto da família, ambiente social e de
trabalho, território. Dessa forma, o propósito é que cada caso sirva de elemento de
estudo e orientação para a condução dos demais usuários.
O apoio matricial é uma estratégia de aproximação dos pontos de atenção
envolvidos no cuidado integral ao usuário, visando a corresponsabilização das
equipes e fortalecimento do vínculo do usuário com a Atenção Primária. É necessário
monitoramento, para que o processo não seja desvirtuado para um ambulatório
itinerante de especialidade.
A metodologia do Apoio Matricial começou a ser utilizada nos anos noventa,
no SUS – Campinas, como estratégia para pensar a relação entre equipes de atenção
primária e núcleos de saúde mental, sendo progressivamente adotada em alguns
hospitais, em Centros de Referência DST/AIDS, Centros de Reabilitação e em várias
especialidades ambulatoriais, CAPS e NASF. Entre 1994 e 1997, durante um projeto
sobre a formação e a especialização médica no Brasil, financiado pelo Conselho
Federal de Medicina (CFM) e pela Associação Médica Brasileira (AMB), os conceitos
de núcleo e campo de atuação profissional foram desenvolvidos e, são aqui
retomados, pois são relevantes nesta reflexão.
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Para CAMPOS (2000) núcleo representa a face mais estruturada do
conhecimento e dos papéis que circunscreve as disciplinas e ajuda a construir a
identidade e a especificidade das profissões. É constituído pelo conjunto de
conhecimentos e atribuições (tarefas) específicos e característicos de cada profissão
e colabora para a materialização do compromisso desta, com a produção de valores
de uso. Enquanto campo indica um conjunto eventual de conhecimentos e tarefas do
qual uma profissão ou especialidade deverá se apropriar para obter eficácia e
legitimidade em determinados contextos. Tais características conferem-lhe uma
conceituação situacional e uma configuração mutante. Assim, o campo representa a
possibilidade da identidade cristalizada e construída pelo núcleo poder se abrir ao
mundo da inter e da transdisciplinaridade.
Neste sentido, utilizando os conceitos de campo e núcleo, identifica-se que de
forma genérica o Apoio Matricial compõe-se de diferentes núcleos profissionais e de
saberes, dialogando entre si e trocando conhecimentos para construir um campo
adequado às necessidades de saúde expressas de forma singular e coletiva. Desta
forma, possibilitando a criação, junto às equipes apoiadas, de projetos terapêuticos
singulares e projetos de saúde coletiva, na medida em que cada profissão busca o
apoio em outras áreas para cumprir suas tarefas.
O termo matriz, de origem latina, carrega vários sentidos e significa também o
lugar onde se geram e se criam coisas. Assim, o Apoio Matricial é entendido como
um dispositivo e um método de trabalho referenciado em um conjunto de conceitos
sobre o “como fazer” o trabalho interprofissional, tanto em equipes quanto em redes
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de atenção à saúde de maneira compartilhada. Este dispositivo trabalha com três
diretrizes:
Levar a lógica do apoio e da cogestão às relações interprofissionais no
cuidado compartilhado;
Lidar a partir do referencial da interdisciplinaridade com processos
sociais, sanitários e pedagógicos;
Construir equipes multiprofissionais com corresponsabilização no
cuidado compartilhado.
Procura assim superar a lógica de encaminhamentos que fragmenta o cuidado
e compromete a responsabilização clínica durante o cuidado interdisciplinar. Visa
ordenar a relação entre equipes de referência e especialistas, não mais com base na
relação de autoridade, mas com base em procedimentos de comunicação dialógicos.
A metodologia do Apoio Matricial busca promover e ativar espaços de
comunicação e de deliberação conjunta, para o compartilhamento de saberes e para
a organização de fluxos na rede de atenção à saúde, onde os profissionais de áreas
especializadas oferecem retaguarda e suporte técnico-pedagógico às equipes da
Atenção Primária, aprimorando o compartilhamento do cuidado.Com relação às necessidades de saúde singulares e coletivas, o apoio
matricial implica sempre na construção de projetos terapêuticos e/ou de projetos de
saúde coletiva integrados, no entanto essa articulação entre equipe de referência e
apoiadores pode desenvolver-se em três planos fundamentais:
Atendimentos e intervenções conjuntas entre o especialista matricial e alguns
profissionais da equipe de referência;
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Em situações que exijam atenção específica ao núcleo de saber do apoiador,
este pode programar para si mesmo uma série de atendimentos ou de
intervenções especializadas, mantendo contato com a equipe de referência,
que não pode se descomprometer com o sujeito em cuidado, ao contrário,
procura redefinir um padrão de seguimento complementar e compatível ao
cuidado oferecido pelo apoiador diretamente ao paciente ou à família ou à
comunidade;
É possível ainda que o apoio se restrinja à troca de saberes e orientações entre
equipe e apoiador; diálogo sobre alterações na avaliação das situações
singulares e/ou coletivas e mesmo reorientação de condutas antes adotadas,
permanecendo, contudo, cada situação sob cuidado da equipe de referência
da atenção primária.
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APOIO MATRICIAL
O conceito de Apoio Matricial (AM) e de Equipes de Referência (ER) vem se
desenvolvendo desde o final da década de 1980. Entre os anos de 1990 a 1998, a
reorganização dos arranjos dos processos de trabalho com base na metodologia do
AM e das ER foi implantada em alguns municípios brasileiros, e, com isso, foi possível
constatar alterações do modelo teórico original, bem como avanços importantes que
vêm contribuindo com a delimitação de seu referencial teórico e prático (Bezerra,
2008).
Atualmente, alguns programas do Ministério da Saúde, tais como: o Humaniza-
SUS, Saúde Mental, e Atenção Básica/Saúde da Família, incorporaram a perspectiva
de implementação desses novos arranjos organizacionais (AM e ER), pois suas
diretrizes favorecem a criação de um modelo de atendimento mais singularizado,
potencializando o trabalho interdisciplinar e o sistema de referenciamento. Tais
arranjos surgiram como forma de superar a racionalidade gerencial tradicionalmente
verticalizada, compartimentalizada e produtora de processo de trabalho fragmentado
e alienante para o trabalhador, produzindo novas formas de abordagem para a gestão
da clínica (Brasil, 2009).
Além disso, como descrito anteriormente, a reorganização dos arranjos dos
processos de trabalho em saúde implica mudanças na estrutura gerencial e
assistencial dos serviços de saúde, e depende, em larga medida, da construção
compartilhada de diretrizes clínicas e sanitárias e de critérios eficazes para acionar
apoio. Nesta direção, há que se deslocar a centralidade do processo de trabalho com
foco nos procedimentos para a produção de saúde, estimulando, assim, maior
coeficiente de vínculo entre os atores envolvidos – profissionais, usuários e familiares.
