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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO INSTITUTO DE SAÚDE E SOCIEDADE CAMPUS BAIXADA SANTISTA BÁRBARA DE PAULA O MODELO TRANSTEÓRICO COMO FERRAMENTA DE INTERVENÇÃO PARA A MUDANÇA DO COMPORTAMENTO ALIMENTAR DE ADULTOS COM SOBREPESO E OBESIDADE Santos 2021 BÁRBARA DE PAULA O MODELO TRANSTEÓRICO COMO FERRAMENTA DE INTERVENÇÃO PARA A MUDANÇA DO COMPORTAMENTO ALIMENTAR DE ADULTOS COM SOBREPESO E OBESIDADE Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) apresentado em monografia, como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Nutrição pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Campus Baixada Santista. Orientadora: Profa. Dra. Danielle Arisa Caranti Santos 2021 RESUMO O presente estudo tem como foco principal verificar os benefícios da aplicação do modelo transteórico na mudança do comportamento alimentar. Para este trabalho foi utilizado dados reais de indivíduos adultos com sobrepeso e obesidade que participaram do programa de intervenção interdisciplinar, oferecido pelo Grupo de Estudos da Obesidade (GEO) - UNIFESP, com intervenção multidisciplinar durante 32 semanas no ano de 2014. Foram analisadas as mudanças na composição corporal, medidas antropométricas, mudanças de estágios do modelo transteórico, bem como mudanças no comportamento alimentar antes e após a intervenção. Os resultados apresentados foram satisfatórios, uma vez que a terapia multidisciplinar alterou positivamente a composição corporal dos participantes, resultando em redução significativa no IMC (-6,9%; P < 0.05), circunferência de cintura (-5,5%; P < 0.05), circunferência de quadril (-4,0%; P < 0.05) e circunferência de pescoço (-4,1%; P < 0.05). Não houve mudança significativa no percentual de gordura e de massa livre de gordura, apesar de terem reduzido. A maioria dos participantes já iniciou a terapia no estágio de ação e manutenção. No entanto, ao final do estudo houve aumento expressivo da quantidade de participantes que encontraram-se no estágio de manutenção, indicando efeito positivo da terapia com a aplicação do modelo transteórico. Além disso, na pesquisa sobre os hábitos alimentares feita antes e após o programa, as respostas dos participantes sofreram alterações significativas quanto às mudanças que os mesmos estavam fazendo ou pretendiam fazer, os fatores que influenciam nas escolhas da alimentação e suas dificuldades para comer de forma mais saudável. Palavras-chave: Comportamento alimentar. Modelo transteórico. Obesidade. Nutrição. SUMÁRIO 1. Referencial teórico 6 1.1. Panorama e etiologia da obesidade 6 1.2. Padrão alimentar da população brasileira 6 1.3. O ambiente obesogênico como fator determinante da obesidade 6 1.4. Medidas de prevenção e controle da obesidade no Brasil 7 1.5. Comportamento alimentar 8 1.5.1. Mudança do comportamento alimentar 8 1.6. Modelo transteórico e estágios de mudança de comportamento 9 1.6.1. Estágios de prontidão para mudança 10 2. Materiais e métodos 14 2.1. Delineamento, protocolo e população do estudo 14 2.1.1. Avaliações e exames 14 2.2. Aplicação de questionários 15 2.3. Terapia interdisciplinar 15 2.4. Análise estatística 15 3. Resultados e discussão 16 4. Conclusão 20 5. Referências Bibliográficas 21 1. Referencial teórico 1.1. Panorama e etiologia da obesidade A obesidade, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), é definida como uma doença crônica de etiologia multifatorial, caracterizada pelo acúmulo anormal ou excessivo de gordura, somado a um processo inflamatório de baixo grau, que pode trazer prejuízos à saúde. A OMS utiliza o Índice de Massa Corporal (IMC) para classificar o sobrepeso e a obesidade, sendo estes referidos por valor maior ou igual a 25 kg/m² para o sobrepeso e maior ou igual a 30 kg/m² para a obesidade. Segundo Blüher, (2019), a obesidade alcançou dimensões pandêmicas nos últimos anos. No Brasil, a obesidade vem crescendo a cada ano e, segundo dados do VIGITEL de 2019, cerca de 55,4% da população encontra-se com excesso de peso, e cerca de 20,3% são obesos (BRASIL, 2019). De acordo com o relatório público da SISVAN de 2020, 34,9% dos adultos encontram-se em estado nutricional de sobrepeso e 32% em estado nutricional de obesidade (BRASIL, 2020b). 