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@sarahellen_figueredo Comunicação de más notícias Estudos mostram que a comunicação entre o médico e seu paciente pode influenciar a adesão ao tratamento e a satisfação com a relação estabelecida. Quando há o avanço da doença ou se desde o início ela se apresenta como ameaçadora da continuidade da vida, algo que afeta negativamente o futuro, o médico não só deve comunicar isso ao paciente e sua família, mas comunicar uma má notícia. A vivência dessa comunicação é vista como uma situação limite para o médico que, muitas vezes, sem saber lidar com o sofrimento emocional do paciente, pode fazer promessas falsas de cura, a mentira piedosa, ou uma transmissão abrupta e sem muitas explicações ou perspectivas de futuro, prejudicando toda a relação terapêutica. Qualquer informação proferida a um paciente ou familiar, que interfira de maneira desfavorável na percepção individual sobre o presente e futuro, modificando as suas expectativas, é considerada uma má notícia. Mais que verbalizar, essa comunicação requer o uso de habilidades como: oferecer resposta às emoções do paciente; envolvê-lo na tomada de decisão; lidar com suas expectativas de cura; envolver seus familiares e proporcionar esperança nas situações mais obscuras. O Protocolo SPIKE O protocolo SPIKES é um exemplo do novo modelo de comunicação com o paciente. Esse protocolo descreve 6 passos de maneira didática para comunicar más notícias. As etapas do protocolo 1- S – Setting up (Ambientação/ Preparando- se para o encontro): esta etapa descreve uma maneira eficiente de iniciar a comunicação, através do ensaio mental. Ela consiste em revisar o plano da transmissão da notícia que será repassada ao paciente e o preparo do médico para responder às possíveis reações emocionais e perguntas difíceis. Procure por um lugar calmo e que permita que a conversa seja particular. Mantenha um acompanhante com seu paciente, isso costuma deixá-lo mais seguro. Sente-se e procure não ter objetos entre você e seu paciente. Escute atentamente o que o paciente diz e mostre atenção e carinho. Estabelecer contato físico como tocar no braço do paciente ou segurar sua mão podem ser atitudes reconfortantes, as quais representam acolhimento. 2- P – Perception (Percepção): Investigue o que o paciente já sabe do que está acontecendo. Antes de iniciar a transmissão da má notícia, o profissional deve verificar o quanto o enfermo sabe acerca da gravidade de sua situação médica e como ele a entende. Dessa forma, será possível identificar as lacunas existentes entre as expectativas e a realidade e, a partir delas, adequar a informação conforme a compreensão do paciente. Procure usar perguntas abertas. 3- I – Invitation (Convite à participação): Identifique até onde o paciente quer saber do que está acontecendo, se quer ser totalmente informado ou se prefere que um familiar tome as decisões por ele. Se o paciente deixar claro que não quer saber detalhes, mantenha-se disponível para conversar no momento que ele quiser. @sarahellen_figueredo Essa abordagem pode ser feita através de perguntas como: “de que maneira você gostaria de ser informado sobre os resultados dos seus exames?” 4- K- Knowledge (Conhecimento): Introduções como “infelizmente não trago boas notícias” podem ser um bom começo. Use sempre palavras adequadas ao vocabulário do paciente. Use frases curtas e pergunte, com certa frequência, como o paciente está e o que está entendendo. Se o prognóstico for muito ruim, evite termos como “não há mais nada que possamos fazer”. Sempre deve existir um plano! 5- E - Emotions (Emoções): Aguarde a resposta emocional que pode vir, dê tempo ao paciente, ele pode chorar, ficar em silêncio, em choque. O método mais útil para a transmissão é a chamada “resposta empática”, que pretende desenvolver uma conduta afetiva através de três subetapas: (1) primeiramente é necessário ouvir e identificar a emoção experimentada pelo paciente. Quando existirem incertezas acerca da emoção, deve-se estabelecer perguntas exploratórias como “o que você está sentindo?”; (2) observa-se uma ligação entre a emoção e o motivo que a desencadeou, o qual, provavelmente, será o recebimento da má notícia. (3) após conceder um tempo para que a pessoa expresse suas emoções, o profissional deve demonstrar que foi sensibilizado pelo paciente. Um exemplo pode incluir: “eu entendo que essa não é a notícia que você desejaria receber, e gostaria que ela fosse melhor” 6- S – Strategy and summary (Estratégia e resumo): nesta etapa o profissional aborda um plano de tratamento após realizar um resumo de tudo que foi comunicado ao paciente, permitindo que o mesmo exponha suas dúvidas e garantindo esclarecimentos a respeito da notícia transmitida. Analisar o nível de compreensão do paciente acerca do que foi discutido é importante para evitar problemas relacionados à adesão ao tratamento. Além disso, precisa-se questionar o paciente se o momento em que se encontra é a melhor ocasião para tratar do assunto e se ele está preparado para tal conversa. O protocolo poderá ser finalizado com um plano claro das próximas decisões e das obrigações que ambos cumprirão ao executá-las. Referências: Cruz, Carolina de Oliveira, and Rachel Riera. "Comunicando más notícias: o protocolo SPIKES." Diagn. tratamento (2016): 106-108. Gesser, Ana Maria, Mirian Silva dos Santos, and Marcelo Vier Gambetta. "Spikes: um protocolo para a comunicação de más notícias Spikes: a protocol for communicating bad news." Brazilian Journal of Development 7.11 (2021): 103334- 103345 Protocolo SPIKES para crianças Apesar da suposta ingenuidade, as crianças têm grande capacidade de observação e percepção de tudo que ocorre a seu redor e em seu mundo interior. Conceituação de morte relacionado ao período do desenvolvimento cognitivo