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1 2 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ......................................................................................... 4 2 LABORATORIO DE BACTERIOLOGIA ................................................... 5 2.1 Atividades de rotina de laboratórios de análises clínicas ......................... 5 2.2 Processos para padrões de qualidade para laboratórios de análises clínicas ............................................................................................................... 6 2.3 Padrões de qualidade .............................................................................. 9 2.4 Condutas para a execução correta dos exames laboratoriais ............... 14 3 NORMAS TÉCNICAS ............................................................................ 17 4 PATOGENICIDADE BACTERIANA ....................................................... 20 4.1 Microbiota normal .................................................................................. 21 4.2 Propriedades patogênicas dos microrganismos .................................... 22 4.3 Penetração dos agentes patogênicos .................................................... 23 4.4 Danos às células do hospedeiro ............................................................ 25 5 TÉCNICAS DE COLORAÇÃO EM BACTERIOLOGIA CLÍNICA ........... 26 5.1 Bactérias gram-positivas e gram-negativas ........................................... 27 5.2 Gram-negativos fermentadores ............................................................. 29 5.3 Patologias e sintomatologia associadas aos bacilos fermentadores ..... 30 5.4 Coloração de gram ................................................................................ 31 5.5 Coloração de Ziehl-Neelsen .................................................................. 33 5.6 Outras técnicas de colorações de bactérias .......................................... 34 6 MEIOS DE CULTURA E CARACTERÍSTICAS BACTERIANAS ........... 37 6.1 Meios de cultura .................................................................................... 38 6.2 Métodos de identificação de bactérias ................................................... 42 8 ESTAFILOCOCOS ................................................................................ 53 8.1 Identificação de estafilococos ................................................................ 53 3 9 ENTEROBACTÉRIAS............................................................................ 57 9.1 Isolamento ............................................................................................. 58 9.2 Cocos Gram-positivos............................................................................ 59 10 UROCULTURA ...................................................................................... 61 10.1 Microbiota comensal dos potenciais patógenos do sistema urinário ..... 62 10.2 Infecção por contaminação fecal: transmissão sexual ........................... 64 10.3 Métodos diagnósticos em urocultura e sua associação com exame qualitativo de urina ........................................................................................... 65 11 HEMOCULTURA ................................................................................... 67 11.1 Procedimentos e técnicas de hemocultura ............................................ 69 11.2 Método de lise-centrifugação ................................................................. 71 11.3 Método semiautomatizado ..................................................................... 71 11.4 Método automatizado ............................................................................ 71 11.5 Cultura de ponta de cateter ................................................................... 72 12 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................... 73 4 1 INTRODUÇÃO O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 5 2 LABORATORIO DE BACTERIOLOGIA Fonte: bit.ly/3yXvxtE O laboratório exerce um papel central na clínica médica. Estima-se que 70% das decisões médicas são baseadas nos exames laboratoriais. Os analistas clínicos utilizam os conhecimentos técnicos e científicos e os recursos tecnológicos disponíveis para fornecer informações essenciais para a detecção ou a exclusão de doenças e o acompanhamento do tratamento. Nesta disciplina, você vai estudar as principais atividades desenvolvidas em um laboratório de bacteriologia e as principais normas técnicas que devem ser seguidas pelos laboratórios clínicos, o que inclui o laboratório de bacteriologia. Você também vai entender como é feito o controle de qualidade dos exames laboratoriais e os principais testes realizados em um laboratório de bacteriologia. 2.1 Atividades de rotina de laboratórios de análises clínicas Os laboratórios clínicos têm a função principal de fornecer informações sobre marcadores do funcionamento do organismo, possibilitando a tomada de decisão pelos médicos sobre as condutas clínicas. Os exames laboratoriais são solicitados com diversas finalidades; as principais estão listadas a seguir (AYRES, 2020). 6 Diagnóstico: fornece dados complementares aos exames físicos e à anamnese, permitindo o auxílio no fechamento do diagnóstico de doenças. Monitorização: serve para o acompanhamento dos resultados de um tratamento, para averiguar a possibilidade de evolução da doença e para dosar os níveis de fármacos presentes no organismo. Prognóstico: auxilia na projeção do desenvolvimento para a cura ou a piora da doença, com base em dosagens de biomarcadores. Rastreamento: exame preventivo, com o objetivo de realizar o diagnóstico precoce de doenças com início assintomático. Avaliação inicial: definição de valores prévios ao tratamento ou para acompanhamento. Tranquilização do paciente: para casos em que o paciente quer descartar a chance de alguma patologia; porém, corre-se o risco de aumento da ansiedade e dos problemas ocasionados por resultados falsos-positivos. Solicitação do paciente: quando o paciente deseja monitorar algum parâmetro. Essa solicitação é feita mediante a orientação médica adequada. Entre as áreas incluídas nas análises clínicas estão: bioquímica, toxicologia e monitoramento de fármacos, microbiologia (bacteriologia), hematologia, imunologia, banco de sangue (medicina transfusional), controle de qualidade e gerenciamento laboratorial. A bioquímica clínica compreende uma série de subdivisões, de acordo com a categoria de análises realizadas. Em algumas regiões, a citopatologia também está incluída nas análises clínicas. Atualmente, uma categoria de testes que tem se desenvolvido muito e ocupado mais espaço na medicina laboratorial é a biologia molecular (BURTIS;BRUNS, 2016 apud AYRES, 2020). 2.2 Processos para padrões de qualidade para laboratórios de análises clínicas Para se chegar ao resultado final de um exame, são necessárias diversas etapas (Figura 1). Desde a solicitação do exame pelo médico até a emissão do laudo, existe uma série de possíveis erros que podem comprometer a confiabilidade do resultado. Veremos a seguir quais são essas etapas e quais são as possíveis fontes de erros no processo. 7 Figura 01 - Etapas de processamento das amostras Fonte: AYRES, 2020. A etapa pré-analítica engloba desde a solicitação feita pelo médico até a preparação do paciente para a coleta e a coleta da amostra em si, incluindo também o transporte da amostra até a área técnica onde o exame será realizado. A solicitação do exame pelo médico deve ser realizada criteriosamente, evitando-se duplicidade de resultados para um mesmo parâmetro em um curto espaço de tempo, sem justificativa, e considerando a real indicação de um determinado exame para o diagnóstico que se pretende realizar ou excluir (AYRES, 2020). Dessa forma, evitam-se gastos desnecessários, que oneram o sistema de saúde, os convênios ou os pacientes particulares; ainda, no caso dos hospitais, pode- se agilizar a liberação dos leitos para novos pacientes. Uma tarefa compartilhada entre o clínico e o laboratório é a orientação dos pacientes quanto ao preparo necessário para a realização dos seus exames, apontando o tempo necessário de jejum, quando for o caso, e o horário do dia mais 8 adequado para a coleta de exames específicos, bem como o uso ou a suspensão de algum medicamento e da prática de atividades físicas antes da coleta. Esses são exemplos de fatores que podem afetar diretamente o resultado dos exames e implicar recoletas (AYRES, 2020). Segundo Ayres (2020), quanto à coleta das amostras, que fica a cargo do laboratório ou dos técnicos de enfermagem hospitalares, é necessário que haja treinamentos e reciclagens periódicos, devido à importância dessa etapa em todos os processos seguintes. Coletadores bem treinados reduzem muito os índices de recoleta e aumentam a confiabilidade dos resultados, devido a simples fatores como o tempo de garroteamento, que influencia diretamente nos resultados de diversos parâmetros laboratoriais. Por fim, na etapa pré-analítica, está incluído o tempo de transporte da amostra do posto de coleta até o laboratório. Para o transporte, tanto o tempo como a temperatura e os recipientes de transporte são essenciais para garantir a confiabilidade dos resultados. Atualmente, com a distribuição de postos de coleta muitas vezes afastados da área técnica, esse ponto se torna ainda mais importante (XAVIER; DORA; BARROS, 2011 apud AYRES, 2020). A etapa analítica inclui a análise das amostras, incluindo o uso de reagentes, equipamentos e recursos humanos. A etapa analítica recebeu muita ênfase ao longo dos anos quanto aos cuidados técnicos e aos padrões de qualidade dos exames. Com a inclusão de automação para a maioria dos exames, a variabilidade e a chance de erros diminuíram consideravelmente. Além disso, os programas de controle de qualidade foram muito aprimorados, com a inclusão de testes de proficiência para controle interlaboratorial e programas de acreditação por empresas especializadas. Em função disso, a fase analítica se tornou a que apresenta a menor chance de erros laboratoriais (XAVIER; DORA; BARROS, 2011). A etapa pós-analítica é a fase que se inicia quando termina a análise da amostra, sendo concluída com a emissão do laudo. Nessa etapa, ocorre a verificação dos resultados pelo analista clínico, para analisar se são pertinentes, se houve algum erro de pipetagem ou outros problemas na fase analítica que possam comprometer o resultado obtido. Ainda, é feita uma comparação com resultados anteriores do paciente, quando houver, para checar se estão coerentes com a história clínica do paciente. Também pode ser feita em alguns laboratórios, especialmente nos 9 hospitalares, a verificação do prontuário do paciente, para checar se os resultados são compatíveis com a condição clínica. Em casos de dúvidas, muitas vezes, o médico solicitante pode ser contatado previamente à liberação do resultado, especialmente quando são encontrados resultados críticos para o atendimento do paciente, que podem exigir uma tomada de decisão médica imediata e que devem sempre ser comunicados com urgência. Nessa fase, também podem ocorrer eventualmente erros de digitação dos resultados no laudo, que estão se tornando menos frequentes devido ao interfaceamento dos resultados diretamente dos equipamentos e à emissão de laudos digitais, com fácil acesso para o médico e o paciente e maior confiabilidade (AYRES, 2020). 2.3 Padrões de qualidade Para permitir uma melhor qualidade nos serviços prestados pelos laboratórios, evitando erros e oportunizando um serviço cada vez mais confiável e eficiente, os laboratórios necessitam investir em equipamentos modernos, pessoal qualificado, área física bem planejada e segura e em uma boa equipe de gestores (MCPHERSON; PINCUS, 2017). O custo inicial aparentemente alto para a implementação de um sistema de qualidade laboratorial gera economia a longo prazo, conforme mostra a Figura 02. Figura 02 - Comparação entre os custos de conformidade e não conformidade em laboratórios clínicos Fonte: Adaptado de BURTIS; BRUNS, 2016. 10 A avaliação dos métodos laboratoriais é diretamente influenciada por algumas diretrizes de órgãos de padronização, como o Clinical and Laboratory Standard Institute (CLSI) e a Organização Internacional para Padronização (ISO, do inglês International Organization for Standardization) (BURTIS; BRUNS, 2016). Para compreender em que se baseiam esses padrões, é importante conhecer as definições apresentadas a seguir de acordo com Ayres (2020). Analito: substância analisada em um procedimento analítico. Calibração: relação entre o sinal fornecido pelo instrumento utilizado e a concentração verdadeira do analito. Comparação de métodos: comparação das medições obtidas por dois métodos, utilizando procedimentos estatísticos e representações gráficas. Erro aleatório: erro que resulta de imprecisões da medição e que apresenta distribuição gaussiana (p. ex., variação na pipetagem, variabilidade do sinal). Erro sistemático: erro na medição causado por viés na calibração ou por inespecificidade do ensaio e que se repete de modo constante em várias análises do mesmo analito, ou que varia de forma proporcional. Especificidade analítica: habilidade de um ensaio em determinar especificamente a concentração do analito-alvo na presença de substâncias ou fatores potencialmente interferentes na amostra; Incerteza: faixa de valores dentro da qual se espera que esteja o valor da quantidade sendo medida. Intervalo de medição: faixa de concentração de analito na qual as medições estão dentro das tolerâncias declaradas para imprecisão e erro; também chamado “intervalo reportável”. Limite de detecção: característica do ensaio, sendo o menor valor que excede significativamente as medidas de uma amostra de branco. Rastreabilidade: série de comparações de medidas que levam a um valor de referência conhecido, realizada para garantir uma concordância razoável entre os métodos de medição de rotina. Sensibilidade analítica: habilidade de um método analítico de avaliar pequenas variações na concentração do analito. Veracidade: proximidade da concordância entre o valor médio obtido de uma grande série de resultados de medição e um valor real. 11 Viés: diferença entre o valor médio e o valor real, que é expressa numericamente e está inversamente relacionada à veracidade. A frequência de erros laboratoriais, de acordo com a literatura, pode variar de 1/100a 1/1.000. Isso se deve à