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Autora: Profa. Maria Eleonora Feracin da Silva Picoli Colaboradoras: Profa. Raquel Machado Coutinho Profa. Renata Guzzo Souza Belinelo Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano Biologia, Histologia, Embriologia Professora conteudista: Maria Eleonora Feracin da Silva Picoli Graduou-se em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) em 1999, concluiu o Mestrado em Biologia Funcional e Molecular na área de Bioquímica pela mesma universidade, no ano de 2002, e obteve o título de doutora em Biologia Funcional e Molecular em 2004, também pela Unicamp. Foi docente no curso de Ciências Biológicas e tutora no curso de Bioquímica da Nutrição, oferecido na modalidade de Educação a Distância (EaD) pelo Departamento de Bioquímica do Instituto de Biologia da Unicamp. Ingressou na Universidade Paulista – UNIP/Campinas no ano de 2002, na qual atua até hoje como docente titular da disciplina de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia nos cursos de Enfermagem, Farmácia, Nutrição, Odontologia e Medicina Veterinária. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) P598b Picoli, Maria Eleonora Feracin da Silva. Biologia, Histologia, Embriologia. / Maria Eleonora Feracin da Silva Picoli. – São Paulo: Editora Sol, 2021. 184 p., il Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 1. Biologia. 2. Histologia. 3. Embriologia. I. Título. CDU 574 U510.06 – 21 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcello Vannini Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Deise Alcantara Carreiro – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Carla Moro Aline Ricciardi Sumário Biologia, Histologia, Embriologia APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................7 Unidade I 1 BIOLOGIA CELULAR ...........................................................................................................................................9 1.1 Conceitos gerais .......................................................................................................................................9 1.2 Composição química da célula ....................................................................................................... 11 1.3 Eucariotos e procariotos .................................................................................................................... 12 2 MEMBRANA PLASMÁTICA ........................................................................................................................... 15 2.1 Transporte através da membrana .................................................................................................. 20 2.1.1 Transporte passivo .................................................................................................................................. 20 2.1.2 Transporte ativo ....................................................................................................................................... 23 2.1.3 Transporte vesicular ............................................................................................................................... 24 2.2 Elementos citoplasmáticos ............................................................................................................... 26 2.2.1 Citosol .......................................................................................................................................................... 26 3 NÚCLEO E DIVISÃO CELULAR ..................................................................................................................... 47 3.1 Núcleo celular ........................................................................................................................................ 47 3.2 Envoltório nuclear ................................................................................................................................ 49 3.3 Nucléolo ................................................................................................................................................... 51 3.4 Cromatina ................................................................................................................................................ 52 3.5 Ciclo celular e mecanismos de expressão gênica .................................................................... 55 4 INTERFASE E DIVISÃO CELULAR ................................................................................................................ 57 4.1 Interfase ................................................................................................................................................... 57 4.1.1 Fase G1 ........................................................................................................................................................ 57 4.1.2 Fase S ........................................................................................................................................................... 61 4.1.3 Fase G2 ........................................................................................................................................................ 63 4.2 Divisão celular ....................................................................................................................................... 64 4.2.1 Mitose .......................................................................................................................................................... 65 4.2.2 Meiose ......................................................................................................................................................... 67 Unidade II 5 EMBRIOLOGIA ................................................................................................................................................... 75 5.1 Gametogenese – conceitos gerais ................................................................................................. 75 5.2 Ovogênese ............................................................................................................................................... 78 5.3 Espermatogênese ................................................................................................................................. 80 5.4 Alterações cromossômicas pré-zigóticas.................................................................................... 83 6 DESENVOLVIMENTO EMBRIONÁRIO ........................................................................................................ 85 6.1 Fertilização .............................................................................................................................................. 85 6.2 Clivagem ..................................................................................................................................................88 6.3 Implantação ............................................................................................................................................ 89 6.4 Gastrulação e neurulação ................................................................................................................. 91 6.5 Gêmeos ..................................................................................................................................................... 94 6.6 Fatores que afetam o desenvolvimento embrionário ........................................................... 96 6.7 As células-tronco embrionárias ...................................................................................................... 98 Unidade III 7 HISTOLOGIA .....................................................................................................................................................105 7.1 Conceito e classificação geral dos tecidos humanos ...........................................................105 8 TECIDOS .............................................................................................................................................................106 8.1 Tecido epitelial .....................................................................................................................................106 8.1.1 Estrutura e função do tecido epitelial..........................................................................................106 8.1.2 Classificação do tecido epitelial ...................................................................................................... 110 8.2 Tecido conjuntivo ...............................................................................................................................119 8.2.1 Estrutura e função do tecido conjuntivo .................................................................................... 119 8.2.2 Tecido conjuntivo propriamente dito .......................................................................................... 120 8.2.3 Tecido conjuntivo de propriedades especiais ........................................................................... 125 8.2.4 Tecido conjuntivo de suporte ......................................................................................................... 132 8.3 Tecido muscular ..................................................................................................................................139 8.3.1 Músculo Estriado Esquelético ......................................................................................................... 140 8.3.2 Músculo Estriado Cardíaco .............................................................................................................. 