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TERAPÊUTICA DAS CEFALÉIAS PRIMÁRIAS A cefaleia é configurada como a segunda queixa mais prevalente nos atendimentos hospitalares. Ela é definida como uma sensação de dor desagradável, porém segue sendo uma queixa subjetiva, pois cada pessoa sentirá a dor de uma forma. Nesse sentido, precisamos trazer objetividade a um sentimento subjetivo. Cefaleia é caracterizada como a dor localizada acima da linha imaginária que vai dos olhos ao pavilhão auricular. Elas são divididas por meio de uma classificação internacional com o objetivo de padronizar os diferentes tipos de cefaleia, dentro dessa classificação, em termos horizontais elas são divididas em três partes: • Cefaleias Primárias: caracterizada como a doença em sí, a própria doença em questão é a cefaleia. • Cefaleias Secundárias: existe uma doença subjacente e a cefaleia é um sintoma dessa doença em questão. • Neuropatias cranianas dolorosas, entre outras cefaleias e dores faciais: geralmente são definidas como dores neuropáticas que existiam no passado, permanecendo uma lesão tecidual. Em termos verticais, essas três classificações ainda são subdivididas em tipos: • Cefaleias Primárias - Enxaqueca - Cefaleia tensional - Cefaleia trigêmino-autonômicas - Outras cefaleias primárias • Cefaleias Secundárias - Atribuída ao trauma de cabeça e pescoço - Atribuída a perturbação vascular craniana ou cervical - Perturbação intracraniana não vascular - Atribuía a uso de substâncias ou privação (cafeína) - Atribuída a infecções (meningites) - Perturbação da hemostasia (HAS, jejum prolongado) - Atribuída a problemas de estruturação da face - Atribuída a perturbações psiquiátricas (muito subjetivas, relacionadas com delírios) • Neuropatias cranianas dolorosas - Neuralgia do trigêmeo - Neuralgia do nervo occipital MIGRÂNEA A migrânea é considerada a sexta doença que mais impacta na população (6º Burden of Disease) piorando a qualidade de vida, principalmente em pacientes abaixo de 50 anos, diminuindo principalmente a produtividade desses pacientes portadores de migrânea, atingindo muito mais o sexo feminino que no sexo masculino. Além disso, a migrânea é muito associada a várias comorbidades, possuindo maior incidência de alterações de sono, depressão, alterações respiratórias, gastrointestinais, etc. FISIOPATOLOGIA Alguns pontos que devem ser destacados são: • O porque algumas pessoas possuem migrânea e outras não: Essa doença está muito relacionada a fatores genéticos, sendo caracterizada como uma doença biológica, acontecendo justamente porque o paciente nasceu com uma predisposição genética para ter migrânea. Essa predisposição é um polimorfismo genético envolvendo mais de 40 genes e mais de 30 lugares diferentes do genoma; a combinação desses diferentes genes fará com que a pessoa possua a migrânea em diferentes intensidades e com diferentes sintomas. É UMA DOENÇA GENÉTICA DE CARATER BIOLÓGICO. • Porque em alguns momentos a pessoa tem a doença e em outros momentos não tem: tudo isso está relacionado a fatores epigenéticos, ou seja, esses genes irão se expressar mais ou menos conforme os fatores epigenéticos que atuarão sobre os genes. Por exemplo, a influência hormonal é muito frequente nesses casos, mulheres em período fértil apresentam mais crises de cefaleia. Alguns medicamentos utilizados também podem fazer com que a pessoa tenha crises com maior frequência. Esses genes levarão a síntese de algumas substâncias de caráter inflamatório e vasodilatador, principalmente o CGRP (Pepitídeo relacionado ao gene da calcitonina), sendo um importante mediador da migrânea. A dor é provocada pelo extravasamento dos mediadores moleculares que com a vasodilatação conseguem sair do espaço vascular, atuando em maior quantidade, nesse sentido não é a vasodilatação que provoca o mecanismo de dor. • Porque algumas pessoas tem aura e outras não: A aura é explicada por uma depressão cortical alastrante, sendo um