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Educação Física Educação Física pONTA gROSSA / pR 2012 ENSINO A DISTÂNCIA Eliane Mauerberg-deCastro Carolina Paioli Tavares LICENCIATuRA Em FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA Núcleo de Tecnologia e Educação Aberta e a Distância - NUTEAD Av. Gal. Carlos Cavalcanti, 4748 - CEP 84030-900 - Ponta Grossa - PR Tel.: (42) 3220 3163 www.nutead.uepg.br 2009 Todos os direitos reservados ao NUTEAD - Núcleo de Tecnologia e Educação Aberta e a Distância - Universidade Estadual de Ponta Grossa, Ponta Grossa, Paraná, Brasil. NUTEAD - UEPG Coordenação Geral Leide Mara Schmidt Coordenação Pedagógica Cleide Aparecida Faria Rodrigues Conselho Consultivo Pró-Reitor de Graduação - Graciette Tozetto Goes Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação - Benjamin de Melo Carvalho Pró-Reitor Extensão e Assuntos Culturais - Miguel Sanches Neto Colaboradores Financeiros Ariângelo Hauer Dias Luiz Antonio Martins Wosiack Colaboradores de Planejamento Carlos Roberto Ferreira Silviane Buss Tupich Colaboradores em Informática Carlos Alberto Volpi Carmen Silvia Simão Carneiro Colaboradores em EAD Dênia Falcão de Bittencourt Jucimara Roesler Colaboradores de Publicação Álvaro Franco da Fonseca - Ilustrador Anselmo Rodrigues de Andrade Júnior - Designer Gráfico/Ilustrador Ceslau Tomczyk Neto – Ilustrador Dyego Marçal – Diagramador Márcia Zan Vieira – Revisora Rosecler Pistum Pasqualini - Revisora Vera Marilha Florenzano – Revisora Colaboradores Operacionais Edson Luis Marchinski Maria Clareth Siqueira CRÉDITOS Universidade Estadual de Ponta Grossa João Carlos Gomes Reitor Carlos Luciano Sant’ana Vargas Vice-Reitor Ficha catalográfica elaborada pelo Setor de Processos Técnicos BICEN/UEPG. ApRESENTAÇÃO INSTITuCIONAL A Universidade Estadual de Ponta Grossa é uma instituição de ensino superior estadual, democrática, pública e gratuita, que tem por missão responder aos desafios contemporâneos, articulando o global com o local, a qualidade científica e tecnológica com a qualidade social e cumprindo, assim, o seu compromisso com a produção e difusão do conhecimento, com a educação dos cidadãos e com o progresso da coletividade. No contexto do ensino superior brasileiro, a UEPG se destaca tanto nas atividades de ensino, como na pesquisa e na extensão Seus cursos de graduação presenciais primam pela qualidade, como comprovam os resultados do ENADE, exame nacional que avalia o desempenho dos acadêmicos e a situa entre as melhores instituições do país. A trajetória de sucesso, iniciada há mais de 40 anos, permitiu que a UEPG se aventurasse também na educação a distância, modalidade implantada na instituição no ano de 2000 e que, crescendo rapidamente, vem conquistando uma posição de destaque no cenário nacional. Atualmente, a UEPG é parceira do MEC/CAPES/FNED na execução do programas Pró-Licenciatura e do Sistema Universidade Aberta do Brasil e atua em 38 polos de apoio presencial, ofertando, diversos cursos de graduação, extensão e pós-graduação a distância nos estados do Paraná, Santa Cantarina e São Paulo. Desse modo, a UEPG se coloca numa posição de vanguarda, assumindo uma proposta educacional democratizante e qualitativamente diferenciada e se afirmando definitivamente no domínio e disseminação das tecnologias da informação e da comunicação. Os nossos cursos e programas a distância apresentam a mesma carga horária e o mesmo currículo dos cursos presenciais, mas se utilizam de metodologias, mídias e materiais próprios da EaD que, além de serem mais flexíveis e facilitarem o aprendizado, permitem constante interação entre alunos, tutores, professores e coordenação. Esperamos que você aproveite todos os recursos que oferecemos para promover a sua aprendizagem e que tenha muito sucesso no curso que está realizando. A Coordenação SumÁRIO PALAVRAS DAS PROFESSO ■ RAS 7 OBJETIVOS & EMENT ■ A 9 INTRODuzINDO A EDuCAÇÃO fíSICA ADApTADA 11 SEçãO ■ 1- CONCEitOS E DEFiNiçõES qUE O EDUCADOr FíSiCO DEvE SABEr 12 SEçãO ■ 2- AtiviDADE FíSiCA ADAPtADA ENqUANtO árEA DE AtUAçãO PrátiCA 23 SEçãO ■ 3- UMA ESPiADA NA hiStóriA 29 DESENvOLvImENTO mOTOR E DEfICIêNCIA: ADApTAÇÃO E NECESSIDADES DESDE A INfÂNCIA 39 SEç ■ ãO 1- DAS tENrAS iDADES 40 SEçãO ■ 2- DEFiCiêNCiA iNtELECtUAL 46 SEçãO ■ 3- AS PArALiSiAS CErEBrAiS 51 SEçãO ■ 4- DiStúrBiOS DE APrENDizAGEM 57 SEçãO ■ 5- DEFiCiêNCiAS SENSOriAiS 60 SEçãO ■ 6- trANStOrNO GLOBAL DO DESENvOLviMENtO (tGD) 70 A pRÁTICA pROfISSIONAL Em EDuCAÇÃO fíSICA ADApTADA: pRINCípIOS E ApLICAÇõES 75 SE ■ çãO 1- A EDUCAçãO FíSiCA ADAPtADA 76 SEçãO ■ 2- AtiviDADES DESENvOLviMENtiStAS 87 SEçãO ■ 3- O CUrríCULO 100 O ESpORTE COmO fERRAmENTA DE INCLuSÃO EDuCACIONAL 107 S ■ EçãO 1- BrEvE hiStóriCO SOBrE O ESPOrtE ADAPtADO 109 SEçãO ■ 2- ESPOrtE DE COMPEtiçãO vErSUS ESPOrtE DE PArtiCiPAçãO 118 SEçãO ■ 3- O PAPEL DO PrOFESSOr DE EDUCAçãO FíSiCA NO CONtExtO iNCLUSivO 134 PALAVRAS FINAI ■ S 141 REFERÊNCIA ■ S 143 NOTAS SOBRE AS AUTO ■ RAS 149 pALAvRAS DAS pROfESSORAS Prezado acadêmico: É com grande satisfação que apresentamos o livro da disciplina Fundamentos da Educação Física Adaptada. Este material lhe auxiliará a refletir sobre os conceitos teórico-práticos dos conteúdos que atendem as aulas de educação física tendo ou não a presença de deficientes. Ao final desta disciplina, o acadêmico deverá ser capaz de compreender as informações referentes aos conceitos e definições da educação física adaptada. Em um momento onde a inclusão está presente no ambiente escolar, é importante que o professor saiba analisar a estrutura de programas e currículos de educação física adaptada e adaptá-los conforme a idade e nível escolar dos alunos. Para que o professor possa aplicar uma prática eficiente em suas aulas, é necessário que ele consiga distinguir as necessidades específicas dos diferentes tipos de deficiências e saiba reconhecer fundamentos essenciais do desenvolvimento da criança. Além disso, é imprescindível ele saber elaborar um currículo que tenha uma justificativa clara e seja realista em sua operacionalização no contexto inclusivo, tanto no formato prático, elaboração de planos de aulas e sua execução. Outro aspecto importante é que o professor de educação física tem a oportunidade de trabalhar as diferenças existentes entre o esporte de competição e o esporte de participação para deficientes. Muitos estudos valorizam o papel que o professor de educação física tem na inclusão da criança com deficiência na escola, uma vez que a disciplina favorece uma interação plena entre todos os alunos. Dessa forma, desejamos que o conteúdo apresentado nesse livro atenda às suas necessidades acadêmicas e o prepare de forma competente para a sua futura profissão. Caro acadêmico do Curso de Graduação de Licenciatura em Educação Física à distância, tenha bom proveito em seus estudos. Eliane Mauerberg-deCastro Carolina Paioli tavares OBJETIvOS & EmENTA ObjetivOs Compreender as informações referentes aos conceitos e definições de ■ educação física adaptada; Distinguir as competências do educador físico que oferece serviços na ■ escola como educador e em outras áreas, principalmente associadas com a reabilitação, em outros ambientes de atuação profissional; Distinguir as necessidades especiais dos diferentes tipos de deficiência e ■ reconhecer fundamentos essenciais do desenvolvimento aplicáveis tanto aos alunos com ou sem deficiência; Saber elaborar críticas sobre o movimento da inclusão na escola e na ■ sociedade, segundo princípios de direitos fundamentais; Elaborar currículos que atendam desde a sua justificativa até a operaciona- ■ lização no contexto inclusivo, e aplicá-los, em formato prático, elaborando planos de aula e executando-os. Compreender as informações referentes ao histórico do esporte adaptado no ■ Brasil e no mundo; Reconhecer o papel do professor de educação física na inclusão da criança■ com deficiência nas aulas. ementa Fundamentos da Educação Física Adaptada - 68 horas Estudo das diversas categorias de deficiência e suas especificidades. ■ Abordagens de propostas metodológicas de atendimento educacional ao aluno com necessidade especial. Tendências pedagógicas atuais, identifi- cando as possibilidades interdisciplinares da educação física no ensino es- pecial. Emprego de materiais e equipamentos adaptados. Adaptação de atividades físicas e recreativas para alunos com necessidades especiais. Aulas teóricas e práticas com ênfase ao desenvolvimento de atividades integradoras e inclusivas. Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 11 UNIDADE 1 Introduzindo a Educação física Adaptada ELIANE MAUERBERG-dECASTRO CAROLINA PAIOLI TAVARES ObjetivOs De aPRenDiZaGem O acadêmico deverá ser capaz de: Compreender as informações referentes aos conceitos e definições de ■ educação física adaptada; Distinguir as competências do educador físico que oferece serviços na ■ escola como educador e em outras áreas, principalmente associadas com a reabilitação, em outros ambientes de atuação profissional; Reconhecer dados históricos e períodos que marcaram mudanças na ■ atuação do educador físico na área. ROteiRO De estUDOs SEçãO ■ 1: Conceitos e definição que o educador físico deve saber SEçãO ■ 2: Atividade física adaptada enquanto área de atuação SEçãO ■ 3: Uma espiada na história U N ID A D E I U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 12 UNIDADE 1 pARA INíCIO DE CONvERSA Aqui iniciamos nossa trilha em busca de competências básicas na educação física adaptada. você será exposto aos conceitos básicos que reforçam a atuação do educador físico como importante elo na educação, na facilitação ao desenvolvimento e na reabilitação. As áreas de inadaptação são apresentadas em diferentes formatos por influência de diversos autores, assim como a própria estrutura da literatura didática à disposição dos acadêmicos difere segundo as influências clínicas e influências pedagógicas. você vai perceber que a terminologia utilizada em educação física adaptada é mais específica, portanto, procure aprender os principais conceitos e definições da disciplina; Aprenda mais sobre as principais áreas de atuação do profissional e quais tipos de serviço ela pode oferecer. Embora as páginas a seguir contenham conceitos e informações essenciais para a capacitação do educador físico em nível de graduação, nós recomendamos que você não pare por aqui. SEÇÃO 1 CONCEITOS E DEfINIÇõES quE O EDuCADOR fíSICO DEvE SABER “Uma aula carregada de conteúdo” Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 13 UNIDADE 1 toda disciplina demanda do aluno entender os conceitos ou princípios básicos da área da especialidade. Na área de atividade física adaptada ou educação física adaptada não é diferente. Mas vamos começar pelas definições gerais da educação física. Educadores físicos são especialistas sobre o corpo que se movimenta. Esta especialidade cobre todos os assuntos sobre o corpo ou o movimento? Obviamente que não. Antes de qualquer coisa, temos de ter em mente quais os contextos nos quais o educador físico atua. Por exemplo, a tradição do ensino e do treinamento nos esportes começou praticamente junto com a implantação da profissão de educação física. Onde nos encontramos dentro da educação física? As primeiras manifestações organizadas de jogos devemos aos gregos dos séculos 600-700 A. C. Mas vamos dar um pulo na história e ir ao que interessa. De acordo com Gamez (2009), Johann Friedrich Simon, alemão, foi o primeiro professor de educação física da era moderna que se tem notícia no mundo. Ele trabalhou em meados de 1700, com ensino de esportes e treinamento físico na Alemanha. Na Dinamarca, no século 19, foi implantado o primeiro currículo de educação física e, junto às suas atividades, estava o esporte. Mas hoje, sabemos que educação física não inclui apenas o contexto do esporte. Existem diversas temáticas e contextos de interesse do educador físico, mas o ponto comum ainda é o corpo em movimento. temos, de fato, uma ciência da motricidade humana. Mas ao final das contas, educação física significa educar alguém sobre o que o corpo pode fazer; significa facilitar o desenvolvimento motor; significa ensinar novos movimentos; e significa ajudar a reabilitar movimentos e a saúde. Então, educação física caracteriza algo físico (quadro i). U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 14 UNIDADE 1 Quadro I – Áreas de atividade física desenvolvidas na educação física, o que estudam e seus contextos. Área de atividade O que estuda? Contexto Esporte Formaliza o conhecimento sobre as técnicas, táticas, regras e disseminação na sociedade e ao longo da história de esportes e jogos. Jogos e modalidades esportivas individuais ou coletivas, tanto de natureza Olímpica como não Olímpicas. Aptidão física e exercício Estuda o esforço e as adaptações que o corpo sofre enquanto impõe cargas variadas de demandas ao gasto energético durante o exercício. Foca no exercício em si enquanto ferramenta a serviço da saúde. Para propósito de avaliação, dividimos a aptidão física em subáreas como: resistência cardiovascular, muscular, força, flexibilidade, estado nutricional. Dança É uma área que foca nos estilos, técnicas e estratégias criativas envolvidas na dança. Pode incluir o ensino, a coreografia, a expressão artística, o registro ou notações, e até mesmo regras (caso das danças enquanto modalidades esportivas). Certamente a dança evoca o estudo dos aspectos socioculturais. temos o formato da dança acadêmica (ex. Balé, dança moderna, danças folclóricas), da dança não-acadêmica (dança educacional, dança natural, entre outras formas livres de integração do movimento dançado com ou sem música), e as danças organizadas em formato esportivo (dança de salão, ginástica rítmica desportiva). Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 15 UNIDADE 1 Lazer e recreação Aborda a natureza do brincar e se divertir do ser humano. O mundo moderno e as demandas do trabalho levaram à necessidade de compreender melhor a importância do lazer e das atividades recreativas, tanto no tempo livre como integradas ao currículo escolar, a protocolos de reabilitação, e como suporte da qualidade de vida, para garantir o bem-estar. hoje temos inúmeros contextos onde o lazer e a recreação são desenvolvidos. Das áreas de lazer na escola, no clube, na comunidade, na natureza, até os hospitais e ambientes de trabalho. O homem e a mulher moderna precisam relaxar e se divertir. Estas áreas são bem reconhecidas por esses princípios. Mas também servem ao desenvolvimento integral do ser humano em qualquer idade, servem ao ensino, servem ao espírito. Atividades psicomotoras Baseadas na disciplina psicomotricidade que estuda o homem e suas relações com o corpo em termos expressivos, simbólicos/conceituais e funcionais. Suas bases teóricas vieram da psicologia, psicanálise, sociologia, linguística e da biologia. inclui uma diversidade de atividades estruturadas com metas no desenvolvimento emocional, aprendizagem, e a reabilitação neuromotora. inclui exercício, jogos e atividades desenvolvimentistas baseadas na imaginação, no entendimento da realidade, na funcionalidade neuropsicológica, na oportunidade social. Atividades motoras alternativas Baseadas numa ampla variedade de abordagens holísticas que resgatam o papel do corpo como um todo; são abordagens centradas na emoção, na diversão, na disciplina, no autoconhecimento, na espiritualidade. São atividades focadas na saúde e no bem-estar. Mauerberg-deCastro (2011) separa as atividades motorasalternativas pelo tipo de contato: contato direto e consciente com o corpo (ex. massagens e os exercícios como ioga, tai Chi Chuan, dança); contato mental (meditação, preces, reiki); contato perceptivo (i.e., música, aromas, cores) e suas mensagens (i.e., cômicas, canto); hábitos de lazer (i.e., passatempos); e o contato mediado por seres de outras espécies (i.e., cachorros, cavalos). U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 16 UNIDADE 1 Atividades de reabilitação motora e física Estuda aspectos do movimento e do corpo alterados por condições de deficiências, e define estratégias de intervenção com o objetivo de melhorar a funcionalidade e promover adaptações. requer a integração de esforços de profissionais da saúde como o educador físico, fisioterapeuta, e outros. Aqui entra o profissional da atividade física. Essas atividades podem ser oferecidas individualmente ou em grupo. independente disso, os profissionais devem levar em consideração as diferenças individuais e preparar programas para grupos heterogêneos. Esse contexto envolve atividades desenvolvimentistas, jogos e esportes, atividades aquáticas, dança, recreação e lazer, atividades alternativas, ou programas de exercício com o objetivo de melhora da aptidão. A peculiaridade dessas atividades é acompanhar seus efeitos sobre o processo de reabilitação ou recuperação de alguma função orgânica comprometida. Definindo o termo “atividade física adaptada” Atividade física adaptada é o termo moderno que resume o que os educadores físicos vêm fazendo desde meados do século passado. Num contexto influenciado pelo modelo médico, educadores físicos ofereceram exercícios, atividades físicas e esportes para uma variedade de participantes com deficiência ou outra condição de inadaptação com o objetivo de remediar problemas. Muito tempo depois, por volta dos anos 70, um modelo educacional começou a ser advogado, inicialmente na escola e posteriormente lado a lado com líderes dos movimentos das pessoas com deficiência. A atividade física adaptada expandiu seu próprio significado focando menos nas dificuldades, no que faltava ao indivíduo, e focando mais no potencial do corpo e a funcionalidade do movimento. hoje, os profissionais envolvidos nessa área oferecem serviços que promovem saúde, estilo de vida ativo, inclusão e reabilitam funções. Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 17 UNIDADE 1 O modelo médico influenciou e influencia até hoje todas as profissões associadas com assistência, intervenção e saúde em geral (MAUERBERG- deCASTRO, 2011). Hardman, Drew e Egan (1999) afirmam que o modelo médico tem a dimensão da normalidade e a dimensão da patologia. Normalidade é a ausência de doença, enquanto patologia é definida como alterações resultantes de doenças e de danos à integridade do organismo. No modelo médico: sintomas, características de anormalidade, defeitos, entre outros são critérios usados para facilitar diagnósticos, prescrições e correções das condições atípicas. como você aplicaria o modelo médico ao descrever uma criança com síndrome de Down? _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ “Dando um chute no conceito de “defeito.” “ (Foto: E. Mauerberg-deCastro) U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 18 UNIDADE 1 Então, modelo médico é o que define a atuação de nossos médicos? Mais ou menos. Objetivamente, o modelo médico resulta do delineamento do problema a partir de fronteiras anatômicas, etiologia, funções fisiológicas, numa visão linear e de categorização. Na realidade, o modelo médico é uma simplificação técnica sobre a falta de saúde. As concepções de doença e de desordens geralmente são entendidas num contexto psicobiológico. Portanto, é uma abordagem neutra. Pelo menos deveria ser. Mas a sociedade e suas instituições (até mesmo as médicas) são vulneráveis a influências socioculturais. Por isso, muitos diagnósticos clínicos são emparelhados com estigmas. quando uma criança é diagnosticada com distúrbio de aprendizagem, o mérito da identificação do problema de aprendizagem é providenciar alternativas metodológicas no ensino para esta criança. Mas, na realidade, não é só o diagnóstico que a família e a criança recebem. Junto irá o estigma da diferença. E, lamentavelmente, este associará uma história nova na vida da criança, tanto com a família, como a escola e seus membros, especialmente os pares. Assim, outra maneira de encarar as condições de doença e inadaptação é observarmos o contexto social e a história pessoal do indivíduo sob intervenção. Por exemplo, as atitudes e os esforços contínuos de adaptação permitem a construção e preservação da identidade e, ao mesmo tempo, permitem resistir às tensões do vínculo social. Na educação, rótulos como “especial,” “excepcional”, “deficiência” e “incapacidade” delineiam a identidade de indivíduos que recebem instrução especializada (hArDMAN, DrEW & EGAN, 1999). Mas como no campo da saúde, da educação, e outros (trabalho, comunidade, família), o rótulo impregna estigma social negativo e resulta nos atos preconceituosos e de discriminação. Muitos de nós temos dificuldades em corrigir nossas percepções sobre o desconhecido e, da mesma forma, aquelas pessoas que expressam preconceito discriminando alguém ou algum grupo, geralmente emparelham a noção de desvio e assuntos de moralidade. Por exemplo, não é incomum, segundo Mauerberg-deCastro (2011), que as pessoas emparelhem doença mental com criminalidade, alcoolismo com vadiagem, homossexualismo com pedofilia, pobreza com marginalidade, e a lista pode ir longe. De qualquer maneira, a sociedade tem seus mecanismos de opressão e repressão contra minorias Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 19 UNIDADE 1 – entenda-se minoria no sentido de ser destituída de poder, liberdade, reconhecimento de direitos, acesso a oportunidades, e assim por diante: raça (p. ex., negros, índios, judeus, etc.), sexo (mulheres), orientação sexual (gays, lésbicas, transexuais), idade (idosos), poder econômico (pobreza), religião, nacionalidade, beleza (estética), magreza, habilidade (presença de uma deficiência), saúde (AiDS), etc. Quando criança, na sua escola, quais os rótulos negativos que costumava ouvir? Quem eram as pessoas que recebiam esses rótulos? _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ hoje, o estereótipo sobre “aquele que precisa de ajuda” (LEStEr, 1996) deu lugar ao conceito “Nada sobre a gente sem a gente,” ou “Nothing About us Without us.” O conceito originou no início dos anos de 1990, dentro do movimento político entre ativistas com deficiência. James Charlton, escritor do livro “Nothing About Us Without Us”, relata ter ouvido o termo em uma conferência dos sul-africanos Michael Masutha e William rowland. Em 1998, Charlton usou o termo como título do seu livro sobre direitos dos deficientes (MAUErBErG-deCAStrO, 2011). Área de conhecimento Área de conhecimento significa aquilo que oferece o embasamento teórico na disciplina. No Brasil, os anos de 1980 marcaram mudanças no currículo da educação física no aspecto do seu conteúdo científico e suas teorias. Disciplinas como a psicologia, biologia, sociologia e outras emprestaram conceitos para a formação dos educadores físicos. Foi o período da multidisciplinaridade da educação física. Foram nos anos de 1990, entretanto, que a educação física ganhou expressão enquanto U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 20 UNIDADE 1 disciplina acadêmica nasnovas estruturas curriculares nas universidades brasileiras. Novas áreas de estudo surgiram como a aprendizagem e o desenvolvimento motor, a biomecânica e o controle motor, a fisiologia do exercício, a psicologia do esporte, entre tantas outras que hoje definem o currículo de formação do professor de educação física. A educação física adaptada, ou atividade física adaptada, é uma entre as novas áreas de especialidade. De acordo com Mauerberg-deCastro (2011), “conceitualmente, o objetivo da atividade física adaptada é integrar e aplicar fundamentos teórico- práticos das várias disciplinas da motricidade humana e áreas vizinhas da saúde e da educação em diferentes programas educacionais e de reabilitação para indivíduos de todas as faixas etárias que não se ajustam total ou parcialmente às demandas das instituições sociais (família, escola, trabalho e comunidade em geral). Em termos práticos, atividade física adaptada é um programa diversificado de atividades desenvolvimentistas, aquáticas, rítmicas e expressivas, de jogos e de esportes cuja organização baseia-se em interesses e capacidades de indivíduos com deficiências ou com necessidades especiais (p. 31-32).” Com uma fundamentação teórica multi e interdisciplinar, hoje a área de atividade física adaptada dá forma às competências profissionais do futuro educador. Na escola, na comunidade, nas instituições e na prestação de serviços, o educador físico, com esta especialidade, vem atendendo as necessidades educacionais especiais e a reabilitação de grupos com inúmeras condições de deficiência ou problemas de saúde. O quadro abaixo resume alguns desses grupos e as suas necessidades. Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 21 UNIDADE 1 Área de inadaptação e contexto da intervenção Deficiência, desordem ou necessidade especial Grupos com deficiência incluem indivíduos que foram afetados significativamente por agentes etiológicos em seu esperado potencial adaptativo e evolutivo. Danos permanentes, de natureza progressiva ou não, em algum ponto precoce do desenvolvimento resultaram em consequências físicas, motoras, intelectuais ou emocionais ou na combinação destas. Deficiência intelectual, desordens sensoriais e psicomotoras, distúrbios de aprendizagem, distúrbios emocionais ou comportamentais; deficiências neuromotoras (paralisia cerebral, esclerose múltipla, distrofias e atrofias, entre outras); acidentes cromossômicos (síndrome de Down); surdez, deficiência visual, autismo; amputações e malformações congênitas (espinha bífida, artrogripose, etc.); lesões medulares (tetraplegia, paraplegia). Grupos com necessidades especiais podem incluir os primeiros, mas geralmente assim são definidos em função de como o contexto ambiental em que se encontram deve ser manipulado ou adaptado. Por exemplo, na escola, crianças de risco ou com deficiências permanentes são enquadradas como grupos com necessidades educacionais especiais. Distúrbios de aprendizagem, transtorno globais do comportamento, desnutrição, vítimas de fatores tóxicos (álcool, radiações, contaminação), problemas de ajuste social (delinquência juvenil, criminosos adultos, dependência de drogas, alcoolismo). Quadro II - Área de inadaptação e contexto da intervenção e correspondente classe de deficiência, desordem ou necessidade especial. U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 22 UNIDADE 1 Necessidades especiais podem incluir pessoas com condições de saúde que requerem serviços específicos de atendimento numa área particular da saúde, como na presença de problemas emocionais ou problemas de saúde (congênito ou adquirido). tais serviços têm metas na reabilitação ou têm suporte complementar a protocolos de atendimento em outras áreas da saúde. Distúrbios psiquiátricos no adulto (neurose de angústia, depressão, neurose obsessivo-compulsiva, síndrome do pânico, crises de ansiedade, psicose maníaco- depressiva, esquizofrenia, entre outras formas clínicas); problemas de deterioração da saúde e na terceira idade (doença de Parkinson, coreia de huntington, doença de Alzheimer, outras demências senis); desordens alimentares e de imagem corporal (anorexia, bulimia, vigorexia), obesidade; traumas ou danos transitórios à saúde (por exemplo, câncer, fraturas, episódios convulsivos), doença arterial coronariana, hipertensão, asma, bronquites e enfisemas, diabetes, hemofilia, câncer, AiDS, tuberculose. Necessidades especiais de grupos não afetados por processos inadaptativos. Nesse último caso, embora prescrições específicas de serviços sejam necessárias, tipicamente não há prescrição de serviços da atividade física adaptada, porque esses grupos não evocam necessidades na reabilitação. Se esses, entretanto, tornam-se elegíveis para reabilitação, é por causa de outros fatores que foram associados à sua condição. Mulheres grávidas, idosos e superdotados intelectualmente ou noutra habilidade. Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 23 UNIDADE 1 SEÇÃO 2 ATIvIDADE fíSICA ADApTADA ENquANTO ÁREA DE ATuAÇÃO pRÁTICA No dia a dia da prática do educador físico, encontramos bons e maus alunos, tenham ou não deficiência. Esta caracterização refere- se, frequentemente, ao comportamento e à disciplina. Existem também alunos, atletas, clientes, pacientes que, independentemente do grau de comprometimento, mostram expectativas negativas sobre si, suas condições e, obviamente, em relação ao resultado de uma intervenção. quase sempre essas condições atitudinais — sejam elas de desafios de oposição a autoridades e regras, ou de procrastinação e pessimismo — causam no professor ou prestador de serviços uma sensação de limitação na competência profissional. Por exemplo, muitos colegas desistem de ensinar uma classe quando confrontados por acesso de raiva ou recusa em participar, de um ou dois alunos. Outros desistem porque não conseguem reconhecer resultados de seus esforços com os alunos. Não é incomum que um educador físico perceba-se ineficiente quando um aluno com uma condição de deficiência como distrofia muscular não modifica seus níveis de aptidão física após um período de intervenção. Este professor “Prepare-se para praticar educação física. Atenção... Já!” (Foto: E. Mauerberg-deCastro) U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 24 UNIDADE 1 esquece-se que, para muitos, manter um nível de desempenho já é um progresso, visto que certos grupos são mais vulneráveis a aceleração de declínios. Sabemos que as competências do professor de educação física adaptada incluem dominar uma série de fundamentos e técnicas na área. Porém, entre as suas competências essenciais estão habilidades de promover diversão no aprender, do transformar, do evoluir com o outro. Esta constatação evolui da experiência em encarar desafios. Como os esforços terapêuticos do educador físico são direcionados a grupos, respeitadas as diferenças individuais, um fator limitante pode ser o tamanho desse grupo, assim como a diversidade de suas necessidades. Por exemplo, não existe um currículo escolar para uma e outra condição de deficiência. indivíduos de qualquer idade são encaminhados conforme seu potencial escolar e adaptativo, suas possibilidades econômicas e o centro de seus interesses pessoais. Portanto, os serviços de atividade física adaptada não são organizados por área de deficiência. Então, como são organizados esses serviços? Serviços Ferramentas Atuação - Planejamento - Diagnóstico, prescrição e encaminhamento - Ensino - Aconselhamento - reabilitação - treinamento em esportes ou em outra área (ex. dança; acrobacia) - Avaliação - Atividades desenvolvimentistas ou psicomotoras - Atividades aquáticas - Atividades de dança - Atividades esportivas - Atividadesde lazer e recreação - Ambiente escolar com grupos heterogêneos (uso de tutores) - Ambiente clínico integrado com outros profissionais da saúde (fisioterapeutas, nutricionistas, médicos, etc.); podem ser clínicas privadas ou setores governamentais de atendimento social à saúde, instituições. Quadro III – Serviços, ferramentas e atuação do educador físico. Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 25 UNIDADE 1 - Coordenação de serviços oferecidos entre diferentes profissionais - Militância, administração e organização de programas - Design instrucional, de tecnologia e de planejamento - Consultoria e capacitação de pessoal - Atividades alternativas (massagem, terapia/ atividade com animais, ioga, etc.). - Atividades na natureza - Atividade física individualizada - Ambiente esportivo (escola, clubes, prefeituras, centros de convivência e equipes de treinamento permanente); pode incluir desde o esporte de participação, educacional e de alto rendimento. - Comunidade (parques, serviços de saúde em academias, clubes). - Ambiente natural (parques, florestas, resorts, trilhas). segundo o quadro acima, com quais dos serviços você se identifica mais, e quais seriam suas áreas de atuação? _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ “Pessoal! Hoje estou me identificando com a ideia de deixar ninguém ficar parado.” (Foto: E. Mauerberg-deCastro) U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 26 UNIDADE 1 Você sabia? A organização dos assuntos na área de atividade física adaptada varia bastante e segue predominantemente um modelo médico. Mas a literatura atual já tende a incorporar áreas da Ciência da Motricidade. O quadro abaixo reúne as diversas tendências encontradas em livros didáticos de educação física adaptada ou atividade física adaptada. Quadro IV – Tendências da organização dos livros didáticos quanto ao assunto, fundamentos ou tópicos em educação física adaptada. Assuntos segundo à área de deficiência Fundamentos teóricos e áreas da motricidade humana Tópicos do livro-texto de Claudine Sherrill, Adapted Physical Activity, Recreation, and Sport. Crossdisciplinary and Lifespan Tópicos do livro- texto de Eliane Mauerberg- deCastro, Atividade Física Adaptada - Deficiência intelectual - Desordens sensoriais e psicomotoras - Distúrbios de aprendizagem - Distúrbios emocionais ou comportamentais - Deficiências físicas ou ortopédicas - Doenças degenerativas progressivas do SNC - Desordens neuromusculares e do SN - Problemas de deterioração da saúde e da terceira idade - Desenvolvimento humano - Comportamento motor - Ciências do exercício - Medidas e testes - Avaliação de programas e alunos - Atributos específicos de aprendizagem - teoria e desenvolvimento de currículo - Militância por direitos civis - Ética - história e filosofia - Comunicação e administração Fundamentos - Diferenças individuais com ênfase no esporte - Estilo de vida saudável e ativo para todos os aspectos filosóficos - Celebrando diferenças, planejando experiências práticas e conquistando a inclusão - Equipe, comunicações e criatividade - Adaptação, militância e legislação - Planejamento curricular e guia de avaliação com mudanças nas atitudes - Avaliação, educação física individualizada e planejamento de encaminhamento - Ensino e consultoria Avaliação e pedagogia para metas específicas - Autoconceito, motivação e bem-estar Cross-disciplinaridade, bases históricas, sociais e políticas. - A disciplina atividade física adaptada. - história da atividade física adaptada e es- portes. - Estereótipos e deficiência: mídia e a cultura da perfeição. Contextos biológico, social e cultural do indivíduo com deficiência. - Ao longo do ciclo vital. - Desenvolvimento motor: teorias sobre a criança e os atrasos nas funções adaptativas. - Cegueira, surdo-cegueira, distúrbios de aprendizagem e deficiência intelectual. Características clínicas, comportamentais e educacionais. Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 27 UNIDADE 1 - inclusão, competência social e mudanças de atitudes - Aprendizagem sensório-motora de deficiências severas - Padrões e habilidades motoras - Aprendizagem perceptivo-motora - Aptidão física e estilo de vida saudável - Posturas, aparência e desequilíbrio muscular Avaliação e pedagogia para metas específicas - Esportes de recreação e competição: socialização, instrução e transição - Dança adaptada, dança terapia e relaxamento - Atividades aquáticas adaptadas Diferenças individuais - Lactentes, crianças pequenas - Outras condições de deterioração da saúde - Distúrbios de aprendizagem, desordem de hiperatividade e déficit de atenção e distúrbio do desenvolvimento da coordenação - Deficiência intelectual, Olimpíadas Especiais e iNAS-FiD (The International Federation of Sports for Persons with Intellectual Disability) - Distúrbios emocionais graves e autismo - Esportes em cadeira de rodas e deficiências ortopédicas - Condições les autres e amputações - Paralisia cerebral, acidente cérebro vascular e lesões cerebrais - Condições de surdez e deficiência auditiva - Cegueira e deficiência visual - Envelhecimento e deficiência - Distúrbios comportamentais e psiquiátricos no adulto e na criança. Degenerações e lesões cerebrais. - Linguagem, comunicação e expressão. Perdas sensoriais e distúrbios da percepção - Aspectos clínicos da lesão medular e amputação Métodos pedagógicos e abordagens terapêuti- cas na atividade física adaptada e no esporte - Organizando a atividade física adaptada: programas e metas - Organizando o brinquedo, o jogo e a atividade física: do valor didático ao terapêutico - Dança adaptada - Atividades aquáticas adaptadas - Exercício, saúde e bem-estar - Atividade física adaptada na escola inclusiva - Esporte para deficientes: do alto rendimento ao esporte de participação - Esportes, atividades na natureza e as pessoas com deficiências - Formas alternativas de intervenção - Medidas e avaliação em atividade física adaptada U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 28 UNIDADE 1 No Brasil, a introdução dos conteúdos da atividade física adaptada no currículo da educação física ocorreu em 1987, através da publicação do currículo mínimo de educação física — especificamente a resolução nº 3/87 do Conselho Federal de Educação. Em seu parágrafo iv do artigo vi, a resolução discorre sobre a necessidade da atuação do professor de educação física com o indivíduo com deficiências através da educação física especial (BrASiL, 1987). Em 1994, quando foi criada a Sociedade Brasileira de Atividade Motora Adaptada (Sobama), o consenso sobre o conteúdo mínimo na educação física foi de que deveria abranger quatro áreas de deficiências: mental, física, comportamental e sensorial. Esta tendência de divisão por área de deficiência, popularizada virtualmente em quase todos os programas de atividade física adaptada e livros-textos, reflete uma herança do modelo médico (MAUErBErG-deCAStrO, 2002). “Olha a herança do modelo médico indo “por água abaixo.” ” (Foto: D. F. Campbell) Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 29 UNIDADE 1 SEÇÃO 3 umA ESpIADA NA hISTóRIA Durante os séculos 16 e 17, pessoas com distúrbios psiquiátricos ou qualquer outra condição de deficiência ou doença foram encarceradas em instituições hospitalares, hospícios e mesmo prisões. A exclusão, em nome do encaminhamento para tratamento, foi uma estratégia para esconder qualquer tipo de diferença. O longo processode invisibilidade de muitas condições de deficiência ou atípicas