143 8.3.3 Músculo Liso .......................................................................................................................................... 144 8.4 Tecido nervoso .....................................................................................................................................146 8.4.1 Os neurônios .......................................................................................................................................... 146 8.4.2 As células da glia .................................................................................................................................. 150 7 APRESENTAÇÃO A Biologia é muito ampla e, justamente por isso, apresenta várias subdivisões. Dentre elas, temos a citologia, aqui chamada de biologia, a embriologia e a histologia. Essas três áreas são altamente interligadas e os conhecimentos adquiridos em uma são essenciais para o entendimento das outras. O conhecimento de como uma célula funciona, sua organização interna e sua função no organismo são essenciais para todos os cursos da área da saúde, em especial, aqueles que lidam diretamente com processos que ocorrem no meio intracelular e refletem na regulação fisiológica do organismo. Assim, elaboramos este livro-texto com o objetivo de capacitar o aluno para entender os processos responsáveis pela geração de uma nova vida (embriologia), como as células são estruturadas e organizadas (biologia – citologia) e como as diferentes células se especializam para interagirem entre si, formando os nossos órgãos (histologia). Portanto, ao terminar esta disciplina, o aluno terá adquirido noções básicas de biologia, histologia e embriologia, o que servirá como alicerce para diferentes procedimentos que ele realizará ao longo de sua vida profissional, bem como irá capacitá-lo para atuar como um agente de transformação social. INTRODUÇÃO Mãe, de onde eu vim? Eu sempre fui deste tamanho? Como eu fui parar dentro de sua barriga? Quem nunca fez ou ouviu essas perguntas de uma criança? Por mais que elas possam nos deixar em uma situação às vezes desconfortável, na hora de darmos uma resposta, elas mostram como o surgimento da vida e a forma como nosso corpo funciona e se organiza despertam o interesse desde a infância. Lidar com o surgimento da vida e a sua manutenção fascina todos os profissionais da área da saúde, principalmente os enfermeiros. Nesse sentido, buscamos fornecer a você, aluno, noções básicas e essenciais para entender processos fisiológicos e patológicos que serão apresentados nas próximas etapas do curso. Abordaremos a célula como unidade fundamental da vida, suas características principais, organização e funcionamento; também veremos como elas são estudadas e quais as diferenças entre as células humanas e as bactérias. Em seguida, veremos como as células se reproduzem tanto para garantir a regeneração de estruturas, quanto para formar as células germinativas. Também veremos qual o papel do núcleo no controle do metabolismo celular e das informações genéticas. Trataremos das fases iniciais do desenvolvimento embrionário e estudaremos como os gametas se formam, o processo de fertilização e formação do zigoto, bem como as primeiras fases do desenvolvimento embrionário. Finalmente, abordaremos a organização estrutural, a função e as especializações celulares sofridas para a formação dos tecidos. 8 Esperamos que, ao final desta etapa, você tenha não só incrementado sua formação na área de biologia, histologia e embriologia, mas também que a leitura tenha despertado seu interesse para novas áreas da saúde, instigando-o a procurar novas fontes de conhecimento na área. Bons estudos! 9 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA Unidade I 1 BIOLOGIA CELULAR 1.1 Conceitos gerais Embora Aristóteles tenha, na Antiguidade, afirmado que todos os animais e vegetais eram constituídos de unidades menores que se repetiam por toda a estrutura, o termo célula foi empregado pela primeira vez em 1665 por Robert Hooke, que observou cortiças através de um jogo de lentes de aumento. O mesmo padrão de organização observado por Hook também já havia sido visto por Malpighi em 1660 e por Leeuwenhoek em 1674, ao observar espermatozoides de diferentes espécies. Lente montada em um suporte metálico Suporte para sustentar o espécime Sistema de focalização e movimento do espécime Figura 1 – A) Microscópio inventado por Anton van Leeuwenhoek (retrato em destaque) visto lateralmente e frontalmente. B) Microscópio inventado por Robert Hooke Em meados de 1839, os pesquisadores alemães Matthias Jakob Schleiden e Theodor Schwann propuseram a Teoria Celular. Os dois pesquisadores confirmaram aquilo que já havia sido proposto por Aristóteles: a célula é a unidade básica para a estrutura e funcionamento de qualquer ser vivo. Os pesquisadores ainda propuseram que cada célula viva havia sido originada de uma célula pré-existente. Nascia, assim, a biologia celular; o conceito descrito passou a nortear todas as pesquisas nas áreas de botânica, zoologia, microbiologia, imunologia e medicina. 10 Unidade I Com o desenvolvimento dos microscópios e o aprimoramento dos métodos de coloração, o estudo das célulase dos seus constituintes internos foi se aprofundando, e a forma como essas pequenas estruturas agiam para controlar todo o funcionamento de um organismo ficaram cada vez mais claras e fascinantes, bem como a importância das células como unidade morfológica e funcional a partir do esclarecimento da patogênese de várias doenças. Mas como é uma célula? Qual a sua organização básica? A célula é a menor unidade de vida capaz de se nutrir, se defender e se reproduzir de forma independente. Toda célula precisa ter quatro elementos básicos em pelo menos uma fase do seu desenvolvimento: (1) membrana plasmática para separar o meio interno do meio externo; (2) um citoplasma onde ocorrerão as reações químicas necessárias para o funcionamento da célula; (3) ribossomos que garantiram a síntese de proteínas e (4) material genético que contenha todas as informações necessárias para que a célula desempenhe suas funções. Membrana plasmática Controla a entrada e saída de substâncias da célula Citoplasma Substância gelatinosa em que ocorrem as reações químicas responsáveis pelo funcionamenteo celular Material genético Informações sobre o funcionamento celular Ribossomos Realizam a síntese proteica Figura 2 – Representação esquemática dos principais elementos de uma célula Observação As hemácias são células anucleadas e sem organelas, ou seja, não possuem núcleo e nem organelas quando presentes no sangue. O processo de perda dos elementos citoplasmáticos é necessário para que a célula se especialize no transporte de oxigênio. 11 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA 1.2 Composição química da célula Para que todas a funções possam ser desempenhadas de maneira eficiente, algumas macromoléculas são indispensáveis. Elas podem estar livres no citoplasma ou associadas a outras estruturas. Sem as proteínas, os ácidos nucleicos (o DNA e o RNA), os fosfolipídios e os carboidratos, todo o funcionamento da célula fica comprometido. As proteínas são polímeras de aminoácidos que se organizam em uma estrutura tridimensional para poderem ser funcionais. Em uma célula, as proteínas podem exercer função estrutural, auxiliando na manutenção da morfologia celular. Além disso, as proteínas podem ter função de transporte de substância e também catalítica, ou seja, permitem que reações químicas ocorram com uma energia de ativação menor do que a necessária. Nesse caso, as proteínas são chamadas de enzimas. Os ácidos nucleicos são formados por nucleotídeos. Os nucleotídeos são divididos em dois grandes grupos. No grupo das purinas, temos os nucleotídeos adenina e guanina; já, no grupo das pirimidinas, temos os nucleotídeos timina, citosina e uracila. Para formar os ácidos nucleicos, os nucleotídeos se unem através de ligações específicas, podendo formar dois tipos de polímeros. Quando os nucleotídeos timina, adenina, citosina e guanina se organizam e formam polímeros que se ordenam em duplas fitas, forma-se o DNA, molécula responsável por carregar toda a informação genética da célula. Agora, quando os nucleotídeos guanina, citosina adenina e uracila se organizam em um polímero de fita simples, forma-se o RNA, que participará da síntese de proteínas. Os lipídios são comumente conhecidos como moléculas de energia, mas, na célula, eles podem exercer diversas funções, por exemplo, estrutural, uma vez que os fosfolipídios, um tipo de lipídio, participam da formação da membrana plasmática e também da sinalização celular; ou as funções desempenhadas pelo colesterol, que participa da síntese de hormônios esteroides. Finalmente, os carboidratos podem ser encontrados livres no citoplasma da célula, em que pode atuar como molécula energética. Porém, os carboidratos podem estar associados aos fosfolipídios, formando os glicolipídios; ou associados às proteínas, formando as glicoproteínas. Tanto os glicolipídios quanto as glicoproteínas são moléculas que podem atuar como sinalizadores químicos, modulando diversas formas de respostas celulares. A figura a seguir resume as características das principais funções dessas macromoléculas. 12 Unidade I Proteínas • Polímeros de aminoácidos • Função estrutural, transporte e catalítica RNA • Polímero de nucleotídeos em fita simples • Síntese de proteínas DNA • Informação genética • Polímero de nucleotídeos em fita dupla Lipídios • Hidrofóbicos • Fosfolipídios - estrutura celular • Colesterol - sinalização química Carboidratos • Função energética e sinalização celular Figura 3 – Características e funções desempenhadas por macromoléculas encontradas na célula Saiba mais Consulte a obra a seguir: ALBERTS, B. et al. Biologia molecular da célula. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010. Disponível em: <https://online.minhabiblioteca.com. br/#/books/9788536321707/cfi/0!/4/4@0.00:0.00>. Acesso em: 15 dez. 2016. 1.3 Eucariotos e procariotos As células podem ser divididas em dois tipos: (a) os eucariontes, mais complexos em termos de organização intracelular e (b) os procariontes, mais simples. As células procariotas, ou procariontes, são células pequenas que possuem todos os elementos mostrados na figura a seguir, porém com algumas adaptações. É obrigatório que os procariontes tenham uma parede celular posicionada externamente à membrana plasmática. Essa parede celular confere rigidez à célula e resistência às alterações de umidade, temperatura e pressão. Além disso, o material genético se apresenta organizado na forma de um cromossomo único e circular que fica em contato direto com o citoplasma. A região em que esse cromossomo fica concentrado recebe o nome de nucleoide. 13 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA No citoplasma dos procariontes, encontramos os ribossomos e outras moléculas essenciais para a realização das transformações necessárias para a manutenção das funções vitais. As proteínas estão presentes dissolvidas no citoplasma ou associadas à face interna da membrana plasmática. Membrana plasmática Nucleoide RibossomosParede celular Figura 4 – A) Estrutura geral de uma célula procarionte; nota-se que o cromossomo circular já foi duplicado, sinalizando que a célula já pode se dividir. B) Micrografia eletrônica de uma bactéria, em que P – parede celular, M – membrana e N – nucleoide Devido a sua grande simplicidade, as células procariontes se dividem muito rapidamente por um processo conhecido como fissão binária, que consiste na duplicação do cromossomo circular seguida por uma invaginação da parede celular que separará os dois cromossomos gerando duas células filhas geneticamente idênticas. Todos os procariontes são unicelulares. São exemplos de organismos procariontes as arqueobactérias, as algas azuis (cianobactérias) e as bactérias. Já as células eucariontes são consideradas células mais complexas tanto por conta do seu tamanho, como também em consequência da sua organização interna. A grande característica das células eucariontes é a presença de compartimentos membranosos que dividem o seu citoplasma em compartimentos funcionais. 14 Unidade I Citosol Núcleo Complexo de Golgi Centríolos Retículo endoplasmático Ribossomos Membrana celular Mitocôndria Nucléolo Lisossomo Cromossomos Membrana plasmática Figura 5 – A) Representação esquemática de uma célula eucarionte e seus diversos compartimentos intracelulares. B) Micrografia eletrônica de um macrófago com seus diversos compartimentos celulares Ao criar regiões especializadas no seu interior, a célula eucarionte aumenta a sua eficiência permitindo que a célula atinja tamanhos maiores sem que haja prejuízo da função, como também permite que as células se organizem de acordo com a semelhança de funções, formando organismos pluricelulares. Daqui em diante, iremos tratar apenas da composição, organização e função das estruturas de uma célula eucarionte. O funcionamento da célula procarionte é estudado por uma área específica da microbiologia: a bacteriologia. 15 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA 2 MEMBRANA PLASMÁTICAA membrana plasmática, muitas vezes, chamada de membrana celular, é uma estrutura presente em todas as células eucariontes e procariontes. Sua presença é obrigatória devido à sua função de separar o meio interno do meio externo, permitindo um maior controle da entrada e saída de substâncias da célula. Podemos citar como funções da membrana plasmática: a) a manutenção do equilíbrio entre o meio intracelular e extracelular; b) o transporte de substância entre os dois meios; c) o reconhecimento de diversas substâncias através de receptores específicos; d) a movimentação celular, incluindo aí os processos de secreção, proliferação mitótica, contração celular etc.; d) a adesão entre as células ou a um substrato; e) a comunicação celular através de sinais elétricos (sinapses) e f) a compartimentalização do meio intracelular (organelas e envoltório nuclear). Para que todas essas funções sejam desempenhadas, a membrana é estruturada de forma bem específica, como podemos observar na figura a seguir. Glicolipídeo Oligossacarídeo Proteína integral ColesterolFosfolipídio Proteína Proteína periféricaperiférica Proteína Proteína integralintegral Proteína Proteína ligada a ligada a lipídiolipídio Hélice α hidrofóbica Figura 6 – Modelo mosaico fluido da membrana plasmática O atual modelo de membrana plasmática foi proposto em 1972 pelos pesquisadores Singer e Nicholson. Segundo eles, a membrana seria composta de duas bicamadas lipídicas de característica anfipática. Entre os lipídios estariam mergulhadas proteínas em diferentes profundidades; algumas posicionadas mais próximas à superfície e outras atravessariam toda a extensão da bicamada. Ligadas aos lipídios e às proteínas, existiriam moléculas de carboidratos. Um dos elementos lipídicos que forma a membrana plasmática são os fosfolipídios (também chamados de glicerofosfolipídios). Os fosfolipídios são responsáveis pela delimitação do perímetro celular e são organizados em bicamada devido a sua natureza anfipática, ou seja, possuem uma extremidade hidrofílica, chamada de cabeça polar, ligada a uma cauda hidrofóbica, conhecida como cadeia acila, ou cauda de hidrocarbonetos. 16 Unidade I Cabeça polar (hidrofílica) Caudas apolares (hidrofóbicas) Ácidos graxos saturados membrana menos fluida Ácidos graxos insaturados membrana mais fluida Ácido graxo insaturadoÁcido graxo saturado Glicerol Figura 7 – Representação esquemática mostrando a estrutura geral de um fosfolipídio e a formas como as cadeias acilas saturadas e insaturadas influenciam na fluidez da membrana plasmática Quando a cadeia acila é formada apenas de ligações simples, dizemos que ela é saturada. A associação de vários fosfolipídios de cadeia saturada torna a membrana menos fluida. No entanto, entre os carbonos que formam a cadeia acila, podem existir duplas ligações. A presença de vários fosfolipídios insaturados em uma membrana torna-a mais fluida. Os principais tipos de fosfolipídios presentes na membrana plasmática são os fosfoglicerídeos (fosfatidilcolina, fosfatidiletanolamina, fosfatidilserina e fosfatidiltreonina) e os esfingolipídios. O tipo e a concentração de cada fosfolipídio da membrana dependem do tipo celular analisado, como pode ser observado no quadro a seguir. Quadro 1 – Principais tipos de fosfolipídios encontrados em algumas células Fosfolipídio Tipo celular Ácido fosfatídico Organelas membranosas Fosfatidiletanolamina Células de mamíferos Fosfatidilcolina Células de mamíferos 17 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA Cardiolipina Células do sistema cardiovascular Fosfatidilinositol Em pequenas quantidades e em todas as células Ceramida (esfingolipídio) Plantas e animais Esfingomielina (esfingolipídio) Bainha de mielina Gangliosídeos (esfingolipídio) Células nervosas Fosfatidilserina Face interna da membrana plasmática Também são abundantes na membrana os glicolipídios; essa classe de lipídios possui, ligadas à sua estrutura, moléculas de carboidratos. Os glicolipídios são encontrados obrigatoriamente na face externa da membrana plasmática, daí sua função ser associada ao reconhecimento de alterações que ocorram no meio externo, como mudança de temperatura e pH, alteração do campo elétrico da membrana e reconhecimento celular. Dentre os glicolipídios, o tipo mais abundante é o gangliosídeo, componente comum na estrutura de vários receptores. A figura a seguir mostra a estrutura de um gangliosídeo. Figura 8 – Estrutura química de um gangliosídeo. A porção lipídica está destacada em verde e os Gm1, Gm2 e Gm3 são as porções de carboidrato das moléculas. À esquerda, podemos ver outra forma de representar um gangliosídeo Outro elemento lipídico da membrana são os esteroides. No caso das células animais, temos o colesterol. A função dos esteroides é dar rigidez à membrana. Quanto maior a concentração de colesterol na membrana, menos fluida ela será. As células procariontes são desprovidas de colesterol. 18 Unidade I Figura 9 – A) Estrutura química do colesterol. B) Forma como o colesterol interage com os fosfolipídios na estrutura da membrana As proteínas são elementos essenciais para qualquer ser vivo devido ao grande número de funções por elas desempenhadas. Na membrana plasmática, a importância dessas macromoléculas não é diferente, uma vez que as proteínas são as grandes responsáveis por manter o equilíbrio dinâmico das membranas. Assim como já ocorre com o conteúdo de fosfolipídios, o conteúdo de proteínas varia das células para a célula não apenas na proporção, mas também no tipo de proteínas existente na membrana. De acordo com seu grau de interação com a membrana, as proteínas podem ser classificadas em proteínas integrais e proteínas periféricas. Chamamos de proteínas integrais aquelas que atravessam totalmente a membrana e, portanto, possuem características anfipáticas e se ligam aos fosfolipídios através de interações hidrofóbicas fortes. Observando a figura a seguir, podemos verificar que as proteínas integrais podem ser divididas em três regiões: uma região hidrofílica que fica em contato com o meio externo; uma região hidrofóbica que atravessa a bicamada de fosfolipídios e, finalmente, uma segunda região hidrofílica que fica em contato com o citoplasma. Essa conformação permite que as proteínas integrais desempenhem papel fundamental no fluxo de substância entre os dois meios e também no reconhecimento e na sinalização celular. Bicamada lipídica A B C D Figura 10 – Representação esquemática das diversas conformações que as proteínas podem apresentar na