Apesar da delimitação existente dos conceitos teórico-práticos relativos a
esses novos arranjos organizacionais – neste caso específico, o de AM – na prática
e no cotidiano dos serviços analisados, seu entendimento não é muito claro ou é muito
variado entre os profissionais, conforme se evidencia nos relatos que se seguem:
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“O matriciamento não é uma coisa que exista como um modelo que você
diga; “é desse jeito que você tem que fazer matriciamento”. Cada serviço faz de um
jeito, tem uma forma de fazer o Apoio matricial.” (E 01)
“Todo mundo fala e diz que faz matriciamento, acolhimento e clínica
ampliada, mas efetivamente não há um entendimento do que de fato, é a origem
desses conceitos [...]. Esses conceitos são utilizados de forma superficial ou como
cada Unidade entende.” (E 02)
“Acho que até hoje cada um construiu um conceito de matriciamento na
cabeça. Ninguém, nunca chegou e falou assim: “Olha matriciamento é isso” para
quem está chegando na rede é difícil saber o que fazer, ou para quem já está na
rede saber o que mudou ou poder se organizar para a mudança. Então, assim...
para mim nunca ficou claro exatamente o que é o matriciamento.” (E 05)
Tomando por base os relatos dos entrevistados E 01, 02 e 05, observamos que
parte deles necessita processar com maior clareza os referenciais teórico-práticos
relacionados ao AM, para que possa incorporar, no cotidiano de trabalho, esta nova
forma de se organizar e de produzir saúde. Esta falta de clareza anunciada por alguns
dos profissionais entrevistados vem sendo apontada como um obstáculo a ser
superado.
Ao realizar estudo sobre o AM, Dimenstein et al. (2009) também observaram
que os profissionais de Unidades de Saúde da Família no Rio Grande do Norte não
tinham clareza sobre a proposta do AM, ao mesmo tempo em que havia uma grande
demanda cotidiana de saúde mental não acolhida. Neste sentido, “a forma como
estão sendo realizadas as discussões acerca do AM nos distritos é de fundamental
importância. Fazem-se necessário um acompanhamento e uma discussão mais
ampla a respeito do AM”.
Entendemos que as experiências e a formação das equipes de AM estão sendo
gradualmente construídas e, conforme ressalta Dimenstein et al. (2009), sua
expansão e qualificação constituem-se desafios para os gestores de saúde mental.
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Ainda em relação a esse aspecto, não podemos nos esquecer que os relatos
descritos acima expressam ideias de trabalhadores que atuam no município de
Campinas, SP, cujo pioneirismo, no que tange à organização do setor saúde,
especialmente no campo da saúde mental – área em que inicialmente se implantou o
AM – é reconhecidamente relevante. Sendo assim, como explicar as perspectivas
apresentadas nos relatos dos entrevistados E 01, 02 e 05, já que estes se
autodenominam com “falta de clareza”, “superficialidade”?
Podemos inferir que isto se dá, na medida em que cada serviço, equipe e
território tem suas especificidades e sua maneira própria de funcionar e trabalhar e,
neste sentido, o fato de cada serviço ter uma forma de fazer AM seria uma assertiva
em relação à proposta teórica dessa ferramenta de gestão da clínica, como
procuraremos aprofundar no próximo tópico. Salientamos que o AM caracteriza-se
como uma metodologia que engendra conceitos e práticas, cujo processo está em
construção, e, por isso mesmo, desafios de toda ordem devem ser superados e
encarados como caminhos para o aprimoramento de sua efetivação.
Deste modo, como já apontaram Campos e Domitti (2007, p.406), foram
identificados “obstáculos estruturais, éticos, políticos, culturais, epistemológicos e
subjetivos ao desenvolvimento desse tipo de trabalho integrado em saúde”. Ou seja,
entendemos que a incorporação do AM no trabalho cotidiano em saúde não passa
apenas por um melhor entendimento conceitual do tema por parte dos trabalhadores,
mas de aprimoramento vinculado ao oferecimento de estrutura adequada para sua
realização e, fundamentalmente, da conquista de mudança nos modos de se pensar,
praticar e produzir saúde, não apenas no município de Campinas, mas em todos os
municípios que pretendem estar em consonância com os princípios do SUS.
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ASPECTOS QUE DIFICULTAM O MATRICIAMENTO
Falar em Saúde Mental sempre foi motivo de angústia para muitos profissionais
de saúde. Isso se deve, em parte, à história de maus-tratos, isolamento,
incompreensão do louco em nossa sociedade e, principalmente, ao preconceito em
relação à loucura e à dificuldade dos trabalhadores em entrar em contato com o
sofrimento do outro. Além disso, a grande maioria das instituições de ensino superior,
embora apresente o tema Saúde Mental em sua grade curricular, não prepara o
profissional de uma maneira mais efetiva para o cuidado aos pacientes em sofrimento
psíquico ou psiquiátrico, tampouco contribuem para tornar essa área maisatrativa.
Porém, a partir da Reforma Psiquiátrica, com a desinstitucionalização do
sujeito em sofrimento psíquico e a busca de novas práticas em saúde mental, não
manicomiais, percebe-se um maior estímulo do cuidado desses indivíduos no
contexto da atenção básica, já que esta, por meio da Estratégia de Saúde da Família,
tem percebido um aumento na demanda de ações de Saúde Mental. A realidade
dessas equipes demonstra que, cotidianamente, elas se deparam com problemas de
“Saúde Mental”, pois 56% das equipes de saúde da família avaliadas pelo Ministério
da Saúde referem realizar “alguma ação de saúde mental”.
Essa maior proximidade, no entanto, não diminui a sensação de apreensão do
trabalhador que acolherá o usuário portador de transtornos mentais, pois os
profissionais, na sua grande maioria, não se sentem preparados para tanto. Percebe-
se que existe ainda uma carência de capacitação para os aspectos subjetivos do
cuidar em saúde mental, como o manejo de crises, o relacionamento interpessoal e
o instrumental terapêutico, que são apontados como requisitos fundamentais para
atuar em Saúde Mental na Atenção Primária. A falta de recursos de pessoal e de
capacitação acabam por prejudicar o desenvolvimento de uma ação integral pelas
equipes.
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Além disso, os trabalhadores de serviços da atenção básica e de serviços
especializados em Saúde Mental apresentam dificuldade em compreender o que é o
matriciamento. Percebe-se que não há clareza acerca da proposta de apoio matricial,
muito menos há espaços para debates sobre matriciamento, bem como sobre outras
estratégias possíveis para tecer uma rede de atenção capaz de fazer a articulação e
a interligação entre os serviços integrantes da Saúde Mental e os demais no território.
Esses profissionais percebem a necessidade de apoio e instrumentalização sobre o
tema para, dessa forma, fortalecer o apoio matricial, melhorando a integração com a
rede de atenção em saúde.
Há também uma lógica na qual o profissional da atenção básica encaminha o
usuário para serviços especializados, transferindo a responsabilidade do cuidado e
dificultando a construção de ações conjuntas. A Saúde Mental, por sua vez, não
cumpre seu papel de retaguarda assistencial especializada, não se apropriando dos
casos e devolvendo o usuário à equipe de referência sem contato prévio, muitas
vezes, sem preencher sequer o documento de contra referência, deixando evidente
a falta de comunicação entre os níveis e dentro das próprias equipes.
