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AULA 2 
FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS, 
PEDAGÓGICOS E CIENTÍFICOS 
DA EDUCAÇÃO ESPECIAL 
Profª Lígia Maria Bueno Pereira Baccarin 
 
 
2 
CONVERSA INICIAL 
Prezados(as) cursistas, 
Em nossa segunda aula, estabeleceremos, de forma inicial, os preceitos 
filosóficos da educação especial. Portanto, temos como objetivo identificar, 
introdutoriamente, o conjunto de reflexões filosóficas com base nas quais se 
fundamentou a educação especial, para que com base nessa fundamentação 
possamos compreender a que entendimentos as teorias formadas pela narrativa 
da inclusão escolar se relacionam na atualidade. 
Como vimos anteriormente, a educação especial tem sido aventada, na 
maioria das vezes, como um complemento da educação regular. A acepção a ela 
conferida é a de auxílio aos deficientes, e não a de educação de estudantes 
portadores de necessidades especiais. A despeito de ser percebida como 
modalidade de ensino, na maior parte dos casos é mira de abordagens 
reducionistas, ao ser demarcada como mera opção para instrumentos 
metodológicos diversificados. 
Isso posto, partimos do princípio filosófico de que as compreensões e 
práticas sobre a educação especial são consequências do processo histórico pelo 
qual passou a sociedade em um determinado momento. Assim, conforme os 
períodos históricos se adaptam a uma determinada concepção, ocorrem, no 
decorrer do tempo, transformações e superações teóricas, possibilitando o 
surgimento de novas concepções, que subsidiam a forma de compreender os 
sujeitos com deficiência. 
Com base nesses pressupostos, identificaremos algumas teorias filosóficas 
que sustentam os fundamentos da educação especial. Para tanto, escolhemos 
como metodologia um estudo bibliográfico, que estabelece algumas das 
produções de fundamentos filosóficos educacionais que versam sobre os 
indivíduos deficientes. 
Nesse início de nossos estudos, algumas questões nortearão nossa 
reflexão: 
 Quais são os fundamentos filosóficos da educação especial? 
 Como foram construídas essas teorias? 
 Quais os principais expoentes no debate acerca do tema? 
CONTEXTUALIZANDO 
 
 
3 
A educação especial é conceituada, filosoficamente, no âmbito dos marcos 
regulatórios brasileiros, como o modelo de ensino que se caracteriza por um 
conjunto de recursos e serviços educacionais especiais constituídos para 
amparar, assessorar e, circunstancialmente, suprir os serviços educacionais 
corriqueiros, de maneira a abonar a educação formal de pessoas com deficiência. 
Esses sujeitos são precisamente aqueles que atualmente têm sido denominados 
de pessoas portadoras de necessidades especiais. Por conseguinte, a questão 
central que move esta aula é a trajetória teórica dessa concepção. 
A história da educação especial delineia uma exterioridade particular do 
processo de desenvolvimento da humanidade, e, de tal modo, a diferenciação de 
cada período da educação especial proporciona os elementos históricos e sociais 
que envolvem as teorias filosófico-educacionais. Isso posto, primeiramente, 
caracterizaremos a trajetória histórica da educação especial, ressaltando suas 
fundamentais concepções, para elencarmos subsídios que colaborem para a 
apreensão da realidade atual, na qual prevalece a narrativa da inclusão. 
Dentre os marcos históricos apreendidos na aula anterior, resgataremos 
como ponto do debate filosófico das teorias sobre educação especial o período 
das contribuições da revolução científica dos séculos XVI e XIX, que 
transformaram a maneira de se compreender o ser humano e o mundo, aludindo 
à mudança na concepção sobre as causas da deficiência. Como visto 
anteriormente, nesse momento histórico, as análises sobre o comportamento dos 
sujeitos deficientes ganhou a faceta patológica, ligada a bases biológicas. 
Porém, Barroco (2007) observa que mesmo com a assimilação da nova 
concepção sobre as causas orgânicas da deficiência, conservou-se os princípios 
do inatismo,1 caracterizado no entendimento de que o deficiente era, 
naturalmente, desfavorecido das qualidades necessárias à vida social e que tal 
condição era irreversível. Dessa forma, será a partir desse período que faremos o 
recorte contextual para iniciarmos nossos estudos acerca dos fundamentos 
filosóficos da educação especial. 
TEMA 1 – PREDOMÍNIO DAS IDEIAS INATAS 
 
1 O inatismo é uma concepção filosófica que define que o conhecimento de um indivíduo é uma 
característica inata, ou seja, nasce com ele. Nessa teoria, a ideia do conhecimento desenvolvido 
com base em aprendizagens e experiências individuais de cada pessoa é desconsiderada. 
 