fenômeno de redução de atividade neuronal, no qual os neurônios hiperpolarizados (menos ativos) causam uma depressão da atividade neuronal, que se propaga pelo córtex de posterior para anterior (começando no córtex occipital) em um ritmo de 3mm por segundo. Essa depressão cortical faz com que a pessoa apresente sintomas transitórios que podem anteceder ou acompanhar a dor, apresentados como um déficit neurológico. Essa aura pode se manifestar com sintomas visuais (geralmente a primeira) e motores, relacionados a fraqueza e parestesia dos membros (da região distal para proximal), algumas pessoas também podem apresentar sintomas relacionados a fala (afasia na área de Brocca), porém, qualquer um desses sintomas é transitório e podem ocorrer dois juntos. • Porque a migrânea pode cronificar em algumas pessoas: em algumas pessoas podem ocorrer modificações sinápticas, uma neuroplasticidade, as sinapses são perpetuadas e os estímulos que geram a dor se tornam crônicos. A pessoa torna-se sensibilizada a sentir a dor, alguns estímulos que não seriam considerados dolorosos, passam a ser percebidos pelo paciente como algo doloroso. SINTOMAS Como já dito anteriormente, dentre os sintomas apresentados pelos pacientes, além da dor, estão os sintomas de fotofobia, fonofobia, osmofobia (sensibilidade aumentada a odores), presença de gastroparesia (tendência a náuseas e vômitos), nesses casos os medicamentos utilizados por via oral possuem uma limitação. Sintomas psíquicos como irritabilidade e sonolência também podem estar presentes. A aura pode ou não acontecer, aproximadamente 20% dos pacientes com enxaqueca apresentam a aura, e os pacientes que possuem a migrânea com aura, nem sempre manifestam os sintomas. A mais comum é a aura visual havendo um escotoma positivo (pessoa enxerga algo no campo de visão), ela geralmente dura de 5-20min até 60min, um tempo maior que 60min apresenta um risco aumentado de evoluir para um quadro de AVC. A dor da cefaleia tem um caráter agudo recorrente, ocorrendo uma crise de dor e posteriormente a melhor, depois mais uma crise de dor e novamente uma melhora. Aspecto de Fortificação Porém, antes do paciente apresentar dor o paciente já começa a apresentar modificações no sistema nervoso, já havendo sintomas presentes que geralmente não são associados pelo paciente com a dor, mas são modificações no sistema nervoso que precedem a dor, esse momento é chamado de pródromo. No pródromo ocorrem alterações no apetite, geralmente a pessoa tem desejo de comer algum alimento, que muitas vezes é relacionado com o inicio da dor, porém o paciente já estava na eminencia de apresentar a dor. Outros sintomas que podem aparecer no pródromo são bocejos de cansaço, sonolência, aumento da percepção a cheiros, barulhos e luzes, e aumento da retenção de líquidos. Posterior ao pródromo ocorre a aura, podendo preceder ou acompanhar a crise de dor, pode ocorrer em situações raras que o paciente apresente a aura, mas não apresente a dor de cabeça. No momento da crise de cefaleia, além da dor, o paciente apresenta náuseas, vômitos, fotofobia, fonofobia, osnofobia, aumento da sonolência. Depois da crise de dor, há um quarto período chamado de pósdromo, que será o momento resolutivo dessa crise, no qual há apenas uma tolerância limitada a alimentos, sensação de estar cansado, animado ou um pouco mais desanimado, além de um aumento da diurese. Posteriormente, o organismo retorna a seu estado basal. DIAGNÓSTICO O diagnóstico é feito basicamente por meio da anamnese, podendo ser utilizado um diário de dor, que facilitará a avaliação do quadro do paciente, esse diário pode ser diagramado ou apenas um relato escrito em caderno. O diagnóstico é guiado pela classificação internacional de cefaleias: • Duração de 4 à 72h • Dor do tipo: - Pulsátil; - Moderada a forte; - Geralmente unilateral; - Agravo da dor com realizaçãode atividades físicas leves (subir escadas) • Para se enquadrar no diagnóstico de migrânea