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Epilepsia 1 Epilepsia Etiologia: Evento elétrico de origem cortical As principais causas para a epilepsia são lesões estruturais, alterações genéticas, infecções, doenças metabólicas e alterações imunológicas A má aderência ao tratamento também deve ser considerada como causa de crises Desregulação entre neurotransmissores excitatórios e inibitórios O bloqueio da inibição do GABA é um importante mecanismo associado às crises Ocorrem disparos descontrolados de potencial elétrico Conceitos: Crise epiléptica: Quadro clínico transitório de sinais e sintomas provocados por ativação neuronal anormal O comprometimento motor ou da consciência não é obrigatório Pode ser provocada (injúria aguda ao cérebro) ou não provocada 📌 Crises convulsivas são aquelas nas quais há presença de abalos motores, podendo ou não estar associadas a crises epilépticas (ex.: quadros psicogênicos) Os olhos costumam manter-se abertos Pode haver liberação esfincteriana Muitas vezes ocorre estado pós-ictal (intervalo de minutos até a plena recuperação da consciência) Epilepsia 2 📌 A epilepsia é definida como uma tendência patológica e prolongada para o desenvolvimento de crises (chance > 60% de novo evento OU 2ª crise após 24h) Crise Sintomática Aguda: Caracterizada por uma diminuição do limiar para crises epilépticas de modo transitório Os principais causadores desse quadro são TCE, doenças cerebrovasculares, infecções do SNC, uso de álcool, substâncias ilícitas, crises febris e distúrbios metabólicos Ocorre em indivíduos sem predisposição prévia para crises epilépticas Síncope: Evento de origem cardiovascular que causa perda temporária da consciência Marcada por um período prodrômico (escurecimento visual, palpitações, palidez, sudorese) Os olhos mantém-se fechados Podem ocorrer pequenos tremores Há retorno rápido da consciência Classificação: Epilepsia 3 Crises focais (parciais): As manifestações iniciais são limitadas a um segmento de um hemisfério cerebral Tipo mais comum em adultos Os lobos temporais, especialmente na região mesial próxima ao hipocampo, são as regiões mais afetadas As crises são precedidas por pródromo (aura) com sensação de mal- estar epigástrico, sensação de medo ou déjà-vu 📌 Automatismos motores são comuns, como mastigação, movimentos dos lábios, movimentos aleatórios dos membros (ipsilaterais), olhar fixo e postura distônica contralateral Quando o acometimento é do lobo frontal, as manifestações são variadas, como atividade motora clônica contralateral (córtex motor primário) e posturas tônicas assimétricas (córtex motor suplementar) Essas crises apresentam curta duração, geralmente durante o sono 📌 A ocorrência de comportamentos hipermotores bizarros, como automatismos sexuais, pode ser erroneamente associada a eventos psicoênicos Os focos occipitais, mais raros, cursam com manifestações visuais diversas, incluindo alucinações Crises parietais podem se apresentar como sintomas sensitivos contralaterais Subtipos: Crise parcial simples (perceptiva): há preservação do nível de consciência Crise parcial complexa (disperceptiva): ocorre comprometimento do nível de consciência A perda de consciência ocorre por 30s a 2min, com olhos abertos Epilepsia 4 Após os episódios, é comum ocorrer confusão pós-ictal por alguns minutos 📌 Ambos os tipos de crise parcial podem evoluir para crises secundariamente generalizadas Crises generalizadas: São mais observadas em crianças Há envolvimento, desde o início, de ambos os hemisférios cerebrais Sua principal característica é a alteração do nível de consciência Subtipos: Crise convulsiva tônico-clônica generalizada: ocorre perda súbita do nível de consciência, seguida por rigidez e abalos clônicos, com duração de poucos minutos. Há fase pós-ictal A contração intensa do diafragma pode provocar um grito epilético Crise de ausência: caracterizada por perda de consciência breve (5- 10s) com olhar fixo e corpo imóvel É mais comum na infância Mioclonias: abalos breves dos membros (”choques”), ocorrendo pela manhã Mioclonias noturnas (antes de dormir) podem