membrana plasmática. Em A, temos uma proteína integral com apenas um domínio hidrofóbico; em B, temos uma proteína integral com vários domínios; em C, podemos ver uma proteína integral do tipo poro e, em D, uma proteína periférica 19 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA Embora em D seja possível observar uma proteína periférica voltada para o meio interno, ela pode também estar voltada para o meio externo. As proteínas periféricas penetram parcialmente na bicamada lipídica. Quando essas proteínas periféricas ficam voltadas para a porção citoplasmática, normalmente, elas participam da estabilização da estrutura da membrana ancorando com o citoesqueleto. Quando voltadas para o lado externo, essas proteínas periféricas atuam como marcadores de identidade celular e reconhecimento celular, estando em sua maioria associadas aos carboidratos, formando as glicoproteínas. Observação Na superfície dos eritrócitos, temos uma associação de glicoproteínas e glicolipídios, formando uma estrutura chamada glicocálice. Os sistemas de determinantes sanguíneo ABO e Rh são formados por diferentes esfingolipídios e glicoproteínas. Os carboidratos são muito importantes para a membrana das células. Essas moléculas estarão sempre associadas aos lipídios e às proteínas e voltadas para o meio externo, ou seja, em contato com o líquido extracelular. Dentre as funções exercidas pelos carboidratos, podemos citar: a) proteçãode superfície externa da membrana contra agressões físicas e químicas; b) atração de cátions, permitindo a transmissão dos impulsos nervosos; c) reconhecimento celular; d) adesão celular; e) identidade celular, permitindo o reconhecimento de célula pertencentes ou não ao organismo; f) ação enzimática, dentre outras. A figura a seguir mostra como os carboidratos ficam associados à membrana plasmática. Glicolipídio Glicoproteína Proteína integralProteína periférica Bicamada de fosfolipídios LIC LEC Carboidrato Figura 11 – Distribuição dos carboidratos na face externa da membrana de uma célula eucarionte. LEC – líquido extracelular; LIC – líquido intracelular; os carboidratos estão representados pelos hexágonos azuis 20 Unidade I Saiba mais O capítulo 12 do livro indicado a seguir traz uma abordagem profunda das características químicas de cada elemento da membrana e as peculiaridades da membrana plasmática de algumas células, como os eritrócitos. VOET, D.; VOET, J. G. Bioquímica. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2013. Disponível em: <https://online.minhabiblioteca.com.br/books/978858 2710050/pageid/408>. Acesso em: 15 dez. 2016. 2.1 Transporte através da membrana Uma das principais características da membrana é a sua permeabilidade seletiva, ou seja, a identificação e a seleção de quais substâncias podem entrar ou sair da célula. Essa movimentação pode ocorrer de forma passiva ou ativa. O transporte passivo sempre vai acontecer sem a necessidade de gasto energético porque acontece a favor do gradiente de concentração, ou seja, as moléculas fluem do lado mais concentrado em direção ao lado menos concentrado. São exemplos de transporte passivo a difusão simples, a difusão facilitada e a osmose. Já o transporte ativo necessita de energia para ocorrer porque as substâncias irão fluir do lado menos concentrado para o lado mais concentrado. A energia utilizada nesse processo é o ATP. 2.1.1 Transporte passivo Como dito anteriormente, o transporte passivo não requer energia porque as moléculas fluem de um lado mais concentrado em direção a uma região menos concentrada. A difusão simples, também chamada de difusão passiva, ocorre quando temos uma molécula pequena e sem carga, por exemplo, o oxigênio, o CO2, a água e o N2. As características da molécula transportada são necessárias devido ao fato de a difusão simples ocorrer através das moléculas de lipídios da membrana. A presença de uma carga positiva ou negativa impediria o fluxo da molécula porque os fosfolipídios, os esfingolipídos e os glicolipídios podem apresentar cargas que atrairiam ou repeliriam as moléculas a serem transportadas diretamente através da bicamada (figura 12A). Compostos lipossolúveis, como o etanol, a ureia, os ácidos graxos, os esteroides e o glicerol, também são capazes de atravessar a membrana por difusão simples. No entanto, existem moléculas bem pequenas que até poderiam atravessar a membrana por difusão simples, mas elas são carregadas, o que inviabiliza o transporte. Também existem moléculas que são grandes demais para atravessar a bicamada por difusão simples. Nessas duas categorias se enquadram, respectivamente, os íons, a glicose e os aminoácidos, elementos essenciais para a célula e que precisam estar em constante fluxo entre os dois meios. 21 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA As moléculas grandes e/ou carregadas podem ser transportadas passivamente através da difusão facilitada. A grande diferença da difusão simples para a difusão facilitada está na presença de uma proteína integral que permite a comunicação entre os meios intra e extracelular. Na difusão facilitada, a molécula a ser transportada chega até o seu destino atravessando a proteína transportadora do tipo canal iônico (figura 12B) ou do tipo permease (figura 12C). N2 CO2 O2 H2O Ureia Esteroides Ácidos graxos Glicerol Canal iônicoCanal iônico Permease Glicose Difusão facilitada Monotransporte LEC LEC LEC LECLEC LEC LEC Membrana plasmática Membrana plasmática Membrana plasmática Gr ad ie nt e el et ro qu ím ic o Gr ad ie nt e el et ro qu ím ic o Gr ad ie nt e el et ro qu ím ic o LEC LIC LIC LIC LICLIC LIC LIC LIC Cotransporte Antiporte (ou Contratransporte) Figura 12 – Mecanismos de transporte passivo através da membrana. A) Difusão simples; B) Difusão facilitada por canal iônico; C) Difusão facilitada por permease. LEC – líquido extracelular; LIC – líquido intracelular. Os canais iônicos, como o próprio nome já sugere, são responsáveis pelo transporte de íons, como o Na+, K+, Ca+2, PO4 -2 entre outros. Esses canais são proteínas integrais que formam um túnel extremamente seletivo para a passagem de íons específicos que, apesar de pequenos, são moléculas carregadas, impossibilitando sua difusão direta pela bicamada lipídica. Os canais estão presentes em todas as membranas plasmáticas e nas organelas, sendo especialmente abundantes nas células nervosas, em que atuam na condução dos impulsos nervosos. 22 Unidade I Observação Os anestésicos locais, como a lidocaína, atuam nos canais iônicos Na+-dependente. Ao impedir o fluxo de sódio, não haverá a transmissão do impulso nervoso e a dor não será sentida. Já as permeases são proteínas integrais específicas para um ou dois tipos de soluto (Figura 12C). Uma grande diferença entre as permeases e os canais iônicos está na mudança da conformação. Enquanto os canais iônicos mantêm sua estrutura ao longo de todo o processo de difusão do íon, a ligação do soluto na permeasse leva à mudança de conformação da proteína para permitir a passagem do soluto. Uma permease pode transportar apenas um soluto por vez (monotransporte), dois solutos diferentes no mesmo sentido (cotransporte) ou dois solutos diferentes em sentidos opostos (antiporte, ou contratransporte). Moléculas como glicose, aminoácidos e nucleotídeos são transportadas por difusão facilitada. Finalmente, a última forma de transporte, passivo é a osmose. Nessa forma de transporte temos as moléculas do solvente, ou seja, da parte líquida, atravessando a membrana. Uma vez que no corpo humano a água seja o solvente, não será errado dizer que a osmose é a passagem de água através da membrana. A pressão necessária para impedir a passagem de água pela membrana plasmática é chamada de pressão osmótica. Lembrete A água também pode atravessar a membrana por difusão simples ou por difusão facilitada através de uma proteína chamada aquaporina. Na osmose, a água flui do meio menos concentrado para o meio mais concentrado. O equilíbrio é atingido quando os dois meios possuírem a mesma concentração. O quadro a seguir resume a classificação dos meios de acordo com a concentração. Quadro 2 – Classificação dos meios de acordo com a concentração Meio isotônico • [LEC]= [LIC] • existe um equilíbrio entre a quantidade de água que entra e sai da célula Meio hipertônico • [LEC]>[LIC] • a célula irá perder água para o LEC, adquirindo um aspecto crinado (“murcho”) Meio hipotônico • [LEC]<[LIC] • a água do meio externo irá entrar na célula, que ficará túrgida (inchada), podendo, inclusive, sofrer a lise osmótica (arrebentar) 23 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA No organismo humano, consideramos como solução isotônica o NaCl 0,9% porque, nessa concentração, a quantidade de solvente que entra na célula é equivalente a que sai, mantendo as características estruturais. Quando uma célula for colocada em concentrações superiores a 0,9%, ela estará em meio hipertônico e a água tenderá a sair, fazendo com que a célula fique enrugada; essa situação é chamada de cremação. Por outro lado, em concentrações inferiores à 0,9%, a célula será submetida a uma solução hipotônica, para que o equilíbrio volte a ser atingido, será necessária a entrada de água da célula, podendo provocar a sua lise. Esses eventos são facilmente observados em hemácias: a hemólise, ou seja, a lise da hemácia em decorrência do meio hipotônico, é o mais comum deles. A figuraa seguir mostra as consequências para a morfologia da hemácia quando o processo de osmose ocorre. Crenada Solução hipertônica LIC LICLEC LECLEC Solução isotônica Solução hipotônica Normal Túrgida Figura 13 – Osmose nas hemácias. LEC – líquido extracelular; LIC – líquido intracelular Observação A diálise peritoneal é um exemplo do uso da osmose. O peritônio atua como uma membrana que permitirá a saída de toxinas após a introdução de uma solução hipertônica na cavidade abdominal 2.1.2 Transporte ativo Algumas substâncias, no entanto, precisam ser transportadas contra um gradiente de concentração e, para tanto, necessitam de energia para ocorrer. As estratégias de transporte recebem o nome de transporte ativo. Obrigatoriamente, serão mediadas por proteínas transportadoras e envolvem mudança de conformação da proteína. A energia utilizada para a realização desse tipo de transporte é a adenosina trifosfato (ATP) e permite que substâncias presentes em baixas concentrações do lado externo das células sejam transportadas para o meio interno. Embora o transporte do LEC para o LIC seja mais comum, o transporte ativo no sentido inverso também pode ocorrer. As proteínas que realizam o transporte ativo são permeases, comumente chamadas de “bombas”, específicas para cada tipo de soluto a ser transportado. A figura a seguir (A) esquematiza o processo de transporte ativo em uma membrana de eucarionte. 