1.2. Padrão alimentar da população brasileira A alta ingestão de alimentos ultraprocessados causa impactos negativos na qualidade da alimentação da população brasileira, uma vez que diminui os teores de fibras e de potássio da dieta e, em contrapartida, aumenta os teores de gordura saturada, de açúcar, de gordura trans, bem como aumenta a densidade energética, elevando o risco de ganho excessivo de peso (LOUZADA et al., 2015). Na Pesquisa de Orçamento Familiar, o consumo de alimentos ultraprocessados pela população brasileira equivale a um quinto da energia ingerida, apesar da redução do consumo de refrigerantes. Entretanto, verificou-se o aumento do consumo diário de açúcar de adição, bem como a redução do consumo de frutas e hortaliças, podendo estar associado à ingestão abaixo das necessidades para micronutrientes como cálcio, vitamina E e vitamina D (IBGE, 2020). Estes fatos levam à diversas implicações complexas a nível individual, social e socioeconômico, afetando a qualidade de vida da população, visto que o sobrepeso e a obesidade são os principais fatores de risco para o desenvolvimento de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) como Diabetes Mellitus Tipo 2, doenças cardiovasculares, hipertensão, acidente vascular cerebral e algumas formas de câncer, além da redução da expectativa de vida -correspondendo a 74% das mortes prematuras por DCNT (WHO, 2000; BRASIL, 2020a). Ademais, o Sistema Único de Saúde (SUS) tem um custo substancial com os tratamentos de doenças relacionadas com a obesidade e sobrepeso, somando um total de R$ 1,39 bilhão em 2018, custos estes atribuíveis à hospitalizações, gastos ambulatoriais e medicamentos (BRASIL, 2005; NILSON et al., 2020). 1.3.O ambiente obesogênico como fator determinante da obesidade Sabe-se que a obesidade, sendo uma doença multifatorial, tem como um de seus predisponentes o ambiente obesogênico, onde o ganho de peso é facilitado por fatores como o ambiente familiar e seus hábitos, a transição nutricional, com aumento demasiado no consumo de fast foods pela população e diminuição no consumo de alimentos minimamente processados, bem como do comportamento sedentário (REBORI et al., 2010; SWINBURG et al., 1999). Blanco, M. et al. verificou, em um estudo caso-controle com crianças obesas e eutróficas com idade entre 8 a 12 anos e suas respectivas mães, que a falta de atividade física, o comportamento sedentário das mães, e a convivência num ambiente obesogênico da família com relação à atividade física são fatores que influenciam o ganho de peso e, além disso, a construção de hábitos (alimentares e da prática ou não de atividades físicas) dessas crianças, podendo gerar impactos para a vida adulta. Ver televisão, assistir às aulas, andar de carro, trabalhar ou estudar à mesa, o uso do computador e a permanência em posição sentada para a prática de jogos de computador, são exemplos de atividades com baixo dispêndio energético e a exposição longa à estes comportamentos sedentários está associada a um maior risco de mortalidade por doenças cardiovasculares (AMORIM; FARIA, 2012). 1.4. Medidas de prevenção e controle da obesidade no Brasil Considerando esse preocupante cenário, medidas de prevenção e controle da obesidade e suas comorbidades foram implementadas no Brasil. Em 2014 foi lançado, pelo Ministério da Saúde, o Guia Alimentar para a População Brasileira, com o objetivo de orientar os profissionais de saúde e a população quanto às políticas públicas de alimentação e nutrição, bem como na promoção de uma alimentação saudável (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). Além disso, o governo brasileiro implementou estratégias importantes para o enfrentamento da obesidade e suas comorbidades, como a Política Nacional de Alimentação e Nutrição, possuindo dentre suas diretrizes a Promoção da Alimentação Adequada e Saudável (PAAS), que objetiva proporcionar a realização de práticas alimentares adequadas aos indivíduos e coletividades através do incentivo, apoio, proteção e promoção da saúde (BRASIL, 2013). O Ministério da Saúde lançou também o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) com metas e ações propostas para o período de 2011 a 2022. Foram definidas diretrizes em três eixos estruturantes para alcance das suas metas: a) vigilância, informação, avaliação e monitoramento; b) promoção da saúde; c) cuidado integral (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2011). Mediante o exposto, o papel do governo no enfrentamento das DCNT no Brasil é a articulação e coordenação de intervenções estratégicas sobre os determinantes de saúde e doença - população, comunidade, organização, família ou indivíduo, a fim de alcançar as metas e ações propostas para a melhoria da saúde da sociedade brasileira (DUNCAN et al., 2012). 