Relacionamos a conceituação de morte com as seguintes estruturas cognitivas: crianças de 1 a 3 anos não têm capacidade de elaborar um conceito formal sobre a morte; entre 3 e 5 anos, não apresentam noção de morte como definitiva e conseguem associar apenas a sono ou separação, tendo a percepção da morte como algo temporário, gradual e reversível; entre 5 e 9 anos, podem ver a morte como personalidade, como alguém que vem buscar a pessoa morta, já sendo percebida como algo irreversível, mas não universal 11. Especialmente a partir dos 8 anos, a criança tem capacidade para desenvolver uma noção sobre sua própria morte, que gira em torno de perda física. A morte representa a separação definitiva do corpo. E crianças entre 9 e 10 anos compreendem @sarahellen_figueredo a morte como encerramento de atividades que ocorrem no corpo, cessação de comportamentos vitais, tida como fenômeno universal e natural. A compreensão da saúde e da doença, seu surgimento e cura, vai amadurecendo com a idade e as experiências pelas quais a criança passa. Transmissão de notícias difíceis para crianças e adolescentes Deve-se levar em conta cada criança em particular, respeitando-se seu momento de desenvolvimento, suas possibilidades de apreensão intelectual, suas demandas, seu “tempo” e seus desejos. Cada criança apresenta uma reação que varia de acordo com seu nível de compreensão e maturidade: quanto mais velha, mais amplo, complexo e realista é seu entendimento. a Resolução 41/1995 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) versa sobre os direitos da criança e do adolescente hospitalizados. Destacamos o artigo 8º, que se refere ao direito a ter conhecimento adequado de sua enfermidade, dos cuidados terapêuticos e diagnósticos a serem utilizados, do prognóstico, respeitando sua fase cognitiva, além de receber amparo psicológico,quando se fizer necessário. Quanto a isso, a Academia Americana de Pediatria recomenda um diálogo sempre direto, claro e realista com os pais, envolvendo, sempre que possível, a criança nas discussões. Esta, por sua vez, deve ser encorajada a falar sobre seus sentimentos de medo, tristeza, solidão e culpa. A adaptação brasileira do protocolo Spikes, o Spikes Junior, apropria-se dos pontos já desenvolvidos no primeiro e sugere escutar a criança ou adolescente antes de qualquer comunicação considerada notícia difícil, para avaliar seu grau de compreensão sobre o próprio estado de saúde. E, sempre que possível, na presença dos pais ou responsáveis. O protocolo adverte que deve ser respeitado o direito do paciente de querer saber – ou não – sobre seu estado. No primeiro caso, o profissional (ou o familiar) não deve mentir para a criança ou adolescente. Elementos de comunicação O processo comunicativo envolve elementos que são nomeados do seguinte modo: EMISSOR, representado por alguém que emite a mensagem; RECEPTOR, quem recebe a informação; MENSAGEM, que se trata do conteúdo; CANAL, meio utilizado para comunicação; e CONTEXTO. Emissor e receptor: Há uma obrigação moral e ética de discutir a saúde e a doença com a criança doente, que indica uma expectativa de que as crianças sejam participantes ativas do seu cuidado. Os pais e os profissionais de saúde devem definir se a criança deve estar presente nas consultas, se os pais preferem contar às crianças eles próprios ou se querem que seja outro agente a revelar a informação à criança ou se a entrevista ocorrerá na presença ou ausência dos pais. Quanto à equipe, o protocolo sugere identificar o profissional com melhor vínculo com o paciente, ou mesmo com um familiar, para a tarefa de comunicar. Mensagem: A comunicação deve ser honesta, o que foi evidenciado como considerar as particularidades da criança e sua família e dizer de maneira clara aos familiares o estado de saúde da criança, sem mentir ou omitir informações acerca do diagnóstico. A mensagem comunicada de maneira objetiva ou direta deve conter todas as informações para compreensão do diagnóstico da criança, utilizando-se de uma linguagem clara e evitando terminologia científica. Quando as entrevistas contiverem notícias difíceis, os profissionais devem ter o cuidado de convidar pessoas-chave da relação do paciente – bem aceitas por ele, com poder de liderança e estabilidade, inclusive para a situação de luto. O local da comunicação deve garantir privacidade; o tempo deve ser suficiente para esclarecer quaisquer dúvidas e para permitir as reações emocionais por parte do paciente e seus acompanhantes. @sarahellen_figueredo Canal: devem-se utilizar recursos lúdicos e ter entendimento ou orientação especializada quanto às diversas etapas do desenvolvimento emocional do paciente, de forma a respeitar as características de cada momento diante das notícias difíceis. Os pais têm expectativa de que os profissionais utilizem material informativo para comunicar a má notícia, e valorizam ter recebido tais materiais, como folhetos de organizações de apoio locais e nacionais, como um incentivo para buscar novas informações. Para as crianças, podem ser utilizado desenhos, programas específicos ou livros como metáforas da situação vivida pela criança. Referências: Afonso, Selene Beviláqua Chaves e Minayo, Maria Cecília de Souza. Notícias difíceis e o posicionamento dos oncopediatras: revisão bibliográfica. Ciência & Saúde Coletiva [online]. 2013, v. 18, n. 9. Toma, Marjory Dionizio, Oliveira, Walter Lisboa e Kaneta, Catalina Naomi. Comunicação de prognóstico reservado ao paciente infantil. Revista Bioética [online]. 2014, v. 22, n. 3 Carrapa, Ana Sofia Guedes da Costa Neves. "Comunicar más notícias em pediatria." (2011). Zanon, Bruna Pase, et al. "Comunicação de más notícias em pediatria: revisão integrativa." Revista Brasileira de Enfermagem 73 (2020).
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