Vale lembrar que, infelizmente, existe uma cultura predominante que toma o
saber profissional nuclear como propriedade privada, fortalecendo a prática de
desresponsabilização do cuidado ao usuário, dificultando cada vez mais as ações em
rede. Fica clara a fragilidade, a fragmentação ou a inexistência de uma rede de
cuidados e a falta de comunicação entre as equipes de saúde, o que inviabiliza,
muitas vezes, o apoio matricial.
Enfim, tais aspectos dificultadores, como falta de capacitação profissional,
incompreensão sobre o tema e inexistência da rede de cuidados, entre outros,
acabam por tornarem-se empecilhos para o desenvolvimento de um trabalho
conjunto, interdisciplinar, com constante troca de saberes, como o preconizado pelo
matriciamento.
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A DIMENSÃO PEDAGÓGICA DO APOIO MATRICIAL
Embora a interdisciplinaridade não seja uma novidade conceitual nas redes de
saúde, sabemos que a multiplicidade de saberes presente em uma equipe de saúde
não garante que o usuário da UBS tenha, naquele serviço, um espaço em que seu
sofrimento seja escutado para além do sintoma, nem que haverá trocas efetivas ou
espaços de formação entre os profissionais.
Ao estabelecer, como um de seus objetivos, o oferecimento de retaguarda
especializada a equipe e profissionais, o AM potencializa os espaços de troca de
experiência e a educação permanente em saúde. Esse compartilhamento de saberes
permite a equipe ampliar seus conhecimentos, sua capacidade de atendimento, além
de propiciar uma aproximação entre a equipe e desta com os usuários, como se pode
observar a partir do relato que se segue:
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“O apoio matricial é um encontro entre um profissional de nível universitário
que sai do CAPS, geralmente uma vez a cada duas semanas e vai para o Centro de
Saúde, onde se faz uma reunião. Assim, se possibilita uma troca de conhecimentos
ou a discussão, às vezes de algum paciente, tanto para encaminhá-lo do CS para o
CAPS ou do CAPS para o CS, ou para uma intervenção de alguém que está na
comunidade e que não está sendo atendido.”
“Na minha percepção o apoio matricial ou o matriciamento é uma função
essencial dentro da equipe de Unidade Básica [...]. Você compartilha o seu
conhecimento com outros profissionais da equipe que tenham outra formação para
potencializar a clínica, para conseguir ter uma outra compreensão sobre o sofrimento
do usuário, sobre aquelas pessoas, aqueles sujeitos, aquele contexto.”
O profissional que atua como apoiador matricial é considerado um especialista
e, por isso mesmo, a partir de suas intervenções, pode contribuir com seus
conhecimentos específicos, somados ao saber da equipe local, para o aumento da
capacidade resolutiva da equipe responsável, além intensificar os espaços de diálogo
e, consequentemente, de aprendizagem.
É importante salientar que não se trata, aqui, de uma defesa valorativa do
saber especializado sobre o saber generalista, nem mesmo se trata de um
entendimento de que o profissional especialista é o ator que fornece conhecimento
para os profissionais da atenção básica, como receptores do saber. Valorizamos, ao
contrário, a dimensão potencial do encontro, da troca entre diferentes atores, que
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ocupam diferentes lugares no emaranhado da rede de saúde, sob diferentes
perspectivas sobre uma dada situação, um dado caso clínico ou uma problemática
específica. O apoio matricial tem a função de compartilhar conhecimento e coconstruir
possibilidades de intervenção, e não de ditar, sozinho, as regras do jogo.
Neste sentido, quando nos referimos ao termo apoio, compreendemos que o
mesmo apresenta duas dimensões: a de suporte assistencial e a técnico-pedagógica.
A dimensão assistencial relaciona-se à ação clínica que se dá diretamente com os
usuários do serviço. Já, a dimensão técnico-pedagógica demanda uma ação de apoio
educativo com e para a equipe, pois é “O momento de maior disponibilidade de uma
equipe para aprender determinado tema, é exatamente quando tem um caso sob sua
responsabilidade e recebe o apoio de um expert no tema de apoio educativo com e
para a equipe”.
Além disso, o AM viabiliza a responsabilização compartilhada dos casos
individuais e coletivos e, ao configurar-se deste modo, abre um espaço de discussão
e diálogo sobre o vivido. Esta abertura possibilita: a reorientação de condutas, a
construção de projetos terapêuticos, a revisão de papéis e funções e,
consequentemente, a constituição de um trabalho com vistas à interdisciplinaridade.
Reafirma-se que o AM, no arranjo organizacional dos serviços, complementa as
equipes de referência, fornecendo subsídios e construindo intervenções terapêuticas
mais adequadas e compatíveis com os sujeitos que as demandam, na medida em
que “este trabalho conjunto e compartilhado produz a corresponsabilização dos casos
e pode se efetivar a partir de discussões conjuntas, tanto do usuário, como da família,
como na forma de supervisão e capacitação” ”(Brasil, 2005, p. 32).
Podemos entender o AM como um momento privilegiado para práticas de
ensino-aprendizagem, seja entre diferentes profissionais, entre diferentes equipes, e
com usuários e familiares, sendo, por isso, um movimento sinérgico à proposta de
Educação Permanente – que se trata de uma proposta:
[...] pedagógica para o processo educativo que colocao cotidiano do trabalho
e da formação em saúde em análise, que se permeabiliza pelas relações
concretas que operam realidades e que possibilita construir espaços
coletivos para a reflexão e avaliação de sentido dos atos produzidos no
cotidiano. (Ceccim, 2005, p.161)
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A possibilidade de se ampliar o olhar e de se estabelecerem trocas de
conhecimento, a partir de situações que emergem no cotidiano da clínica – aspectos
estes, descritos nos relatos E 01 e 07 –, caracterizam a constituição de espaços
clínicos formativos, espaços de aprendizagem, que são, ao mesmo tempo, também
espaços de ensino que permitem: desenvolver as habilidades das equipes envolvidas,
o acesso a outras informações e, portanto, as várias dimensões da problemática
discutida, a construção de novas estratégias de intervenção, fortalecendo a
interdisciplinaridade e a integralidade da atenção.
ESPAÇO DE RELAÇÕES E DE PRODUÇÃO DE
SUBJETIVIDADE
Sabemos que o AM procura construir e ativar espaço para comunicação ativa
e para o compartilhamento de conhecimentos entre profissionais de referência e
apoiadores (Campos, Domitti, 2007). Porém, Pena (2009) acrescenta que, para além
da construção do conhecimento, o AM também lida com a produção do trabalhador,
isto é, com a invenção do lugar do trabalhador na equipe de saúde, com a invenção
de si mesmo.