1.5. Comportamento alimentar O comportamento alimentar é um elemento importante na construção de hábitos alimentares e, portanto, tem grande influência no desenvolvimento da obesidade. É determinado por diversos aspectos, que incluem os nutricionais, demográficos, econômicos, sociais, culturais, ambientais e psicológicos de um indivíduo ou de uma coletividade (ROSSI et al., 2008). Além disso, outras características demográficas como sexo, estado civil, etnia e escolaridade são consideradas determinantes do consumo alimentar (TORAL; SLATER, 2007). Havas et al. (1998) e Trudeau et al. (1998) demonstraram em seus estudos que a escolaridade e o nível educacional são preditores importantes no consumo de frutas e hortaliças tanto de homens como de mulheres adultas. Quanto aos aspectos econômicos, cabe salientar que a pobreza, o subemprego e a falta de acesso à alimentação adequada e saudável são determinantes para o aumento do consumo de produtos industrializados e, consequentemente, aumento da obesidade, considerando que estes alimentos têm preços mais acessíveis, são altamente palatáveis, com alta densidade energética e baixo valor nutricional (FERREIRA; PEREIRA, 2018; WILK, 2018). Paralelamente, Drewnowski e Specter (2004) corroboram com isso, mostrando em seu estudo que dietas saudáveis com o maior consumo de hortaliças, frutas, grãos e cereais integrais são mais caras quando comparadas às dietas ricas em alimentos gordurosos e doces - características do padrão ocidental. Somado a isso, evidenciam que os preços dos alimentos influenciam as escolhas alimentares dos consumidores, bem como de uma dieta saudável. Segundo o IBGE (2020), o consumo de alimentos preparados e misturas industriais é 688% maior entre as classes de menor rendimento total familiar, comparado ao consumo das classes de maior rendimento total familiar. Toral e Slater (2007) afirmam que, dentre os fatores psicológicos, o descontentamento do indivíduo com o peso e a imagem corporal pode acarretar na prática de restrições alimentares, influenciando diretamente o comportamento alimentar individual ou de uma coletividade. Perante o exposto, nota-se a interação entre as dimensões cognitivas e emocionais, bem como sua influência no comportamento alimentar e suas possíveis mudanças (TORAL; SLATER, 2007). 1.5.1. Mudança do comportamento alimentar A mudança de comportamento tem papel importante na promoção de hábitos saudáveis e na aderência aos tratamentos. Além disso, deve-se considerar também que uma série de fatores determina as escolhas alimentares e, portanto, compreender, avaliar e discutir como os indivíduos encaram a comida, o sabor, o prazer, as consequências da ingestão alimentar e em que se baseiam suas escolhas é fundamental para que as ações de promoção de práticas alimentares adequadas e saudáveis sejam bem sucedidas e, consequentemente, a efetividade de intervenções nutricionais possa aumentar (ALVARENGA; TARAGANO, 2019; NI MHURCHU, 1997). A educação nutricional exerce um papel importante no processo da mudança de comportamentosalimentares, visto que conduz e capacita indivíduos e grupos na estruturação de novos conhecimentos, orientando-os a uma prática de comportamentos de prevenção e de promoção da saúde consciente (TORRES et al., 2003). Um estudo de Zuccolotto e Pessa (2018) analisou a intervenção de um programa de educação alimentar e nutricional através de um programa multiprofissional em grupo envolvendo adultos com excesso de peso e, ao final do projeto, pôde-se observar mudanças no perfil antropométrico dos participantes, bem como de hábitos alimentares -tendo como exemplo o aumento do consumo de água e alimentos mais saudáveis. Diante disso, mostra-se que a educação alimentar e nutricional é uma estratégia efetiva para situações de excesso de peso. A motivação é caracterizada pelo processo de impulsionar o indivíduo a agir, e é fundamental para a mudança de seus padrões alimentares (TORAL; SLATER, 2007). Desse modo, podemos citar as motivações intrínseca e extrínseca para uma mudança de comportamento. A intrínseca é aquela que surge a partir das metas, desejos e necessidades do indivíduo, a fim de alcançar uma recompensa interna. O desejo de prevenir doenças, ter uma boa saúde ou perder peso são exemplos de motivações internas. Em contrapartida, a motivação extrínseca é gerada por fatores externos e estes podem atuar positiva ou negativamente nesta motivação. O suporte familiar, o prazer e as orientações médicas para o tratamento de uma doença são exemplos de motivação extrínseca. A efetivação da mudança do comportamento alimentar pode ser estimulada ou prejudicada de acordo com os tipos de motivação (ASSIS; NAHAS, 1999). Em contrapartida, a adesão de práticas alimentares mais saudáveis - dietas ricas em fibras, frutas e hortaliças e pobres em gorduras -, foi observada apenas com motivação intrínseca (TRUDEAU et al., 1998). Assim, o estímulo de hábitos alimentares saudáveis por esse tipo de motivação deve estar entre as estratégias de intervenção nutricional (TORAL; SLATER, 2007). A inclusão do treinamento profissional para a aprendizagem de habilidades técnicas que impulsione os indivíduos no sentido esperado, assim como utilizar e integrar modelos teóricos para planejar essas ações é de extrema importância para os programas de intervenção nutricional que têm como objetivo a mudança do comportamento alimentar (ASSIS; NAHAS, 1999). As teorias são ferramentas que possibilitam um melhor entendimento sobre diversos comportamentos em saúde e, a partir disso, sugerir formas de proporcionar mudanças nos mesmos (CONTENTO, IR., 2008). 