diferente classificação dos erros nos diversos estudos. Porém, a maior parte dos erros ocorrem dentro da faixa da normalidade para o parâmetro testado, não impactando diretamente no paciente. Na maior parte dos estudos, observa-se um maior percentual de erros ocorrendo na fase pré-analítica, sendo a troca de amostras entre pacientes um dos mais comuns (AYRES, 2020). Os erros pré-analíticos também incluem amostras hemolisadas, coaguladas ou com volume insuficiente, problemas de identificação da amostra, coleta em tubo inadequado para o teste e armazenamento de forma errada. Os principais erros analíticos incluem problemas de calibração e mau funcionamento dos equipamentos. Entre os erros pós-analíticos mais comuns estão o envio de resultados para o médico errado e os atrasos na liberação dos resultados (MCPHERSON; PINCUS, 2017). O foco dos laboratórios privados e governamentais em reduzir as fontes de erros levou à implementação de ferramentas de gerenciamento da qualidade total (GQT) e melhoramento contínuo da qualidade (MCQ). O GQT é um sistema que foca nas equipes, nos processos, nas estatísticas e na entrega de produtos ou serviços que alcancem ou ultrapassem as expectativas dos clientes. Já o MCQ é um elemento do GQT que busca o melhoramento continuado das práticas, indo além do alcance dos padrões de qualidade (MCPHERSON; PINCUS, 2017 apud AYRES, 2020). Duas outras ferramentas muito utilizadas para melhorar a qualidade são a Lean Six Sigma. São processos independentes, mas que normalmente são combinados, formando a metodologia Lean Six Sigma. O Six Sigma é um programa de melhoramento de performance, que tem como chave a melhoria por meio da eliminação das variações no processo: melhor performance, melhor qualidade, melhor ponto de partida, maior satisfação do cliente e maior satisfação dos colaboradores. Trata-se de um processo estruturado, baseado em estatísticas e medidas quantitativas, por meio das quais os defeitos e erros do processo são analisados, as causas potenciais são identificadas e as melhorias são implementadas. O defeito é considerado algo que não atende aos requisitos do cliente, como um erro laboratorial, o atraso na liberação do resultado ou problemas de controle de qualidade (MCPHERSON; PINCUS, 2017). 12 Já o sistema Lean tem como objetivo a redução de desperdícios (“atividades sem valor agregado”) em processos de produção ou fabricação. Foi desenvolvido a partir de princípios utilizados pela empresa Toyota, para melhorar a qualidade e a eficiência na produção de automóveis, e foi aplicado aos métodos de produção de várias indústrias, incluindo os laboratórios clínicos. O sistema lean utiliza diversas técnicas, como a dos 5S, que abrange os seguintes termos provenientes do idioma japonês segundo Ayres (2020): seiri — senso de utilização, uso eficiente de recursos; seiton — senso de organização; seiso — senso de limpeza; seiketsu — senso de padronização e saúde; e shitsuke — senso de disciplina. Outra técnica utilizada é o PDCA, sigla proveniente dos termos em inglês plan, do, check e act, ou planejar, fazer, checar e agir. O PDCA é utilizado para reduzir os custos, por meio da identificação de atividades diárias de trabalho que não agregam diretamente aos serviços do laboratório de forma eficiente ou custo-efetiva. Um laboratório LEAN utiliza menos recursos, reduz os custos, aumenta a produtividade, promove a moral da equipe e melhora a qualidade do cuidado com o paciente (MCPHERSON; PINCUS, 2017). Para o controle do desempenho dos métodos analíticos, são utilizadas amostras com valores conhecidos, e os valores obtidos pelo método testado são comparados com os valores esperados para aquele material. Os valores conhecidos são especificados como um intervalo de valores aceitáveis, incluindo um limite superior e um limite inferior para o material de controle. Quando os valores estão dentro dos limites esperados, isso indica que o método testado está com desempenho adequado. Quando os valores ficam abaixo ou acima do esperado, pode haver problemas metodológicos, que devem ser testados um a um, para se determinar a fonte de erro (BURTIS; BRUNS, 2016). Podem ser problemas com os reagentes utilizados, com o operador ou, até mesmo, algum problema mecânico do equipamento. Os controles podem ser classificados em internos e externos, conforme descrito a seguir. 13 Controle interno: o controle interno busca comparar o desempenho de um teste em vários momentos de um mesmo dia ou de um dia para o outro e ao longo do mês, a fim de detectar quando ocorrerem variações que possam impactar na confiabilidade do teste. Para isso, são utilizados geralmente materiais de controle comercial produzidos pela mesma empresa que fornece os reagentes. Os controles comerciais necessitam ter estabilidade e ser disponibilizados em alíquotas ou frascos que permitam a sua utilização por longos períodos. A variação entre os frascos deve ser mínima, permitindo que as variações observadas possam ser atribuídas a outras variáveis do método. O material de controle deve ser o mais próximo possível ao material analisado na rotina e, de preferência, de origem humana — mas, devido à escassez e aos riscos biológicos, eventualmente podem ser utilizados materiais de fonte animal. Para se verificar o desempenho do método diante de valores normais e alterados, devem-se utilizar controles dentro da faixa normal e controles para faixas alteradas. Muitas vezes, os materiais de controle se apresentam liofilizados ou congelados, para aumento do tempo de estabilidade. Porém, deve-se ter cuidado com a reconstituição desses materiais quando for o caso, com o intuito de não alterar suas características (BURTIS; BRUNS, 2016). Controle externo: o controle externo serve para realizar a comparação de resultados entre diferentes laboratórios, com o objetivo de verificar se há uma homogeneidade nos resultados de diferentes laboratórios que utilizam a mesma metodologia. Os materiais de controle são enviados para diversos laboratórios, que realizam os testes e enviam para a sociedade profissional ou o fabricante dos controles, que compara os resultados de cada laboratório com a média dos resultados do grupo inteiro. Caso o laboratório apresente diferença estatística em relação aos resultados do grupo, é necessário que seja detectada a fonte de erro e sejam adotadas medidas corretivas. Em seguida, é enviado novo material, e se verifica se as medidas tomadas surtiram efeito (BURTIS; BRUNS, 2016). 14 2.4 Condutas para a execução correta dos exames laboratoriais Para garantir a qualidade dos exames e a correta execução é indispensável que o laboratório realize o controle interno da qualidade e os ensaios de proficiência. As informações do desempenho do laboratório nos programas de ensaio de proficiência e controle interno são unificadas para se definir a estratégia de especificação da qualidade analítica, ampliando a análise da performance analítica do exame e aprimorando a agilidade na tomada de decisões. Para garantir a qualidade, é necessário padronizar os processos envolvidos, desde a solicitação médica dos exames até a liberação do laudo, prevenir, detectar, identificar e corrigir erros ou variações que possam ocorrer em todas as fases do teste (pré-analítica, analítica e pós-analítica). Assim, será possível assegurar a monitoração da qualidade dos resultados (SBPC/ML, 2017). A acreditação laboratorial é outra forma de complementar a qualidade nos processos laboratoriais. Não é obrigatória, mas é um diferencial para o laboratório, pois valida seu compromisso com o serviço prestado. Laboratórios que não a utilizam estão mais vulneráveis a cometer erros e fornecer resultados incorretos. Os indivíduos que realizam exames num laboratório certificadotêm a garantia de que o seu exame está sendo feito de acordo com rígidos critérios para que os resultados sejam os mais precisos possíveis. Os programas de acreditação foram criados como uma resposta às persistentes alegações de práticas inadequadas, inexistência de padrões, fraudes e desempenho ruim dos laboratórios clínicos (SBPC/ML, 2017). De acordo com o objetivo do laboratório e a necessidade do momento, é possível escolher a instituição mais indicada: Programa de Acreditação de Laboratórios Clínicos (PALC) da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML); Departamento de Inspeção e Credenciamento da Qualidade (DICQ) da Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (SBAC); Colégio Americano de Patologia (CAP): emite uma acreditação de cunho internacional. Os profissionais responsáveis pelo uso e pela manutenção do equipamento devem documentar a manutenção dos equipamentos e as calibrações realizadas internamente, em conformidade às exigências do Instituto Nacional de Metrologia (INMETRO). 15 Os certificados de calibração dos padrões e instrumentos de medição devem estar de acordo com os requisitos estabelecidos pela Associação Brasileira de Normas Técnicas como ABNT NBR ISO/IEC 17025, Requisitos Gerais para Competência de Laboratórios de Ensaio e Calibração. Confira no Quadro 01 as principais RDC’s que devem ser seguidas pelos laboratórios de análises clínicas. (CAVAGNOLLI, 2021). Quadro 01 - Principais RDC’s que devem ser seguidas pelos laboratórios de análises clínicas Fonte: CAVAGNOLLI, 2021. 16 O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), constitui informações sobre direitos, deveres e obrigações que devem ser cumpridos pelo trabalhador e pelo empregado a fim de garantir que o trabalho seja seguro e sadio, prevenindo acidentes e doenças ocupacionais. As NR’s nº 01 (Disposições gerais e gerenciamento de riscos ocupacionais), nº 07 (Programa de controle médico de saúde ocupacional -PCMSO), nº 09 (Avaliação e controle das exposições ocupacionais a agentes físicos, químicos e biológicos) e nº 18 (Condições de segurança e saúde no trabalho na indústria da construção), tiveram o prazo para início de vigência dos novos textos prorrogados conforme a Portaria SEPRT nº 1.295/2021 (BRASIL, 2021). NR-6: Regulamenta o uso de EPIs. Para funcionários com deficiência, os EPIs devem ser adaptados pelo próprio fabricante com certificado de aprovação. Caso o certificado já tenha sido emitido, não é necessária a emissão de um novo. NR-32: Institui as medidas de segurança e proteção à saúde de quem trabalha em serviços de saúde e de quem exerce atividades de promoção e assistência à saúde, estando expostos a riscos biológicos. Seguem as atualizações: O empregador deve elaborar e implementar Plano de Prevenção de Riscos de Acidentes com Materiais Perfurocortantes, conforme as diretrizes estabelecidas no Anexo III desta Norma Regulamentadora. As empresas que produzem ou comercializam materiais perfurocortantes devem disponibilizar, para os trabalhadores dos serviços de saúde, capacitação sobre a correta utilização do dispositivo de segurança. O empregador deve assegurar, aos trabalhadores dos serviços de saúde, a capacitação prevista no subitem 32.2.4.16.1 (BRASIL, 2011 apud CAVAGNOLLI, 2021). 17 3 NORMAS TÉCNICAS Fonte: bit.ly/3VJ9Ln9 Os laboratórios de análises clínicas devem atuar de acordo com as normas técnicas, a fim de garantir a correta execução dos exames. Neste capítulo, você vai estudar as principais normas técnicas para laboratórios de análises clinicas incluído o laboratório de bacteriologia. O laboratório precisa cumprir as exigências legais das resoluções da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) definidas por Resoluções da Diretoria Colegiada (RDC), que inclui a RDC nº 50/2002, a RDC nº 302/2005, a RDC nº 063/2011 e a RDC nº 222/2018. É importante também seguir as normas de segurança e saúde no trabalho em serviços de saúde, quais sejam: a Norma Regulamentadora 32 (NR-32) e a Norma Regulamentadora 6 (NR-6) para uso de EPIs (AYRES, 2020). Essas normas preconizam que os laboratórios devem seguir regras para a construção de salas de coleta de sangue e de procedimentos para a coleta e de outros líquidos biológicos, assim como outros setores do laboratório. Equipamentos de proteção individual devem ser oferecidos pelo laboratório de modo a garantir segurança e saúde no trabalho conforme as normas estabelecidas. Os laboratórios clínicos, como estabelecimentos de saúde, são altamente regulados, com o intuito primordial de proteger a população contra práticas profissionais inadequadas e que possam expor a saúde das pessoas a riscos. De 18 modo geral, a legislação que se aplica aos estabelecimentos de saúde se constitui pelas normas listadas a seguir (KELLER, 2014). Lei Federal nº 6437, de 20 de agosto de 1977 - Lei das Infrações Sanitárias. Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990). Legislação estadual e municipal. Regulamentações do Ministério da Saúde (MS), da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), da Agência Nacional de Saúde Suplementar, dos estados e municípios (decretos, portarias, resoluções, instruções normativas). Regulamentos dos conselhos de classe profissional. Quanto à legislação que se aplica de modo mais específico aos laboratórios de análises clínicas, podemos citar os regulamentos listados a seguir (KELLER, 2014). Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) da Anvisa nº 302, de 13 de outubro de 2005, que dispõe sobre o regulamento técnico para o funcionamento de laboratórios clínicos. RDC Anvisa nº 50, de 21 de fevereiro de 2002, que dispõe sobre o regulamento técnico para planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos de estabelecimentos assistenciais de saúde. RDC Anvisa nº 189, de 18 de julho de 2003, que dispõe sobre a regulamentação dos procedimentos de análise, avaliação e aprovação dos projetos físicos de estabelecimentos de saúde no Sistema Nacional de Vigilância Sanitária. Portaria do Gabinete do Ministro/MS (GM/MS) nº 3523, de 28 de agosto de 1998 - regulamento técnico da qualidade do ar de interiores — e Resolução (RE) Anvisa nº 09, de 16 de janeiro de 2003, que tratam dos padrões de qualidade do ar em ambientes climatizados. Portaria GM/MS nº 2914, de 12 de dezembro de 2011, que dispõe sobre a qualidade da água para consumo humano e trata da água reagente. Decreto Presidencial nº 5296, de 02 de dezembro de 2004, que regulamenta as Leis n° 10.048, de 8 de novembro de 2000 - que dá prioridade de atendimento às pessoas portadoras de deficiência, aos idosos com idade igual ou superior a 60 anos, às gestantes e lactantes e às pessoas acompanhadas por crianças de colo - e n° 10.098, de 19 de dezembro de 2000 - que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade. 19 RE Anvisa n° 2605, de 11 de agosto de 2006, que trata de produtos de uso único e proibidos de reprocessamento. RE Anvisa n° 2606, de 11 de agosto de 2006, que trata do reprocessamento de produtos médicos. RDC Anvisa n° 306, de 07 de dezembro de 2004, que dispõe sobre resíduos de serviços de saúde e estabelece o plano de gerenciamento de resíduos de serviços de saúde. Portaria MS/GM nº 1.271, de 6 de junho de 2014, que define a lista nacional de notificação compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde pública nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território nacional. Norma Regulamentadora (NR) nº 32, que dispõe sobre segurança e saúde no trabalho em serviços de saúde. Portaria GM n° 485, de 11 de novembro de 2005, aprova a NR 32. Portaria GM n° 939, de 18 de novembro de 2008, complementa a NR 32. RDC Anvisa n° 02, de 25de janeiro de 2010, que dispõe sobre a gestão de tecnologias - estabelece critérios mínimos a serem seguidos para o gerenciamento de tecnologias em saúde utilizadas na prestação de serviços de saúde, de modo a garantir a sua rastreabilidade, a sua qualidade, a sua eficácia, a sua efetividade e a sua segurança e, no que couber, o seu desempenho, desde a entrada no estabelecimento de saúde até́ o seu destino final. RDC Anvisa nº 20, de 10 de abril de 2014, que dispõe sobre o regulamento sanitário para o transporte de material biológico. RDC Anvisa n° 63, de 25 de novembro de 2011, que trata dos requisitos de funcionamento de serviços de saúde (AYRES, 2020). RDC Anvisa nº 222 de 28 de março de 2018, regulamenta as Boas Práticas de Gerenciamento dos. Resíduos de Serviços de Saúde e dá outras providências. 20 4 PATOGENICIDADE BACTERIANA Fonte: bit.ly/3eP87zZ O homem abriga em seu corpo uma variedade imensa e complexa de microrganismos, os quais buscam benefícios, como alimentos e ambiente ideal para o seu crescimento. Na maioria das vezes, esses microrganismos não trazem qualquer prejuízo à saúde humana, podendo, inclusive, beneficiá-la, como o fato de ajudar na proteção contra microrganismos patogênicos e na estimulação do sistema imune (SOUZA, 2019). De acordo com Souza (2019) a interação entre eles e os hospedeiros pode ser neutral, benéfica ou patogênica. Neste último caso, os microrganismos utilizam estruturas especializadas ou deficiências do hospedeiro para infectá-lo, causando danos no seus tecidos e células. Nosso corpo é formado por bilhões de células e, entre elas, temos diferentes tipos, como neurônios, células musculares, epiteliais e do sangue. Além delas, em nosso corpo, existe uma grande quantidade de células exógenas, representada por microrganismos como fungos e bactérias. Existe, assim, um equilíbrio entre os componentes, e a presença dos microrganismos é fundamental para o bom funcionamento de alguns tecidos e órgãos (MADIGAN et al. 2016 apud SOUSA, 2019). Em algumas ocasiões, esse equilíbrio é quebrado, e agentes denominados patógenos conseguem infectar o corpo, causando lesões. Esses microrganismos podem utilizar estruturas especializadas, toxinas e enzimas para invadir ao hospedeiro 21 e, muitas vezes, aproveitam momentos de baixa imunidade do indivíduo para atacar (são os chamados patógenos oportunistas) (SOUSA, 2019). 4.1 Microbiota normal O ser humano convive com muitos microrganismos permanentemente em seu corpo, desde o nascimento até a morte, sem que necessariamente causem doenças. Eles estão presentes na pele, nas mucosas e em outros locais do corpo humano, usufruindo dos nutrientes, da temperatura, da umidade, da pressão osmótica e do pH do hospedeiro para utilizarem como fonte de energia e se multiplicarem (SOUZA, 2019). Segundo Souza (2019) essa população de microrganismos são comensais (relação simbiótica), pois colonizam o ser humano sadio de forma harmônica em busca de benefícios, normalmente não trazendo problemas. Além disso, são denominados como microbiota normal ou flora normal, fazendo parte milhares de espécies de bactérias, arqueas, fungos, vírus e protozoários. Muitos deles podem, inclusive, trazer benefícios ao ser humano, como proteção contra infecções causadas por organismos patogênicos, digestão de alimentos, produção de vitaminas e estimulação da imunidade. Em termos evolutivos, os microrganismos que compõem a microbiota normal são mais adaptados ao homem do que aqueles microrganismos extremamente patogênicos, pois estes podem levar a óbito, o que não é vantajoso para o microrganismo (MURRAY et al. 2004; TORTORA; FUNKE; CASE, 2017 apud SOUZA, 2019) Além dos microrganismos que formam a microbiota normal (de forma permanente), existem alguns que colonizam o homem de forma transitória (permanecem por horas, dias ou semanas) e normalmente não são patogênicos, os quais são chamados de microbiota transitória (SOUZA, 2019). Os microrganismos que vivem no corpo humano colonizam virtualmente todas as superfícies expostas ao ambiente externo. A microbiota está presente na boca, no estômago, no intestino, nos tratos genitourinário e respiratório, nos olhos, na pele, etc. Embora esta se distribua por todas as áreas de contato com o exterior, a maior parte da colonização (cerca de 70%) ocorre no trato gastrointestinal (ANTUNES, 2014). Além dessa variação no tempo, o conjunto de microrganismos também exibe grandes diferenças espaciais. No trato gastrointestinal, por exemplo, cada segmento 22 do tubo digestivo tem micróbios relativamente específicos. No estômago, são comuns bactérias dos gêneros Lactobacillus, Veillonella e Helicobacter. No intestino delgado, predominam estreptococos, actinobactérias e corinebactérias. No intestino grosso, algumas das bactérias mais abundantes são os gêneros Bacteroides e Clostridium (ANTUNES, 2014). Quadro 02 - Principais bactérias comensais e localização Localização Bactérias comensais mais comuns Pele Acinetobacter, Brevibacterium, Clostridium perfringens, Corynebacterium, Enterobacter, Klebsiella, Micrococus, Propionibacterium, Proteus, Pseudomonas, Streptococcus, Staphylococcus aureus, Staphylococcus epidermidis e outros estafilococos coagulase negativos. Cavidade oral Actinomyces, Bacteroides, Corynebacterium, Trato respiratório superior Corynebacterium, Haemophilus, Neisseria, Staphylococcus, Streptococcus, Veillonella. Ouvidos externos Staphylococcus coagulase negativo Olhos Corynebacterium, Haemophilus, Neisseria, Sthaphylococcus, Streptococcus, Veillonella Estômago Lactobacillus, Streptococcus Intestino delgado Peptostreptococcus, Parphyromonas, Prevotella. Intestino grosso Bacteroides, Bifidobacterium, Citrobacter, Enterococcus, Enterobacter, Escherichia coli, Eubacterium, Fusobacterium, Klebsella, Lactobacillus, Proteus. Uretra anterior Lactobacillus, Staphylococcus coagulase negativo e Streptococcus; Vagina Gardnerella, Lactobacillus, Staphylococcus, Streptococcus; Fonte: Adaptado de ANTUNES, 2014. 4.2 Propriedades patogênicas dos microrganismos Segundo Souza (2019), a patogenicidade é a capacidade que os microrganismos têm de causar doenças ao superarem o sistema imunológico do hospedeiro, enquanto a virulência se refere ao grau ou à extensão da patogenicidade (refere-se a uma capacidade quantitativa). Existem algumas propriedades que indicam que um microrganismo tem potencial de patogenicidade. 23 Quadro 03 - Principais propriedades patogênicas Adesão (ou aderência ou fixação) É a capacidade de as bactérias se aderirem às células epiteliais do hospedeiro ou a superfícies, formando biofilmes. Esta é uma etapa importante para causar infecção, pois, caso contrário, a bactéria pode ser eliminada do organismo. Existem alguns fatores de adesão que podem estar presentes na bactéria, como proteínas de aderência, ácido lipoteicoico, cápsula, fímbrias, pili e flagelos. Invasão É a capacidade que o microrganismo tem de penetrar nas células ou nos tecidos do hospedeiro, de forma a permitir a sua disseminação e a propagação da doença. Toxicidade É a capacidade que o microrganismo tem de produzir a toxina que causa doença no hospedeiro. Os microrganismos podem produzir exotoxinas, que são as proteínas tóxicas liberadas pelos patógenos enquanto eles crescem (p. ex., enterotoxinas produzidas pelas bactérias Clostridium perfringens e Bacillus cereus que causam intoxicação alimentar) ou podem produzir endotoxinas — que são os lipopolissacarídeos (LPS) tóxicos que causam febre, hipotensão e choque séptico —, as quais são produzidas somente pelas bactérias gram-negativas, já que somente elas têm LPS em suas membranas externas. Resistência a antimicrobianos e a desinfetantes Microrganismos com resistência a antimicrobianos e desinfetantes comumente utilizadossão mais virulentos e têm maior potencial de causar doença. Fonte: Adaptado de ANTUNES, 2014. 4.3 Penetração dos agentes patogênicos A adesão dos microrganismos às células do hospedeiro geralmente envolve interações específicas. Alguns fatores de adesão são macromoléculas que não estão covalentemente ligadas aos patógenos e revestem a superfície da bactéria (glicocálix). Um exemplo de glicocálix é a cápsula de Bacillus anthracis (causadora do antraz), formada por ácido D-glutâmico (MADIGAN et al. 2016). Além da participação das cápsulas na adesão celular, também podem contribuir à evasão dos mecanismos de defesa do hospedeiro. Assim, por exemplo, a cápsula de Neisseria meningitidis e de Streptococcus pneumoniae evita que os fagócitos se liguem à bactéria. Outro tipo de fator antifagocitário são as proteínas de parede celular de algumas bactérias, como a proteína A de Staphylococcus aureus, que se liga à IgG, evitando a ativação do complemento (LEVINSON, 2016). 24 Quadro 04 - Fatores de aderência de patógenos microbianos Fator Exemplo Cápsula/camada limosa Escherichia coli - a cápsula promove a aderência à borda em escova das microvilosidades intestinais. Streptococcus mutans - a camada limosa de dextrana promove a ligação às superfícies dentárias; Proteína de aderência Streptococcus pyogenes - a proteína M na célula liga-se a receptores da mucosa respiratória; Neisseria gonorrhoeae - a proteína Opa na célula liga-se aos receptores CD66 do epitélio. Ácido lipoteicoico Streptococcus pyogenes - o ácido lipoteicoico facilita a ligação ao receptor da mucosa respiratória (em conjunto com a proteína M). Fímbrias (pili) Neisseria gonorrhoeae - os pili facilitam a ligação ao epitélio; Espécies de Salmonella - fímbrias do tipo I facilitam a ligação ao epitélio do intestino delgado; Escherichia coli patogênica - antígenos de fatores de colonização (CFAs) facilitam a ligação ao epitélio do intestino delgado. Fonte: Adaptado de MADIGAN et al. 2016. A invasão ao hospedeiro não seria possível sem a participação de enzimas produzidas pelos patógenos. Entre elas, temos coagulase, colagenase, hialuronidase, protease de IgA e leucocidinas. A coagulase favorece a formação de um coágulo de fibrina que isola ao patógeno e oferece proteção da fagocitose (um bom exemplo é Staphylococcus aureus). As enzimas hialuronidase e colagenase permitem a invasão do tecido subcutâneo ao degradar ácido hialurônico e colágeno, respectivamente, e foram associadas à formação de celulite causada pela bactéria Streptococcus pyogenes. As proteases de imunoglobulina A podem degradar IgA, favorecendo a adesão com as membranas mucosas. Por sua parte, as leucocidinas ajudam no combate a macrófagos e neutrófilos (LEVINSON, 2016 apud SOSA, 2019). Alguns microrganismos são capazes de sobreviver dentro da célula hospedeira e são denominados patógenos intracelulares. Dentro das bactérias mais representativas desse grupo, temos Brucella, Listeria e Mycobacterium e, em relação aos fungos, um exemplo conhecido é Histoplasma. O fato de permanecer dentro da célula hospedeira favorece sua proteção contra mecanismos de defesa extracelulares, 25 como neutrófilos e anticorpos. Para poder sobreviver intracelularmente, esses patógenos possuem vários mecanismos de defesa, como (LEVINSON, 2016): Impedir a fusão do fagossomo com o lisossomo, evitando enzimas de degradação; Inibir a acidificação do fagossomo, diminuindo a eficácia de enzimas degradativas; Fugir do fagossomo para o citoplasma. Para invadir o hospedeiro, as bactérias utilizam estruturas proteicas denominadas “invasinas”, que interagem especificamente com receptores celulares da família das integrinas. Depois de entrar na célula, as bactérias podem ficar no citoplasma ou dentro de vacuólos (como fagossomos). Outra alternativa é migrar para células vizinhas por meio da formação de túneis de actina. Dessa forma, patógenos como Listeria monocytogenes conseguem invadir células vizinhas, evitando mecanismos de defesa. 4.4 Danos às células do hospedeiro As bactérias podem causar doenças por meio de dois mecanismos: produção de toxinas e invasão e inflamação. As toxinas podem ser divididas em exotoxinas, quando são liberadas pela bactéria, e endotoxinas, não liberadas e geralmente formadas por lipopolissacarídeos da parede celular (LEVINSON, 2016). Quadro 05 - Relação propriedades patogênicas exotoxina e endotoxina Propriedades Exotoxina Endotoxina Fonte Certas espécies de bactérias gram-positivas e gram- negativas. Parede celular de bactérias gram-negativas. Secretada pela célula Sim Não Química Polipeptídeo Lipopolissacarídeo Localização dos genes Plasmídeo ou bacteriófago Cromossomo bacteriano Toxicidade Alta (dose letal da ordem de 1micrograma). Baixa (dose letal da ordem de centenas de microgramas). Efeitos clínicos Inúmeros efeitos. Febre e choque. Modo de ação Inúmeras maneiras Inclui TNF e interleucina 1 Antigenicidade Induz altos títulos de anticorpos, denominados antitoxinas. Pouco antigênica. 26 Vacinas Toxoides utilizados como vacinas. Ausência de formação de toxoides e nenhuma vacina disponível. Estabilidade térmica Rapidamente destruídas a 60°C (exceto pela enterotoxina estafilocócica). Estável a 100°C por 1 hora. Doenças típicas Tétano, botulismo e difteria. Meningococemia, septicemia, por bacios gram- negativos. Fonte: Adaptado de LEVINSON, 2016. 5 TÉCNICAS DE COLORAÇÃO EM BACTERIOLOGIA CLÍNICA Fonte: bit.ly/3gcDrsC A identificação de espécies bacterianas faz parte da rotina de laboratórios de bacteriologia clínica. Dessa forma, diferentes técnicas de coloração são utilizadas para que seja possível observar as bactérias em microscopia de campo claro, já que os corantes aumentam o contraste e facilitam a visualização. Neste capítulo, você vai aprender a caracterizar e diferenciar as bactérias gram-positivas e gram-negativas e entender como elas são coradas pela técnica coloração de Gram, além de saber o que são bactérias álcool-acidorresistentes, por que elas não são coradas pela coloração de Gram e qual é a técnica de coloração utilizada para essas bactérias. Você ainda vai aprender, neste capítulo, outras técnicas de coloração que são utilizadas na bacteriologia clínica (SOUZA, 2020). 