ser fisiológicas Epilepsia 5 Crises não classificadas: não conseguem ser enquadradas nos padrões anteriores Síndromes Epilépticas: 📌 As síndromes epilépticas descrevem condições claramente identificáveis por características eletroclínicas específicas Convulsões febris: Síndrome mais comum, ocorrendo em crianças de 3 meses a 5 anos Os principais fatores de risco são febre alta, infecções virais, vacinação prévia e histórico familiar Normalmente ocorre no 1º dia da doença Apresentam 30% de chance de recorrência, mas não aumentam o risco futuro de epilepsia Quando há convulsões febris complexas, no entanto, há maior propensão a epilepsia 📌 Convulsão febril simples: dura < 15 min, não são focais e não se repetem em 24h Convulsão febril complexa: qualquer padrão que não o anterior O tratamento emergencial é realizado na presença de crises > 5 min A profilaxia deve ser individualizada, com uso de medicamentos anti-crise apenas na presença de crises complexas Síndrome de West: Tem início entre os 3 e 7 meses de idade Caracterizada por espasmos, comprometimento do DNPM e hipsarritmias no EEG Apresenta mau prognóstico neurológico Tem resposta a terapia hormonal com ACTH Epilepsia 6 Epilepsia rolândica: Acomete crianças de 3 a 13 anos, com maior incidência no 10º ano de vida Não há prejuízo do DNPM Caracterizada por crises focais (motoras ou sensitivas) simples, com envolvimento da face, língua e lábios Há sialorreia intensa e dificuldade para falar Ocorrem mais comumente durante a noite As alterações no EEG, descargas na região centro-temporal, são ativadas pelo sono A evolução do quadro é benigna O tratamento deve ser direcionado a pacientes com crises diurnas e/ou frequentes Epilepsia de ausência da infância: Ocorre em crianças de 3 a 12 anos, com desenvolvimento neuropsicomotor normal As crises de ausência ocorrem várias vezes por dia, sem período pós-ictal Normalmente são desencadeadas por hiperventilação No EEG, há descarga generalizada lenta (3 Hz) em padrão espícula-onda A evolução costuma ser benigna (melhora espontânea com a idade) Síndrome de Lennox-Gastaut: Acomete crianças de 3 a 8 anos Apresenta alta mortalidade Tem relação com alterações genéticas e malformações estruturais Há comprometimento do DNPM, com possibilidade de retardo mental O padrão das crises é diverso, incluindo episódios tônicos, ausências e atônicos Dentre os exames complementares, podem ser solicitados perfil genético e RNM Epilepsia 7 É uma epilepsia de difícil controle, requerendo tratamento com múltiplas medicações O canabidiol pode ser considerado em quadros refratários, assim como a adoção de dieta cetogênica Epilepsia mioclônica juvenil: Marcada por crises mioclônicas sem comprometimento funcional Em algum momento, podem se desenvolver crises tônico-clônicas generalizadas ou ausências Surge na adolescência O EEG apresenta paroxismo com poliespículas frontais de 4-6 Hz Epilepsia do lobo temporal: A esclerose mesial temporal é uma importante causa de epilepsia refratária Há um período prodrômico com aura, seguido por parada comportamental e automatismo motor Demais características das crises já foram descritas acima Na RNM, observa-se atrofia e hipersinal do hipocampo Opções terapêuticas para o tratamento das síndromes epiléticas da infância Epilepsia 8 📌 As etiologias das epilepsias são divididas em sintomática (lesões cerebrais bem definidas), idiopática (susceptibilidade genética) e criptogênica (provavelmente por lesão estrutural, porém ainda não detectada pelos métodos disponíveis) Investigação Diagnóstica: Exames laboratoriais: Glicemia Eletrólitos Hemograma Função renal Função hepática Sumário de urina Perfil toxicológico Neuroimagem: A ressonância magnética apresenta maior resolução para a detecção de anormalidades corticais No PS a tomografiaé mais disponível, sendo suficiente para descartar a maioria das causas estruturais graves 📌 As principais indicações para a realização de exames de imagem são diagnóstico recente e epilepsia de difícil controle O comprometimento hipocampal é unilateral, evidenciado pelo hipersinal (seta) Epilepsia 9 