1.6. Modelo transteórico e estágios de mudança de comportamento Na Psicologia, diversos modelos teóricos são estudados com foco na promoção de hábitos saudáveis, prevenção de doenças e na aderência aos tratamentos (CAVALCANTI et al., 2005). O modelo transteórico foi desenvolvido por James Prochaska e Carlos Di Clemente, a partir de uma análise comparativa das principais teorias da psicoterapia e da mudança de comportamento mediante estudos com tabagistas (PROCHASKA; VELICER, 1997; 2005). A partir da observação de que muitos fumantes deixavam o vício sem apoio de psicoterapia, enquanto outros apenas obtinham êxito com esse tratamento, surgiu a hipótese -posteriormente confirmada- de que haviam princípios básicos capazes de explicar a estrutura da mudança de comportamento que acontecia na assistência ou não de psicoterapia. Em vista disso, o modelo transteórico tem sido utilizado a outros comportamentos além do tabagismo, como uso de drogas, álcool, pŕatica de atividade física, realização de mamografia, modo de exposição ao sol, entre outras situações (PROCHASKA et al., 1992). A teoria deste modelo é frequentemente denominada como modelo de estágios de mudança de comportamento, pois as alterações no comportamento relacionadas à saúde ocorrem por meio de cinco estágios distintos: pré-contemplação, contemplação, decisão, ação e manutenção (ALVARENGA; TARAGANO, 2019). Cada estágio representa em qual momento o indivíduo se encontra no processo de mudança de determinado comportamento, podendo ser o abuso de álcool e abuso de substâncias, ansiedade, prevenção de AIDS, distúrbios alimentares e obesidade, dentre outros (PROCHASKA; VELICER, 1997). No âmbito alimentar, a identificação dos diferentes estágios de mudança de comportamento possibilita o desenvolvimento de estratégias de intervenção nutricional mais assertivas, viabilizando a adesão da população às práticas alimentares saudáveis, bem como promove uma qualidade de vida duradoura (TORAL; SLATER, 2007). 1.6.1. Estágios de prontidão para mudança As fases de mudança percorrem pelos cinco estágios previamente mencionados e as passagens entre elas acontecem a partir da intenção, atitude e comportamento do indivíduo, considerando, ainda, os aspectos temporal e motivacional para mudança (PROCHASKA; VELICER, 1997). O aconselhamento nutricional viabiliza a construção dos conhecimentos sobre alimentação e hábitos saudáveis. Entretanto, é necessária a sensibilização e reconhecimento dos indivíduos sobre seus padrões alimentares e suas condições de saúde para que, a partir disso, seja possível a promoção da mudança destes comportamentos e, consequentemente, mudanças positivas nos hábitos alimentares e da qualidade de vida (ZUCCOLOTTO; PESSA, 2018). Por conseguinte, a identificação de cada estágio de mudança é fundamental para o direcionamento dos profissionais quanto às intervenções realizadas com os participantes em programas de perda de peso (CATTAI et al, 2010). A Tabela 1 resume os estágios, seus significados e estratégias possíveis em relação ao comportamento do indivíduo de acordo com o estágio de prontidão em que se encontra. Tabela 1- Estágios de mudança, seus significados e estratégias. Estágio de mudança Significado Estratégia de ação Pré-contemplação Não está pronto para mudar, negação sobre a necessidade de mudar. Pode ser resistente/defensivo para reconhecer ou modificar seus comportamentos e minimizar o Estabelecer vínculo, envolver e acolher. Evitar confrontos. Avaliar e estimular a motivação (intrínseca e extrínseca). Incentivar maior consciência sobre adecisão de mudar. problema. Ampliar o foco. Aumentar a percepção do paciente sobre os riscos e problemas do comportamento atual. Contemplação Sabe que precisa fazer mudanças, mas tem sentimentos ambivalentes sobre como mudar. Identificar os problemas, começar a pensar em pequenas metas, empoderamento, encorajamento. Reduzir os “contras” da mudança. Aconselhamento baseado nas vantagens e desvantagens de mudar e no encorajamento. Conectar os pacientes com seus pontos positivos, explorar as melhores experiências com mudanças no passado. Encorajar a pensar na pessoa que quer ser. Decisão Paciente expressa o desejo de mudar no período próximo e está