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Prevaricação: Crime de Funcionário Público

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Prevaricação 
Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente 
31-08-2022 
BASE LEGAL 
Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, 
indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo 
contra disposição expressa de lei, para 
satisfazer interesse ou sentimento pessoal: 
Pena - detenção, de três meses a um ano, e 
multa. 
 
CONSIDERAÇÕES GERAIS 
É um crime de pequeno potencial ofensivo. 
Não existe nenhum tipo de vantagem 
indevida 
Esse crime ocorre quando o funcionário 
público não cumpre com suas obrigações 
funcionais (deveres de ofício). 
O funcionário publico é movido por um 
sentimento, motivo ou interesse pessoal. É 
endógeno (vem de dentro). 
Existem vários sentimentos que fazem parte, 
como, o ódio, raiva, amor, compaixão. Esse 
componente afetivo do crime brota do 
funcionário público. 
 
EVOLUÇÃO HISTÓRICA 
Nasceu no direito romano, por meio do delito 
de “prae varicato” (significa andar fora da 
linha). Esse crime tratava-se da situação que 
o funcionário público desviada da sua função 
por alguns motivos. 
Na idade média, era um crime de 
infidelidade de cargo, considerado grave. 
Era uma ofensa ao rei e à igreja. 
No Brasil, não havia uma divisão clara entre 
responsabilidade administrativa e penal, 
então tínhamos apenas um delito de 
infidelidade de cargo. Com o CP de 1940, 
surgiu a prevaricação. 
 
 
1 Crime de mão própria é aquele que somente pode ser 
praticado pela própria pessoa, por si mesma. 
BEM JURÍDICO TUTELADO 
Trata-se da regularidade da administração 
pública, sendo que os funcionários públicos 
devem exercer seus deveres funcionais, de 
modo eficiente. 
Inclusive, o art. 37, da CF, estabelece o 
princípio da eficiência administrativa. 
 
CONCEITO 
“Consiste na conduta típica em que o 
funcionário público, indevidamente, retarda 
ou não pratica ato de ofício, ou ainda, 
pratica esse ato contra expressa disposição 
legal, com a finalidade de satisfazer um 
interesse próprio ou um sentimento pessoal.” 
 
SUJEITO ATIVO E PASSIVO 
Quanto ao sujeito ativo, temos o funcionário 
público (crime próprio). No entanto, há uma 
corrente eu diz que este crime não é tão 
somente próprio, e sim de mão própria1 – que 
nenhuma outra pessoa pode praticar no 
lugar do agente. Por exemplo, somente será 
crime quando o funcionário público tiver 
atribuição para aquela função. 
Ademais, admite-se a participação de 
terceiros (não precisam ser funcionários 
públicos) na prevaricação, na hipótese de 
que esses terceiros apesar de não poderem 
executar ato de ofício, podem induzir o 
funcionário pulico a produzir um interesse ou 
sentimento pessoal. O terceiro não realiza um 
pedido (se tiver é crime de corrupção passiva 
privilegiada), mas ele contribui para que 
nasça o sentimento ou interesse no 
funcionário público. 
Por exemplo, o delegado no plantão que irá 
lavrar flagrante de rapaz que estava 
vendendo drogas e é filho de seu amigo. Ele 
pode tomar a decisão de relaxar o flagrante 
por um sentimento pessoal (piedade, 
compaixão). Caso faça isso sozinho, comete 
prevaricação. Mas, se foi induzido pela 
Prevaricação 
Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente 
esposa, por exemplo, de modo que criou esse 
sentimento, ela contribuiu para o crime e será 
partícipe. Mas, se ela pedir para soltar o 
rapaz, será corrupção passiva e se o 
delegado atende esse pedido, temos o art. 
317, parágrafo segundo (corrupção passiva 
privilegiada). 
Já em relação ao sujeito passivo, temos o 
Estado. Mas, podemos ter uma situação que 
a prevaricação pode prejudicar o cidadão 
(vítima secundária). 
Por exemplo, “A’ e “B” passaram no concurso, 
em primeiro e segundo lugar, 
respectivamente. “B” trabalhava no cartório, 
retardou a prática do ato de assinatura de 
certidões que “A” precisava disponibilizar 
para empossar ao cargo. “B” por inveja 
tomou tal conduta. 
 