27 5.1 Bactérias gram-positivas e gram-negativas As bactérias podem ser classificadas como gram-positivas ou gram-negativas. Essa classificação é feita de acordo com a resposta à coloração de Gram em diferenças estruturais nas paredes celulares (TORTORA; FUNKE; CASE, 2017). Fonte: bit.ly/3eJdfpo Quadro 06 - Bactérias gram-negativas Bactérias gram-negativas As paredes celulares das bactérias gram-negativas têm uma ou poucas camadas de peptidoglicano, mas são mais complexas estrutural e quimicamente em relação às gram- positivas. Somente as gram-negativas têm uma membrana externa, que é constituída de LPSs, lipoproteínas e fosfolipídios. As funções da membrana externa incluem manter a estrutura bacteriana, conferir defesa celular e funcionar como uma barreira de permeabilidade a grandes moléculas (por exemplo, metais pesados, enzimas digestórias, como a lisozima, e antibióticos) e moléculas hidrofóbicas (por exemplo, detergentes). A membrana externa, porém, permite uma permeabilidade seletiva por intermédio das proteínas da membrana — chamadas de porinas —, as quais formam canais que permitem a passagem de determinadas moléculas, como nucleotídeos, dissacarídeos, peptídeos, aminoácidos, vitamina B12 e ferro. 28 Algumas espécies de bactérias gram-negativas têm enzimas β-lactamases no espaço periplásmico, que degradam antibióticos da classe β-lactâmicos, como, por exemplo, a penicilina, podendo ser, portanto, naturalmente resistentes a essa classede antibióticos. O LPS, constituinte da membrana externa, é uma molécula grande, anfipática (extremidades hidrofóbicas e hidrofílicas) e complexa. O LPS é uma endotoxina extremamente tóxica, sendo considerado um potente estimulador de respostas imunológicas no hospedeiro, podendo causar febre, choque e outros sintomas graves. O LPS é constituído por três unidades distintas: Lipídio A — responsável pelos efeitos tóxicos; • cerne polissacarídeo — formado por cinco açúcares ligados ao lipídio A, tem a função estrutural de estabilidade; • polissacarídeo O (ou antígeno O) — composto por moléculas de açúcar, tem a função de antígeno, sendo útil para diferenciar espécies bacterianas gram-negativas, já que existe grande variabilidade entre espécies e cepas bacterianas. Fonte: Adaptado de SOUZA, 2019. Algumas bactérias gram-negativas, como Neisseria meningitidis, N. gonorrhoeae, Haemophilus influenzae e H. ducreyi, não têm LPS na membrana externa, mas têm uma molécula semelhante, o lipo-oligossacarídeo, que é um importante fator de virulência causador de febre e outros sintomas. Outros exemplos de bactérias gram-negativas são Escherichia coli, Salmonella enterica e Pseudomonas aeruginosa (BROOKS et al. 2014; LEVINSON, 2016; MURRAY et al. 2004; TORTORA; FUNKE; CASE, 2017). Quadro 07 - Bactérias gram-positivas 29 Bactérias gram-positivas As paredes celulares das bactérias gram-positivas são mais espessas e rígidas em comparação às das gram-negativas, pois têm várias camadas de peptidoglicano. O espaço periplásmico também está presente, porém, nas bactérias gram-positivas, há uma camada granular composta por ácido lipoteicoico (SOUZA, 2019). Apenas as bactérias gram-positivas contêm ácidos teicoicos (presente na maioria das espécies de bactérias gram-positivas), que são polímeros hidrossolúveis de poliol fosfatos situados na camada externa da parede celular. Quando estão ligados à camada de peptidoglicano, são classificados como ácidos teicoicos da parede, porém, quando atravessam a camada de peptidoglicano, ligando-se aos lipídios da membrana citoplasmática, são classificados como ácidos lipoteicoicos (têm um ácido graxo). Os ácidos teicoicos são antígenos de superfície das bactérias gram-positivas que favorecem a ligação com outras bactérias e receptores específicos de células de mamíferos (fenômeno patogênico chamado de aderência), podendo ser utilizados na diferenciação de sorotipos bacterianos. Além disso, os ácidos teicoicos são importantes fatores de virulência, pois são capazes de induzir choque séptico no hospedeiro. Alguns exemplos de bactérias gram- positivas são: Streptococcus agalactiae, Staphylococcus aureus, Corynebacterium diphtheriae e Bacillus anthracis (BROOKS et al. 2014; LEVINSON, 2016; MURRAY et al. 2004; TORTORA; FUNKE; CASE, 2017). 5.2 Gram-negativos fermentadores Os bacilos gram-negativos fermentadores de glicose são constituídos por 42 gêneros e mais de 100 espécies. Algumas dessas espécies são patogênicas, causando infecções tanto no homem quanto nos animais, outras são patógenos oportunistas. As enterobactérias podem ser diferenciadas com base em suas características bioquímicas segundo Splendore (2018). São bacilos gram-negativos; Fermentam a glicose com ou sem produção de gás; São aeróbios e anaeróbios facultativos; A maioria reduz nitrato a nitrito; A maioria é oxidase negativa e catalase positiva; Podem ser móveis por flagelos peritríquios ou imóveis; Crescem bem em meios comuns de cultura, como ágar MacConkey; São encontradas no trato gastrintestinal de animais e seres humanos. 30 As principais enterobactérias de importância clínica são: Escherichia coli, Klebsiella spp., Enterobacter spp., Proteus spp., Providencia spp., Morganella spp., Citrobacter spp., Salmonella spp., Shigella spp. e Serratia spp. 5.3 Patologias e sintomatologia associadas aos bacilos fermentadores As enterobacteriaceaes podem causar infecções intestinais e extraintestinais. As infecções extraintestinais podem ser localizadas ou sistêmicas. As infecções localizadas mais frequentes são as das vias urinárias, dos pulmões, do sistema nervoso central, da pele e de feridas. As infecções, tanto intestinais como extraintestinais, podem permanecer localizadas ou se transformarem em infecções sistêmicas, como as bacteremias. Esta transformação se dá em consequência da translocação das enterobactérias presentes no intestino para a corrente sanguínea. Vários fatores podem favorecer essa translocação. Todos os representantes das enterobactérias, por serem organismos gram-negativos, contêm endotoxina na parede celular. Além disso, várias exotoxinas são produzidas causando diarreia (SPLENDORE, 2018). Quadro 08 - Principais agentes etiológicos e dados clínicos Agente etiológico Dados clínicos comuns E. coli enterotoxigênica (ETEC) Diarreia, náuseas e cólicas abdominais. E. coli enteropatogênica (EPEC) Diarreia, náuseas e cólicas abdominais. Diarreia, febre e cólicas abdominais. E coli enterohemorrágica (EHEC) Púrpura trombocitopênica e insuficiência renal aguda, diarreia sanguinolenta, fortes cólicas abdominais. E coli enteroinvasora Diarreia que pode ser sanguinolenta, febre e cólicas abdominais. Salmonella Typhi Febre, anorexia, indisposição, cefaleia, mialgia, diarreia e constipação. Outras salmoneloses Diarreia, febre e cólicas abdominais. Shigella sp Diarreia, cólicas e febre. Yersinia enterocolitica Diarreia e dor abdominal severa. Vibrio cholerae Diarreia aquosa geralmente acompanhada de vômito. Vibrio parahaemolyticus Diarreia Campylobacter Diarreia geralmente sanguinolenta, dor abdominal e febre. Listeria monocytogenes Diarreia, febre e cólicas abdominais. Clostridium perfringens Diarreia e cólicas abdominais. Klebsiella Febre acima de 39°C, aumento da frequência cardíaca, dificuldade para respirar. Fonte: SPLENDORE, 2018. 31 5.4 Coloração de gram Fonte: bit.ly/3golCXA Desenvolvida pelo médico dinamarquês Hans Christian Joachim Gram em 1884, tem como fundamento o fato de que as bactérias, quando coradas por derivados próximos da rosanilina (violeta genciana, cristal-violeta, metilvioleta, etc.) e depois de tratadas pelo iodo (solução iodo-iodetada, conhecida como lugol), formam um composto de coloração escura, entre o iodo e o corante, chamado iodopararosanilina. Este composto, nas bactérias gram-positivas, é fortemente retido e não pode ser facilmente removível pelo tratamento posterior com o álcool, ao passo que nas gram- negativas este composto é facilmente descorado pelo álcool (NOGUEIRA; SOUZA, 2009). Durante as primeiras etapas da coloração o corante cristal de violeta e o iodo são incorporados ao citoplasma das bactérias, entretanto, ao adicionar um descorante, algumas bactérias se tornam incolores, sendo então denominadas gram- negativas, enquanto outras permanecem coradas de azul/púrpura, sendo estas chamadas de gram-positivas. Tendo em vista que as bactérias gram-negativas se tornam incolores depois da descoloração, é necessário que elas sejam, então, coradas para que possam ser visualizadas no microscópio de campo claro. Para isto, utilizam-se os corantes vermelho safranina ou fucsina (TORTORA; FUNKE; CASE, 2017). 32 A retenção, ou não do corante cristal de violeta é explicada devido a algumas diferenças estruturais das paredes celulares das bactérias gram-positivas e gram- negativas. As bactérias gram-positivas têm uma parede celular mais espessa em relação às gram-negativas, a qual é composta por várias camadas de peptidoglicano, enquanto somente as bactérias gram-negativas têm LPSs na parede celular. O cristal de violeta e o iodo penetram facilmente nas células das bactérias, formando um complexo insolúvel de cristal violeta-iodo, que é maior do que a moléculade cristal que entrou na célula. Quando as células são lavadas com álcool ou solução álcool- acetona podem ocorrer duas situações: As bactérias gram-negativas conseguem eliminar o complexo cristal violeta- iodo, que atravessa uma camada fina de peptidoglicano, uma vez que o álcool penetra e rompe a camada externa de LPSs; As bactérias gram-positivas retêm o complexo cristal violeta-iodo, já que esse complexo não consegue ultrapassar a espessa camada de peptidoglicano. A coloração de Gram é, portanto, considerada uma técnica diferencial, haja vista que as bactérias gram-positivas são coradas de azul/púrpura, enquanto as gram- negativas ficam na tonalidade rosa/vermelho (SOUZA, 2020). 33 5.5 Coloração de Ziehl-Neelsen Fonte: bit.ly/3CQLrY7 Você acabou de aprender sobre as peculiaridades das bactérias álcool- acidorresistentes e entendeu o porquê elas não são usualmente coradas pela coloração de Gram, então, a partir de agora, você vai aprender com mais detalhes como as bactérias álcool-acidorresistentes são coradas para que possam ser visualizadas em microscopia de campo claro. A técnica mais utilizada em laboratórios de bacteriologia clínica para corar as bactérias álcool-acidorresistentes é a coloração de Ziehl-Neelsen. De acordo com Holanda (2017), a primeira etapa dessa coloração consiste na adição do corante vermelho carbol-fucsina na lâmina contendo o esfregaço previamente fixado, sendo necessário aplicar calor para aumentar a penetração e a retenção do corante. Após a lavagem com água, a lâmina é descolorada com álcool- ácido, nessa etapa, as bactérias álcool-acidorresistentes permanecem coradas com o corante vermelho, no entanto, as outras bactérias que não têm o ácido micólico em sua parece celular acabam sendo descoloridas. Dessa forma, um contracorante (coloração de contraste) deve ser adicionado (geralmente o azul de metileno) para corar as bactérias que se não são álcool- acidorresistentes. No microscópio óptico, as bactérias álcool-acidorresistentes se apresentam com cor rosa/vermelha, enquanto o fundo da lâmina e os outros microrganismos não acidorresistentes apresentam a cor do contracorante (geralmente azul) (SOUZA, 2020). 34 Também chamada de pesquisa de BAAR (bacilo álcool-ácido resistente), baciloscopia ou BK. Basicamente, a coloração de Ziehl-Neelsen é usada para micobactérias, cuja parede celular feita de ácidos micólicos resiste à descoloração ácido-álcool e mantém a cor do corante original, fucsina concentrada. Portanto, os bacilos apresentam coloração vermelha ao final do procedimento. Essa coloração é o método mais rápido para detectar micobactérias em amostras clínicas suspeitas de tuberculose ou hanseníase. (HOLANDA, 2017). Esfregaços para micobactérias podem ser obtidos a partir de amostras de escarro, lavado brônquico, lavado gástrico, linfa do lóbulo da orelha (hanseníase), urina, líquido cefalorraquidiano, líquido pleural, biópsias e secreções. O escarro é o material mais comumente usado para amostragem. O diagnóstico deve ser baseado em duas amostras: a primeira é no momento da consulta e a segunda depois de acordar no dia seguinte. É muito importante que o laboratório ou o médico forneçam orientação adequada ao paciente na hora da coleta das amostras. As amostras devem ser colocadas em frascos estéreis, transparentes e de boca larga com tampa de rosca. As amostras devem ser enviadas para o laboratório o mais rápido possível, transportadas refrigeradas e embaladas de forma a evitar o risco de derramamento (HOLANDA, 2017). 5.6 Outras técnicas de colorações de bactérias Além das colorações Gram e Ziehl-Neelsen, que são as mais rotineiramente realizadas, existem outras que também são utilizadas para corar bactérias em situações específicas. A coloração de Kinyoun é usada para diferenciar as espécies álcool-acidorresistentes (Mycobacterium, Corynebacterium e Nocardia) das não álcool-acidorresistentes, sendo uma opção quando se coram fracamente pelo método de Ziehl-Neelsen. Na realidade, a coloração de Kinyoun é uma modificação do teste de Ziehl-Neelsen, no qual se acrescenta uma etapa prévia ao adicionar uma fórmula contendo fucsina básica, fenol, etanol e água destilada (BROOKS et al. 2014). Os corantes podem ser utilizados individualmente em soluções aquosas ou alcoólicas para visualizar as bactérias de forma destacada e determinar a morfologia e arranjo. Como exemplos, destacamos os corantes azul de metileno, carbol-fucsina, cristal violeta e safranina (TORTORA; FUNKE; CASE, 2017 apud SOUZA, 2020). 