comprometido/decidido e confiante com essa mudança (“cliente ideal”). Construir e reforçar a autoeficácia do paciente. Estruturar um plano para mudança, considerar adequação, viabilidade e dificuldades do planejamento, explorar dificuldades em assumir novos comportamentos. Oferecer ajuda para que a pessoa encontre uma estratégia de mudança ou um objetivo que seja aceitável, apropriado e realizável - proporcionar treino e assistência, administrar expectativas. Identificar passos e habilidades necessárias para mudança gradual; discutir situações que podem ser problemáticas Ação Tem alterações de comportamento - de entusiasmo e mudança. Requer mais comprometimento do paciente para colocar em ação o Prática do plano de ação e compromisso de mudança: assistir, reforçar, encorajar, trabalhar a solução de problemas. Fonte: DUNKER et al., 2019. É importante ressaltar que os estágios de mudança de comportamento não seguem necessariamente uma sequência linear e estática, o que nos permite observar que durante o processo é comum idas e vindas, tornando-o como uma espiral dinâmica. Recaídas são comuns de ocorrer, dado que indivíduos em ação não mantêm suas técnicas por longo período na primeira tentativa, reclassificando-os em estágios anteriores (PROCHASKA et al., 1992; TORAL; SLATER, 2007). A Figura 1 ilustra como ocorre o movimento dos indivíduos pelos estágios de mudança. que planejou (pode ter impulso de voltar a antigos comportamentos). Provocar uma mudança na área do problema. Se necessário, revisar o planejamento. Consolidar ganhos e aumentar a autoeficácia. Ter plano de enfrentamento para os momentos difíceis; estabelecer rede de suporte e compartilhar suas mudanças com os outros, planos de continuidade, suporte e fortalecimento, criar novos desafios. Manutenção Mantém as mudanças por tempo considerável. Evitar recaídas e consolidar ganhos obtidos durante a fase de ação. Reforçar o novo comportamento. Esclarecer que lapsos e recaídas são normais, reforçar os benefícios e conquistas, manter o desafio, não julgar (especialmente na recaída - identificar o que o fez retomar os comportamentos de risco). Propor um plano de seguimento, suporte e fortalecimento. Explorar estratégias de superação. Figura 1 - Modelo em Espiral dos Estágios de Mudança. Fonte: Extraído de PROCHASKA et al., 1992 A classificação de cada indivíduo nos estágios de mudança é feita através de um algoritmo, um questionário que possui um número determinado de perguntas mutuamente excludentes. Foi observado em estudos que, ainda que houveram diferenças entre os algoritmos aplicados, o consumo maior de frutas, hortaliças e fibras e menor de gordura foi preditivo para a classificação dos indivíduos em estágios mais avançados (GLANZ et al., 1994; LING; HORWATH, 2000). A aplicação do modelo transteórico na mudança de comportamento alimentar é complexa e possui limitações, visto que no tratamento de tabagismo é preconizado o abandono do vício, enquanto que na alimentação não existe a eliminação da prática alimentar. Portanto, na intervenção nutricional, a alimentação do indivíduo deve ser mantida, porém, modificada, a fim de torná-la mais saudável e adequada (TORAL; SLATER, 2007). O fato de o modelo ter sido projetado visando à interpretação e intervenção acerca do comportamento de indivíduos é outro entrave importante na aplicação deste em intervenções de educação nutricional para coletividades. No entanto, pesquisas de intervenção realizadas em grupos populacionais embasadas no modelo transteórico têm evidenciado resultados satisfatórios (FRENN et al., 2003; NI MHURCHU, 1997). Toral e Slater (2007) observam que as intervenções nutricionais tradicionais têm se mostrado insustentáveis na maioria das situações, visto que subentendem que todos os indivíduos estão preparados para a ação, em outras palavras, para uma mudança em seu comportamento alimentar. Portanto, acredita-se que levar em consideração os diferentes estágios de mudança comportamental nos programas de educação nutricional pode ser benéfico para um indivíduo ou coletividade, uma vez que para cada estágio convém diferentes percepções e atitudes perante a nutrição e a saúde. Por conseguinte, a construção de intervenções para cada indivíduo inserido em cada estágio de mudança de comportamento alimentar pode propiciar mais eficazmente a motivação destes para a adoção e manutenção do comportamento alterado (TORAL; SLATER, 2007). 