TIPO OBJETIVO 
A) Condutas nucleares: 
✓ Retardar. Neste caso, existe a prática 
do ato, porem, de modo atrasado – 
visa-se procrastinar (enrolar). Há uma 
omissão injusta, calcada em motivos 
pessoais. 
 
✓ Deixar de praticar. O gesto negativo 
está caracterizado. É uma omissão, 
não fez o ato. Há uma omissão injusta, 
calcada em motivos pessoais. 
 
✓ Praticar contra disposição expressa em 
lei. O agente executa um ato, mas ao 
praticar o ato, contrariou a lei. Temos 
aqui, uma norma penal em branco2 – 
deve-se saber que lei é essa. 
 
Por exemplo, na compra e venda de 
veículo, existe o doc. De transferência 
de veiculo, reconhecido firma no 
cartório de notas. Se por amizade, o 
tabelião reconhece a firma para o 
amigo, cometerá esse crime. 
 
Não existe prevaricação em atos 
discricionários, pois nesses atos o 
 
2 A norma penal em branco é aquela que ao tipificar o crime, 
no seu corpo, traz preceito genérico, indeterminado e 
incompleto. 
funcionário púbico tem liberdade. Ex. 
prefeito possui uma verba e poderá 
decidir onde aplicá-la. 
 
Trata-se de um tipo misto alternativo3. 
 
B) Prevaricação e ato de ofício 
O funcionário publico deverá ter 
competência funcional, que advém de lei, 
estatuto ou natureza do cargo, para o ato de 
ofício. Apenas assim haverá prevaricação! 
Salvo, se houver questões ligadas a 
participação. 
O ato de ofício é aquele que é inerente a sua 
função, ou seja, está obrigado a praticar. 
Ex. O policial é obrigado a efetuar prisão e 
flagrante; juiz é obrigado a produzir sentença 
daquele processo que lhe foi designado. 
Inclusive, somente teremos prevaricação 
dentro da função pública, diferentemente de 
concussão e corrupção passiva. Portanto, 
não há prevaricação antes de assumir a 
função ou estiver afastado desta. 
➔ ADPF 881 
Se discute as circunstâncias ligadas aos 
membros do MP e Magistrados, em que se 
aborda a independência funcional. Há uma 
liminar que entende que não há 
prevaricação porque possuem 
independência funcional e liberdade para 
interpretar de acordo com seus 
conhecimentos jurídicos. 
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No caso de “praticar contra disposição 
expressa em lei”, o ato que gera 
prevaricação deverá contrariar uma lei 
expressa. Se previsto em outro dispositivo, 
senão a lei, não cometerá prevaricação. 
Existem dispositivos normativos que parecem 
ser lei mas não são. Por exemplo, portarias, 
editais normativos, resoluções, provimentos 
(parece lei!). A lei é produto do poder 
legislativo. 
3 Crime que possui mais de um núcleo do tipo, sendo que 
penas um deles é capaz de consumar o crime. A prática de 
miais de um deles, configura crime único. 
Prevaricação 
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Neste sentido, vamos analisar a seguinte 
situação: o funcionário público adora a 
cozinha ou copa de estabelecimento 
público. É baixada uma ordem de serviço 
proibindo ficar na cozinha a qualquer tempo, 
sendo permitido apenas em horários 
estabelecidos. Neste caso, se o funcionário 
público contraria tal ordem por preguiça, vai 
fora do horário na copa, pratica então ato 
contra uma ordem interna. Não há 
prevaricação nessa situação porque não 
contrariou lei. 
 