Se as ações relacionadas ao AM se dão no cotidiano do trabalho da equipe e
no contato desta com outras equipes de trabalho, portanto com si mesmas e com os
outros, é fundamental que possamos analisar de que maneira estes sujeitos que
integram as equipes dão sentido às suas experiências de trabalho e aos processos
de interação e subjetivação. Entendemos que:
A produção de subjetividade se refere aos modos de sentir, pensar e agir
produzidos pelas redes da história formatando modos de sensibilidade e
comportamento coletivos, através de discursos, instituições, leis e
dispositivos sociais diversos ligados por uma rede de saber-poder que
produz sujeitos e objetos de conhecimento. (Guatarri, Rolnik, 1986, p.64)
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É também relevante compreendermos que o trabalho em equipe se caracteriza
a partir de “uma rede de relações entre pessoas, rede de relações de poderes,
saberes, afetos, interesses e desejos, onde é possível identificar processos grupais”
(Fortuna et al., 2005, p.264). O entendimento de todas essas dimensões que abarcam
a subjetividade dos sujeitos (seus conflitos, desejos, suas relações e vínculos com os
demais membros da equipe, bem como o próprio trabalho) em muito pode contribuir
com a construção de uma prática de saúde voltada para a integralidade da atenção.
Portanto, ao falarmos de uma equipe interdisciplinar ou do encontro de
diferentes núcleos de saber a partir da tecnologia do AM,
[...] estamos nos referindo ao encontro de diferenças, tanto objetivas quanto
subjetivas. É a partir desses encontros que o trabalho coletivo se desenvolve.
E também as simpatias, as antipatias, os conflitos, as alianças, as
dificuldades de comunicação, as resistências... É na interseção dessas
perspectivas – a profissional e a interpessoal – que as dificuldades começam
a surgir. Em outras palavras, além da diferença entre o saber do médico, da
enfermeira, do psicólogo, do dentista, do agente comunitário de saúde, do
paciente, estou me referindo àquelas entre a Maria, o José, a Sandra, o Paulo
e todos aqueles que, de algum modo, participam do processo [...]. (Cardoso,
2004, p.48)
Os relatos que se seguem expressam aspectos relacionados ao AM que
merecem análise mais detalhada:
“Em alguns momentos eu percebo que o matriciamento funciona como um
espaço de cura. Ele é para curar as angústias da equipe em relação ao caso que eles
estão atendendo lá e que está difícil.” (E 03)
“Fazer essa coisa que é o matriciamento, com uma formação muito deficiente
- porque não é só uma questão técnica, mas de experiência de trabalho na rede - é
muito difícil.” (E 08)
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“O apoio matricial me parece que é uma coisa, assim, que é mais um sintoma
do que uma proposta. Sintoma do quê? Bom, já que a gente não tem equipe de Saúde
Mental em todas as unidades que possa fundamentar o trabalho da equipe de saúde
daquela unidade [...]. Bom! Então vamos usar os recursos dos profissionais para
capacitar quem está nas unidades básicas e deficitárias desse tipo de atenção, desse
olhar. Eu vejo que é uma coisa que é um quebra-galho.” (E 04)
No caso dos relatos E 03, 04, 08, a ação relacionada ao AM, uma das possíveis
atribuições do profissional no serviço, ou seja, o trabalho de fazer matriciamento ou o
trabalho do apoiador matricial, evidencia angústias, falta de experiência, formação
deficiente. Todos esses podem ser entendidos como dimensões subjetivas
relacionadas ao trabalho. Neste sentido, muito se tem discutido acerca do trabalho
como fonte de valorização pessoal e profissional, mas, também, como fonte de
sofrimento. “Para vencer os obstáculos do trabalho real, o trabalhador necessita
colocar muito de si, de suas emoções, paixões e investimento pessoal e com isso é
justo que seu esforço seja reconhecido”.
Como fonte de sofrimento, o trabalho pode influenciar o comportamento do
profissional no serviço, interferindo na qualidade da atenção prestada, bem como
afetar a sua própria qualidade de vida. Portanto, ao se considerarem as exigências e
demandas advindas da implementação desses novos arranjos organizacionais, há
que se estar atento ao fato de que esta nova forma de atuar pode acarretar
sobrecarga para o profissional, especialmente se a implementação do apoio matricial
acontece dissociada de um planejamento e gestão eficazes do processo de trabalho
na unidade e dos processos subjetivos inerentes ao trabalho em saúde.
Temos, ainda, que reconhecer que esses novos arranjos organizacionais (AM
e equipes de referência) colocam, a todos os profissionais da saúde, o desafio da
construção de práticas mais criativas, articuladas, com potência para flexibilizar os
limites das competências especificas, com foco na integralidade da atenção e do
cuidado, tanto dos profissionais como dos usuários dos serviços de saúde. Ao
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envolver aspectos distintos e complexos, esta construção requer empenho contínuo,
pois não se trata de uma tarefa rápida e isolada e, sim, de um trabalho coletivo
profundo e amplo.
CONCEPÇÕES SOBRE O APOIO MATRICIAL
O matriciamento ou apoio matricial em saúde mental assume variadas formas,
dependendo do contexto em que se desenvolve e das percepções dos profissionais
envolvidos, pois o modo como é concebido influencia diretamente sua implantação e
desenvolvimento. Portanto, essa temática permite uma reflexão sobre os modos
como o matriciamento é idealizado pelos profissionais da ESF e da equipe
especializada.
No que diz respeito à troca de conhecimentos entre os diversos núcleos de
saberes, aponta-se a saída de um processo de trabalho individualizado ou
fragmentado pela especialização para uma ação dialogada e interdisciplinar,
repercutindo, inclusive, nos atendimentos individuais, ampliando a perspectiva clínica
do profissional. Nesse sentido, há um caráter técnico-pedagógico no matriciamento
que se reflete na transformação do cuidado produzido pelos profissionais com os
usuários. Pode-se observar essa afirmação nos discursos a seguir:
[...] quando a gente matricia pela primeira vez na vida, a gente deixa de
executar um trabalho individualmente. Nós nos reunimos e formamos uma roda de
conversas com o terapeuta ocupacional, o psicólogo, o enfermeiro, o médico, e isso
acaba nos gerando uma troca de conhecimentos, eu aprendo com a psicóloga, ela
aprende comigo, e nós aplicamos o que foi aprendido até nos nossos atendimentos
individuais.
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[...] além da visão multi e interdisciplinar, onde realmenteno matriciamento a
gente consegue ver um pouco o que é um trabalho multidisciplinar, onde cada um
com seus diversos saberes, com seus pontos de vista, com um núcleo de ação no
seu contexto profissional está ali para trazer lucro e benefícios para esse usuário.
Essas concepções aproximam se da afirmação de Campos (1999) sobre o AM
como dispositivo potente para alterar a lógica de cuidado individualista. Então, é
possível observar que, nessa ideia, o AM assume, como caráter essencial, a
interdisciplinaridade das ações. Essa característica foi evidente nos discursos dos
profissionais tanto do Caps quanto da equipe de saúde da família, que o percebem
como estratégia que possibilita o diálogo e a troca de saberes entre as várias
categorias.