24 Unidade I citosol Molécula pequena Domínios ATPase Gradiente eletroquímico de K+ Gradiente eletroquímico de Na+ 2 citosol 22 LEC + 2 Pi Figura 14 – Transporte ativo em eucariontes. A) Representação esquemática do processo de transporte ativo; B) Representação esquemática do funcionamento da bomba Na+, K+ ATPase A bomba Na+, K+ ATPase é um tipo de transporte ativo presente em todas as células humanas. Seu papel é essencial para manter as diferenças eletroquímicas entre o LEC e o LIC. A bomba Na+, K+ ATPase tem como objetivo colocar, simultaneamente, 3 Na+ para o meio externo (LEC) e 2 K+ para o meio interno (LIC) para criar uma diferença de cargas entre a face interna e a face externa da membrana plasmática. Esse processo é essencial para que ocorra contração muscular e a transmissão do impulso nervoso (sinapse). 2.1.3 Transporte vesicular As macromoléculas, como as proteínas e os polissacarídeos, são muito grandes e não conseguem atravessar a membrana nem mesmo através de proteínas. Elas são transportadas através do transporte vesicular, tanto para entrar como para sair da célula. O processo de transporte vesicular envolve modificações e movimentações na membrana plasmática de forma a criar uma vesícula. Chamamos de endocitose o mecanismo de entrada de macromoléculas nas células, e a vesícula formada ao redor da partícula que penetra na célula recebe o nome de endossomo. Através da endocitose, a célula pode absorver substâncias grandes presentes no meio externo e também agentes infecciosos 25 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA como as bactérias e os protozoários. Quando ocorre a endocitose de uma partícula em suspensão, chamamos o processo de pinocitose. Já a fagocitose é o processo de endocitose de partículas “sólidas” e maiores, como as bactérias. Lembrete Os macrófagos e os neutrófilos são células que compõem o sistema imune inato do organismo. A principal estratégia dessas células para destruir os agentes infecciosos é a fagocitose. Vesícula de pinocitose revestida Vesícula de pinocitose Fusão em endiossomo precoce Retorno de receptores e de membranas Endossomo tarde Digestão no lisossomo Proteínas do revestimento (clatrina) Moléculas ligantes Membrana plasmática Figura 15 – Mecanismos de endocitose (seta vermelha) e exocitose (seta verde) realizados pelas células Observação As bactérias desenvolveram mecanismos que impedem a ocorrência da fagocitose. O principal deles é a cápsula que impede que os macrófagos e neutrófilos reconheçam a bactéria e realizem a fagocitose. 26 Unidade I No entanto, da mesma forma que várias substâncias grandes podem entrar na célula por transporte vesicular, o mesmo processo também é utilizado quando a célula precisa transportar substâncias maiores para o meio externo, por exemplo, produtos de secreção ou ainda compostos tóxicos. Quando a célula utiliza o transporte vesicular para liberar algo para o meio externo, o processo recebe o nome de exocitose. Durante a exocitose, existe a formação de uma vesícula que estará cheia da substância a ser lançada para o LEC. Essa vesícula é formada por fosfolipídios e migra em direção à periferia da célula. Devido a sua natureza similar à membrana plasmática, a vesícula se funde à membrana e lança seu conteúdo ao meio externo. A exocitose é responsável por permitir o retorno de receptores à membrana plasmática, liberar os produtos da digestão celular que não são úteis às células e secretar os elementos da matriz extracelular. 2.2 Elementos citoplasmáticos A membrana delimita o perímetro celular, separando o meio externo (LEC – líquido extracelular) do meio interno (LIC – líquido intracelular). O LIC, nos eucariontes, também recebe o nome de matriz citoplasmática, ou citosol. O citoplasma é uma solução em estado coloidal, ou seja, gelatinoso, e está presente em todos os tipos celulares, tanto eucariontes como também procariontes, devido a sua função. É no citoplasma que ocorrem todas as reações químicas da célula. Lembrete O termo citoplasma se refere a todo conteúdo delimitado pela membrana plasmática, ou seja, as organelas, o citoesqueleto e o citosol, que se refere apenas à parte líquida do citoplasma. 2.2.1 Citosol Como vimos, o citosol se refere apenas à parte líquida do citoplasma. Essa solução tem característica coloidal, ou seja, gelatinosa e, em alguns pontos, pode apresentar maior ou menor consistência. Sua composição é bem variada entre os diferentes tipos celulares. Diversas macromoléculas são encontradas dispersas no citosol na forma de inclusões. O conteúdo das inclusões pode variar tanto entre as diferentes espécies, quanto entre os diferentes tecidos de uma mesma espécie. Nas células hepáticas e musculares, por exemplo, é comum encontrarmos inclusões de glicogênio, ou grânulos de glicogênio, que serão utilizadas como fonte de energia, uma vez que o glicogênio é um polissacarídeo. Outra forma de reserva de energia são as gotículas de lipídios, normalmente formadas por triacilglicerídio, que, embora possam existir em todas as células, são mais comuns em células hepáticas e musculares. Proteínas e enzimas solúveis também podem ser encontradas no citoplasma, sendo as enzimas responsáveis por catalisar as reações de síntese e degradação de pequenas moléculas. 27 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA Células como os melanócitos da pele e das mucosas têm seu citoplasma rico em um pigmento, a melanina, que confere proteção contra a radiação ultravioleta. Além disso, são encontrados dispersos no citoplasma os íons, moléculas carregadas positivas ou negativamente que são importantes para a manutenção da carga elétrica da membrana, da manutenção do pH celular, em torno de 7,2, e da pressão osmótica da célula. Analisando a figura a seguir, podemos observar que os mesmos elementos são encontrados no LIC e no LEC, mas a concentração deles em cada região é diferente. É importante que essa diferença seja mantida, pois é ela que garante o funcionamento adequado da célula e a manutenção do organismo. Essa diferença de valores entre os dois compartimentos é mantida graças aos mecanismos ativos e passivos de transporte através da membrana. Na+ 142 K+ 4 Ca+2 5 Cl- 103 HCO3 - 28 PO4 -2 4 Glicose 90 Aminoácidos 30 10 140 <1 4 10 75 0 - 20 200 Núcleo LEC Citoplasma Membrana plasmática Figura 16 – Composição citoplasmática de uma célula eucarionte. As concentrações dos íons Na+; K+, Ca+2, Cl-, HCO3- e PO4-2 estão expressas em m Eq/L; as concentrações de glicosee aminoácidos estão expressas em mg% 2.2.1.1 Ribossomos O citoplasma é o meio onde ocorrem as mais diversas reações químicas necessárias para a manutenção da funcionalidade da célula. Dentre as reações, está a síntese de proteínas que ocorre nos ribossomos. O processo de síntese proteica será abordado mais adiante. Agora, abordaremos apenas a estrutura dos ribossomos e sua função. Os ribossomos são produzidos no nucléolo, um componente nuclear, e são formados por proteínas e RNA ribossômico. A maioria dos ribossomos é encontrada livre no citoplasma, mas também pode ser encontrada nas mitocôndrias e no retículo endoplasmático rugoso. Apenas uma parte das proteínas sintetizadas permanece no citoplasma, e o restante é encaminhado para o núcleo ou para as organelas. As proteínas sintetizadas pelos ribossomos mitocondriais acabam permanecendo na própria mitocôndria, enquanto que aquelas sintetizadas pelos ribossomos associados ao retículo são normalmente secretadas para o meio externo. 28 Unidade I rRNA 18S Subunidade menor Subunidade maior Ribossomo Ribossomo citoplasmáticos Retículo endoplasmático rugoso Proteínas associadas a outras organelas Proteínas nucleares Proteínas mitocondriais Proteínas citossólicas Proteínas que serão secretadas Proteínas que serão inseridas na membrana plasmática rRNA 28S rRNA 5,8S rRNA 5S Figura 17 – Representação esquemática da formação dos ribossomos e sua localização na célula Saiba mais Para saber mais sobre como as proteínas são direcionadas para cada região celular, leia: DE ROBERTIS, E. M.; HIB, J. Biologia celular e molecular. 16. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014. Disponível em: <https://online. minhabiblioteca.com.br/books/978-85-277-2386-2/epubcfi/6/46[;vnd. vst.idref=chapter16]!/4/2/4/2@0:0>. Acesso em: 15 dez. 2016. 