do desenvolvimento levou a sociedade a construir mais estereótipos e reforçar o medo do desconhecido. Foram séculos de privação e violação da liberdade e, em muitos casos, da própria vida. Nas instituições, todo tipo de atendimento ou tratamento foi centrado em controle e restrição dos sintomas ou da expressão da deficiência. tentativas de educar pessoas institucionalizadas foram raras. O modelo psiquiátrico também promoveu o tratamento de crianças com atraso no desenvolvimento (i.e., deficiência intelectual, paralisia cerebral, outras). A institucionalização dessas crianças arrastou-se até o início do século 20 quando, nos Estados Unidos, pais inspirados nos movimentos civis (negros, feminismo) levaram o governo americano aos tribunais e o forçaram a criar leis educacionais. Segundo Mauerberg- deCastro (2011), este foi o marco da instalação da educação especial, muito embora, o modelo de segregação continue até hoje em muitas partes do mundo industrializado. Na área de educação física adaptada, o marco do seu surgimento na América do Norte foi durante uma reunião anual da American Alliance for Health Physical Education, Recreation and Dance (AAhPErD), em 1905, quando a baronesa rose Posse instalou uma divisão de terapia, marcando o início da profissão em atividade física adaptada. O quadro v resume aspectos históricos da área de atividade física adaptada. U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 30 UNIDADE 1 Período O que aconteceu Antes de 1900 visão do exercício como meio de remediar dificuldades; corrigir problemas. Médicos escreveram os livros sobre exercícios corretivos e foram amplamente usados pelos educadores físicos. De 1900 a 1950 É o período de transição da orientação médica para a orientação esportiva. A valorização e introdução do esporte na cultura americana, por causa do retorno de veteranos de guerra, mudaram o ambiente do esporte. Em 1948, no hospital de Stoke Mandeville, na inglaterra, Sir Ludwig Guttman organizou competições esportivas com veteranos da Segunda Guerra Mundial com deficiências físicas. Foi o marco do uso do esporte como ferramenta de reabilitação. Entre 1950 e 1970 Desde a proposta pela AAhPErD sobre os princípios da educação física adaptada em 1952, e da terminologia “educação física adaptada” por hollis Francis Fait em 1956, currículos nas universidades foram direcionados à especialização dos educadores físicos não só para o esporte para deficientes, mas atender a escola em parceria com a educação especial. De 1970 aos dias atuais inicia o uso do termo atividade física adaptada ao invés de educação física adaptada. Nos anos de 1970, inicia a rejeição do sistema de classificação médica adotado nos esportes com cadeiras de rodas (StrOhKENDL, 1996) e o marco da infusão da filosofia das Olimpíadas Especiais (criada em 1968) no cenário internacional como um modelo de programação esportiva contínua ao longo do ano para participantes com deficiência intelectual. Em 1973, foi fundada a Federação internacional de Atividade Física Adaptada, no Canadá, que promove o International Symposium of Adapted Physical Activity (iSAPA). A cada dois anos, o iSAPA acontece nos mais diversos países do mundo. Em 2007, a 16ª edição do iSAPA foi hospedada em rio Claro, SP, Brasil. Quadro V – Período histórico da atividade física adaptada. Psicomotricidade No Brasil, a psicomotricidade foi (e ainda é) uma área de especialidade promovida entre os profissionais da psicologia, pedagogos e educadores físicos interessados em reabilitar funções psicomotoras. Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 31 UNIDADE 1 A literatura psicomotriz tornou-se muito popular na década de 80 com inúmeras traduções de livros de autores franceses para a língua portuguesa (WErEBE & NADEL-BrULFErt, 1986; AJUriAGUErrA, 1983; LAPiErrE & AUCOUtUriEr, 1984, 1985a, 1985b, 1985c, 1986; GUiLLArME, 1983; LEBOULCh, 1986; AiMArD, 1986, AJUriAGUErrA & MArCELLi, 1986; BArBizEt & DUizABO, 1985). Criada em 1950, no hospital de La Salpetriere em Paris, a psicomotricidade tem uma estrutura curricular baseada em abordagens clínicas dos distúrbios de adaptação do corpo, movimento e suas expressões comportamentais afetivas. Em síntese, a psicomotricidade estuda as relações do homem com o corpo. Baseada em conceitos da psicologia, psicanálise, sociologia, linguística e biologia, a terapia psicomotriz é um estímulo à expressão do corpo através do imaginário (BrUNELLE & BEAUChESNE, 1983). Em educação física adaptada, até hoje conceitos psicomotores são populares na prática e na fundamentação teórica. Porém, a educação especial foi a área que mais ajustou as propostas psicomotoras em termos metodológicos. A área terapêutica é representada pelos fisioterapeutas, cinesioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos e outros, que dão ênfase a uma psicomotricidade baseada na neurofisiologia e neuropsicologia (MAUErBErG-deCAStrO, 2011). “Vamos brincar de corpo imaginário, pessoal.” (Foto: D. F. Campbell) U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 32 UNIDADE 1 E a história no Brasil? “É bem provável que a atividade física adaptada e o esporte para pessoas com deficiência estejam de ‘mãos dadas’ com a primeira geração de estudiosos, de profissionais e de militantes da área” (MAUErBErG- deCAStrO, 2011, p. 68). A história da educação física adaptada no Brasil é recente, omissa ou imprecisamente documentada. Uma parte dessas documentações refere- se às poucas informações sobre o esporte e as suas instituições, atletas deficientes que se projetaram em competições internacionais Olímpicas e Paralímpicas. Ainda, referem-se aos projetos governamentais e de ensino superior em torno da capacitação, tanto no nível de graduação, especialização e pós-graduação, iniciados nos anos 80. Finalmente, temos as mudanças na legislação e movimentos militantes de líderes com deficiência que mudaram a cara da escola do século 21. No Brasil, foi inicialmente o movimento da integração (também dos anos 80) seguindo do movimento da inclusão escolar com o advento da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996. O esporte para deficientes foi marcado pela fundação de dois clubes voltados para o esporte praticado por deficientes na década de 50. robson Almeida Sampaio, do rio de Janeiro, e Sérgio Serafim Del Grande, de São Paulo, ambos em 1958, fundaram, quase ao mesmo tempo, os primeiros clubes de esporte do gênero: o Clube do Otimismo no rio de Janeiro e o Clube dos Paraplégicos de São Paulo (CPSP). A partir daí, os marcos históricos resumem-se na criação das várias associações e organizações governamentais que regulamentam e promovem o esporte (quadro vi). No campo da educação e capacitação, os esforços iniciaram nos anos 80 com os cursos de especialização em alguns centros universitários como a Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e Faculdades isoladas Castelo Branco. A Declaração de Salamanca (SALAMANCA - 1994), concluída em Assembleia Geral das Nações Unidas, trata dos princípios, da política e da prática na educação especial. A capacitação profissional do educador físico veio como uma necessidade mobilizada pelas novas leis como a LDB de 1996, e a pressão internacional por uma escola para todos através da Declaração de Salamanca de 1994. O Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 33 UNIDADE 1 documento incluiu orientação para promover a igualdade de oportunidades para deficientes. Ao lado dos documentos da Convenção sobre os Direitos da Criança de 1988 e da Declaração Mundial sobre Educação para todos de 1990, tornou-se um dos mais importantes documentos internacionais sobre inclusãosocial e educação inclusiva. Quadro VI – Marcos históricos do esporte e da educação física adaptada no Brasil. Data Evento 1962 - Criação da Federação Nacional das Apaes (Fenapaes) que organiza o esporte dentro da Federação Nacional das Apaes. http://www.apaebrasil.org.br/ 1969 - Primeira participação internacional brasileira de basquetebol sobre rodas durante a 2ª edição dos Jogos Pan- Americanos, em Buenos Aires (Argentina). 1972 - Primeira participação brasileira em Jogos Paralímpicos na Alemanha. A modalidade foi a bocha, sem conquista de qualquer medalha. 1975 - Criação da Associação Nacional de Desporto para Deficientes que responde pelo esporte brasileiro para deficientes. Atende o esporte praticado pelos paralisados cerebrais e les autres (Ande). http://www.ande.org.br/ 1977 - Criada a Associação Brasileira de Desporto para Cegos (ABDC). http://www.lerparaver.com/node/8430 1981 - Preocupado com a formação, especialmente por causa do Ano internacional das Pessoas Deficientes, o Ministério da Educação e Cultura publica o livro “Atividade Física para Deficiente”, seguido por “Educação Física para o Excepcional” em 1982. 1984 - Surge a Associação Brasileira de Desportos em Cadeira de rodas (Abradecar). http://dawhois.com/site/abradecar.org.br.html 1987 - Fundada a Confederação Brasileira de Desporto para Surdos (CBDS). http://www.cbds.org.br/ - Publicação do Currículo Mínimo de Educação Física, com a resolução no. 3/87 do Conselho Federal de Educação que especifica uma disciplina sobre educação física especial. Foi o marco da formação profissional em atividade física adaptada. U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 34 UNIDADE 1 1989 - Autorizada a Lei Federal nº 7.853 sobre os direitos das pessoas com deficiência, que deu instruções sobre apoios para a integração social. 