O matriciamento busca ultrapassar as ações isoladas e verticalizadas dos
profissionais nos serviços de saúde, amparadas pelo modelo biomédico, já
considerado limitado para atender às necessidades dos usuários quando lhes
pretendia garantir um real cuidado conduzido pela concepção de clínica ampliada.
Então, assim, com certeza, depois do matriciamento, eu tô mais sensibilizada,
já dou mais atenção, escuto melhor. Nem tudo precisa estar indo pro Caps, realmente
não. Muitas vezes, o paciente quer apenas ser ouvido, acolhido, e isso dá pra gente
fazer aqui, tanto no atendimento individual quanto nos grupos.
A reorientação das práticas dos profissionais da equipe de saúde da família,
com a contribuição dada pelo matriciamento, no que se refere ao cuidado em saúde
mental, é evidente no discurso do profissional, uma vez que este questiona o excesso
de encaminhamentos para o Caps com origem na percepção de que é possível se
corresponsabilizar e, em alguns casos, tornar-se referência do projeto terapêutico do
usuário. Sobre essa concepção, Campos e Domitti (2007) apontam que o
matriciamento é um arranjo capaz de oferecer outro modo organizacional para os
serviços de saúde que complementa a organização hierarquizada em mecanismos
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de referência e contra referência, protocolos e centros de regulação, pois a
dialogicidade e troca de saberes, bem como o apoio especializado, permitem essa
corresponsabilização pelos casos de saúde mental.
Percebe se, ainda, que a contribuição do matriciamento não está apenas no
tensionamento do modelo médico hegemônico de atenção à saúde, pois há a
sensibilização dos profissionais para ampliar a visão sobre o contexto de vida do
usuário. Esse novo olhar mira processos de cuidado que envolvem acolhimento das
narrativas de vida, leva em conta afetos, de modo que os profissionais da ESF
consigam se comprometer eticamente com o sofrimento psíquico leve, tornando-se
também uma referência de cuidado em saúde mental. Portanto, mais do que uma
dimensão de modelo de processo de trabalho em saúde, a noção do matriciamento
como modo de sensibilizar para o cuidado atinge a dimensão pessoal de cada
profissional.
NÚCLEOS DE APOIO A SAÚDE DA FAMÍLIA
O Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil, nos últimos anos, vem mostrando
significativos avanços desde sua criação pela constituição de 1988. Entre eles está a
ampliação do número de equipes de Saúde da Família que ao longo da década de
1990 se expandiu por todo o país sob indução do Ministério da Saúde, por meio de
incentivos financeiros do Piso de Atenção Básica (PAB) variável, que prevê
pagamentos adicionais por equipe em funcionamento.
A Atenção Primária à Saúde (APS) envolve um conjunto de práticas em saúde,
individuais ou coletivas desempenhadas pelas Equipes de Saúde da Família. A ESF
é caracterizada como a porta de entrada prioritária do sistema local. O Ministério da
Saúde criou os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), mediante a Portaria
GM nº 154, de 24 de janeiro de 2008, com o objetivo de “apoiar à inserção da
Estratégia de Saúde da Família na rede de serviços e ampliar a abrangência, a
resolutividade, a territorialização, a regionalização, bem como a ampliação das ações
da APS no Brasil” (BRASIL, 2009).Outras portarias foram promulgadas
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posteriormente, contudo nos referenciamos à primeira (BRASIL, 2008), pois a mesma
orientou a implantação do NASF em estudo.
O NASF deve atuar a partir de algumas diretrizes e dentro dessa lógica, de
apoiar as ESF ampliando as ações da APS, o NASF é constituído por profissionais
de várias áreas do conhecimento como descrito em sua primeira Portaria:
Art. 3º Determinar que os NASF estejam classificados em duas modalidades,
NASF 1 e NASF 2, ficando vedada a implantação das duas modalidades de
forma concomitante nos Municípios e no Distrito Federal.§ 1º O NASF 1
deverá ser composto por, no mínimo cinco profissionais de nível superior de
ocupações não-coincidentes entre as listadas no § 2º deste artigo.§ 2º Para
efeito de repasse de recursos federais, poderão compor os NASF 1 as
seguintes ocupações do Código Brasileiro de Ocupações -CBO: Médico
Acupunturista; Assistente Social; Profissional da Educação Física;
Farmacêutico; Fisioterapeuta; Fonoaudiólogo; Médico Ginecologista; Médico
Homeopata; Nutricionista; Médico Pediatra; Psicólogo; Médico Psiquiatra; e
Terapeuta Ocupacional.§ 3º O NASF 2 deverá ser composto por no mínimo
três profissionais de nível superior de ocupações não-coincidentes entre as
listadas no § 4º deste artigo.§ 4º Para efeito de repasse de recursos federais,
poderão compor os NASF 2 as seguintes ocupações do Código Brasileiro de
Ocupações -CBO: Assistente Social; Profissional da Educação Física;
Farmacêutico; Fisioterapeuta; Fonoaudiólogo; Nutricionista; Psicólogo; e
Terapeuta Ocupacional. (PORTARIA nº 154, de 24 de janeiro de 2008).
(BRASIL, 2008)
Portanto, a organização dos processos de trabalho do NASF, tendo sempre
como foco o território sob sua responsabilidade, deve ser construída priorizando o
atendimento compartilhado e interdisciplinar, com troca de saberes, capacitação e
responsabilidades mútuas, gerando experiência para todos os profissionais
envolvidos mediante amplas metodologias, tais como estudo e discussão de casos e
situações de saúde, projetos terapêuticos, orientações e atendimento conjunto etc.
Um novo arranjo organizacional para o trabalho em saúde já era proposto
desde 1989, com base nos conceitos de equipes de referência e apoio especializado
matricial. Ele parte da suposição de que uma reorganização do trabalho em saúde,
baseada no vínculo terapêutico entre equipe e usuário, estimularia cotidianamente
um novo padrão de relação entre profissionais e comunidade e assim de
responsabilidade pela coprodução de saúde, ampliaria o compromisso dos
profissionais com a produção de saúde e aprimoraria os processos de comunicação
entre ambos.
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Nesse novo arranjo, os serviços de saúde são organizados por meio da
formação de equipes básicas de referência, uma composição multiprofissional,
seguindo o objetivo de cada unidade de saúde, as características de cada local e a
disponibilidade de recursos. Os usuários de um determinado território são de
responsabilidade de uma equipe de referência. As equipes de referência contam com
o apoio especializado matricial de outros profissionais, sendo que o apoio dessas
especialidades é fornecido para várias equipes de referência tanto no aspecto
assistencial quanto no suporte técnico pedagógico.