Eletroencefalograma: Identificam marcadores biológicos das crises (paroxismo epiletiforme) Apresentam sensibilidade relativamente baixa e alta especificidade Repetições seriadas podem favorecer a detecção de alterações 📌 A punção liquórica pode ser considerada em quadros novos sugestivos de meningoencefalite ou outras infecções Tratamento: Orientações ao paciente: O paciente com histórico de eventos epilépticos deve ficar impedido de dirigir por 1-2 anos, enquanto realiza acompanhamento médico A aptidão para realizar atividades laborais de risco deve ser avaliada individualmente O uso de fármacos antiepilépticos pode aumentar o risco de osteoporose Drogas antiepilépticas: Amplo espectro: são capazes de agir sobre crises focais e generalizadas Ex.: valproato (antigo) e lamotrigina/levetiracetam (novos) Curto prazo: limitam-se ao tratamento de crises focais, podendo agravar quadros generalizados Ex.: carbamazepina (antigo) e lacosamida (novo) Os medicamentos antiepilépticos atuam sobre canais iônicos e vias de neurotransmissores Epilepsia 10 O grupo de indutores enzimáticos (fenitoína, carbamazepina, fenobarbital) pode interagir com outras medicações, como anticoncepcionais, varfarina e quimioterápicos Mulheres devem ser orientadas quanto ao potencial teratogênico do valproato Para mulheres com desejo de engravidar, recomenda-se reduzir a dose dos fármacos antiepilépticos para a mínima tolerada, além de suplementar ácido fólico 📌 Optar por lamotrigina e levetiracetam durante a gestação, evitando mudar drogas em uso. Pode ser necessário dosar mensalmente o nível sérico das drogas Tratamento para controle das crises: Esquema inicial: diazepam, 10 mg em bolus EV, preferencialmente sem diluição, OU midazolam 10 mg IM (se > 40 kg) + fenitoína (250 mg/5 ml) 20 ml + 80 ml EV de SF 0,9%, em dose de 15-20 mg/kg Caso a crise dure mais de 5 min, repetir a dose do benzodiazepínico e conduzir como mal epiléptico Efeitos adversos das principais drogas antiepilépticas Epilepsia 11 📌 O uso de drogas antiepilépticas em monoterapia após a 1ª crise é recomendado a pacientes com anormalidades no EEG, lesões estruturais comprovadas, crises durante o sono ou sinais focais Refratariedade: Definida pela presença de escape de crises mesmo em uso de duas drogas antiepilépticas em dose otimizada É necessário reavaliar o diagnóstico de epilepsia com outros exames (videoeletroencefalograma) Cirurgias ressectivas podem ser opções para quadros focais ou epilepsia mesial temporal Estado de Mal Epiléptico: 📌 Definido como a permanência de crise por mais de 5 min ininterruptos OU ocorrência de crises de duração breve com recuperação incompleta de consciência entre elas Apresenta etiologias e manifestações clínicas semelhantes àquelas das crises epilépticas gerais O diagnóstico é clínico e deve ser feito rapidamente Tratamento: Primeira linha (benzodiazepínicos): diazepam (5 mg/ml) 0,15 mg/kg EV OU midazolam (5 mg/ml) 0,2 mg/kg IM, com dose inicial de até 10 mg (> 40 kg) Para pacientes de 13-39 kg, administrar 5 mg de midazolam 📌 Para crianças, também podem ser administrados midazolam bucal (0,2 mg/kg, máx: 10 mg) ou retal (0,5 mg, máx: 20 mg) Segunda linha (anticonvulsivantes): fenitoína (50 mg/ml) 15-20 mg/kg EV, por 20 a 30 min, OU fenobarbital (200 mg/2 ml) 50-75 mg/min EV diluídos em 90 ml SF 0,9%, com dose máx. de 10 mg/kg, OU levetiracetam (100 Epilepsia 12 mg/ml) 40-60 mg/kg em 15 min, não ultrapassando 4500 mg, OU valproato (100 mg/ml) 25-40 mg/kg EV em 10 min O uso de fenitoína também pode ser chamado de hidantalização Manutenção da refratariedade: recomenda-se indução do coma com midazolam (5 mg/ml) 0,2 mg/kg em bolus EV, seguido por infusão contínua de 1 mg/kg/hora, OU propofol (10 mg/ml) 1-2 mg/kg em bolus, com manutenção de 20 microgramas/kg/minuto Após a recuperação da crise, o paciente deve ser mantido em UTI, com monitoramento por EEG e realização de outros exames diagnósticos 📌 Os pilares do tratamento do estado de mal epiléptico são suporte geral à vida, determinação da etiologia (realizar perfil laboratorial e EEG), e tratamento direcionado