29 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA 2.2.1.2 Organelas membranares Outro elemento citoplasmático exclusivo de eucarionte são as organelas. As organelas são estruturas membranares que criam compartimentos funcionais dentro da célula. Todas as células têm basicamente todas as organelas, porém, conforme a função da célula dentro do organismo, ela poderá ter a prevalência de uma ou outra organela. Figura 18 – Representação esquemática de uma célula eucarionte e suas organelas Retículo endoplasmático O retículo endoplasmático é uma rede de membranas que apresenta uma conformação semelhante a um grupo de túbulos achatados. Eles se iniciam como um prolongamento do envoltório nuclear e se estendem por todo o citoplasma. Na região próxima ao núcleo, há uma série de ribossomos associados externamente, recebendo o nome de retículo endoplasmático rugoso; à medida que a estrutura se afasta do envoltório nuclear, os ribossomos vão diminuindo e a região que fica desprovida de ribossomos associados passa a se chamar retículo endoplasmático liso. O retículo endoplasmático rugoso (RER) tem sua função associada à síntese e modificação de proteínas que serão inseridas em outras organelas, na membrana plasmática, ou que serão secretadas. É comum que o RER sempre esteja próximo ao complexo de Golgi, uma vez que essas duas organelas atuam em conjunto no processo de modificação e endereçamento das proteínas. Já o retículo endoplasmático liso (REL) tem sua função associada à síntese de lipídios e também à modificação de algumas proteínas. 30 Unidade I RE rugoso V S G N RER Envelope nuclear Aparelho de Golgi Endossomo Lisossomo Núcleo Membrana plasmática Glicogênio REL Vesícula secretora Figura 19 – A) Relação entre o núcleo e o retículo endoplasmático. B) Células intestinal destacando o retículo endoplasmático rugoso (RER) e sua proximidade com o núcleo (N) e o complexo de Golgi (G) para que haja a secreção do muco (S); em destaque a relação entre os compartimentos citados. C) Micrografia eletrônica de células de testículo mostrando os canias de túbulos membranosos formados pelo retículo endoplasmático liso (REL) Observação As células hepáticas são ricas em retículo endoplasmático liso, pois essa organela tem também a função de auxiliar na neutralização de compostos tóxicos. Complexo de Golgi O complexo de Golgi, ou aparelho de Golgi, se apresenta como uma rede de sacos sobrepostos, lembrando muito uma pilha de panquecas. 31 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA Sempre está posicionado próximo ao retículo endoplasmático rugoso devido às funções interligadas que ambos possuem na sinalização e no endereçamento de proteínas. Cada região do complexo de Golgi tem um papel específico nas modificações de proteínas que foram sintetizadas pelo RER. Existem regiões que são responsáveis por modificações químicas, como glicosilação (adição de carboidratos), fosforilação (adição de fosfato) ou proteólise (clivagem da proteína); existem regiões que são responsáveis pelo endereçamento das proteínas e, finalmente, outras regiões que farão o empacotamento dessas proteínas em vesículas para sua distribuição em outros pontos da célula ou secreção. Figura 20 – A) Fotomicrografia mostrando o complexo de Golgi (G) e sua relação com o retículo endoplasmático rugoso (RER). Na foto ainda é possível observar o retículo endoplasmático liso (REL), o peroxissomo (P) e a mitocôndria (M). B) Diferentes vias de tráfego das vesículas liberadas pelo complexo de Golgi 32 Unidade I Lembrete As células secretoras, como as glândulas exócrinas, as células da mucosa intestinal e do epitélio respiratório são ricas em complexo de Golgi. Lisossomos Dentre as diversas vesículas liberadas pelo complexo de Golgi, uma tem um destino diferente. Essas vesículas possuem um tamanho maior do que as outras e delimitam um espaço rico em enzimas digestivas de característica ácida. O pH dentro do lisossomo é 5,2. As enzimas existentes dentro do lisossomo são chamadas de hidrolases ácidas e são sintetizadas pelos ribossomos do retículo endoplasmático rugoso. O mecanismo de ação dessas enzimas está diretamente ligado à função dos lisossomos, que é a reciclagem de macromoléculas não funcionais e a digestão de substâncias adquiridas por fagocitose. Figura 21 – Eletromicrografia de uma célula e seus lisossomos (L) Lembrete Os macrófagos são ricos em lisossomos devido ao seu papel na fagocitose de bactérias e outros agentes infecciosos. A digestão celular é um importante processo modulado pelos lisossomos, uma vez que permite tanto a destruição de elementos exógenos que possam ser prejudiciais para o organismo, como as bactérias, 33 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA quanto possibilita a reciclagem de moléculas endógenas, permitindo a reutilização dos seus elementos para outros processos. O mecanismo de digestão celular está intimamente ligado aos processos de endocitose e exocitose e consiste na formação do endossomo e na sua posterior fusão com o lisossomo. A fusão endossomo-lisossomo permite a mistura das enzimas ácidas com as macromoléculas a serem quebradas, formando o vacúolo digestivo. As moléculas menores geradas por esse processo atravessam a membrana do vacúolo e chegam ao citoplasma onde serão reutilizadas; já aquelas que não são interessantes para a célula permanecem no vacúolo, agora chamado de residual, são eliminadas por exocitose. A figura a seguir detalha os passos do processo de digestão celular. Bactéria Bactéria citosol Fagossomo 1 µm 1 µm Autofagossomo Citoesqueleto de actina Corpo residual Fagossomo LisossomoVesículas de transporte com enzimas lisossômicas recém-sintetizadas Endossomo inicial Mitocôndria Mitocôndria Membrana plasmática Autofagia de uma mitocôndria Fa go ci to se d e um a ba ct ér ia Célula branca sanquínea fagocitica Membrana plasmática Peroxissomo Figura 22 – A) Diferentes vias que mostram as funções desempenhadas pelos lisossomos. B) Mecanismo de digestão celular: 1) Interação da partícula estranha com os receptores celulares; 2) Emissão dos pseudópodes para a captura da partícula; 3) Formaçãodo fagossomo no meio intracelular; 4) Fusão do fagossomo com os lisossomo formando o vacúolo digestivo onde ocorre a degradação da partícula; 5) Formação do vacúolo residual e (6) Mobilização do vacúolo para a exocitose 34 Unidade I Observação A ausência ou a deficiência das enzimas lisossomais pode provocar as chamadas “doenças lisossômicas de depósito”, como a doença de Tay Sachs e as mucopolissacaridoses. Essas situações de alterações genéticas impedem a atuação das enzimas e, consequentemente, várias substâncias não são degradadas e/ou recicladas, podendo causar diversas alterações no organismo. Mitocôndria A mitocôndria é a organela mais complexa de todas. É dotada de uma organização única e a única a possuir seu próprio DNA. A forma como as mitocôndrias estão organizadas relaciona-se diretamente com as funções desempenhadas por ela dentro das células. A mitocôndria é dotada de uma membrana externa dupla e uma membrana interna simples que se expande em direção ao seu interior, formando prolongamentos conhecidos como cristas mitocondriais. O espaço delimitado pelas membranas externas e internas é preenchido por um fluido conhecido como matriz mitocondrial. Nessa matriz são encontradas sequências circulares de DNA, o chamado DNA mitocondrial, e ribossomos livres. Matriz mitocnodrial - onde são encontradas enzimas que participam dos processos de produção de energia, o DNA mitocondrial, além de risossomos e outras moléculas menores. Membrana externa - membrana dupla formada por uma bicamada de fosfolipídios. Fica em contato direto com o citoplasma, sendo permeável à maioria dos compostos presentes no LIC Espaço intermembrana - região localizada entre as membranas interna e externa. Possui diferentes íons e proteínas solúveis. Membrana interna - bicamada de fosfolipídios impermeável a muitas moléculas. Esta membrana se estende em direção à matriz mitocondrial onde forma as cristas mitocondriais. Nesta região são encontradas as proteínas da cadeia de transporte de elétrons, responsáveis pela fosforilação oxidativa, e também a bomba ATP - sintase, responsável pela produção de ATP. 100 nm Figura 23 – Fotomicrografia eletrônica de uma célula mostrando suas mitocôndrias (setas). Em destaque, uma mitocôndria com a localização de suas principais regiões 35 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA Observação A presença do DNA mitocondrial sugere que as mitocôndrias sejam procariontes primitivos que foram fagocitados por uma célula eucarionte com a qual passou a viver em simbiose. Todas as células possuem mitocôndrias. Essa organela é essencial para a sobrevivência da célula, uma vez que nela é produzida a maior parte da energia para a ocorrência das reações químicas necessárias para a manutenção da viabilidade celular. Na mitocôndria ocorrerão as reações bioenergéticas e as reações químicas oxidativas que irão produzir o ATP (adenosina trifosfato), molécula responsável por fornecer energia para as reações químicas da célula. Na matriz mitocondrial ocorrerão as reações do Ciclo de Krebs, processo responsável pela produção das coenzimas reduzidas. As coenzimas reduzidas são reservatórios de prótons e elétrons, elementos essenciais para a síntese de ATP. As coenzimas reduzidas serão oxidadas pelas proteínas da cadeia de transporte de elétrons, localizadas nas cristas mitocondriais. Como resultado dessa oxidação, os prótons e elétrons serão liberados e forçarão a passagem de prótons da matriz mitocondrial para o espaço intermenbranas. Os prótons do espaço intermembranas precisam retornar para a matriz mitocondrial e utilizam como passagem a proteína bomba ATP sintase. Ao passarem por essa proteína, localizada também na membrana interna, os prótons possibilitam a união de um ADP com o fosfato inorgânico formando o ATP. Sem a energia produzida por esses processos, a célula será incapaz de sobreviver devido à falta de energia. Além disso, as mitocôndrias participam ativamente do processo de apoptose que ocorre quando uma célula precisa morrer porque já não está mais funcionando adequadamente ou foi infectada por algum patógeno. Membrana externa Membrana interna Membrana Ristas Latriz Espaço intermebranas Espaço intermebranas 4H+ NADH 1/2 O2+2H+ H2O H+ + NAD+ Complexo I Complexo III Complexo IV 4H+ 2H+ Figura 24 – Localização dos processos de produção de energia dentro da mitocôndria. Os números indicam a sequência de ocorrência de cada um dos processos 36 Unidade I Observação O mau funcionamento das mitocôndrias em consequência da ausência ou deficiência das enzimas da cadeia de transporte de elétrons ou na bomba ATP sintase provoca distúrbios degenerativos de origem muscular e nervosa, chamados de doenças mitocondriais. 