35 Algumas bactérias (p. ex., Klebsiella pneumoniae) produzem cápsula externamente à parede celular, o que é considerado um fator de virulência. A coloração negativa para cápsulas é um método utilizado para verificar se a bactéria em análise tem cápsula. O princípio da técnica é que a maioria dos corantes não consegue corar as cápsulas bacterianas, pois estas são solúveis em água, mas cora o restante do material, dessa forma, o fundo fica escuro e as cápsulas são visualizadas como halos incolores. É possível utilizar o corante tinta da Índia, ou nigrosina, mas existem outros protocolos possíveis (p. ex., método de Welch, que utiliza cristal violeta e sulfato de cobre (SOUZA, 2020). Algumas bactérias (p. ex., Bacillus cereus) produzem endósporos, que são estruturas dormentes intracelulares que conferem resistência bacteriana em condições ambientais adversas, como calor extremo, radiação, produtos químicos fortes, dessecamento e carência nutricional. A maioria dos corantes (como os utilizados no Gram) não consegue penetrar na parede dos endósporos, não sendo, portanto, corados por eles, porém, existe uma técnica capaz de corar e detectar se a bactéria analisada tem endósporo, a qual é chamada de coloração de endósporo (Schaeffer-Fulton). Nessa técnica, aplica-se o corante verde malaquita com fixação em calor, o que ajuda a sua penetração na parede do endósporo, além de um contracorante (safranina) que cora as porções celulares que não são endósporos. Assim, o endósporo adquire uma cor verde, enquanto o restante adquire cor vermelho/rosa (MADIGAN et al. 2016; TORTORA; FUNKE; CASE, 2017). Os flagelos, estruturas que conferem motilidade celular, são encontrados em algumas bactérias (p. ex., Salmonella enterica). A detecção da presença de arranjos flagelares pode auxiliar no diagnóstico, entretanto, os flagelos são muitos finos, o que impede que sejam visualizadas no microscópio óptico sem uma coloração adequada. Existe um protocolo para coloração do flagelo, no qual se utiliza um mordente (suspensão coloidal de sais de ácido tânico) que aumenta o diâmetro do flagelo, seguido da aplicação do corante carbol-fucsina, sendo então possível a sua visualização em microscópio óptico (SOUZA, 2020). 36 Quadro 09 - Principais colorações utilizadas na Bacteriologia Clínica Coloração Classif icação Corantes utilizados Principais aplicações Aparência da coloração Gram Diferen cial Cristal violeta e safranina (ou fucsina). Diferenciar a maioria das espécies bacterianas, classificando-as como gram- positivas (cor azul/púrpura) ou gram-negativas (cor rosa/vermelha). Gram-negativa e gram-positiva, respectivamente Ziehl- Neelsen Diferen cial Carbol- fucsina (ou fucsina fenicada) e azul de metileno. Diferenciar espécies álcool- acidorresistente s (Mycobacterium, Corynebacteriu m e Nocardia) (cor rosa/vermelha) das espécies não álcool- acidorresistente s (cor azul). Kinyoun Diferen cial Fucsina e azul de metileno. Diferenciar espécies álcool- acidorresistente s (cor rosa/vermelha) das espécies não álcool- acidorresistente s (cor azul). Azul de metileno, carbol- fucsina, cristal violeta e safranina Simple s Utilizados individualme nte em soluçõesaquosas ou alcoólicas. Determinar a morfologia e os arranjos bacterianos. 37 Negativa para cápsulas Especi al Normalmente tinta da Índia ou nigrosina. Detectar a presença de cápsula bacteriana (halo incolor). Endósporo (Schaeffer- Fulton Especi al Verde malaquita e safranina. Detectar a presença de endósporo na bactéria (cor verde). Fonte: Adaptado de TORTORA; FUNKE e CASE, 2017. 6 MEIOS DE CULTURA E CARACTERÍSTICAS BACTERIANAS Fonte: bit.ly/2xesey7 Uma das práticas mais rotineiras de um laboratório de bacteriologia clínica é o cultivo de bactérias em meios de cultura. Os meios de cultura podem servir para a estocagem e a manutenção de culturas bacterianas (o que pode ser interessante para manter uma coleção de bactérias no laboratório, por exemplo), para identificar e diferenciar grupos ou espécies de bactérias, o que auxilia no diagnóstico, e para realizar testes de sensibilidade aos antibióticos. Além de saber escolher o meio de cultura adequado para cada situação e interpretar corretamente os resultados do cultivo bacteriano de acordo com as https://bit.ly/2xesey7 38 características apresentadas pelas colônias bacterianas, é essencial que o profissional saiba inocular as bactérias nos meios de cultura utilizando as técnicas de semeadura adequadas. Neste capítulo, você vai reconhecer os principais meios de cultura utilizados na bacteriologia clínica e suas finalidades, além de saber identificar as características bacterianas a partir de meios de cultura utilizados em testes bioquímicos e aprender a utilizar a técnica de semeadura adequada para o cultivo bacteriano (SOUZA, 2020). 6.1 Meios de cultura As bactérias requerem fontes de nutrientes adequadas para crescerem, como, por exemplo, carbono (obtido a partir de compostos orgânicos), nitrogênio, enxofre e fósforo. Em um laboratório de bacteriologia, as bactérias podem crescer in vitro em placas ou tubos que contenham meio de cultura (também chamado de meio de cultivo), os quais devem reproduzir as condições nutricionais necessárias. Entretanto, os tipos de nutrientes necessários variam muito entre as espécies, logo, não existe um meio de cultura universal. Foram, portanto, desenvolvidos vários meios de cultura, cada um com uma composição diferente de nutrientes, de modo a permitir o crescimento da maioria dos microrganismos, de grupos ou de espécies bacterianas específicas. Porém, é importante destacar que os meios de cultura não servem apenas para obter o isolamento das colônias bacterianas, muitas vezes eles possibilitam a identificação das bactérias, seja de um grupo específico, ou até mesmo a identificação de uma espécie (SOUZA, 2020). É importante que você saiba reconhecer os diferentes meios de cultura e para o que são utilizados, para, dessa forma, poder escolher o mais adequado de acordo com a natureza da investigação bacteriana. Os meios de cultura utilizados na bacteriologia podem ser agrupados em duas grandes classes: meios definidos e meios complexos segundo Souza (2020): Meios definidos (ou meios sintéticos): são aqueles que se sabe exatamente a composição química (qualitativa e quantitativamente conhecida), pois são preparados com quantidades exatas de compostos químicos orgânicos e inorgânicos, sendo utilizados normalmente em trabalhos experimentais ou para 39 o crescimento de bactérias autotróficas (as que produzem o seu próprio alimento). Meios complexos: são os que não se sabe exatamente a composição, mas que utilizam variadas fontes de nutrientes, como extratos de leveduras, de carnes, de soja ou de plantas, componentes de produtos microbianos, proteína do leite (caseína), entre outras, sendo estes os mais utilizados rotineiramente. Os meios de cultura também podem ser classificados como meios de transporte e conservação, meios para teste de sensibilidade aos antimicrobianos, meios seletivos, meios diferenciais e meios de enriquecimento (BRASIL, 2004; MADIGAN et al. 2016; TORTORA; FUNKE; CASE, 2017). Meios de transporte e conservação: são aqueles que contêm um agente redutor, mas não têm nutrientes. Esses meios são utilizados para tornar o ambiente viável, prevenir desidratação e oxidação enzimática e manter as culturas vivas. Exemplos: Cary Blair, Salina Tamponada, Meio Stuart e ágar nutriente. Meios para teste de sensibilidade aos antimicrobianos: são os usados para se fazer antibiograma. Exemplos: HTM (haemophilus test medium), Agar Mueller Hinton e Agar Mueller Hinton Sangue. Meios seletivos: são aqueles que inibem, de forma seletiva, o crescimento de alguns microrganismos e favorecem o crescimento dos microrganismos de interesse clínico. Exemplos: Ágar Thayer-Martin e Ágar Salmonella Shigella (SS). Meios diferenciais: são os meios que diferenciam as bactérias pelas características especiais das colônias bacterianas de interesse, como diferentes colorações. Exemplos: ágar-EMB e ágar-sangue. Meios de enriquecimento: são aqueles utilizados para isolar microrganismos fastidiosos (ou seja, que são nutricionalmente exigentes), cujo crescimento pode ser inibido se outras bactérias estiverem presentes em maior número. Os meios de enriquecimento também são considerados meios seletivos, já que utilizam substâncias altamente nutritivas que favorecem o crescimento dos microrganismos fastidiosos e inibem o crescimento de outros. A sua utilização mais frequente é em amostras de fezes e de solo. Exemplos: ágar-chocolate, caldo selenito e caldo tetrationato. 40 7.1.1 Ágar-sangue O ágar-sangue é um meio de cultura sólido composto, principalmente, por sangue desfibrinado de carneiro ou de coelho e uma mistura de peptonas. Trata-se de um meio de cultura rico em nutrientes que permite o crescimento da maioria dos microrganismos (com exceção de alguns fastidiosos), logo, não é um meio seletivo. Ele é considerado um meio diferencial por ser na identificação presuntiva de Haemophilus spp. e na análise diferencial de produção de hemólise pelas bactérias Streptococcus spp. e Staphylococcus spp (SOUZA, 2020). O Haemophilus pode ser identificado pela prova do satelitismo. Essa prova consiste em semear no ágar-sangue uma suspensão de bactéria suspeita de ser Haemophilus e fazer um inóculo em forma de estria da bactéria Staphylococcus aureus, a qual secreta a enzima NAD (Fator V), que é liberada no meio. A bactéria Haemophilus necessita do Fator V para crescer, sendo assim, se essa bactéria estiver presente na amostra semeada, ela irá crescer em forma de satélite ao redor da estria de S. aureus (Figura 03) (SOUZA, 2020). Figura 03 - Prova do satelitismo Fonte: shutr.bz/3VIZ6Jh Teste presuntivo de identificação de Haemophilus spp realizado em ágar- sangue. As colônias de Haemophilus crescem ao redor da S. aureus, que produz o Fator V, o qual é essencial para o crescimento de Haemophilus. 41 Algumas espécies de Streptococcus e Staphylococcus causam hemólise (destruição de hemácias), o que pode ser observado no ágar-sangue (que contém hemácias). A α-hemólise produz uma lise parcial, formando colorações verdes ao redor das colônias (exemplos de bactérias α-hemolíticas: Streptococcus viridans e Streptococcus pneumoniae), enquanto a β-hemólise produz lise total, formando halos transparentes e luminosos em volta das colônias (exemplos de bactérias β- hemolíticas: Streptococcus pyogenes e S. aureus) (SOUZA, 2020). 7.1.2 Ágar MacConkey O ágar MacConkey é um meio de cultura sólido composto, principalmente, por cristal violeta, sais biliares e peptonas. Este é um meio seletivo, pois nele crescem somente as bactérias gram-negativas, já que o cristal violeta inibe o crescimento das bactérias gram-positivas. O ágar MacConkey também é considerado um meio diferencial pelo fato de diferenciar bactérias gram-negativas fermentadorasde lactose (produzem colônias rosas), como a Escherichia coli, das não fermentadoras (que produzem colônias incolores ou beges), como a Pseudomonas aeruginosa. Ele é usado principalmente para isolar e identificar enterobactérias e fazer a contagem de coliformes fecais a partir de diferentes tipos de amostras, como amostras biológicas (p. ex., fezes), água e alimentos (SOUZA, 2020). 7.1 3 Ágar-chocolate O ágar-chocolate, que recebe esse nome pela sua cor marrom, é um meio de cultura sólido composto basicamente por sangue lisado de coelho, cavalo ou carneiro. As hemácias do sangue são lisadas pelo calor e então liberam os compostos hemina e hematina, que são necessários para o crescimento de microrganismos fastidiosos, como Neisseria gonorrhoeae, Neisseria meningitidis, Haemophilus spp. e Moraxella spp., sendo, portanto, esse meio classificado como um meio de enriquecimento. Não se trata de um meio seletivo, pois ele também permite o crescimento de outros microrganismos não fastidiosos, embora o meio possa ser suplementado com o antibiótico vancomicina, que inibe alguns microrganismos, de modo a favorecer o crescimento dos fastidiosos (SOUZA, 2020). 42 7.1.4 Ágar Thayer-Martin chocolate O ágar Thayer-Martin chocolate é uma modificação do ágar-chocolate, com a diferença de ser suplementado com antibióticos (colistina, nistatina, trimetropina e vancomicina) que inibem o crescimento da microbiota normal e favorecem o crescimento das bactérias N. gonorrhoeae e N. meningitidis, o que o torna um meio seletivo e de enriquecimento (SOUZA, 2020). 7.1.5 Ágar SS O ágar SS é um meio de cultura sólido composto principalmente por sais biliares, verde brilhante, citrato de sódio, tiossulfato de sódio e citrato férrico. Trata-se de um meio seletivo, já que os compostos sais biliares, verde brilhante e citrato de sódio inibem o crescimento de microrganismos gram-positivos. Ele também é considerado um meio diferencial por diferenciar as bactérias fermentadores de lactose (produzem colônias rosas ou vermelhas) das não fermentadoras (produzem colônias incolores). O ágar SS é utilizado para isolar Salmonella (produz colônias com centro negro devido à detecção de H2 S ou incolores) e Shigella (produz colônias incolores) a partir de amostras biológicas (p. ex., fezes e urina) e (SOUZA, 2020). 7.1.6 Ágar Löwenstein-Jensen O ágar Löwenstein-Jensen é um meio de cultura sólido composto por ovos de galinha, fécula de batata, verde malaquita, asparagina, fosfato e sais de magnésio. Este é um meio seletivo, pois permite o crescimento de micobactérias, como Mycobacterium tuberculosis e Mycobacterium leprae, por exemplo (SOUZA, 2020). 6.2 Métodos de identificação de bactérias Você acabou de aprender os principais meios de cultura utilizados na bacteriologia clínica para o crescimento bacteriano. Alguns deles permitem a identificação presuntiva de grupos ou espécies bacterianas, como a diferenciação de bactérias gram-negativas fermentadoras de lactose das não fermentadoras nos meios 43 ágar MacConkey e ágar SS. Porém, existem ainda outros meios de cultura utilizados na realização de provas bioquímicas (também chamados de testes bioquímicos), os quais permitem identificar as espécies bacterianas pela pesquisa das enzimas metabolizadoras, dos produtos metabólicos e catabólicos e da sensibilidade a diferentes compostos, haja vista que cada bactéria tem um perfil bioquímico único (SOUZA, 2020). O Quadro 10 apresenta um resumo dos principais meios de cultura utilizados no crescimento bacteriano e na realização das provas bioquímicas. Quadro 10 - Principais meios de cultura utilizados na bacteriologia clínica Meio de cultura Utilização Aspectos dos meios de cultura Ágar MacConkey Isolamento de bactérias gram- negativas - Diferenciação da gram-negativas fermentadoras de lactose das não fermentadoras - Identificação de enterobactérias Fermentadora e não fermentadora de lactose, respectivamente. Fonte: shutr.bz/3VIZ6Jh Ágar-chocolate Isolamento de microrganismos fastidiosos, como N. gonorrhoeae, N. meningitidis, Haemophilus spp e Moraxella spp Fonte: shutr.bz/3VIZ6Jh Ágar SS Inibição das bactérias gram-positivas - Diferenciação das gram negativas fermentadoras de lactose das não fermentadoras - Isolamento e diferenciação de Salmonella e Shigella A – E. coli B – Shigella C – Salmonella Fonte: shutr.bz/3VIZ6Jh 44 Ágar citrato Simmons - Diferenciação de espécies de enterobactérias que utilizam o citrato como única fonte de carbono para obter energia das que precisam de outras fontes Citrato + e citrato –, respectivamente Ágar triplo açúcar Ferro (TSI) Diferenciação dos bacilos gram-negativos - Fermentação dos carboidratos (glicose, lactose e sacarose) - Produção de CO2 e H2 S Vários resultados do ágar TS Fonte: shutr.bz/3VIZ6Jh Descarboxilação de lisina e ornitina Identificação das enterobactérias - Verificação da descarboxilação da lisina ou da ornitina - Utilização de Caldo Base de Moeller, ou os dos meios MIO (motilidade, indol, ornitina) ou MILi (motilidade, indol, lisina) ou LIA (lisina, H2 S) Descarboxilação + Fonte: shutr.bz/3VIZ6Jh Ágar de Christensen Diferenciação das bactérias produtoras da enzima urease das não produtoras Urease + e urease –, respectivamente Fonte: shutr.bz/3VIZ6Jh Fonte: Adaptado de SOUZA, 2020. 