A ESF é a equipe de referência dos usuários e o NASF oferece apoio
especializado matricial a essa equipe, “especialistas e profissionais organizariam uma
rede de serviços matriciais de apoio às equipes de referência”. (CAMPOS, 1999) Os
serviços oferecidos incluiriam:
(...) Um cardápio tão amplo quanto o possível, de maneira a enriquecer as
possibilidades de composição dos projetos terapêuticos individuais. Esta
organização amplia as possibilidades e composição interdisciplinar dos
projetos terapêuticos, sem diluir a responsabilidade sobre os casos e sem
criarpercursos intermináveis de encaminhamento. (CAMPOS, 1999)
Os profissionais que oferecem apoio especializado matricial possuem um
núcleo de conhecimento e um perfil diferente daquele dos profissionais da equipe de
referência, mas que pode acrescentar recursos de saber e contribuir com
intervenções que aumentam a resolutividade dos problemas de saúde dos usuários.
“O apoio matricial procura construir e ativar espaço para comunicação ativa e para o
compartilhamento de conhecimento entre profissionais de referência e apoiadores.”
(CAMPOS; DOMITTI, 2007), buscando personalizar os sistemas de referência e
contra referência, estimulando o contato direto entre referência responsável pelo caso
e especialista de apoio. As formas básicas para o estabelecimento desse contato
podem ser através de reuniões onde se discute o caso selecionado pela equipe de
referência e elabora-se um projeto terapêutico, acordando uma linha de intervenção
para os diversos profissionais.
Os autores citados (CAMPOS; DOMITTI, 2007) também recomendam
reservar-se um tempo para diálogos sobre temas clínicos, de saúde coletiva ou de
gestão do sistema. E em algum caso específico quando não é possível aguardar a
reunião regular, como na lógica dos sistemas hierarquizados, o profissional de
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referência deve acionar o apoio matricial por meio de contato pessoal, eletrônico ou
telefônico e não apenas por meio de encaminhamento impresso entregue ao usuário.
O apoio matricial envolve sempre a construção de um projeto terapêutico
integrado, no entanto essa articulação entre equipe de referência e apoiadores pode
desenvolver-se em três planos fundamentais, a saber: atendimentos e intervenções
conjuntas entre os especialistas matriciais e os profissionais de referência;
atendimentos programados para o especialista matricial mantendo contato com a
equipe de referência onde a mesma dê continuidade ao cuidado oferecido pelo
apoiador ou ainda apoio que proporcione a troca de conhecimento e de orientações
entre equipe de referência e apoiado.
O modelo permite também aos profissionais de saúde desenvolver dentro do
seu trabalho atividades de forma menos prescritiva, proporcionando aos profissionais
maior autonomia e espaços para a criatividade, possibilitando o desenvolvimento de
um modelo de atendimento personalizado e singularizado para cada paciente, criação
de vínculo, potencializando o papel terapêutico e o melhor acompanhamento de cada
usuário. Nota-se que nesse arranjo é possível uma ampliação de clínica e o diálogo
entre as distintas profissões e conhecimentos para a busca da integralidade do
cuidado.
OBSTÁCULOS
Obstáculo Estrutural
Há obstáculos na própria maneira como as organizações vêm se estruturando,
que conspiram contra esse modo interdisciplinar e dialógico de operar-se. Esses
obstáculos precisam ser conhecidos, analisados e, quando possível, removidos ou
enfraquecidos para que seja possível trabalhar-se com base em equipe
interdisciplinar e sistemas de co-gestão.
O apoio matricial e a equipe de referência são metodologias de trabalho, modo
para se realizar a gestão da atenção em saúde, mas são, ao mesmo tempo, arranjos
organizacionais que buscam diminuir a fragmentação imposta ao processo de
trabalho decorrente da especialização crescente em quase todas as áreas de
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conhecimento. Para que a interdisciplinaridade ocorra de fato e contribua para
aumentar a eficácia das intervenções, é importante não somente se facilitar a
comunicação entre distintos especialistas e profissionais, como também montar um
sistema que produza um compartilhamento sincrônico e diacrônico de
responsabilidades pelos casos e pela ação prática e sistemática conforme cada
projeto terapêutico específico. O papel de cada instância, de cada profissional, deve
ficar bem claro. Alguém deve se responsabilizar pelo seguimento longitudinal e pela
construção de uma lógica que procure integrar a contribuição dos vários serviços,
departamentos e profissionais. Em geral, esse papel cabe a integrantes da equipe de
referência. Com certeza, não é essa a tradição de funcionamento dos serviços de
saúde.
Em Medicina e na saúde em geral houve uma crescente divisão do trabalho
que dificulta a integração do processo de atenção e cuidado às pessoas, já que as
distintas especialidades médicas e profissões de saúde definiram objetos de
intervenção e campos de conhecimento sem grandes compromissos com a
abordagem integral de processos saúde e doença concretos.
Em decorrência dessa realidade vieram se estruturando organizações de
saúde com elevado grau de departamentalização. Analisando a estrutura de duas
organizações prototípicas da área da saúde – o hospital e o ambulatório – verificamos
que elas, em geral, dividem-se em departamentos ordenados segundo lógica das
profissões e especialidades médicas. Estudiosos da administração têm identificado
várias racionalidades que vêm sendo empregadas para dividir responsabilidades em
organizações contemporâneas. Há organizações com departamentos ordenados
segundo produtos – tipos de bens ou serviços produzidos –, outras de acordo com
etapas do processo de trabalho ou ainda com a função de cada área da empresa,
outras se dividem segundo a clientela a ser atendida, há também aquelas que se
organizam segundo o território onde o trabalho se realiza.
Pois bem, em hospitais, ambulatórios e outros serviços de saúde tem
predominado uma lógica que leva ao extremo a fragmentação do cuidado. Verifica-
se na área da saúde que a construção de unidades de gestão obedece antes de tudo
à lógica corporativa e das profissões. Esse fato é marcante em áreas voltadas para a
assistência ao usuário, que se organizam em departamentos, diretorias ou
coordenações recortadas segundo profissão ou especialidade médica. Em áreas-
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meio, em geral, observa-se uma agregação maior, identificando-se unidades de
gestão recortadas segundo funções: departamento de administração e finanças,
lavanderia, nutrição e dietética, laboratório etc. No entanto, nos departamentos
voltados diretamente para a atenção ao usuário, encontra-se departamento de
enfermagem, de ortopedia, de psiquiatria, infectologia etc. Nesses serviços, há uma
composição multiprofissional de pessoal, com baixo grau de coordenação,
comunicação e integração entre as distintas especialidade e profissões. Até mesmo
o desenho arquitetônico da maioria dos ambulatórios reflete essa lógica de ferro: uma
sucessão de pequenas salas para consultório ou procedimentos que, de tão
desconectados, bem poderiam funcionar em espaços geográficos distintos.
Essa estrutura cria dificuldades gerenciais extremas e constitui-se em um
obstáculo estrutural à adoção do método de trabalho de apoio matricial. Um mesmo
espaço de trabalho, uma enfermaria hospitalar, por exemplo, com responsabilidade
sanitária, objetivos, métodos de trabalho e funções, todos muito bem definidos;
quando a organização obedece a essa lógica de departamentos corporativos, não se
constitui em uma única unidade de gestão.