2.2.1.3 Citoesqueleto celular Uma vez que o citosol é uma solução coloidal e, portanto, sem nenhuma rigidez, a manutenção da forma celular através apenas da membrana plasmática não seria possível. Para tanto, a célula possui uma rede de filamentos proteicos que funcionam como se fossem o alicerce de uma casa. É o chamado citoesqueleto celular. Dentre as funções atribuídas ao citoesqueleto, podemos citar: • forma celular: a manutenção da forma celular e a grande variedade de morfologias celulares existentes são possíveis graças à forma como as proteínas do citoesqueleto estão distribuídas; • movimentos celulares: a realização de movimentos celulares, como os que ocorrem durante a fagocitose e na contração muscular; • movimentos intracelulares: a manutenção da posição das organelas, bem como o trânsito de vesículas pelo citoplasma e o processo de separação dos cromossomos durante a divisão celular. Para que todas essas funções possam ser realizadas, o citoesqueleto é formado por três classes de filamentos proteicos: microtúbulos, filamentos intermediários e filamentos de actina, que formam o citoesqueleto em si. Além disso, existem as proteínas acessórias que controlam o surgimento dos filamentos, a interação entre eles e o movimento dessa rede. A interação entre os diversos grupos de proteínas que formam o citoesqueleto permite que a célula se adapte rapidamente conforme a necessidade. Fica fácil perceber a importância de uma resposta rápida do citoesqueleto quando pensamos em todas as alterações que uma célula sofre durante o processo de divisão celular. Essa resposta rápida é possível graças à forma como os três filamentos estão distribuídos no meio intracelular. 37 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA Filamentos intermediários Filamentos intermediários Microtúbulos Microtúbulos Filamentos de actina Filamentos de actina Figura 25 – Citoesqueleto celular. A) Representação esquemática dos três tipos de filamentos proteicos que formam o citoesqueleto. B) Esquema e foto da distribuição das proteínas do citoesqueleto na célula Filamentos intermediários Os filamentos intermediários atuam na manutenção da estrutura geral da célula e no suporte, daí estarem distribuídos ao longo de toda a área celular e concentrados ao redor do núcleo, como é possível observar na figura a seguir. Para tanto, é organizado a partir de monômeros proteicos ordenados de forma helicoidal e de dímeros dispostos de forma espiral. Podem ser classificados em seis classes de acordo com a composição proteica e distribuição celular. Dentre essas classes, podemos citar as citoqueratinas ácidas (classe 1) e a citoqueratina básica (classe 2), que apresentam distribuição mais ampla entre as células. As queratinas, ou citoqueratinas, são abundantes nas células epiteliais e, por consequência, nos tecidos epiteliais, em que se espalham por todo o citoplasma e se conectam às células vizinhas através dos desmossomos, garantindo a coesão característica desse tecido. Outra classe muito abundante é a das laminas (classe 5), que estão associadas ao envoltório nuclear e, ao contrário dos outros filamentos intermediários, são encontradas exclusivamente no núcleo. Existem ainda os neurofilamentos, que, como opróprio nome já sugere, são numerosos nos neurônios e estão localizados em abundância na região do axônio. 38 Unidade I Existem ainda proteínas associadas a esses filamentos: são as proteínas ligadoras que conectam os filamentos intermediários entre si e também com outros filamentos do citoesqueleto, garantindo a coesão do sistema. Figura 26 – Distribuição dos filamentos intermediários (em verde) em uma célula Observação A distribuição inadequada dos filamentos intermediários pode estar associada a algumas doenças. Hoje já se sabe que células nervosas de pacientes que sofrem com a doença de Alzheimer possuem alterações na distribuição dos seus neurofilamentos. Na cirrose hepática de origem alcoólica, são observados hepatócitos com acúmulos de filamentos intermediários de queratina, formando inclusões chamadas de corpúsculos de Mallory. Microtúbulos São filamentos longos e delgados formados por uma proteína chamada de tubulina. Os monômeros de tubulina se unem formando dímeros que se associam em forma de hélice, mas que estão em constante reorganização e crescimento dentro do citoplasma celular. Embora estejam distribuídos por todo o citoplasma, existe uma maior concentração desses filamentos na periferia da célula, enquanto no citoplasma eles formam uma rede interconectada que permite o trânsito de vesículas e outras estruturas. 39 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA Figura 27 – Distribuição dos microtúbulos (em azul) em uma célula Os microtúbulos possuem várias funções dentro da célula, dentre elas, podemos citar: • transporte intracelular de vesículas e organelas, como os lisossomos, as vesículas secretoras e os endossomos; • motilidade celular através dos cílios e dos flagelos; • movimentação dos cromossomos durante os eventos de mitose e meiose; • participação na citocinese e na formação dos centríolos; • motilidade celular, como observada na fagocitose; • manutenção da forma celular, em especial naquelas células que não são simétricas. Os microtúbulos que desempenham a função de transporte de vesículas e organelas, na motilidade celular e na manutenção da forma celular, são chamados de microtúbulos citoplasmáticos. Os microtúbulos mitóticos são aqueles que participam da movimentação dos cromossomos, enquanto os centriolares participam exclusivamente na formação dos centríolos. Os centríolos são formados por nove trincas de microtúbulos distribuídos de forma octogonal. São mais abundantes próximos ao núcleo e, ao seu redor, são encontrados vários monômeros de tubulina. Embora sempre pensemos nos centríolos como estrutura responsável pelo alinhamento dos cromossomos durante os eventos de mitose e meiose, essa estrutura também é responsável por iniciar a formação dos cílios e dos flagelos. Os centríolos vão fornecer o corpúsculo basal, base em cima da qual serão construídos os cílios e os flagelos através da deposição de novas unidades de tubulina, que empurrarão a membrana plasmática para fora. Durante o processo de divisão celular, também existe a participação dos centríolos, que atuarão na formação das fibras do fuso. Assim que se inicia o processo mitótico ou meiótico, os centríolos se posicionam nos polos celulares, determinando o local de onde partirão os fusos mitóticos que se ligarão aos centrômeros dos cromossomos, permitindo seu alinhamento e sua separação durante a anáfase. 40 Unidade I Cílio Corpúsculo basal Pró-centríolo Novo centríolo Pró-centríolo Centríolo Via centriolar Formação de um cílio através de um centríolo pré-formado Via acentriolar Formação de um cílio através de uma nova dimerização da tubulina Deuterossomo Grânulos fibrosos Figura 28 – A) Papel dos centríolos na formação dos cílios e flagelos. B) Participação dos centríolos na formação das fibras do fuso. Em destaque, um centríolo com as fibras do fuso em formação mostrando que algumas delas se retraem (setas vermelhas) e outras de expandem (setas verdes) Observação Alguns medicamentos utilizados no tratamento do câncer inibem a formação das fibras do fuso, impedindo o prosseguimento da divisão celular. Esses medicamentos são agentes antiproliferativos e antimitóticos. Os cílios e os flagelos são duas estruturas associadas à motilidade celular formadas através dos corpúsculos basais de origem centriolar. Cílios e flagelos se diferenciam em relação ao tamanho e à função. 41 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA Os cílios são projeções menores e numerosas que ficam localizadas na superfície apical de uma célula. Nos cílios, os microtúbulos estão distribuídos em paralelo e envoltos por membrana. No ser humano, são encontrados nas tubas uterinas e no trato respiratório e associados a células que secretam muco. Uma característica desse apêndice é a capacidade de se deslocar de forma unidirecional, permitindo o impulso de uma partícula de poeira em direção ao meio externo, no caso do epitélio respiratório, ou ainda a condução do óvulo em direção ao útero, no caso das tubas uterinas. Por outro lado, os flagelos são estruturas únicas e longas encontradas apenas nos espermatozoides, quando se trata do ser humano. Os flagelos, ao se movimentarem, impulsionam os espermatozoides para frente através de um movimento semelhante ao de uma hélice em um barco. Porém, ao contrário dos cílios, os flagelos precisam de uma maior quantidade de ATP para realizarem seu movimento; na base do flagelo, são encontradas várias mitocôndrias que fornecem a energia necessária para que o movimento aconteça. Lembrete As substâncias presentes no cigarro destroem os cílios, impedindo a depuração das secreções respiratórias e causando o famoso pigarro. Capuz acrossômico Cílio Região pós-acrossômica Peça intermediária Colo Cabeça Cauda Peça principal Peça terminal Microtúbulos do complexo axonêmico Fibras densas externas Mitocôndrias Bainha mitocondrial Bainha fibrosa Fibras densas externas 4, 5, 6 Flagelo Duplas externas do complexo axonêmico Par central de microtúbulos do complexo axonêmico Figura 29 – Fotomicrografia eletrônica de cílios e A) Flagelos e os B) Movimentos desencadeados