45 As provas bioquímicas podem ser manuais, sendo as reações feitas em tubos de ensaio que contêm meios de cultura específicos, ou podem ser automatizadas, como os equipamentos ATB Expression®, MiniApi® e Vitek® (todos BioMérieux), os quais fornecem resultados mais rápidos. Aqui, ganharão destaque os métodos bioquímicos manuais mais comuns utilizados na bacteriologia clínica, uma vez que os princípios bioquímicos são os mesmos dos testes automatizados (TRABULSI; ALTERTHUM, 2008). 7.2.1 Prova da catalase Essa prova é utilizada na diferenciação entre estreptococos (catalase negativas) e estafilococos (catalase positivas). A enzima catalase decompõe o peróxido de hidrogênio (água oxigenada) em água. Em uma lâmina microscópica, deve-se fazer um esfregaço com as colônias bacterianas e aplicar água oxigenada. Caso o resultado seja positivo (estafilococos), há liberação de oxigênio e formação de bolhas (SOUZA, 2020). 7.2.2 Prova da coagulase Utilizada para diferenciar a Staphylococcus aureus (coagulase positiva) de outras espécies de estafilococos (coagulase negativas). A S. aureus contém uma enzima coagulase em sua parede celular, que coagula o fibrinogênio do plasma, convertendo-o em fibrina. Essa prova pode ser realizada em lâmina (adiciona-se a colônia emulsionada em solução salina na lâmina, em seguida, coloca-se uma gota de plasma e se aguarda o período de 10 s) ou em tubo de ensaio (incuba-se por uma noite a colônia suspeita em tubo de ensaio contendo BHI (caldo infusão cérebro coração, do inglês brain heart infusion broth) e plasma, depois é incubado a 35ºC por 4 h), sendo o resultado positivo para S. aureus se houver formação de coágulo (SOUZA, 2020). 46 7.2.3 Teste da novobiocina Prova utilizada para diferenciar a bactéria Staphylococcus saprophyticus de outros estafilococos coagulase negativos. A S. saprophyticus é resistente ao antibiótico novobiocina, enquanto os outros estafilococos coagulase negativos são sensíveis. O teste de resistência é feito ao adicionar um disco de papel impregnado com 5 µg de novobiocina em placa de Petri contendo ágar Mueller Hinton. Halos de 6 a 12 mm são resistentes (positivo para S. saprophyticus), enquanto halos de 16 mm ou mais são sensíveis (SOUZA, 2020). 7.2.4 Teste da bacitracina Teste presuntivo para identificação de estreptococos β-hemolíticos do grupo A (S. pyogenes),já que estes são sensíveis ao antibiótico bacitracina, enquanto os estreptococos β-hemolíticos do grupo B (S. agalactiae) são resistentes. O teste de sensibilidade é feito ao adicionar um disco de papel impregnado com 0,04 U de bacitracina em placa de Petri contendo ágar-sangue e então é verificado o tamanho do halo (SOUZA, 2020). 7.2.5 Teste da optoquina Teste utilizado para a diferenciação presuntiva entre Streptococcus pneumoniae e outros estreptococos α-hemolíticos, já que a optoquina inibe o crescimento da S. pneumoniae (i. e., é sensível à optoquina). O teste de sensibilidade é feito ao colocar um disco de papel impregnado com 5 µg de optoquina em placa de Petri contendo ágar-sangue. Em seguida, verifica-se o tamanho do halo (halos maiores que 14 mm identificam S. pneumoniae (SOUZA, 2020). 7.2.6 Ágar bile-esculina O ágar bile-esculina é um meio sólido inclinado ou em placa utilizado na identificação presuntiva de Streptococcus do grupo D (S. bovis e S. equinus) e de espécies de Enterococcus bile-esculina positivas (p. ex., E. faecalis). Essas bactérias 47 são capazes de hidrolisar a esculina (um derivado da cumarina glicosídica) em presença de sais biliares, formando a esculetina, que reagem com íons férricos do meio de modo a formar um complexo preto. Assim, os resultados positivos são pretos, enquanto os resultados negativos permanecem com a coloração original do meio (amarelo acinzentado) (SOUZA, 2020). 7.2.7 Ágar citrato Simmons O ágar citrato Simmons é um meio sólido inclinado ou em placa utilizado na diferenciação de espécies de enterobactérias. O teste se baseia na capacidade de algumas espécies de enterobactérias utilizarem o citrato como única fonte de carbono para a obtenção de energia. O ágar é originalmente verde e permanece dessa cor em caso de bactérias citrato-negativo (p. ex., E. coli), mas muda para a cor azul em caso de bactéria citrato-positivo (p. ex., Enterobacter e Klebsiella) (SOUZA, 2020). 7.2.8 Produção de sulfeto de hidrogênio (H2S) Este teste é baseado na capacidade de algumas bactérias de gerar H2S a partir de aminoácidos ou compostos contendo enxofre. Meios de cultura usam sais de sulfeto contendo metais pesados, geralmente ferro. A formação positiva de H2S produz cor preta no meio (BROOKS et al. 2014). 7.2.3 Fermentação de carboidratos Os testes de fermentação de carboidratos são baseados na capacidade que algumas bactérias têm de produzir metabólitos ácidos a partir de carboidratos (p. ex., glicose, lactose, sacarose, manitol, xilol, arabinose, entre outros) em situações de anaerobiose (via fermentativa ou oxidativa). Com a formação de ácidos orgânicos, há uma diminuição do pH, o que pode mudar a coloração dos meios por intermédio de indicadores de pH (SOUZA, 2020). 48 7.2.4 Descarboxilação de lisina e ornitina É um teste no qual se utiliza o caldo base de Moeller, que é usado principalmente para identificar bactérias intestinais. Este teste demonstra que algumas bactérias descarboxilam o aminoácido lisina (por exemplo, Klebsiella pneumoniae e Enterobacter aerogenes) e ornitina (por exemplo, Enterobacter cloacae e Serratia marcescens) em meios anaeróbicos (alcalinos). Com base na capacidade de formar compostos de amina (alcalinos) cadaverina e putrescina respectivamente. Um indicador de pH de bromocresol violeta é usado e a cor original do meio é violeta. São usados dois tubos de reação. Um é um tubo de controle (sem aminoácidos) e o outro é um tubo com aminoácidos. A descarboxilação é positiva se o tubo de controle ficar amarelo e o tubo de aminoácidos ficar roxo, e negativo se ambos os tubos permanecerem roxos (SOUZA, 2020). 7.2.5 Produção de indol Este teste é baseado no fato de que algumas bactérias possuem a enzima triptofanase. A triptofanase metaboliza o aminoácido triptofano para produzir indol (benzopirrol), ácido pirúvico e amônia. Para isso, use caldo de triptona (rico em triptofano) e adicione o reagente p-dimetilaminobenzaldeído (reagente Kovacs ou Ehrlich). Uma vez que o indol é formado, ele reage com reagentes Kovacs ou Ehrlich para formar uma cor vermelha semelhante a um anel na superfície (BROOKS et al. 2014; TRABULSI; ALTERTHUM, 2008). 7.2.6 Teste de motilidade Um teste realizado em um meio semi-sólido para ver se as bactérias são móveis. A inoculação deve ser feita fazendo furos no meio semi-sólido. Se a motilidade for positiva, as bactérias da linha de inóculo difundem-se no meio, deixando um meio turvo. No entanto, quando a motilidade é negativa, o meio permanece límpido e o crescimento bacteriano concentra-se na linha de inóculo (SOUZA, 2020). 49 7.2.7 Fenilalanina desaminase Teste utilizado na identificação das espécies Proteus, Morganella e Providencia, pois, somente essas espécies, entre as enterobactérias, têm a enzima fenilalanina desaminase, que converte a fenilalanina em ácido fenilpirúvico. Utiliza-se, então, o Ágar Fenilalanina (meio sólido inclinado) e, caso haja a formação do ácido fenilpirúvico (resultado positivo), a superfície do meio (originalmente amarela) adquire uma coloração verde escura (BRASIL, 2004; TRABULSI; ALTERTHUM, 2008). 7.2.8 Prova de oxidase Este teste baseia-se na detecção da enzima citocromo oxidase C presente em várias espécies bacterianas e pode ser realizado em tiras de papel filtro impregnadas com corante cloridrato de p-fenilenodiamina. Se a bactéria for oxidase positiva (presença de citocromo oxidase), a reação ficará roxa, mas se for negativa, o papel não mudará de cor (o reagente permanece transparente) (BRASIL, 2004; TRABULSI; ALTERTHUM, 2008). 7.2. 9 Prova de urease Um teste que distingue entre bactérias produtoras de urease (como Proteus vulgaris) e bactérias não produtoras de urease (como E. coli) usando ágar de Christensen (meio sólido inclinado). A urease hidrolisa a ureia em amônia e dióxido de carbono. A amônia é uma substância alcalina e, portanto, aumenta o pH dos meios que contêm indicadores de pH. Neste caso, o meio originalmente amarelo torna-se rosa. Resultados positivos fracos têm uma área central rosa e o restante permanece amarelo (BRASIL, 2004; TRABULSI; ALTERTHUM, 2008). 7.3 Técnicas de semeadura Semeadura são técnicas que servem para inocular o microrganismo nos meios de cultura. A técnica adequada deve ser escolhida de acordo com o tipo de meio (sólido, semissólido ou líquido), o tipo de recipiente que contém o meio de cultura 50 (placa de Petri ou tubo), se o meio em tubo é inclinado ou não e que tipo de análise se deseja fazer (isolamento de cultura ou quantificação bacteriana) (HÖFLING; GONÇALVES, 2008). Além dos meios de cultura, são necessárias alças (extremidade em forma de 0) ou fios (extremidade reta) de platina (também podem ser utilizadas alças plásticas descartáveis e estéreis), os quais são utilizados para os inóculos nos meios de cultura, e bico de Bunsen, que serve para esterilização por calor. Antes de iniciar o procedimento de semeadura, é necessário realizar algumas etapas de assepsia para evitar a contaminação da amostra (SOUZA, 2020): 1. flambar a alça/fio de platina com a chama do bico de Bunsen (essa etapa é eliminada caso sejam utilizadas alças descartáveis estéreis). 2. abrir os recipientes (tubos de ensaio ou placas de Petri) perto da chama. Se for utilizado tubo de ensaio, manter a tampa (ou bucha de algodão) na mão durante a inoculação (nunca colocar na bancada, pois contamina). Caso seja utilizada a placa de Petri, deve-se deixar a parte externa da tampa encostada na bancada. 3. passar a boca do tubo de ensaio na chama para esterilizar (etapa não realizada se o recipiente for placa de Petri). 4. resfriar a alça/fio de platina na parte interna do recipiente antes de encostar na amostra. 5. fazero inóculo no recipiente de acordo com a técnica de semeadura apropriada. 6. aquecer novamente o tubo de ensaio na chama (não se aplica para placa de Petri) e flambar a alça/fio de platina (se for alça descartável, flambar e colocar no lixo). 7. fechar o tubo de ensaio ou a placa de Petri. (SOUZA, 2020). 7.3.1 Semeadura em meio líquido Nessa técnica, utiliza-se uma alça bacteriológica para se transferir uma amostra de cultura líquida ou sólida para um meio líquido (p. ex., transferência para o BHI). Em seguida, agita-se delicadamente a alça no meio líquido transferido para homogeneização. É possível observar o crescimento de colônias por intermédio da turvação do meio, da formação de película ou de depósito (HÖFLING; GONÇALVES, 2008). 51 7.3.2 Semeadura em meio sólido inclinado ou em placa Técnica de esgotamento simples feita em meio sólido inclinado (p.ex., ágar nutriente, ágar citrato Simmons, ágar bile-esculina) ou em placas. É feito um movimento em estria (zigue-zague) com a alça bacteriológica na superfície do meio. Essa técnica é utilizada na estocagem das bactérias, em provas bioquímicas que utilizam meio sólido inclinado e na avaliação de crescimento bacteriano (exceção: o meio sólido inclinado TSI deve ser semeado com fio de platina por picagem até o fundo do tubo e depois é estriada a superfície) (BRASIL, 2004a; HÖFLING; GONÇALVES, 2008). 7.3.3 Semeadura em meio semissólido em tubo (picagem profunda) Técnica utilizada em meio semissólido (p. ex., meios SIM, MIO e MILi) em tubo para verificar a motilidade da bactéria. Com um fio de platina, é feita uma picada no centro do meio até 2/3 da altura do tubo (HÖFLING; GONÇALVES, 2008). Semeadura em meio sólido em placa (semeadura por esgotamento). Também chamada de técnica Streak, a técnica de semeadura por esgotamento é utilizada para a obtenção de culturas puras (isolamento de colônias) em placas de Petri contendo meio sólido. Primeiro, deposita-se o material em um ponto da superfície do meio com alça bacteriológica, depois, distende-se em movimento de estrias com o auxílio da alça, rotaciona-se e, por fim, repete-se o processo em mais dois ou três setores da placa, sem recarregar a alça com o material, de maneira que o número de bactérias diminua e apareçam colônias isoladas (Figura 04) (SOUZA, 2020). Figura 04 - Semeadura por esgotamento Fonte: TORTORA; FUNKE e CASE, 2017. 52 Essa técnica é utilizada para obter colônias bacterianas puras e isoladas em placa de Petri que contenha meio sólido. As setas indicam a direção do esgotamento. 7.3.4 Semeadura em profundidade (pour-plate) Técnica de semeadura em placa utilizada para obter colônias isoladas ou para realizar a contagem do crescimento bacteriano em placa (número de colônias). É necessário preparar uma suspensão que contenha as células bacterianas e misturar com o ágar fundido, após, coloca-se nas placas de Petri e então se espera que solidifique. Assim, as bactérias são imobilizadas no ágar e crescem em colônias isoladas (BROOKS et al. 2014; HÖFLING; GONÇALVES, 2008). 