2. Materiais e métodos 2.1. Delineamento, protocolo e população do estudo Trata-se de um estudo de intervenção, longitudinal retrospectivo, sem grupo controle e com abordagem quantitativa realizado na Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP/ Campus Baixada Santista, com indivíduos adultos classificados com sobrepeso e obesidade no ano de 2014. A amostra de voluntários foi selecionada por conveniência e os indivíduos que a compunham passaram por critérios de inclusão como o Índice de Massa Corporal (IMC) entre 25 e 40 kg/m², idade entre 30 e 50 anos e disponibilidade para a participação, bem como critérios de exclusão: uso abusivo de álcool e drogas; limitações músculo-esqueléticas que possam impossibilitar a prática de exercício físico; doença genética; gravidez. O presente estudo contou com a participação de 48 voluntários, onde 24 deles permaneceram até o final. 2.1.1. Avaliações e exames Após o ingresso dos voluntários no programa realizado pelo Grupo de Estudosda Obesidade (GEO) sob a coordenação da Profa. Dra. Danielle Arisa Caranti, foi realizada a triagem dos mesmos, seguida de avaliações antropométricas, exames e aplicação de questionários a fim de obter informações quantitativas e qualitativas, como a anamnese clínica, dados para caracterização sócio demográfica, além de questionário sobre comportamento alimentar, doenças atuais e pregressas, atividade física, antecedentes familiares e hereditários, fatores psicológicos, entre outros. Subsequente à triagem, foi realizada a avaliação antropométrica, onde foram medidas a massa corporal, estatura, medidas de perímetro da cintura, do quadril e do pescoço. A massa corporal e a estatura foram aferidas com o voluntário vestindo roupas leves e descalço. Após a obtenção desses parâmetros, foi calculado o IMC através da divisão da massa corporal em kg pela estatura em metros elevada ao quadrado (kg/m²) e a classificação do estado nutricional por meio deste foi realizada de acordo com os pontos de corte para adiposidade corporal propostos pela Organização Mundial da Saúde (Tabela 2). Tabela 2 - Classificação do estado nutricional segundo o Índice de Massa Corporal (IMC) e o risco de doenças segundo o grau ou classe da obesidade. IMC (kg/m²) Classificação Obesidade grau/classe Risco de doença < 18,5 Magro ou baixo peso 0 Normal ou elevado 18,5 - 24,9 Normal ou eutrófico 0 Normal 25 - 29,9 Sobrepeso ou pré-obeso 0 Pouco elevado 30 - 34,9 Obesidade I Elevado Fonte: Diretrizes Brasileiras de Obesidade (ABESO, 2016). As medidas de perímetro da cintura, do quadril e do pescoço foram aferidas utilizando fita métrica flexível e inelástica, com o indivíduo ereto, pernas estendidas e sem comprimir os tecidos. 2.2. Aplicação de questionários Para a avaliação do consumo alimentar dos indivíduos, foi aplicado no início e ao final da terapia o Registro Alimentar de 3 dias não consecutivos, incluindo um dia do final de semana. Todos os voluntários foram instruídos previamente ao preenchimento do mesmo, incluindo uma intervenção sobre medidas caseiras e utensílios de referência para assistir o preenchimento correto. Através do Registro Alimentar de 3 dias foi avaliado o padrão alimentar, por meio do grau de processamento dos alimentos segundo a classificação NOVA. A avaliação do padrão alimentar foi realizada utilizando-se a média desses dias. 2.3. Terapia interdisciplinar Posteriormente, iniciou-se o programa de intervenções interdisciplinares durante o período de 32 semanas, composto por três encontros semanais (segundas, terças e quintas-feiras), de 18:30 às 20:30 horas. Uma hora foi dedicada para a prática de exercício físico e a outra para intervenção nutricional, psicológica e fisioterapêutica. A intervenção nutricional ocorreu uma vez por semana (às quintas-feiras), a do exercício físico três vezes por semana, a fisioterapêutica uma vez por semana (terças-feiras) e psicológica uma vez por semana (segundas-feiras), como alternativas para o tratamento da obesidade através da mudança de comportamento e estilo de vida. Ao final da terapia, as avaliações, exames e questionários foram reaplicados. Todos os participantes leram e assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido antes do início das avaliações e do programa de intervenções, concordando em participar de forma voluntária do estudo. 2.4. Análise estatística Com o objetivo de avaliar o efeito da intervenção interdisciplinar na mudança do comportamento alimentar, foram aplicados testes estatísticos paramétricos e não paramétricos. Os testes estatísticos possuem pressupostos que devem ser verificados antes da aplicação dos mesmos, como, por exemplo, examinar a distribuição dos dados. Deve-se notar também que os mesmos indivíduos foram avaliados em dois momentos distintos e, portanto, há presença de amostras dependentes (ou pareadas) e isso deve ser considerado na escolha dos testes. 