TIPICIDADE SUBJETIVA 
O elemento subjetivo do tipo é o dolo – 
vontade livre e consciente. É dolo específico, 
porque o agente busca satisfazer o interesse 
ou sentimento pessoal. 
O interesse é aquilo que sob o aspecto 
subjetivo, o agente entende ser importante, 
vantajoso, digno de atenção. Este interesse 
beneficia o agente de qualquer modo, 
inclusive financeiro e econômico. 
Confunde-se esse interesse financeiro e 
econômico com o crime de corrupção. Mas, 
a doutrina e jurisprudência entende que pode 
existir esse interesse financeiro e econômico 
na prevaricação, de modo indireto. 
Por exemplo, quando alguém instala uma 
empresa é necessário ter alvará de 
funcionamento. O secretario de vigilância 
sanitária precisa liberar o funcionamento da 
empresa nesse alvará. Este funcionário porinteresse econômico e financeiro não 
expediu a documentação necessária, 
porque a sua esposa explorava a mesma 
área empresarial da referida empresa, 
portanto, seria concorrente direto. 
Já o sentimento pessoal é aquele estado 
afetivo que leva o indivíduo a tomar uma 
atitude que pode beneficiar ou prejudicar 
alguém. O funcionário público é conduzido 
por um estado emocional. 
Por exemplo, funcionário público ira realizar o 
despejo de uma favela, mas movido pelo 
sentimento de piedade, não faz (Caso 
Tratorista Amilton – não derrubou as casinhas 
da favela). 
O MP ao denunciar o funcionário público por 
prevaricação, na denúncia, deve descrever 
qual é o sentimento ou interesse pessoal. 
Mesmo o sentimento sendo nobre, existirá o 
crime de prevaricação. Mas, isso influenciará 
na fixação da pena no momento de 
dosimetria. 
Outra questão muito discutida refere-se ao 
sentimento de preguiça do funcionário 
público, há o entendimento que pode 
caracterizar prevaricação, até porque o 
funcionário precisa ser eficiente. Mas, o 
posicionamento predominante entende que 
a preguiça não é um sentimento e sim uma 
inação física. Mas, de qualquer forma, a 
preguiça caracteriza improbidade 
administrativa. 
Ademais, aquele que trata mal o cidadão 
pode estar praticando prevaricação. 
 
CONSUMAÇÃO E TENTATIVA 
É um crime formal. Consuma-se com o 
retardamento, omissão ou pratica do ato 
contra lei, independentemente da satisfação 
do interesse ou sentimento do agente. 
Os comportamentos podem ser omissivos 
(não fazer) e comissivos (por ação). 
Nas atitudes omissivas não se admite 
tentativa, mas nas atitudes comissivas admite-
se tentativa. 
 
DISTINÇÃO NORMATIVA 
O crime de desobediência (rt. 330, CP) é 
muito similar a prevaricação, pode ou não ser 
praticado pelo funcionário público. A 
segunda diferença consiste no fato de que o 
funcionário público que comete 
desobediência, esta envolve o recebimento 
de uma ordem de um superior, em que não 
está relacionada com as suas atribuições 
funcionais. 
Prevaricação 
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Para ser prevaricação, precisa estar no rol de 
atividade do funcionário público – atribuição 
funcional. 
Deve-se também diferenciarmos 
prevaricação e condescendência criminosa. 
A condescendência está prevista no art. 320, 
na essência é uma prevaricação. Neste 
crime, há uma situação em que o funcionário 
público deixa de fazer algo por motivo 
pessoal, sendo necessário um sentimento de 
indulgencia (perdão), assim o superior 
hierárquico não pune administrativamente 
por sentimento de perdão. 
No caso de o funcionário está no mesmo grau 
hierárquico ou abaixo, deve comunicar ao 
superior algo de errado que está 
acontecendo, mas se não comunicar será 
tipificado esse crime também. 
 
FIGURA EQUIPARADA: prevaricação 
imprópria ou penitenciária 
Art. 319-A. Deixar o Diretor de Penitenciária 
e/ou agente público, de cumprir seu dever 
de vedar ao preso o acesso a aparelho 
telefônico, de rádio ou similar, que permita a 
comunicação com outros presos ou com o 
ambiente externo: (Incluído pela Lei nº 
11.466, de 2007). 
Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) 
ano. 
Nesta figura equiparada, se o diretor de 
penitenciária ou agente público (policial 
penal) se deparar com telefone celular e não 
faz nada, responderá por esse artigo. 
Neste caso, o dolo não é específico e sim 
genérico. 
Mas, se o preso avisar o guarda e lhe oferecer 
propina, não será o art. 319-A. Haverá 
corrupção ativa por parte do preso e 
corrupção passiva pelo guarda. 
Já a visita que entra com o celular 
escondido, responderá pelo crime de 
favorecimento real penitenciário (art. 349-A) 
 
 
AÇÃO PENAL E ASPETOS FINAIS 
A ação penal é pública incondicionada. 
Crime de pequeno potencial ofensivo, cabe 
transação penal, sursis. 
OBS. Pena aumenta se exercer cargo de 
chefia.

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