1990 - Surge a Associação Brasileira de Desporto para Amputados (ABDA) http://www.abddf.org.br/ e a Associação Olimpíadas Especiais – Brasil que anos mais tarde mudou para Federação da Special Olympics Brasil. http://www.specialolympics.org.br/site 1994 - É implantado o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) para administrar o esporte para deficientes e atender ao Comitê Paralímpico internacional. http://www.cpb.org.br/ - Aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), (Lei no. 9.394, de 20 de dezembro de 1996); no artigo 4, inciso iii afirma: “Do Direito à Educação e do Dever de Educar - O dever do Estado com a educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino.” - Fundada em 4 de dezembro de 1994 a Sociedade Brasileira de Atividade Motora Adaptada (Sobama). Fonte: Araújo (1998); IPC (2010); Mauerberg-deCastro (2011). “Vamos achar um time para jogar?” (Foto: E. Mauerberg-deCastro) Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 35 UNIDADE 1 Brasil (2001). Plano Nacional de Educação. Lei no 10.172, de 9 de janeiro de 2001. [acesso em 10/01/2011; https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10172. htm]. Esta unidade abordou conceitos ou princípios básicos da área de educação física adaptada e comparou com a educação física de maneira geral e todas as disciplinas que compõem esta profissão e área de conhecimento. Nós falamos da tradição do esporte, até as áreas curriculares que definem as competências profissionais e do professor de educação física. Nesta unidade, embora com críticas, o modelo médico foi apresentado como a principal influência na especialidade. Do trânsito deste modelo, estabelecemos a crítica e avançamos por temas modernos como saúde, estilo de vida ativo, inclusão e reabilitação através do esporte e atividade física. Falamos das atitudes e formação de estereótipos que, ao longo dos séculos, promoveram as diversas formas de discriminação. Introduzimos generalizações sobre as diversas áreas de inadaptação, serviços, ferramentas e áreas de atuação do educador físico. Por fim, apresentamos alguns dados históricos importantes que delinearam a existência dessa especialidade. 01) Qual o objetivo da atividade física adaptada? Descreva os serviços prestados pelos especialistas nesta área. 02) Quais os tópicos de interesse da educação física adaptada? 03) De que maneiras a discriminação pode ser expressa? U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 36 UNIDADE 1 CEDIPOD (2011). Portal da Cidadania da Pessoa com Deficiência [acesso: 12/01/2011; http://www.cedipod.org.br/]. Grupo Gay da Bahia (2003). O crime anti-homessexual no Brasil [acesso em 11/01/2011; http://www.ggb.org.br/crime.html]. Help guide (2007). Understanding Schizophrenia: A guide to the signs, symptoms, and causes [acesso em 20/01/2011; http://www.helpguide.org/mental/schizophrenia_ symptom.htm]. IBGE (2000). Censo Demográfico 2000 [acesso em 02/01/2011; http://www.cedipod. org.br/Ibge1.htm]. UNESCO (2003) [acesso em 01/01/2011; http://www.unesco.org/pt/brasilia/social- and-human-sciences/poverty-reduction/]. UNESCO (2010). Redução da Pobreza no Brasil. [acesso em 01/01/2011; http:// www.unesco.org/pt/brasilia/social-and-human-sciences/poverty-reduction/]. Wikipedia (2009b). “Nothing About Us Without Us” by James Charlton [acesso em 26/10/2009; http://en.wikipedia.org/wiki/Nothing_About_Us_Without_Us, acesso em 4/1/2011]. World Health Organization-WHO [acesso em 10/01/2011; http://www.who.int/en/] Leitura Complementar Livros-textos importantes publicados no Brasil AJURIAGUERRA, J. Manual de Psiquiatria Infantil. São Paulo: Masson. (É um clássico e merece ser lido e consultado), 1983. MAUERBERG-DECASTRO, E. Atividade Física Adaptada (2ª edição). Ribeirão Preto: Novo Conceito, 2011. SHERRILL, C. Adapted Physical Activity, Recreation and Sport. Crossdisciplinary and Lifespan (6th Edition). Dubuque: McGraw-Hill, 2004. WINNICK, J. P. Educação física e esportes adaptados (3ª Ed.) São Paulo: Manole, 2004. Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 37 UNIDADE 1 Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 39 UNIDADE 2 Desenvolvimento motor e Deficiência: Adaptação e Necessidades Desde a Infância ObjetivOs De aPRenDiZaGem O acadêmico deverá ser capaz de: Selecionar informações relevantes sobre as várias deficiências ■ que o educador físico frequentemente encontra na escola; Distinguir as necessidade especiais dos diferentes tipos de deficiência ■ e reconhecer fundamentos essenciais do desenvolvimento aplicáveis tanto aos alunos com e sem deficiência; Reconhecer o papel do professor de educação física na ■ equipe multidisciplinar. ROteiRO De estUDOs SEçãO ■ 1: Das tenras idades SEçãO ■ 2: Deficiência intelectual SEçãO ■ 3: As paralisias cerebrais SEçãO ■ 4: Distúrbios de aprendizagem SEçãO ■ 5: Deficiências sensoriais SEçãO ■ 6: Transtorno global do desenvolvimento (TGD) U N ID A D E II ELIANE MAUERBERG-dECASTRO CAROLINA PAIOLI TAVARES U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l UNIDADE 2 40 pARA INíCIO DE CONvERSA Nesta unidade, você encontrará uma reunião de informações técnicas e clínicas sobre fatores de inadaptação e tipos principais de deficiência que você possivelmente encontrará na escola. Essas informações partem dos primórdios do desenvolvimento, ou seja, partem da dinâmica de como ser um bebê de desenvolvimento típico ou atípico. Nesta unidade, você será exposto a uma série de informações sobre desenvolvimento, particularmente o motor, num contexto de deficiência. Logicamente, muitas dessas informações já devem ter sido estudadas em disciplinas de desenvolvimento e crescimento. Mas elas são fundamentais aqui. Entenda que as condições de inadaptação, precoces ou tardias na vida, são apenas espectros da diversidade humana e devem, posteriormente,auxiliar na sua prática ao determinar as potencialidades dos alunos e as metas da sua intervenção como educador ou profissional. Procure entender a etiologia das deficiências que são apresentadas neste capítulo, bem como suas principais características. Os atrasos de desenvolvimento são elementos importantes no diagnóstico das deficiências, portanto, leia mais sobre eles. SEÇÃO 1 DAS TENRAS IDADES Para você que está começando a se familiarizar com a disciplina de educação física adaptada, é importante saber que a linha desenvolvimen- tista é o fundamento principal nas competências profissionais. Por quê? Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 41 UNIDADE 2 Bom, quase sempre lidamos com deficiências ou fatores de inadaptação ou distúrbios que afetam o ser humano, muito antes de ele nascer. Mesmo depois do nascimento, e até a fase adulta, encontramos desafios críticos que podem resultar em interrupção, ou mesmo regressão daquelas funções, as quais já adquirimos no curso normal do desenvolvimento. Por exemplo, uma pessoa idosa que sofre um acidente vascular cerebral (AvC, ou conhecido como derrame cerebral) pode parar de andar por um tempo ou permanentemente depois da intercorrência. Antes do AvC, esta pessoa idosa foi perfeitamente capaz de andar por inúmeras décadas. Esse é um exemplo de como uma função filogenética (ex., o andar) pode ser perdida devido a um dano no sistema nervoso central (SNC). também existem os fatores ambientais que podem ser adversos ao desenvolvimento. Por exemplo, sabemos que a desnutrição aguda e prolongada tem significativo impacto no desenvolvimento geral do bebê. Ainda, extensa privação sensorial, situações de abandono, abuso físico, abuso sexual, e isolamento social podem, além do atraso mental, gerar consequências psiquiátricas de variada manifestação. Muitas das deficiências que afetam o desenvolvimento, e que encontramos presentes entre alunos na escola, foram adquiridas precocemente ou congenitamente (antes do nascimento). Por isso, é muito importante, como educadores físicos, sabermos mais sobre “Porque eu cheguei agora. Quer ver para onde vou?” (Foto: C. P. Tavares) U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l UNIDADE 2 42 o desenvolvimento precoce da criança em condições típicas. E as condições atípicas? também. Mas, inicialmente temos a premissa de que o entendimento sobre o desenvolvimento dentro de condições normais, tanto do organismo como de condições favoráveis do meio ambiente, deve ser o requisito básico na formação do aluno de educação física. O motivo é claro: a descrição de funções típicas do ser humano em evolução (ou seja, na tenra infância) permite fazermos inferências sobre o status neurológico de funções que ainda estão por aparecer, ou seja, das diversas funções como a mobilidade, a busca por estimulação pela manipulação, a exploração (“passeios”) do meio ambiente, e mesmo a comunicação social (MAUErBErG-deCAStrO, 2011). Permite ainda, encontrarmos caminhos na reabilitação e na estimulação através do movimento que sejam compatíveis com o potencial de adaptação. Do conhecimento sobre o curso normal do desenvolvimento, compreendemos melhor os desvios e como podemos idealizar adaptações no ambiente para favorecer funções ou habilidades adaptativas (i.e., comunicação, cuidados pessoais, independência doméstica, interação social, participação na comunidade, independência em resolução de problemas, saúde e segurança, funcionamento acadêmico, lazer, e trabalho, como ilustram hArDMAN, DrEW & EGAN, 1999). “Sou um garotão em pleno desenvolvimento.” (Foto: E. Mauerberg-deCastro) Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 43 UNIDADE 2 Nós, da educação física, temos conhecimento sobre uma variedade de movimentos ou habilidades motoras fundamentais. Alguns