35 - 39,9 Obesidade II Muito elevado > 40,0 Obesidade grave III Muitíssimo elevado Para investigar a existência de diferenças estatisticamente significantes entre os momentos pré e pós-intervenção, no caso em que os dados são provenientes de uma população com distribuição normal, o teste adequado a ser aplicado é o teste t-student para amostras pareadas . Alternativamente, para os dados que não são normalmente distribuídos, o teste equivalente e adequado não paramétrico é o teste de wilcoxon para amostras pareadas. O teste de Shapiro-Wilk foi utilizado para verificar a normalidade dos dados e o mesmo foi aplicado para as variáveis de interesse nos momentos pré e pós-intervenção, separadamente. O plano geral de análise consistiu em: I ) realizar análise exploratória dos dados; II) verificar se as variáveis são provenientes de distribuição normal através do teste de Shapiro-Wilk ; III) para dados normalmente distribuídos, verificar as diferenças entre os momentos pré e pós-intervenção através do teste t-student para amostras pareadas; IV) para dados que não são normalmente distribuídos, verificar as diferenças entre os momentos pré e pós-intervenção através do teste de Wilcoxon para amostras pareadas; Em todos os testes estatísticos aplicados, o nível de significância adotado foi de 5%. Ou seja, haverá indicação de diferenças quando o p-valor dos testes for menor do que 5%. 3. Resultados e discussão Diante dos elevados índices de sobrepeso e obesidade em nossa população e dos diversos impactos negativos na saúde e qualidade de vida, verifica-se a importância do seu tratamento e, principalmente, prevenção e controle (WHO, 2000). Neste contexto, este estudo analisou o comportamento alimentar e a utilização do modelo transteórico como ferramenta avaliativa dos estágios de mudança dos voluntários, bem como para melhor entender e direcionar de maneira mais assertiva as intervenções voltadas para a mudança do comportamento. A maior parte da amostra é composta por mulheres (92%) e a média de idade foi de 41 anos. As características demográficas, socioeconômicas, comportamentais e antropométricas dos participantes estão ilustradas na Tabela 3.Tabela 3 - Características demográficas, socioeconômicas, comportamentais e antropométricas dos participantes (N=24). Nota-se que no início do estudo, 4% dos indivíduos foram classificados com sobrepeso, 46% com obesidade grau I, 42% obesidade grau II e 8% obesidade grau III. Ao final do estudo, 25% dos participantes foram classificados com sobrepeso, 50% com Características N % Participantes 24 100 Demográficas Idade (anos) 30-39 9 38 40-50 15 62 Socioeconômicas Escolaridade Médio 11 46 Superior 13 54 Trabalho Não 5 21 Sim 19 79 Comportamentais Atividade física Não 14 58 Sim 10 42 Antropométricas IMC (kg/m²) 25-29,9 1 4 30-34,9 11 46 35-39,9 10 42 > 40 2 8 obesidade grau I e 25% com obesidade grau II. Podemos observar que, ao final do estudo, não houveram indivíduos classificados em estado nutricional de obesidade grau III e, paralelamente, não houveram participantes que foram classificados em eutrofia ao final do programa, apesar da redução significativa do IMC (Figura 2). Figura 2 - Percentual dos indivíduos de acordo com a classificação do IMC. Os participantes foram classificados em seus respectivos estágios de mudança antes e após o estudo (Figura 3). A maioria dos participantes já iniciou a terapia no estágio de ação e manutenção. No entanto, ao final do estudo houve aumento expressivo da quantidade de participantes que encontraram-se no estágio de manutenção, indicando efeito positivo da terapia com a aplicação do modelo transteórico. Figura 3 - Estágios de mudança de comportamento dos participantes antes e após as intervenções Levar em consideração os estágios de mudança de comportamento dos participantes é um método eficiente para o estímulo à motivação, tanto intrínseca quanto extrínseca e para uma maior adesão a comportamentos alimentares mais adequados e saudáveis (TIMERMAN et al., 2019). A terapia multidisciplinar alterou positivamente a composição corporal dos participantes, resultando em redução significativa no IMC (-6,9%; P < 0.05), circunferência de cintura (-5,5%; P < 0.05), circunferência de quadril (-4,0%; P < 0.05), circunferência de pescoço (-4,1%; P < 0.05) (Tabela 5). Não houve mudança significativa no percentual de gordura e de massa livre de gordura, apesar de terem reduzido. Poli et al., 2017 encontrou resultados similares em seu estudo de intervenção multidisciplinar com mulheres obesas, tendo diminuição significativa no IMC, peso, percentual de gordura, circunferência de cintura e circunferência de quadril ao final da terapia. Tabela 5 - Medidas antropométricas antes e depois do programa A avaliação do consumo alimentar apresentou mudanças significativas ao final da terapia. O consumo total de calorias reduziu significativamente, bem