7.3.5 Semeadura para quantificação Técnica utilizada para fazer a quantificação do crescimento bacteriano em placa. Faz-se uma única estria em toda a superfície do ágar com uma alça bacteriológica calibrada (é feita uma semeadura de quantidade conhecida) e em seguida um estriamento (lembra o osso de um peixe, por isso também é conhecida como semeadura estria de peixe) (Figura 05). Essa técnica permite quantificar as unidades formadoras de colônia por mL (UFC/mL), já que as colônias bacterianas ficam dispersas, o que facilita a contagem (SOUZA, 2020). Figura 05 - Semeadura para quantificação Fonte: shutr.bz/3eKdArF Técnica utilizada para a contagem do crescimento bacteriano em placa. 53 8 ESTAFILOCOCOS Fonte: glo.bo/2Zlu2WD Estafilococos são bactérias gram-positivas aeróbias. Algumas espécies estão presentes na microbiota normal da pele e das mucosas dos seres humanos, e não provocam nenhum efeito patogênico ao organismo. Porém, em algumas ocasiões, estas ou outras espécies podem causar no indivíduo supuração, abscessos, infecções piogênicas e até a morte por septicemia. Pelo menos 40 espécies de bactérias compõem o gênero Staphylococcus spp. Destas, três apresentam grande relevância clínica: Staphylococcus aureus, Staphylococcus epidermidis e Staphylococcus saprophyticus. Neste capítulo, você vai ter uma visão geral do gênero Staphylococcus spp e das suas principais espécies de importância clínica. Você aprenderá também sobre as principais características morfológicas desse gênero bacteriano. Por último, estudará os testes disponíveis no laboratório de bacteriologia para a sua caracterização e identificação. 8.1 Identificação de estafilococos Durante a identificação preliminar, é possível diferenciar estafilococos de estreptococos e identificar as diferentes morfologias entre esses dois agentes em meio líquido. Nesse momento, pode-se ver uma cadeia normalmente longa de estreptococos, ou cocos aos pares ou em cachos de uva nos estafilococos. O método 54 de escolha para esse procedimento é a coloração de Gram, que é um corante diferencial amplamente utilizado na bacteriologia. Com esse protocolo, é possível diferenciar as bactérias em gram-positivas, com coloração roxo-violeta, e as gram- negativas, com cor-de-rosa. Essa diferenciação no aspecto das células analisadas em microscopia ocorre em função da diferença na estrutura da parede bacteriana. Após o uso do corante cristal violeta, que confere uma coloração roxa, o tratamento com etanol descora as células gram-negativas, mas não as gram-positivas. A razão para esse fenômeno é a grande quantidade de proteoglicanos. Em seguida, é utilizado um corante de contraste como a safranina e, a partir disso, os dois tipos de células podem ser distinguidos por suas diferentes cores (MADIGAN et al. 2016). A Figura 06. Ilustra o processo de diferenciação por cores desses microrganismos. Figura 06 - Coloração diferencial de células para observação microscópica Fonte: MADIGAN et al. 2016. 55 Com relação à cultura, os estafilococos podem crescer na maioria dos meios de cultivo em condições aeróbias ou microaerofílicas. Em inoculação primária em placa de ágar sangue de carneiro e incubada em 5% de tensão de CO², as colônias de estafilococos são geralmente maiores, convexas, de coloração variando de branco- porcelana a amarelo, podendo apresentar hemólise ou não. Figura 07 - Colônias de Staphylococcus aureus em placa ágar sangue após incubação de 24 horas: as colônias são envolvidas por β-hemólise. Fonte: BROOKS et al. 2014. Culturas de estafilococos coagulase-negativos normalmente produzem colônias brancas e não hemolíticas, sendo diferenciados com base na sensibilidade ao antibiótico novobiocina, ao qual o S. epidermidis é sensível e o S. saprophyticus é resistente. Para a família Microccocacea, que engloba o gênero Staphylococcus, a prova da catalase é geralmente positiva; já para a família Streptococcacea, como os estreptococos, ela é negativa. Dessa forma, a enzima catalase que converte o peróxido de hidrogênio em água e oxigênio é produzida por estafilococos. O teste é realizado com uma gota de peróxido de hidrogênio a 3% em uma pequena quantidade de crescimento bacteriano sobre uma lâmina. A presença de bolhas indica positivo para catalase. Um importante teste na identificação dos estafilococos de maior importância clínica é o teste da coagulase. O 56 plasma de coelho com EDTA é misturado com partes iguais de caldo de cultura ou crescimento de colônias em ágar, sendo incubado a 37 °C. Se houver a formação de coágulos de uma a quatro horas após a incubação, o resultado do teste é positivo. A coagulase é uma enzima que provoca coagulação do plasma porativação do fator plasmático à protrombina, formando trombina. A trombina (uma serina protease) converte o fibrinogênio em coágulo de fibrina. O S. aureus é considerado coagulase-positivos, enquanto o S. epidermidis e o S. saprophyticus são coagulase-negativos (BROOKS et al. 2014). Outro teste utilizado na identificação de estafilococos é chamado de DNAse. Essa prova permite verificar se a bactéria apresenta a enzima desoxiribonuclease, a qual degrada o ácido nucleico (DNA). O teste da DNAse é feito com a inoculação de colônias em meio contendo DNA (DNAse test ágar), obtido comercialmente. Os Staphylococcus aureus são identificados pela formação de halo cor-de-rosa, indicando DNAase-positivos. O crescimento sem formação de halo cor-de-rosa identifica Staphylococcus DNAse-negativos (epidermidis e saprophyticus). O S. aureus é conhecido por fermentar o manitol, diferentemente dos Staphylococcus coagulase-negativos. Esse teste é útil em casos de amostras biológicas contaminadas com microbiota mista, como urina, secreções, feridas e exsudatos. Essas amostras podem ser cultivadas em meio que contenha NaCl a 7,5% sal inibe a maior parte da microbiota normal, com exceção do S. aureus. Portanto, de forma a isolar o S. aureus, utiliza-se ágar com manitol hipertônico ou um meio cromogênico disponível comercialmente. A degradação do manitol com a produção de ácido muda a cor do meio de rosado para amarelo. Como os S. aureus normalmente fermentam o manitol, as colônias são maiores e rodeadas de uma zona amarela. Para distinguir entre o S. epidermidis e o S. saprophyticus, realiza-se o teste de sensibilidade à novobiocina. A amostra é semeada de maneira semelhante ao antibiograma em placa de Muller Hinton com a adição de um disco teste de novobiocina contendo 5 μg. As amostras resistentes exibem zonas de inibição de 6 a 12 mm, enquanto as suscetíveis apresentam halos de 16 mm ou mais. As cepas de S. saprophyticus são resistentes, ao passo que as de S. epidermidis são sensíveis (CORRÊA, 2020). 57 9 ENTEROBACTÉRIAS Fonte: bit.ly/3DcSAmM A família Enterobacteriaceae inclui uma variedade de espécies bacterianas de importância medicinal. Essas espécies representam mais de 70% dos isolados bacterianos em testes laboratoriais de rotina e são responsáveis por uma ampla variedade de infecções, incluindo gastroenterite, bacteremia, infecções do trato urinário, infecções de feridas e meningite, principalmente em ambiente hospitalar (HOLANDA, 2017). Membros desta família são as principais causas de infecções oportunistas (incluindo septicemias, pneumonia, meningite e infecções do trato urinário). Exemplos do gênero que causa infecções oportunistas são: Citrobacte Enterobacter Escherichia, Hafnia, Morganella Providencia e Serratia. A seleção de terapia por antibiótico é complexa devido à diversidade de organismos (FOX, 2009). A infecção urinária (“ascendente”) mais comumente adquirida de forma comunitária é causada por E. coli. A grande maioria das infecções do trato urinário é ascendente, frequentemente de contaminação fecal. Proteus é outra causa comum de infecção do trato urinário; os organismos produzem uma urease que degrada oreia produzindo uma urina alcalina. 58 9.1 Isolamento O primeiro passo na identificação de enterobactérias patogênicas é a semeadura de amostras em meios seletivos e diferencial. Os meios mais utilizados para essa finalidade são: ágar Eosina Azul de Metileno (ágar EMB, também chamado de ágar Teague), ágar McConkey, ágar Salmonella-Shigella (ágar SS), ágar Xilose- Lisina-Desoxicolato (XLD) e o ágar entérico Hektoen (HE) (HOLANDA, 2017). 59 9.2 Cocos Gram-positivos Isolamento: Cocos Gram-positivos são exemplos de bactérias comumente isoladas de amostras clínicas. Por esta razão, meios como ágar sangue ou ágar manitol salgado (se houver suspeita de S. aureus) são frequentemente usados para a semeadura primária de amostras, dependendo do estado clínico do paciente (HOLANDA, 2017). 60 61 10 UROCULTURA Fonte: bit.ly/3eN44UQ Infecções do trato urinário (ITUs) são síndromes infecciosas que acometem tanto homens como mulheres, desde o recém-nascido até o idoso. Elas ocorrem devido à ascensão da microbiota entérica normal da uretra para a bexiga. As mulheres são mais afetadas por conta das condições anatômicas, haja vista que têm a uretra mais curta e próxima à flora retal em comparação aos homens (LEVINSON, 2016). O diagnóstico das ITUs é realizado por meio de avaliação clínica e solicitação de exames, como cultura de urina ou urocultura, e exame qualitativo de urina, ou exame simples de urina. A urocultura é o padrão ouro para a avaliação da infecção e direciona a terapia antimicrobiana adequada. O meio de escolha para semeadura de amostras de urina é o ágar CLED (Cystine Lactose Electrolyte Deficient). Uma vez que este meio não contém eletrólitos, não se forma a névoa característica das amostras de Proteus sp. O CLED tem o tom original azul claro (esverdeado). Neste meio, as colônias positivas para lactose são amareladas e as colônias negativas para lactose são azuis. Uma das principais características relevantes para a análise microbiológica da urina é a forma de semeadura, que deve ser feita quantitativamente em uma alça calibrada (HOLANDA, 2017). Neste capítulo, você vai diferenciar a microbiota comensal dos potenciais patógenos do sistema urinário, comparar a infecção por contaminação fecal em 62 relação à transmissão sexual e identificar os métodos diagnósticos em urocultura e a sua associação com o exame qualitativo de urina. 10.1 Microbiota comensal dos potenciais patógenos do sistema urinário As ITUs são síndromes infecciosas que afetam pacientes da comunidade e pacientes hospitalares, sendo a principal infecção de diagnóstico no laboratório de bacteriologia. De acordo com Tortora (2017), sua manifestação clínica é classificada da seguinte maneira: • uretrite — infecção da uretra; • cistite — infecção da bexiga; • ureterite — infecção dos ureteres; • pielonefrite — infecção dos rins; Os microrganismos responsáveis pelo processo de infecção são encontrados na urina. Essa infecção ocorre pelo contato com a flora residente da pele. No ambiente hospitalar, é possível desatacar as infecções ocasionadas pela realização de procedimentos invasivos, como cateteres urinários, por exemplo. Na comunidade, a infecção está relacionada, basicamente, à anatomia humana. As bactérias intestinais são as principais responsáveis pelas ITUs devido à proximidade com a flora retal. Isoladas de Escherichia coli, elas são prevalentes no diagnóstico das infecções (TORTORA, 2017). Os microrganismos entéricos atingem a bexiga por meio da ascensão pelo canal da uretra. As mulheres são mais atingidas pelas infecções, por ter o canal da uretra mais curto, a vagina também é colonizada por espécies de Lactobacillus e microrganismos entéricos, como a E. coli. Uma vez que as bactérias penetram na bexiga, elas são capazes de se reproduzir e desencadear uma resposta inflamatória, resultando nos sintomas da infecção (LEVINSON, 2016). A pele e as mucosas são habitadas por microrganismos que vivem em uma reação saudável com o hospedeiro, sendo responsáveis pela defesa inicial a diferentes patógenos. Há uma grande variedade de microrganismos e estes podem ser detectados no exame de cultura de urina, porém, a sua quantificação deve ser avaliada. A uretra, local pelo qual a urina é excretada, tem alguns microrganismos que podem aparecer no exame de urina. Esses microrganismos são detectados em baixa 63 contagem bacteriana, em número de 102 a 104 de unidades formadoras de colônias (UFCs)/mL. Considera-se infecção quando são detectadas colônias bacterianas iguais ou superiores a 105 UFC/mL (XAVIER; DORA; BARROS,2016). Figura 08 - Sistema urinário masculino Fonte: bit.ly/3eN44UQ Os microrganismos da flora vaginal também podem ser identificados e a correlação com o exame qualitativo de urina indicando infecção deve ser realizada. Figura 09 - Sistema urinário feminino Fonte: bit.ly/3eN44UQ 64 10.2 Infecção por contaminação fecal: transmissão sexual A cistite é a infecção mais comum, levando à inflamação da bexiga. O quadro clínico é característico de dor ao urinar, emergência miccional e até mesmo de quadros repetitivos após o tratamento. Já a pielonefrite é uma infecção grave que pode levar a infecções sistêmicas. Nesse caso, o paciente relata dor e febre. Casos de bacteriúrias assintomáticas também são observados e podem estar relacionados à idade do indivíduo. Em idosos, observa-se essa classificação devido a condições anatômicas (LEVINSON, 2016). Neisseria gonorrhoeae e Chlamydia trachomatis são classificadas como doenças sexualmente transmissíveis e causam quadros de infecção do trato urinário. N. gonorrhoeae é um diplococo gram-negativo, com oxidase positiva, e seu habitat é o trato genital humano, sendo que a sua transmissão ocorre por contato sexual. Na infecção, liga-se às células mucosas da parede epitelial, desencadeando uma inflamação. Em homens, a infecção é mais prevalente e gera um prurido forte e muita secreção. O diagnóstico é realizado por exame direto em microscopia ou semeadura da urina em meios específicos, como ágar-Thayer Martin, por exemplo (LEVINSON, 2016; TORTORA, 2017). Chlamydia trachomatis é um parasita intracelular com habitat no trato genital humano. A sua transmissão também ocorre via contato sexual. Esse caso é relatado com maior frequência em mulheres, porém, são necessários exames específicos para a realização do diagnóstico. São observadas estruturas na coloração de Giemsa ou marcadas com anticorpos fluorescentes. Algumas técnicas de biologia molecular são amplamente empregadas, como a reação da cadeia de polimerase (PCR). Tais diagnósticos são importantes para o manejo clínico e o tratamento adequado (LEVINSON, 2016; TORTORA, 2017). 65 Quadro 11 - Meios de cultivo utilizados na semeadura das urinas Fonte: TORTORA, 2017. 