movimentos são, na verdade, precursores do ato voluntário e ocorrem muito cedo na vida do bebê. Entre esses movimentos precursores temos os reflexos primitivos e as reações posturais (vocês já devem ter lido sobre este assunto em disciplinas sobre crescimento e desenvolvimento). Os reflexos primitivos são integrados, em sua maioria, no final do primeiro semestre da vida do bebê. As reações posturais, por sua vez, acabam, em sua maioria, sendo incorporadas em forma de automatismos contra mudanças súbitas do corpo ou como respostas de equilíbrio nas diferentes posições que o corpo pode assumir. E as habilidades motoras fundamentais tendem a consolidar seu desenvolvimento antes da adolescência. Diferencie fatores etiológicos congênitos dos adquiridos. _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ Você se lembra de algumas habilidades motoras fundamentais e a época que surgem? _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ você sabia que o desenvolvimento motor ou psicomotor é altamente correlacionado com o desenvolvimento cognitivo até os 6 anos aproximadamente? Depois disso, existe uma dissociação. Funções cognitivas continuam evoluindo em complexidade, mesmo que a criança não avance em ampliar seu repertório de habilidades motoras. É lógico U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l UNIDADE 2 44 que habilidades motoras podem aumentar em função de esportes, habilidades profissionais especializadas, mas depende de o indivíduo ter oportunidades para aprendê-las e praticá-las. O quadro i ilustra uma série de habilidades motoras fundamentais desde idades tenras. Global De contato com objetos Sentar-se Levantar-se Deitar-se rolar Engatinhar Andar Correr Subir escadas rastejar Escalar Pendurar-se Saltar para baixo ou para cima Saltar sobre Saltito Alcançar Agarrar receber rebater Arremessar rebater com a mão quicar Chutar Driblar com a mão Driblar com o pé Adaptado de: Mauerberg-deCastro (2011). Quadro 1 - Habilidades motoras fundamentais. “Esta habilidade me deixa de quatro.” (Foto: C. P. Tavares) Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 45 UNIDADE 2 Vamos falar dos problemas que desafiam o desenvolvimento A época que uma condição atípica ao desenvolvimento aparece é mais importante do que a natureza do agente etiológico. Da fecundação até aproximadamente 8 ou 9 anos, as mudanças estruturais e os comportamentos filogeneticamente determinados, particularmente as aptidões motoras fundamentais, atingem níveis adultos de integração (MAUErBErG-deCAStrO, 2011). Danos ao desenvolvimento podem ser de origem hereditária ou ser adquiridos em diferentes momentos da existência. Esses momentos podem ser bastante precoces como na fecundação, até antes do nascimento (fatores congênitos) ou após o nascimento (adquiridos). É importante lembrar que existem fatores hereditários que se manifestam muito depois da criança ter nascido (ex. distrofia muscular de Duchenne). Danos precoces no SNC ou disfunção neurológica podem ser detectados pela: preservação de um reflexo para além da idade esperada, ausência completa de um reflexo, presença de respostas reflexas bilaterais desiguais, presença de respostas muito fracas ou muito fortes, tônus elevado ou diminuído, atrasos nas reações posturais (tAvArES, 2010). Entre as crianças com deficiência intelectual e aquelas com déficits neuromotores, como é o caso da paralisia cerebral, o desenvolvimento pode aparecer comprometido ou atrasado em vários domínios (i.e., físico, motor, perceptivo, social, cognitivo). vamos começar discutindo a deficiência intelectual que é a mais frequente na estatística das deficiências. U n iv e rs id a d e A b ert a d o B ra si l UNIDADE 2 46 SEÇÃO 2 DEfICIêNCIA INTELECTuAL No Brasil, o censo de 2010 aponta números de aproximadamente 23,9% de deficientes na população brasileira (iBGE, 2011). A deficiência intelectual é considerada a maior população com deficiência no mundo (SOi, 2008). Existem 200 milhões de indivíduos com deficiência intelectual em todo o mundo, de acordo com a World Health Organization (Organização Mundial de Saúde) (WhO, 2011). Este dado representa 3% da população do planeta. Em 2000, a população brasileira com deficiência intelectual era a mais frequente entre as deficiências e chegava a 40%, de acordo com o censo de 2000 (iBGE, 2000). Os critérios para a qualificação de deficiência intelectual incluem (SOi, 2008): 1. Funcionamento intelectual ou quociente de inteligência (qi) abaixo de 70-75; “Somos parte de um grande grupo especial.” (Foto: E. Mauerberg-deCastro) Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 47 UNIDADE 2 2. Limitação significativa em duas ou mais áreas de funções adaptativas1 e 3. A condição se manifesta antes da idade de 18 anos. Atualmente, o entendimento de funcionamento intelectual não se baseia apenas no qi. Mas o sistema tradicional de classificação ainda compara elementos de desempenho adaptativo com o quociente de inteligência (qi) (MAUErBErG-deCAStrO, 2011). Na deficiência intelectual leve e moderada, a criança evolui em suas habilidades motoras fundamentais com atrasos de até 2 a 3 anos em relação aos pares não deficientes. Os níveis de escolaridade chegam até o final do ensino fundamental, tornando esses indivíduos capazes de estabelecer relações e analisar situações concretas, porém tem dificuldade 1 áreas de funções adaptativas: funções da vida diária necessárias para viver, trabalhar e se divertir na comunidade. Segundo a SOi (2008), dez funções ou habilidades adaptati- vas incluem: comunicação, auto-cuidado, vida doméstica, habilidades sociais, habilida- des de lazer, saúde e segurança, sentido de direção, funcionamento acadêmico, uso dos recursos da comunidade e trabalho. Educação especial Divisão de atrasos escolares American Association for Mental Deficiency (AAMD) Deficiência intelectual educável - 75 a 50 Deficiência intelectual leve - 70 a 55 Deficiência intelectual treinável - 50 a 25 Deficiência intelectual moderada - 55 a 40 Deficiência intelectual dependente - abaixo de 25 Deficiência intelectual severa/ grave - 40 a 25 Deficiência intelectual profunda - abaixo de 25 Quadro II - Sistemas de classificação baseados no QI. U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l UNIDADE 2 48 no pensamento abstrato, formação de conceitos, resolução de problemas, e capacidade de avaliação de suas próprias ações. As diferenças físicas e a capacidade de expressão verbal são o suficiente para dar uma impressão inicial de desenvolvimento normal. Atitudes de discriminação por parte dos pares não deficientes são agravantes da pobre autoestima e noção de autocompetência. Os problemas de origens musculoesqueléticas e neuromotora são tão frequentes quanto na população geral, exceto na síndrome de Down. Entre os adultos, o maior problema refere-se ao sedentarismo e às escolhas nutricionais ruins. Nos deficientes intelectuais de nível moderado, o perfil psicomotor tem o mesmo andamento que daquele dos de nível leve, mas a diferença entre provas psicomotoras é mais acentuada (PiCq & vAYEr, 1985). Os distúrbios neuromotores (sincinesias, discinesias, paratonias) são mais evidentes. também observamos em maior ou menor grau: hábitos de perseveração motora e comportamental, dificuldade de atenção, memória de curto-prazo, déficits na consciência espacial, corporal, temporal e direcional. “Cuidados com o estado nutricional é um dos desafios no atendimento a deficientes intelectuais.” (Foto: E. Mauerberg-deCastro) Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 49 UNIDADE 2 Aspectos Especificação Físicos e estruturais Microcefalia, estatura baixa, diminuição do córtex frontal e vermix cerebelar, regressão e distorção da árvore dendrítica, defeito na laminação do córtex, e sinapses anormais, fronte baixa, nariz pequeno, boca entreaberta com língua escrotal e fissurada, respiração oral, pregas epicantais no canto interno dos olhos, manchas de Brushfield na íris, dentes são mal- implantados, braços curtos, pés e mãos largas, arco plantar inexistente, articulações dos dedos curtas e amplo espaço entre as articulações em geral (hiperextensível), abdômen distendido e hipotônico, hiperlordose, hipercifose, deslocamento do quadril, peito em forma de pombo, instabilidade atlantoaxial (1ª e 2ª vértebras cervicais), defeitos congênitos do coração (40% a 60%) no septo ventricular e no canal atrioventricular (corrigidos por cirurgia ao 1º ano), pulmões hipoplásicos, problemas na tiroide, déficits na audição e visão (catarata, nistagmo, estrabismo e miopia), indivíduos do sexo masculino são estéreis. Funcionais “Postura instável, aparência hipotônica, atrasos motores como a aquisição do sentar, ficar em pé e marcha, os quais em geral apresentam atrasos de 12 a 36 meses, inteligência média (qi) é em torno de 50 e tende a diminuir com a idade, aparecimento do mal de Alzheimer entre os idosos com síndrome de Down.” Comportamental A infância é marcada por um temperamento amigável, solidário, responsável e cooperativo. Na adolescência se tornam teimosos e começam a adotar hábitos de sedentarismo, o que aumenta a taxa de obesidade entre os adultos. Quadro III – Características da síndrome de Down. O deficiente intelectual profundo representa uma parcela pequena entre os deficientes intelectuais (entre 3 e 5%) com níveis de menor comprometimento mental. Ainda, a interação com outras condições de U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l UNIDADE 2 50 deficiência é comum. Seu desenvolvimento cognitivo é tão baixo que a idade mental não