como o consumo de carboidrato, gordura total e gordura saturada. O consumo de proteína não mudou significativamente, no entanto, estava dentro das recomendações da DRI. Apesar de o consumo de carboidrato ter apresentado diminuição significativa, sua média de ingestão ficou abaixo do recomendado, alcançando, em média, 41,3% das calorias totais. Em contrapartida, a ingestão média de gordura total e gordura saturada ao final do estudo estava adequada de acordo com as DRIs, alcançando 24,7% e 5,9%, respectivamente (PADOVANI et al., 2006). Tabela 6 - Consumo de calorias totais e macronutrientes antes e após o programa Sabe-se que a alta ingestão de alimentos ultraprocessados causa impactos negativos na qualidade da alimentação da população brasileira, uma vez que aumenta os teores de gordura saturada, gordura trans, bem como aumenta a densidade energética, elevando o risco de ganho excessivo de peso (LOUZADA et al., 2015). Portanto, as mudanças referidas no estudo foram positivas e, possivelmente, capazes de diminuir o risco de ganho excessivo de peso, bem como indicam uma mudança no comportamento alimentar dos participantes. Na pesquisa sobre os hábitos alimentares feita antes e após o programa, as respostas dos participantes sofreram alterações significativas quanto às mudanças que os mesmos estavam fazendo ou pretendiam fazer, os fatores que influenciam nas escolhas da alimentação e suas dificuldades para comer de forma mais saudável. (figuras 4, 5 e 6). Dentre as dificuldades para comer de forma mais saudável, o item “alteração do consumo de fim de semana” foi o único que aumentou depois da terapia. Uma possível justificativa para essa mudança deve-se ao fato de que as intervenções ocorriam apenas em dias de semana e, talvez a ausência delas pudesse ter tornado a adesão aos finais de semana mais difícil. Figura 4 - Mudanças que têm feito ou têm tentado fazer na alimentação * Diferença entre proporções significativa ( P < 0.05) Figura 5 - Fatores que influenciam nas escolhas da alimentação * Diferença entre proporções significativa ( P < 0.05) Figura 6 - Dificuldades para comer de forma mais saudável * Diferença entre proporções significativa ( P < 0.05) A partir desses resultados é possível observar a magnitude da mudança do comportamento alimentar dos indivíduos, mostrando a efetividade da utilização do modelo transteórico em terapias multidisciplinares, bem como as intervenções nutricionais inseridas nestas, que visam trabalhar com a mudança de comportamento de pessoas com sobrepeso e obesidade. A motivação de um indivíduo ou coletividade para a adoção de comportamentos adequados e saudáveis depende de inúmeros fatores. Portanto, conhecer os determinantes do comportamento alimentar é de suma importância para tornar possível mudanças efetivas nas práticas alimentares. Sugere-se que a partir da identificação dos diferentes estágios de mudança de comportamento, seja possível que as intervenções sejam mais assertivas, levando os indivíduos a uma maior adesão ao tratamento da obesidade quando comparado às intervenções tradicionais, visto que pode promover maior estímulo e motivação para a mudança do comportamento alimentar, propiciando uma qualidade devida duradoura. 4. Conclusão Tendo em vista a prevalência mundial da obesidade e as inúmeras pesquisas existentes que buscam entender e tratá-la efetivamente, as terapias interdisciplinares têm sido estudadas como estratégias mais eficazes para tal. O presente estudo verificou a aplicação do Modelo Transteórico em intervenções interdisciplinares como uma estratégia eficaz para auxiliar na mudança do comportamento alimentar de adultos com sobrepeso e obesidade. Os resultados apresentados foram satisfatórios, uma vez que a terapia multidisciplinar alterou positivamente a composição corporal dos participantes, os estágios de mudança de comportamento, bem como o comportamento alimentar. Por conseguinte, sugere-se que a utilização deste modelo como ferramenta para a mudança do comportamento alimentar pode ser eficaz no tratamento da obesidade, bem como a adesão a este, visto que está pautado na motivação e intervenção direcionada à cada estágio de prontidão para a mudança. 5. Referências Bibliográficas ABESO - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA PARA O ESTUDO DA OBESIDADE E DA SÍNDROME METABÓLICA. Diretrizes brasileiras de obesidade : 2016. São Paulo, 2016. Disponível em: <https://abeso.org.br/diretrizes/>. Acesso em: 30 jun. 2019. ALVARENGA, .M; TARAGANO, R. Fundamentos teóricos sobre mudança comportamental. In: ALVARENGA, M. et al. Nutrição Comportamental . 2. ed. Barueri: Manole, 2019. Cap. 1. p. 19-22. AMORIM, P; FARIA, F. 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