precisa apenas de dois de quadro itens preenchidos • Se a pessoa apresentar cefaleia com aura, bastam 2 crises para fechar o diagnóstico de migrânea, pacientes sem aura precisam de uma repetição de 5 vezes do quadro para confirmar o diagnóstico. • Os sintomas associados apresentados pelos pacientes pesam mais no momento do diagnóstico do que as próprias características da dor. Basta que a pessoa apresenta fotofobia e fonofobia juntas, ou náuseas ou vômito. • Outro critério utilizado é o fato de não haver outra cefaleia que explique melhor o quadro apresentado pelo paciente (primariedade). MIGRÂNEA CRÔNICA A dor acomete o paciente por mais do que 15 dias do mês e por mais de 3 meses. Pelo menos 8 dias do mês possuindo dores com características de migrânea isolada já podem ser caracterizados como uma dor crônica. A tendência é que com a cronificação da migrânea o padrão de dor também se altere, tornando-se mais leve e menos incapacitante, por esse motivo, pelo menos 8 dias do mês precisam ter as características de migrânea isolada, mas não necessariamente todos os dias. Principal fator de risco para cronificação é o uso excessivo de analgésicos, e esse uso excessivo é causado por um fenômeno chamado Cefalalgiofobia, que é o medo de apresentar dor de cabeça e sofrer com a dor. Alguns outros fatores também podem predispor a cronificação da cefaleia: TERAPÊUTICA DA MIGRÂNEA Existem várias vias de tratamento para cefaleia, tendo elas o mesmo objetivo, mas correndo por vias diferentes. No geral existem quatro linhas que andam paralelamente: • Terapia aguda: tratamento realizado no momento em que o paciente presenta a dor; • Terapia profilática: evita que as crises aconteçam (medicamentos diários) • Terapia transicional: paciente faz uso do tratamento agudo e começará o profilático, até o tratamento profilático surtir efeito é necessário o uso dessa terapia de transição, também chamado de Tratamento Ponte, pois faz a ligação entre o tratamento da fase aguda e da fase preventiva. • Medidas Comportamentais: algumas vezes o tratamento comportamental pode substituir o tratamento medicamentoso, sendo necessário em todos os casos. TERAPIA AGUDA • Analgésico simples ou Anti-inflamatório não hormonal (AINH) em casos de dor moderada. Dentre os principais que são considerados melhores para tratamento da migrânea estão: - Naproxeno - Ibuprofeno • Triptanos – são analgésicos antimigranosos específicos para migrânea. Eles são agonistas serotoninérgicos, a serotonina é um dos neurotransmissores responsáveis por desencadear o estímulo de dor, por esses medicamentos serem agonistas serotoninérgicos, eles devem ser utilizados no início da dor, quando a cascata de substâncias ainda não foi liberada. Quando o paciente apresenta aura, ele deve ser usado quando os sintomas da aura iniciaram, antes da dor começar. O medicamento interrompe a liberação de substâncias algogênicas, quando ele é usado depois dessa liberação, sua eficácia diminui. Dois dos principais são: - Naratriptano - Sumatriptano • Ergotamínicos – são analgésicos mais antigos derivados do ergo, porém com o surgimento dos triptanos o uso desses medicamentos não é mais tão comum, porém alguns pacientes ainda fazem uso. Atualmente não são encontrados no Brasil como substância isolada, sendo encontrados apenas em combos com associação a analgésicos, anti-inflamatórios, relaxantes musculares e cafeína. Alguns deles são: - Enxack - Cefaliun • Existem ainda associações que podem ser feitas: - AINH + Triptano (naproxeno + sumatriptano) – Sumax pro - Analgésico simples + AINH + Ergotamínico + Miorelaxante (relaxante muscular) + Cafeína O tratamento da migrânea pode ser feito de maneira escalonada, começando com uma medicação menos potente e aumentando gradativamente para medicamentos mais fortes em casos de não melhora. - Analgésico simples → AINH → Medicamento específico para migrânea (Triptanos). Outro tipo de tratamento é o estratificado, nesse caso você