Ao contrário, essa mesma enfermaria tende a ser comandada por, no mínimo,
meia dúzia de gerentes que não estão obrigados a se compor em colegiados ou a
coordenar e integrar seus planos de trabalho. Em uma mesma enfermaria destinada
à Psiquiatria, por exemplo, pode haver um comandante dos médicos especialistas, o
psiquiatra chefe; há outro chefe de enfermagem; outro comanda os psicólogos, outro
os fisioterapeutas, outro a assistente social; a disciplina, regras para visitas, a limpeza
e suprimento serão comandados por um outro chefe da área administrativa; e caso
haja ainda casos clínicos complicados, o médico internista terá ainda um décimo
diretor diferente.
Esse tipo de estrutura também contribui para diluir a responsabilidade sanitária
sob os casos acompanhados. Há uma dupla fragmentação, do processode trabalho
e da unidade de gestão, que dificulta a identificação clara do responsável clínico, bem
como torna quase impossível a integração comunicativa das abordagens diagnósticas
e terapêuticas. Esse fenômeno está sendo denominado de obstáculo estrutural à
prática de uma clínica ampliada, bem como do trabalho interdisciplinar. Valeria
proceder-se maiores investigações para esclarecer o peso que esse tipo de obstáculo
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teria na tendência a custos crescentes, perda de eficácia e aumento da iatrogenia
verificada em serviços de saúde.
Não é lógico, parece pouco racional, mas assim vem funcionando há décadas
na maioria dos serviços de saúde. Vem funcionando, porque a administração sanitária
tem se utilizado de vários instrumentos para atenuar os efeitos negativos desses
obstáculos estruturais. Entre os recursos gerenciais que se contrapõem a essa
tendência, ressalta-se o papel integrador do corpo de enfermagem, que ainda que
organizado de maneira vertical e paralela às demais profissões – daí advém o
conceito utilizado de "corpo" –, espalha-se por todo o hospital, compensando, com
seu zelo, a extrema fragmentação imposta pela circulação vertiginosa de
especialistas entre usuários. Outros recursos frequentemente adotados para atenuar
esse tipo de fragmentação são normas, sistemas de acreditação e protocolos que
procuram padronizar condutas e definir fluxos por onde deveriam circular os
pacientes.
Essas tendências à descontinuidade e a fragmentação dos projetos
terapêuticos acentuam-se quando a intervenção depende de mais de um serviço
integrante do sistema de saúde. O recurso gerencial utilizado para conectar esses
pedaços são os sistemas de referência e contra referência e os Centros de Regulação
com seus protocolos e regulamentações. Alguns sistemas criam instâncias de
decisão – gestão de caso – distanciadas do atendimento direto ao paciente: são os
famosos reguladores a distância ou gerentes de casos.
Que potência teria a reestruturação das organizações de saúde segundo
equipes interdisciplinares apoiadas por especialistas matriciais? Há evidências
teóricas de que contribuiria bastante para melhor definir os padrões de
responsabilidade sanitária, permitindo com isso o estabelecimento de programas com
coeficiente de vínculo entre profissionais e usuários mais humanos e eficazes, além
de criar espaço onde uma integração interdisciplinar seja possível, ainda que não
automática ou de simples execução.
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Obstáculos decorrentes do excesso de demanda e da carência
de recursos
A implantação do SUS é parcial. Há evidências indicando que o volume de
serviços oferecidos à população brasileira ainda é insuficiente. De qualquer modo,
reconhece-se que esses recursos poderiam ter um uso mais adequado e racional,
caso ocorressem reordenações no modelo de gestão e de atenção. Ressalte-se,
nesse aspecto, o papel que a construção de uma rede básica com ampla cobertura
populacional e capacidade de resolver problemas tem tido na viabilidade de sistemas
nacionais de saúde. Entre outros arranjos, também o apoio matricial poder ser
relevante para racionalizar o acesso e o uso de recursos especializados, alterando-
se ainda a ordenação predominantemente multidisciplinar do sistema para uma outra
mais consentânea com a interdisciplinaridade.
Esse arranjo permite um uso racional de recursos, quando cria oportunidade
para que um único especialista integre organicamente seu trabalho com o de várias
equipes de referência. Por exemplo: um único clínico geral ou um fisioterapeuta
poderia assegurar apoio matricial a várias (quatro, cinco, seis?) equipes
especializadas em trauma e composta por cirurgiões, ortopedistas e enfermeiros,
contribuindo tanto para a avaliação conjunta do estado clínico dos casos quanto para
o controle de infecções pós-cirúrgicas ou de outras intercorrências clínicas. Com esse
tipo de relação, no decorrer do tempo, a equipe de trauma iria incorporando em seu
campo de conhecimento aspectos antes delegados aos clínicos ou fisioterapeutas,
ampliando com isso sua capacidade de resolver problemas de saúde e indicando com
mais sensibilidade e precisão os casos que necessitariam de apoio especializado.
Como o apoio é dinâmico e depende de relações interpessoais, esses
especialistas como que passariam a fazer parte dessa meia dezena de equipes de
trauma, possibilitando, em tese, uma ampliação da visão sobre o processo saúde,
doença, intervenção, sem que haja uma diluição da responsabilidade sobre os casos.
Também nesse aspecto esse obstáculo funciona como um empecilho para o apoio
matricial, no entanto o apoio matricial é, ao mesmo tempo, uma maneira de reduzir a
potência desse obstáculo.
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Obstáculo político e de comunicação
As organizações de saúde têm a tradição de funcionar com concentração de
poder: concentrado nos diretores, nos médicos e nos especialistas. O SUS introduziu
a diretriz do controle social, no entanto a ideia de gestão compartilhada foca
instâncias do sistema de saúde – conferências e conselhos em municípios, estados
e união – e não necessariamente internas aos serviços ou programas. As criações de
espaços coletivos, em que equipes de saúde compartilhem a elaboração de planos
gerenciais e de projetos terapêuticos, depende ainda de uma ampla reformulação da
mentalidade e da legislação do sistema de saúde. As políticas de humanização têm
igualmente tentado ampliar o poder dos usuários no cotidiano dos serviços de saúde.
Ressalta-se, nesse momento, que são tendências ainda não consolidadas e que o
apoio matricial e mesmo o funcionamento de equipes de referência dependem de um
importante grau de compartilhamento do poder entre distintos profissionais
componentes de uma equipe e desses com outros especialistas.