por cada um deles 42 Unidade I Observação Na síndrome de Kartagener ocorre uma alteração no padrão de organização dos microtúbulos que impede a organização correta das proteínas. Como consequência, pode ocorrer a imobilização dos cílios do epitélio respiratório, impedindo a eliminação das secreções acumuladas. Também pode ocorrer infertilidade feminina, já que essa condição impede o transporte do óvulo e/ou do zigoto até o útero e, também, a esterilidade masculina, por afetar a motilidade dos espermatozoides. Filamentos de actina Dentre todos os filamentos que formam o citoesqueleto, os filamentos de actina, também chamados por alguns autores de microfilamentos, são os mais curtos, finos e flexíveis de todos. Como todos os outros filamentos citoplasmáticos, o filamento de actina é formado pela polimerização de vários monômeros de actina, que se organizam em um arranjo helicoidal de filamentos duplos. Também é o filamento presente em todas as células do organismo, podendo estar localizado na periferia celular, próximo à membrana plasmática, em que é classificado como filamentos corticais, ou dispersos pelo citoplasma, sendo chamados de filamentos transcelulares. Figura 30 – Distribuição dos filamentos de actina (em vermelho) em uma célula 43 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA Podemos atribuir aos filamentos de acitina as seguintes funções: • manutenção da forma celular: a interação entre os filamentos corticais, como os transcelulares, é essencial para a manutenção da forma celular. Nas células epiteliais existe uma prevalência de filamentos corticais, ao passo que nas células do tecido conjuntivo, mais assimétricas, os filamentos transcelulares são mais abundantes; • locomoção celular: através de movimentos chamados de ameboides, uma célula pode se deslocar de uma região. É um movimento muito frequente durante o desenvolvimentoembrionário e das células de defesa para chegar até seu local de atuação, mas também é observado em células tumorais que adquiriram capacidade de invasão. Sua ação mais visível é no citoesqueleto das células musculares, em que atua fortemente junto com outros filamentos no processo de contração muscular; • fluxo citoplasmático: o citoplasma não é um meio estático; a movimentação dos fluidos ocorre graças à movimentação dos filamentos de actina. Além disso, junto com os microtúbulos, também contribuem para a movimentação das organelas; • fixação e movimento das proteínas de membrana: uma vez que esses filamentos estão localizados próximos à membrana, eles são responsáveis pela ancoragem das proteínas membranares e também pela adesão de uma célula à outra em tecidos como os epiteliais; • formação das microvilosidades: as microvilosidades são especializações celulares presentes na superfície apical de células envolvidas em processos absortivos, por exemplo, as células da mucosa intestinal. Embora possam ser encontradas em vários tipos celulares, as microvilosidades são mais abundantes nas células da mucosa intestinal devido a sua característica absortiva. A presença das microvilosidades na superfície apical das células aumenta a superfície de absorção celular. Estruturalmente, as microvilosidades são formadas por feixes paralelos de filamentos corticais de actina que se projetam para o meio externo; na base das microvilosidades, sustentando os feixes de actina, temos uma rede de filamentos intermediários. 44 Unidade I Substância amorfa Cadeia de actina Miosina I Vilina Fimbrina Espectrina Figura 31 – Fotomicrografia da superfície apical da mucosa intestinal de um rato; em destaque, a distribuição dos filamentos de actina na microvilosidades 45 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA Observação Algumas pessoas possuem uma alteração genética que as torna intolerantes a uma proteína presente nos grãos como trigo, aveia, cevada etc. Essa proteína é o glúten, e as pessoas que manifestam essa intolerância possuem a doença celíaca. A doença se caracteriza, dentre outras coisas, pela destruição das microvilosidades intestinais, prejudicando a absorções de nutrientes e provocando um quadro inflamatório com diferentes gravidades. O citoesqueleto das células musculares esqueléticas apresenta uma estruturação especial devido ao papel que essas células desempenham no organismo. Comumente nos referimos às proteínas que formam essa estrutura como miofibrilas, cuja principal característica é a capacidade de adaptar-se à atividade mecânica da célula, encurtando-se durante a contração e alongando-se durante o relaxamento. As miofibrilas são formadas por filamentos de actina (mais finos) e miosina (mais grossos) dispostos ao longo de toda a extensão da célula muscular e organizados na forma de sarcômeros. Quando o músculo está relaxado, os filamentos de actina e miosina estão separados; na presença de um estímulo adequado, os filamentos se aproximam e interagem provocando o encurtamento do sarcômero e a contração da musculatura. Observação Os sarcômeros estão ausentes nas células musculares lisas, nas quais os filamentos de actina são mais grossos e estão distribuídos em vários sentidos formando uma malha tensora. 46 Unidade I Miofibrila Actina Miosina RelaxamentoRelaxamento ContraçãoContração Músculo esquelético contraídoMúsculo esquelético contraído ContraçãoContração máximamáxima Sarcômero Sarcômero Figura 32 – A) Organização dos filamentos de actina e miosina em uma miofibrilas. B) Interação dos filamentos de actina e miosina no sarcômero de uma célula muscular durante os movimentos de contração e relaxamento. Os filamentos de actina estão mostrados em vermelho e os de miosina em verde Lembrete O processo de contração requer ATP para acontecer, e as células musculares são ricas em mitocôndrias. Alterações no funcionamento dessa organela prejudicam o processo e compromete várias funções importantes do organismo. 47 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA Leitura obrigatória Consulte as obras a seguir: CHANDAR, N.; VISELLI, S. Biologia celular e molecular ilustrada. Porto Alegre: Artmed, 2011. Disponível em: <https://online.minhabiblioteca.com. br/#/books/9788536326580/cfi/0>. Acesso em: 15 dez. 2016. ÁRTICO, A. E.; GARCIA, M. R. L.; FELLET, R. L. Biologia para enfermagem. Porto Alegre: Artmed, 2015. Disponível em: <https://online.minhabiblioteca.com.br/#/ books/9788582711200/cfi/2!/4/4@0.00:0.00>. Acesso em: 15 dez. 2016. 3 NÚCLEO E DIVISÃO CELULAR 3.1 Núcleo celular O núcleo é um elemento exclusivo das células eucariontes e deve estar presente em, pelo menos, uma fase do desenvolvimento da célula. A maior parte da informação genética de uma célula encontra-se na forma de cromossomos localizados dentro do núcleo. Podemos comparar o núcleo a um grande centro de controle que comandará todo o metabolismo celular através das informações que serão transcritas do DNA conforme a necessidade da célula. A maioria das células é mononucleada, mas existem células, como as do tecido muscular estriado esquelético, que são polinucleadas, ou as hemácias, que, quando maduras, perdem o seu núcleo. A posição do núcleo na célula varia conforme a sua função. Células secretoras tendem a ter um núcleo basal, enquanto células de revestimento possuem um núcleo mais centralizado. Quando uma célula não está em divisão, dizemos que seu núcleo é interfásico. O DNA estará organizado na forma de cromatina, que fica mergulhada em uma substância gelatinosa chamada de nucleoplasma e separada do resto do citoplasma pelo envoltório nuclear. Também é possível observar uma ou mais massas esféricas chamadas de nucléolos. O nucleoplasma é o “citoplasma do núcleo”; é composto de elementos que garantirão a integridade e a funcionalidade de todos os elementos nucleares. A composição e a função dos outros elementos nucleares serão discutidas a seguir. 48 Unidade I Lâmina nuclear RibossomoEnvoltório nuclear EC HC NU HC EC Figura 33 – A) Esquema do núcleo celular e B) Núcleo celular em micrografia, em que seta cheia – envoltório nuclear, HC – heterocromatina, EC – eucromatina, Nu – nucléolo 49 BIOLOGIA, HISTOLOGIA, EMBRIOLOGIA 3.2 Envoltório nuclear A principal característica de uma célula eucarionte é o fato de seu material genético ficar isolado dos outros elementos citoplasmáticos por uma membrana referida como envoltório nuclear, ou carioteca. Figura 34 – Envoltório nuclear (EN) visto ao microscópio. Setas mostram a descontinuidade do envoltório. En – envoltório nuclear; C – cromatina; Nu – Nucléolo; Np – nucleoplasma Lembrete Durante o processo de divisão celular, o envoltório nuclear é fragmentado logo no início da prófase, voltando a se regenerar ao final da telófase. Ao isolar o material genético em um compartimento especifico, esse envoltório passa a ter como principal função o controle de toda e qualquer substância que poderá entrar em contato com o DNA, ou seja, o envoltório nuclear exerce um papel fundamental como mediador do fluxo de substâncias entre o interior do núcleo e o citoplasma. 50 Unidade I O envoltório nuclear é formado por uma bicamada dupla e descontínua de natureza lipoproteica. A membrana interna fica ligada ao nucleoplasma por meio de proteínas filamentosas chamadas de lâmina nuclear. As proteínas da lâmina nuclear atuam como âncoras entre a membrana interna do envoltório e a cromatina e dão estabilidade e forma ao núcleo. Já a membrana externa fica em contato direto com o citoplasma e é rica em ribossomos. Projeções dessa membrana originam o retículo endoplasmático rugoso. Membrana interna e externa do envoltório nuclear Poro nuclear Ribossomos CromatinaLâmina nuclear Figura 35 – Elementos do envoltório nuclear e sua relação com o retículo endoplasmático rugoso Como dito anteriormente, o envoltório nuclear é descontínuo. Nesses pontos, observa-se uma fusão entre a membrana interna