passa as orientações para o paciente a respeito da dor e dos tipos de medicamentos para cada intensidade. - Dor leve: Analgésico simples ou AINH - Dor moderada: AINH ou triptano - Dor intensa: Triptano Exemplos de medicamentos anti-inflamatórios não esteroides: ERGOTAMINA E DIIDROERGOTAMINA Como já dito anteriormente, essas drogas são mais antigas e possuem muitos efeitos colaterais, não havendo um bom custo benefício em sua utilização. Enquanto os triptanos atuam especificamente em dois receptores de serotonina, a ergotamina atua em outros receptores além da serotonina, por isso apresenta mais efeitos colaterais. Além disso, pode causar uma reação chamada queijo e vinho; se o paciente faz uso da ergotamina e consome queijos amarelos ou vinhos (que possuem a tiramina), podem apresentar uma reação mais exacerbada. TRIPTANOS São agonistas dos receptores de serotonina, específicos principalmente dos receptores 5HT1B e 5HT1D, e por agir especificamente apenas sobre esses dois receptores, isso diminui a quantidade de efeitos colaterais dos triptanos, além de funcionarem melhor no início da dor. Sumatriptano: possuem a via nasal e subcutânea, essas vias são interessantes em pacientes que possuem muitas náuseas ou vômitos durante as crises de dor, sendo necessário fugir da via oral. Os sumatriptanos são contraindicados nos pacientes com HAS não controlada e pacientes com doença cardíaca isquêmica, devido a sua ação vasoconstritora. TRATAMENTO PROFILAXIA Uso de medicamentos diariamente para prevenir que ocorram crises. Coloquiais: são medicamentos que foram desenvolvidos para outros fins terapêuticos, porém com o passar do tempo percebeu-se que poderiam ser utilizados para profilaxia da migrânea. Até recentemente, existia apenas esse tratamento, compreendido por várias classes farmacológicas sem muita ligação entre sí, mas que eram eficazes para o tratamento de cefaleia. Sendo eles: - Betabloqueadores: tendo a necessidade de penetrarem pela barreira hematoencefálica, para que consiga atuar no sistema nervoso. Ex: atenolol, propranolol. - Antidepressivos tricíclicos: amitriptilina - Anticonvulsivantes: principalmente topiramato e ácido valproico (Depakene) - Antivertiginosos: Flunarizina (vertix) Antagonistas de CGRP: medicamentos específicos para o tratamento de migrânea, eles tem apenas essa finalidade. Entre eles, estão: - Erenumab - Galcanezumab, entre outros Toxina Botulínica: quando aplicada em pontos específicos ela serve para profilaxia de cefaleia crônica. Essa toxina tem a capacidade de realizar a desnervação periférica, retirando a aferência do nervo periférico evitando a neuroplasticidade indesejada que acontece na migrânea crônica. A toxina botulínica é utilizada apenas em casos de cronificação, já os outros medicamentos profiláticos são utilizados em casos de migrânea muito intensa, com uma frequência de mais de 3 crises por mês (principal indicação). Pessoas que tem auras muito incapacitantes geralmente utilizam esses tratamentos profiláticos. Inibidores seletivos da recaptação de serotonina (sertralina, floxetina) não são indicados para profilaxia de migrânea. Vertix QUAL TRATAMENTO PROFILATICO ESCOLHER? A eficácia de todos é muito parecida, existem apenas mais trabalhos comprovando a eficácia do topiramato, apenas por motivos da indústria farmacêutica ter investido nisso, mas não significa que seja mais eficaz que outras drogas. Assim como a indústria também investiu na toxina botulínica, que atualmente é considerada o nível A de evidência para profilaxia de migrânea juntamente com o topiramato. A escolha do melhor tratamento será baseada no quadro clínico do paciente, sobretudo em suas comorbidades,por exemplo, pessoas que já fazem uso de betabloqueadores, podem utilizar o mesmo medicamento para tratamento de prevenção, por outro lado, se o paciente possui asma o betabloqueador não deve ser a opção de escolha. POR QUANTO TEMPO?
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