A circulação de informações, os contatos interprofissionais e a preocupação
em captar as várias dimensões do sujeito com problema de saúde têm dimensões
bastante restritas no modelo tradicional de estruturação do poder em organizações
de saúde. Não é fácil acordar-se sobre o que está ou não em discussão, ou seja, até
onde vai o poder de influência, ou mesmo de deliberação conjunta, entre os distintos
especialistas. A equipe de referência e o apoio matricial diminuem o peso da
influência "paterna" na solução de conflitos, ou seja, as autoridades externas – chefes,
leis e regras – são reinterpretadas na horizontalidade dos irmãos reunidos em
uma fratria. Por outro lado, há poucos serviços organizados em sistemas de co-
gestão, com equipes e colegiados com poder de deliberação e com sistemas
interdepartamentais e Inter equipes de construção de pactos de gestão.
Resumindo: o método do apoio matricial depende da existência de espaços
coletivos, ou seja, do estabelecimento de algum grau de co-gestão ou de democracia
institucional.
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Obstáculo Subjetivo e Cultural
O trabalho interdisciplinar depende também de certa predisposição subjetiva
para se lidar com a incerteza, para receber e fazer críticas e para tomada de decisão
de modo compartilhado. É mister reconhecer que não é esse o padrão de
subjetividade dominante em ambientes de concorrência exacerbada, modo
predominante de funcionamento das instituições contemporâneas. Nesses casos, as
pessoas tendem a cristalizar-se em identidades reativas, que as induzem a desconfiar
do outro e a defender-se de modo paranoico da concorrência alheia. Por outro lado,
é comum o profissional construir identidade e segurança, apegando-se à identidade
de seu núcleo de especialidade, o que dificulta a abertura para a interação inevitável
em espaços interdisciplinares.
Nesses ambientes, a descoberta de problemas ou de faltas costuma ser
identificada à falha ou erro e ser utilizada para luta política ou em defesa de interesses
particulares. Não há cultura, entre gestores e entre equipes, sobre métodospara
programar trabalho dialógico e interativo, criando instâncias de mediação, espaços
protegidos e processos de contrato em que se estabeleçam metas e critérios para
avaliação do trabalho.
Os profissionais habituaram-se a valorizar a autonomia profissional, julgando-
a conforme o direito que teriam de deliberar sobre casos de modo isolado e definitivo.
O apoio matricial promove encontro entre distintas perspectivas, obrigando os
profissionais a comporem projetos terapêuticos com outras racionalidades e visões
de mundo. Note-se que, em casos de impasse, e se o impasse se referir ao
terapêutico, não há instâncias superiores para resolver o conflito. O gerente em
saúde, em geral, tem pequena capacidade de interferir sobre conduta específica do
especialista, cabendo aos envolvidos no conflito encontrar uma saída que não
prejudique o usuário nem paralise o projeto terapêutico.
O conceito de projeto terapêutico tem se mostrado útil para mediar esse tipo
de relação. Trata-se de uma discussão prospectiva de caso, em que, depois de uma
avaliação de risco e de vulnerabilidade compartilhada, são acordados procedimentos
a cargo de diversos membros da equipe. Ainda que seja possível uma descrição
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singela desse tipo de trabalho em grupo, não é simples, no cotidiano, estabelecer-se
esse tipo de diálogo, com decisões e tarefas definidas de modo compartilhado.
Obstáculo Ético
Se o método de trabalho com base em equipe de referência e apoio matricial
busca definir de maneira precisa a responsabilidade sanitária, ao mesmo tempo,
complica-se o tema da privacidade e do segredo sobre a história do paciente, da
família ou de grupos comunitários. A utilização de prontuário único pela equipe
interdisciplinar, a discussão de casos em equipe, toda essa circulação de informação,
obriga a todas as profissões de saúde a repensarem o tema das relações entre eles
e deles com os usuários.
Que aspectos de uma história colhida em um atendimento individual, um
médico ou uma psicóloga ou um enfermeiro podem registrar no prontuário ou
comunicar aos demais membros da equipe ou do apoio? Observação que um agente
de saúde recolhe durante uma visita familiar, como e em que grau a divulgar a outros
colegas de equipe? Cada profissional teria um registro particular e outro
compartilhado com a equipe? Como lidar com o coletivo e com a circulação de
informação, sem comprometer o direito à privacidade de cada caso ou de cada
família?
Obstáculo Epistemológico
A maioria das especialidades e profissões de saúde trabalha com um
referencial sobre o processo saúde e doença restritas. Predominam os filiados à
racionalidade biomédica, o que os leva a pensar e a agir segundo essa perspectiva
restrita 32. Outros tendentes a valorizar o social na explicação desse fenômeno
também geram soluções restritas a essa linha de intervenção. O mesmo se pode
observar entre aqueles adeptos de explicação subjetiva (desejo ou cognição) que
31
pensam linhas de trabalho restritas a esses planos. O enfoque de clínica ampliada,
ou clínica do sujeito, sugere maneiras para integrar essas perspectivas em um
método de trabalho que reconheça a complexidade e variabilidade dos fatores e dos
recursos envolvidos em cada caso específico, seja ele um problema individual ou
coletivo. Pois bem, novamente o apoio matricial é um dispositivo importante para
ampliação da clínica; ao mesmo tempo, para se trabalhar em uma perspectiva
interdisciplinar, pressupõe-se algum grau de adesão a um paradigma que pense o
processo saúde, doença e intervenção de modo mais complexo e dinâmico.
32
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Depreende-se dos aspectos descritos que o AM implica mudanças na estrutura
gerencial e assistencial dos serviços, e isto se dá na medida em que, ao ser entendido
como um novo arranjo organizacional do processo de trabalho, tem, por objetivo,
reverter a fragmentação das práticas e saberes em saúde, buscando dirigir o foco da
atenção para um modelo de atendimento mais singularizado e interdisciplinar. Neste
contexto, o AM busca inverter a lógica da estrutura tradicional da clínica, da gestão e
da formação em saúde, configurando-se a partir de uma remodelação precisa quanto
aos seus aspectos conceituais e práticos.
Além disso, o AM mostra-se como espaço que possibilita a ampliação e o
estabelecimento de trocas e de conhecimento, caracterizando situações cotidianas
de ensino e aprendizagem, permitindo o desenvolvimento de habilidades dos
profissionais envolvidos, bem como o acesso a outras informações, a construção de
novas estratégias de intervenção, a corresponsabilização e fortalecimento do trabalho
interdisciplinar.
O trabalho do apoiador matricial implica dimensões subjetivas dos sujeitos,
seus conflitos, suas relações e vínculos com os demais membros da equipe e com o
próprio trabalho. Todos esses aspectos, que surgem das exigências e demandas
advindas da implementação desses novos arranjos organizacionais, podem funcionar
como fonte de valorização pessoal e profissional, mas, também, como fonte de
sofrimento e angústia, conforme se constatou em alguns relatos descritos; portanto,
há que se estar atento para que estas ferramentas de gestão de processos de
trabalho não acarretem sobrecarga para o profissional, o que, consequentemente,
pode influenciar na qualidade de atenção oferecida nos serviços.
Para isso, faz-se necessária uma mudança nos antigos modos de produzir
saúde e gestão, e não somente implementar o AM de forma descolada de mudanças
mais amplas no próprio processo de trabalho em saúde.
33
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