passa dos 3 anos; a linguagem ou outras formas de comunicação estruturada são ausentes. Ele é incapaz de compreender relações entre suas ações e dos outros e, muito menos, analisar conceitualmente situações concretas. Seus problemas físicos, de saúde e comportamentais requerem supervisão integral e atendimento médico multidisciplinar. As convulsões ocorrem em 20% dos casos, mas aumentam a 50% quando o qi cai para níveis abaixo de 20. Podem ser condicionados a vestir-se, comer e ir ao banheiro sozinhos (mas muitos usam fraldas). A insensibilidade à dor, a indiferença, comportamento estereotipado, autoagressão, agressão aos outros, destruição de propriedades, isolamento social, letargia, estados habituais de sonolência, agitação, todos confirmam desordens psiquiátricas (MAUErBErG-DECAStrO, 2011). hiperatividade e sensibilidade exagerada a sons e luz podem resultar em manifestações de fuga ou agitação. As características físicas e os atrasos no desenvolvimento psicomotor incluem assimetrias craniofaciais e deformidades posturais (posição equina dos pés, cifose e escolioses), reflexos primitivos não integrados (controle de saliva prejudicado pela falta ou exagero de reflexo de sucção), impossibilidade absoluta de relaxamento voluntário, “Na deficiência intelectual profunda, poucos sinais de divertimento.” (Foto: D. F. Campbell) Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 51 UNIDADE 2 hipotonicidade abdominal, problemas respiratórios (respiração é curta e bucal; incapaz de apneia voluntária), e presença de déficits sensoriais visuais e auditivos. Segundo Mauerberg-deCastro (2011), não existe memória muscular e a perseveração motora restringe a mudança de hábitos. Novos comportamentos podem ser aprendidos sob uma rotina rígida de condicionamento comportamental. SEÇÃO 3 AS pARALISIAS CEREBRAIS A paralisiacerebral é uma condição de deficiência adquirida muito cedo na vida (fetal, durante ou após o nascimento). A paralisia cerebral é uma desordem não-progressiva decorrente de lesão no sistema nervoso central que afeta o desenvolvimento da postura e do movimento. A etiologia da paralisia cerebral inclui: intercorrências neo, peri e pós- natais, anomalias congênitas, prematuridade com baixo peso, hipóxia ou isquemia, doença pulmonar crônica, hemorragia intracraniana grave, entre outras. Os distúrbios motores da paralisia cerebral são geralmente acompanhados de problemas na integração dos reflexos, prejuízos nas reações posturais e movimento voluntário, tônus aumentado ou flutuante, dificuldades na sensação tátil, cinestésica, vestibular e visual, (rOSENBAUM et. al., 2005). Os tipos de paralisia cerebral são definidos a partir da origem de suas lesões no SNC. Lesões são mais comuns no córtex motor (causando a paralisia cerebral espástica), núcleos da base (causando a paralisia coreoatetósica), cerebelo (causando a paralisia cerebral atáxica) e outras áreas mais difusas (paralisias cerebrais mistas). Ainda, o lado hemisférico cerebral e a topologia da área cerebral lesada também definem o lado e a parte corporal afetada (ex. hemiplegia, diplegia, quadriplegia). U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l UNIDADE 2 52 tipos de classificação da paralisia cerebral estão ilustrados no quadro iv. Distribuição do acometimento, número e tipo de segmentos corporais Severidade e capacidade funcional (descrição sintomática) Tipo de tônus - tetraplegia: envolvimento dos quatro membros - triplegia: envolvimento de três membros - diplegia: envolvimento de dois membros que podem ser superiores ou inferiores - hemiplegia: envolvimento de um lado ou hemisfério do corpo - monoplegia: envolvimento de apenas um membro do corpo - limitação funcional - necessidade de assistência tecnológica - qualidade do movimento - espástica - atetósica ou coreoatetósica - atáxica Outros tipos menos frequentes de paralisia cerebral são: - rígida - com tremor - mista Quadro IV. Sistemas de classificação usados na paralisia cerebral. “Na paralisia cerebral, posturas atípicas podem ser herança dos reflexos primitivos.” (Foto: E. Mauerberg-deCastro) Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 53 UNIDADE 2 Quadro V. Tipos de paralisia cerebral, ocorrência, área do SNC afetada e sinais. Paralisia cerebral Ocorrência Área cerebral afetada Sinais Espástica 66% dos casos Córtex motor reflexo exagerado de contração causando um hipertônus nos flexores das extremidades superiores e extensores das extremidades inferiores. Por causa da hipertonia há uma dificuldade de realizar movimentos precisos. Movimentos de arranco ocorrem por causa da falha de coordenação de músculos antagonistas em relaxar durante a ação agonista (fenômeno chamado clonia). Coreoatetósica 20 a 30% dos casos Gânglios da base Fluxo contínuo de movimentos das várias partes do corpo, movimento lento, involuntário e incontrolável da face e das extremidades (musculatura distal). A tentativa de intencionalmente cessar este fluxo acaba aumentando-o. Atáxica 8% Cerebelo Desordens de equilíbrio e propriocepção, perda de orientação no espaço, tropeçar em objetos, desorientação postural. Rígida 4% várias áreas do SNC rigidez em ambos os músculos de contração e seus antagonistas, inelasticidade generalizada pela ausência do reflexo de estiramento, hiperextensão das várias partes do corpo, hipertonicidade. U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l UNIDADE 2 54 Tremor 2% Núcleos da base e cerebelo Distonia, movimentos involuntários vibrando ritmicamente e regularmente, tremor acentua durante a tentativa de executar o movimento voluntário, pode desaparecer durante o sono ou na atividade de alta concentração. Afeta os músculos craniofaciais e dedos. Misto < 2% Difusa Os sintomas são de vários tipos e comprometem a parte cognitiva e sensorial de forma acentuada. A espasticidade e a atetose podem coexistir. Multideficiente. Ao longo do desenvolvimento, reflexos que não são integrados tornam-se patológicos e eventualmente prejudicam o crescimento e alinhamento ortopédico (ex. encurtamento de tendões), modificam o tônus (rigidez, tônus elevado, diminuído, flutuante), e limitam as reações posturais ou de equilíbrio, ultimamente, afetando a emergência dos “Paralisia cerebral espástica: tudo muito comum.” (Foto: D. F. Campbell) Fu n d a m e n to s d a e d u c a ç ã o F ís ic a a d a p ta d a 55 UNIDADE 2 movimentos voluntários. Existe um número de reflexos primitivos que, se não integrados, afetam várias atividades motoras ligadas ao esporte (quadro v). Ao final do primeiro semestre quando, no desenvolvimento normal, a maioria dos reflexos primitivos desaparece (i.e., é integrada), as reações posturais começam a predominar, e vêm ajudar na manutenção da posição bípede, na mudança de decúbitos, na posição sentada, e durante atividades de mobilidade. Reflexo primitivo Alteração patológica Época de surgimento e desaparecimento reflexo tônico labiríntico- prono Este reflexo estimula o tônus flexor de todo o corpo em resposta a qualquer mudança imposta na posição da cabeça. Causa uma distribuição anormal do tônus muscular e inabilidade dos segmentos corporais se moverem independentemente um do outro. impede a elevação da cabeça, causa protração (adução) dos ombros, inabilidade de mover os braços na posição deitada em prono. 0 – 4 meses reflexo tônico labiríntico- supino Aumento do tônus extensor em resposta a qualquer mudança na cabeça, dominância do tônus extensor, causando retração (abdução) dos ombros, impede a movimentação da cabeça, e impossibilita a criança de trazer os braços na linha média e de rolar. 0 – 4 meses reflexo tônico cervical assimétrico (rtCA) Posição do “esgrimista,” o reflexo é ativado pela rotação lateral da cabeça. Os problemas devido à falta de integração são: restrição no rolar da posição supina para prona, braço estendido e fixo restringe o desenvolvimento normal da coordenação olho-mão dificultando o desenvolvimento da fixação ocular; em condições severas, contribui para escolioses, subluxação ou deslocamento de quadril. 0 – 4 meses Quadro VI – Reflexos primitivos que, quando não integrados no SNC, causam problemas na aprendizagem motora e nas respostas posturais. U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l UNIDADE 2 56 reflexo tônico cervical simétrico A flexão da cabeça aumenta o tônus flexor da parte superior do tronco e extensor da parte inferior do tronco; a extensão da cabeça faz o contrário. Os problemas incluem: ausência de movimentos de flexão e extensão recíprocos das pernas necessários para rastejar (i.e., “posição de sapo”); impede o ato de sentar; a cabeça inclinada para frente promove a reação de extensão nas extremidades inferiores; a cabeça elevada ajuda a manter a posição sentada, mas dificulta as atividades porque os braços ficam estendidos; durante o andar, compromete a distribuição do tônus muscular porque as pernas ficam hiperestendidas, explica porque a marcha de bebês ocorre com os braços elevados e na ponta dos pés. 6 – 8 meses reflexo de preensão plantar Este reflexo também aumenta a força muscular dos pés. quando se torna patológico, interfere com o equilíbrio no andar e ficar na posição em pé; associado com o reflexo de suporte positivo das pernas (aumenta o tônus extensor que resulta em andar na ponta dos pés). 0-9 meses reflexo de suporte positivo das pernas Caracterizado pelo tônus extensor aumentado (flexão plantar) devido ao toque dos pés em qualquer superfície. Nas condições patológicas, quando completamente
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