10.3 Métodos diagnósticos em urocultura e sua associação com exame qualitativo de urina As Enterobactérias são a causa mais comum de ITU. A maioria dos episódios é causada pela bactéria Escherichia coli e, em segundo lugar, pela Klebsiella pneumoniae, sendo ambas bacilos gram-negativos. Os patógenos gram-positivos também são responsáveis pelos episódios, entre eles, o Staphylococcus saprophyticus, que acomete principalmente mulheres e crianças, e bactérias Enterococcus spp. Espécies de Candida também são identificadas em pacientes com uso discriminado de antibióticos ou pacientes hospitalares submetidos a procedimentos invasivos (LEVINSON, 2016). Para o diagnóstico das infecções do trato genital, são solicitados o exame qualitativo de urina e a urocultura com teste, dessa forma, avaliam-se as características da urina e a ausência/presença do agente infeccioso. Tais exames devem ser solicitados a partir da mesma amostra de urina para a correlação e a avaliação dos resultados (TORTORA, 2017). O exame qualitativo de urina de rotina inclui a avaliação de características físicas, como cor, e características químicas, incluindo pH, proteínas, glicose, cetonas, sangue, bilirrubina, nitrito, esterase leucocitária e urobilinogênio. O exame é realizado manualmente por uma tira ou fita comercial que consiste em mensurações qualitativas (positivo ou negativo) ou semi-quantitativas (p. ex., traços a 4+) (BALZAN, 2019). 66 A análise é rápida e de baixo custo, devendo ser realizada com cuidado, pois a interpretação depende do analista responsável pelo exame. Métodos automatizados já são disponibilizados em grandes centros laboratoriais, mas demandam custo e uma rotina de grande porte. A análise manual da fita é realizada em dois minutos, sendo que as cores geradas em cada campo reagente variam de acordo com a concentração do analito presente. O exame ainda consiste na avaliação do sedimento urinário, no qual se observam estruturas microscópicas, como eritrócitos, leucócitos e outros patógenos (p. ex., brotamento de levedura e Trichomonas vaginalis). O exame de urina realizado por laboratórios utiliza a metodologia de uma tira reagente. Ele inclui mensurações qualitativas (positivo ou negativo) ou semi- quantitativas (p. ex., traços a 4+) das características citadas acima. O exame de urina ainda contém a análise do sedimento urinário, no qual a amostra é centrifugada a 2.000 rpm (rotações por minuto) por cerca de cinco minutos. A análise do sedimento é realizada em microscópico no aumento de 100× e, após, para quantificação em aumento de 400× (BALZAN, 2019). Cristais, bactérias e parasitas podem ser relatados como presentes e raros, sendo alguns moderados ou frequentes. Nos casos de ITU, observa-se a presença de nitrito positivo na leitura da tira e números aumentados de leucócitos na análise do sedimento (MUNDT; SHANAHAN, 2012 apud BALZAN, 2019). A cultura de urina, ou urocultura, é um exame que identifica o microrganismo causador da infecção urinária. Após a identificação, é realizado o teste de sensibilidade aos antimicrobianos para orientação da terapia antimicrobiana (XAVIER; DORA; BARROS, 2016). O teste de sensibilidade aos antimicrobianos é conhecido como antibiograma. O método mais realizado é a técnica de disco difusão, ou teste de Kirby-Bauer. Realiza-se, então, o meio ágar-Mueller-Hinton, no qual a suspensão bacteriana, que consiste na bactéria isolada com solução salina em escala de 0,5 MacFarland, é estriada para, em seguida, ser realizada a dispensação dos discos de antimicrobianos (BALZAN, 2019). Trata-se de antimicrobianos difundidos em discos de papel com a concentração adequada para testes in vitro. Após, a placa é incubada em estufa bacteriológica em temperatura de 35 ± 2°C, e a leitura dos halos é realizada no período de 24 h. O diâmetro dos halos é lido em milímetros com régua comum e mais tarde é interpretado 67 por padronizações internacionais. Nessa avaliação, serão encontrados alguns dados, como sensível, resistente e intermediário, e é analisada a ação do antimicrobiano. Esse teste é importante para a correta indicação da antibioticoterapia, o que evita o uso disseminado de antibióticos de amplo espectro. A resistência bacteriana já é um problema de saúde mundial. Popularmente, são conhecidas como as superbactérias, microrganismos resistentes a múltiplas classes de antimicrobianos, limitando, dessa forma, as opções de terapia (BALZAN, 2019). 11 HEMOCULTURA Fonte: bit.ly/3EWvQZD O sangue circulante, em indivíduos sadios, normalmente se encontra estéril. Embora alguns microrganismos que compõem a microbiota respiratória ou gastrintestinal possam atingir o sangue, estes são rapidamente eliminados pelo sistema reticuloendotelial (YOKOMIZO, 2019). O termo bacteremia significa a presença de bactérias na corrente sanguínea. A presença de organismos viáveis em uma amostra de sangue é clinicamente importante, pois este é um local essencialmente estéril. A identificação de patógenos associados à bacteremia pode fazer uma diferença crucial no manejo terapêutico e, portanto, no desenvolvimento clínico e prognóstico do paciente. Por isso, desde o 68 momento da investigação até a divulgação do relatório, deve-se ter o cuidado de publicar resultados rápidos e confiáveis. Figura 10 - Etapas da sepse Fonte: YOKOMIZO, 2019. A hemocultura, metodologia que emprega a cultura de uma amostra de sangue em meios específicos, representa uma das ferramentas diagnósticas mais utilizadas em casos de suspeita de bacteremia ou sepse por ser de fácil execução e por fornecer informaçõesaltamente relevantes nesses casos. Por intermédio da hemocultura, é possível identificar a presença de patógenos viáveis no sangue, o que é de grande importância diagnóstica, já que estes podem causar sepse e são responsáveis por uma alta taxa de mortalidade (YOKOMIZO, 2019). A hemocultura se torna mais importante em casos graves, nos quais o paciente apresenta febre persistente, mas sem acusar infecção em outros exames microbiológicos. Dos pacientes que chegam ao grau de sepse grave, 30 a 50% apresentam resultados positivos de hemocultura (YOKOMIZO, 2019). A coleta de hemoculturas não é realizada em todos os quadros infecciosos. Nos casos das infecções bacterianas mais comuns, por exemplo, não é indicada a coleta de hemoculturas, pois a positividade dos exames é baixa, gerando apenas aumento nos custos do tratamento e nenhum tipo de retorno. Para infecções como sinusites, amigdalites, infecções de pele e tecido subcutâneo, indica-se o tratamento 69 com administração dos antibióticos descritos na literatura e empiricamente eficazes contra os agentes etiológicos. A coleta de sangue para hemocultura é indicada nos seguintes casos (YOKOMIZO, 2019): • suspeita de endocardite; • suspeita de sepse ou bacteremia; • infecções hospitalares (antes ou após a troca de esquema de tratamento por antibióticos); • febre com origem desconhecida; • infecções em pacientes imunodeprimidos; • meningites (em conjunto com a coleta de líquor — líquido cefalorraquidiano —, que é mais importante que a hemocultura nesses casos); • pneumonias graves 11.1 Procedimentos e técnicas de hemocultura Os materiais e equipamentos básicos para realizar a coleta do sangue são segundo Yokomizo (2019): • seringas hipodérmicas descartáveis estéreis; • gaze estéril; • frascos de coleta para armazenar o sangue; • agulhas hipodérmicas descartáveis estéreis e cateteres borboleta; • álcool 70% (pode ser iodado ou não); • estufa bacteriológica. Alguns procedimentos são padrão para a rotina de coleta de sangue: Realizar a coleta de sangue antes de iniciar qualquer terapia antimicrobiana; Deve-se coletar o periférico, que é imediatamente transferido para os frascos de hemocultura para evitar/mitigar a contaminação do sangue; Manipular as amostras com extrema cautela, pois estão potencialmente contaminadas e podem causar graves doenças infectocontagiosas; Para descartar as amostras, estas devem ser primeiramente autoclavadas. Fonte: YOKOMIZO, 2019. 70 Os princípios da técnica são simples (YOKOMIZO, 2019): O frasco de hemocultura contendo amostra de sangue é incubado na temperatura de 35 a 37°C por até sete dias (14 dias para casos de suspeita de endocardite); Se houver crescimento no frasco, observado pela turvação e pelo aumento do volume, o material é repicado em placas de petri que contenham diferentes tipos de meio de cultura, os quais variam de acordo com o agente etiológico; Na triagem, identifica-se o agente etiológico e se determina seu perfil de acordo com a resposta a antibióticos e outros fármacos. Cada punção realizada em adultos é, geralmente, dividida em dois frascos: um frasco para hemocultura de agentes aeróbios, como Neisseria spp. ou Pseudomonas spp., e um frasco para agentes anaeróbios (enterobactérias ou estafilococos, que são anaeróbios facultativos) (YOKOMIZO, 2019). Nas crianças, esses volumes mudam em função do peso e da volemia (quantidade de sangue circulante) Fonte: Adaptado de ARAUJO, 2012. Para realizar a leitura/diagnóstico da hemocultura manual, segue-se um protocolo de sete dias de incubação dos frascos, com agitação/inversão periódica destes, sendo essa agitação um fator essencial para obter resultados positivos. Durante esses sete dias, realizam-se subcultivos em placas e tanto os frascos quanto esses subcultivos ficam mantidos a 35 ± 2°C (YOKOMIZO, 2019). 71 11.2 Método de lise-centrifugação Esse sistema foi considerado o padrão-ouro para hemoculturas durante muitos anos. Ele foi desenvolvido pelos laboratórios Wampole™ (sistema Isolator®) e é constituído de tubo a vácuo para sangue pediátrico ou adulto. O tubo contém uma substância hemolítica para leucócitos e hemácias, causando, portanto, a liberação de microrganismos intracelulares. Depois disso, os tubos são centrifugados e é desprezado o sobrenadante. O pellet formado, que possivelmente contém o agente etiológico, é então utilizado para semear algum meio em placa de cultura, incluindo- se meios para Legionella, micobactérias e fungos (ARAUJO, 2012). 11.3 Método semiautomatizado Nos sistemas semiautomatizados, os frascos de cultura são constituídos de uma parte para laminocultivo com duas faces, que ficam acoplados à parte superior de um recipiente plástico que contém TSB suplementado com extrato de levedura e SPS, sendo possível acrescentar outras substâncias com a finalidade de neutralizar agentes antimicrobianos. O laminocultivo contêm diversos meios, como ágar Sabouraud, ágar MacConkey e ágar-chocolate. Os frascos inferiores que ficam acoplados ao laminocultivo são alocados em estufa específica que verte os caldos periodicamente sobre o laminocultivo por inversão (YOKOMIZO, 2019). No frasco, há também um indicador colorimétrico de CO2 que acusa a positividade da cultura. Outros exames, como a identificação etiológica, o antibiograma e a bacterioscopia, são realizados retirando colônias desenvolvidas diretamente no laminocultivo, sem a necessidade de subcultivo (ARAUJO, 2012). 11.4 Método automatizado A hemocultura automatizada requer um equipamento específico para a incubação e a inversão dos frascos. Existem diversos equipamentos automatizados no mercado, e as principais vantagens desse tipo de hemocultura, quando comparada ao método manual, dizem respeito à velocidade de obtenção de resultados e à menor necessidade de trabalho laboratorial técnico (YOKOMIZO, 2019). 72 Grande parte dos protocolos recomenda cinco dias de incubação, no entanto, os resultados positivos são obtidos, majoritariamente, nas primeiras 48h de cultivo. Na maioria dos equipamentos automatizados, as metodologias têm como princípio tecnológico a detecção fluorimétrica ou colorimétrica. Existem outras diversas vantagens e benefícios ao usar essa metodologia, tais como (YOKOMIZO, 2019): • Monitoramento contínuo (leituras intervaladas em minutos); • Maior sensibilidade e rapidez para detecção da positividade da amostra (agitação); • Possibilidade de criação de um banco de dados contendo informações dos patógenos isolados e a sua localização demográfica; • Mitigação do risco de contaminação; • Amostras negativas não são repicadas; • Economia de tempo (resultados mais rápidos) e de insumos; • Risco de contaminação durante a manipulação praticamente inexistente; • Como são usados frascos de plástico, estes são mais leves e oferecem menor risco associado a acidentes. 11.5 Cultura de ponta de cateter A etiologia das infecções da corrente sanguínea é multifatorial e pode resultar da contaminação do fluido de infusão, da conexão do cateter com a linha de infusão, do local da punção e/ou colonização endógena do cateter. De preferência, as hemoculturas não devem ser coletadas de cateteres, exceto para diagnosticar infecções relacionadas a cateteres (HOLANDA, 2017). Segundo Holanda (2017) as infecções relacionadas ao acesso vascular são de grande importância clínica. A infecção do cateter pode ser suspeitada em pacientes hospitalizados que apresentam sinais de infecção, mas não têm foco de infecção. Os tipos de cateteres nos quais as culturas podem ser realizadas são: central, periférico, arterial, Swan-Ganz e Hickman. A cultura semiquantitativa da superfície do cateter (método Maki) é o método mais comumente usado para determinar a relação entre a colonização do cateter ea infecção. Assim como na inserção de um cateter, deve-se ter cuidado ao removê-lo. A pele circundante deve ser cuidadosamente limpa com uma solução de iodo (PVPI) 73 e decapada com álcool etílico a 70%. Deve-se cortar assepticamente a porção distal de aproximadamente 5 cm (que é inserida na pele do paciente) com tesoura estéril, colocando em um frasco seco e deixando em temperatura ambiente (20-25 °C) por não mais que 1 hora ou até 12 horas, se refrigerado (HOLANDA, 2017). 12 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACUMEDIA. Ágar eosina azul metileno holt: eosin methylene blue agar. PI7134, rev. 3, 2011. AMERICAN ACADEMY OF FAMILY PHYSICIANS. Lab classifications. [S. l.], 2020. ARAUJO, M. R. E. Hemocultura: recomendações de coleta, processamento e interpretação dos resultados. Journal of Infection Control, v. 1, n. 1, p. 8−19, 2012. AYRES, L. S. Laboratório Clínico. Sagah, 2020. BALZAN, L. L. R. Bacteriologia Clínica. Sagah, 2019. BARROS, E.; MACHADO, A.; SPRINZ, E. (org.). Antimicrobianos. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2013. BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Descrição dos meios de cultura empregados nos exames microbiológicos: módulo IV. Brasília, DF, 2004. BRASIL. 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