 
4 
A dominância das concepções inatas e sua generalização foram objetadas 
por John Locke (1632-1704), tendo como consequência uma nova maneira de 
conceber a atividade intelectual. Para Locke, a experiência sensorial teria 
preponderância na assimilação do conhecimento e seria um instrumento no 
provimento de material para as intervenções particulares da atividade intelectual, 
ou seja, a razão só poderia se fundar por vinculação direta daquilo que o empírico 
lhe poderia fornecer. Para o autor, “[...] as crianças e os idiotas possuem almas, 
possuem mentes, dotadas dessas impressões [inatas] devem inevitavelmente 
percebê-las, e necessariamente conhecer e assentir com essas verdades; se, ao 
contrário, não o fazem, tem-se como evidente que essas impressões não existem” 
(Locke, 1978, p. 146). 
Mas no que se refere à deficiência, o entendimento cunhado por Locke 
falha em compreender a deficiência como falta de experiências sensíveis. Tal 
compreensão foi empregada por outros estudiosos, como Condillac2 (1715-1780), 
na educação de pessoas com deficiência por meio de metodologias baseadas no 
exercício sensorial. 
É importante perceber que o ensino para deficientes, que se estabeleceu 
sobre uma base epistemológica empirista, mesmo se reduzido a uma educação 
excepcional sob a perspectiva do treinamento de funções incipientes sensório-
motoras, foi um progresso para a caminhada das concepções da educação 
especial, ao longo do tempo. 
Com base no empirismo, o ensino voltado a pessoas com deficiência foi 
ganhando corpo. Com o liberalismo do século XVIII, difundiu-se ideais dentre os 
quais destacamos a defesa da extensão das oportunidades educacionais para 
todos, o que permitiu a compreensão de que os sujeitos com deficiência teriam 
condições de convívio social. Essa disposição deu origem, conforme os estudos 
de Mazzotta (1996), a vários movimentos pedagógicos que culminaram no século 
XIX com a denominação de pedagogia dos anormais, pedagogia teratológica, 
pedagogia curativa ou terapêutica, pedagogia da assistência social. 
1.1 Base epistemológica positivista 
 
2 Étienne Bonnot de Condillac concebeu, na época do Iluminismo, uma teoria do conhecimento 
cunhada no empirismo. Nela as sensações são o principal instrumento do conhecimento. Para ele, 
o conhecimento é um sistema complexo que exige o estudo dos sentidos de maneira separada 
para que se consiga entender quais sentidos originam quais ideias. 
 
 
5 
Mazzotta (1996) também observa que essa mudança conceitual só ocorreu 
quando houve modificação do sistema econômico, por que o fato permitiu que 
algumas pessoas acendessem nos vários círculos da vida social para a 
organização de percepções e alternativas de ação com o objetivo de melhorar as 
condições de vida das pessoas portadoras de necessidades especiais. 
No século XIX houve uma considerável expansão da educação especial no 
interior do movimento de organização das ciências humanas e de aplicação do 
método das ciências naturais a elas. Para esclarecimento, ressaltamos que nesse 
momento histórico ocorreu a separação entre sociologia, filosofia e psicologia. 
Elas passaram a ser compreendidas como teorias que possuem objeto próprio emétodo distinto. 
O objetivo era aplicar as metodologias das ciências naturais nas ciências 
humanas, utilizando o sujeito das ciências humanas como um objeto análogo ao 
das ciências da natureza. Essa experiência procedeu da fundamentação 
epistemológica positivista, que se alicerça na concepção de que o único 
conhecimento é o que pode ser observável e mensurável. 
Conforme Padilha (2004), essa concepção auxiliou na gestação da psicologia, 
que se muniu das experimentações positivistas para compreender fatos 
psicológicos humanos, originando a psicologia behaviorista. 
É importante salientar que o behaviorismo não se caracteriza por ser uma 
ciência do comportamento humano; entretanto, configura-se na filosofia dessa 
ciência. Por isso, mesmo com todas as críticas contemporâneas a essa filosofia, 
inegavelmente aceitamos que os questionamentos por ela levantados 
impulsionaram a compreensão sobre como a Educação Especial se tornou fonte 
de conhecimento teórico. As principais questões elencadas com base no 
behaviorismo e que serviram de base para as sucessoras análises sobre 
educação especial são: 
 É possível a existência de uma ciência do comportamento humano? 
 Essa ciência explicaria todas as expressões do comportamento humano? 
 Que métodos pode aplicar? 
1.1.1 O behaviorismo 
Zanoto, Moroz e Gioia (2009) nos ensinam que o behaviorismo foi um 
movimento filosófico que nasceu em antítese à chamada psicologia da mente. Os 
 
 
6 
psicólogos, no início do século XIX, já avaliavam a mente como um formidável 
objeto de investigação e empregavam a concentração reflexiva como 
procedimento metodológico. Respondendo a essa tendência, na segunda metade 
do século XX, tomou corpo uma corrente filosófica que apresentava como objeto 
de análise da psicologia o comportamento. O estudo de John B. Watson, A 
psicologia do ponto de vista de um behaviorista, de 1913, é reconhecido como um 
marco do behaviorismo metodológico. Para Watson, a psicologia, 
equivocadamente, era entendida como a ciência da mente, mas deveria ser 
estudada como a ciência do comportamento. Por conseguinte, precisaria seguir 
métodos objetivos e recusar elementos concernentes à mente como objetos de 
estudo. O comportamento humano deveria ser explicado com base em fatos 
observáveis e verificáveis objetivamente. 
Com isso, percebemos que na segunda metade do século XX, com base 
em diversas teorias da filosofia e da psicologia, passou-se a questionar as teorias 
vigentes sobre deficiência. Esses enfoques embasados em pesquisas acerca dos 
transtornos colaboraram para a transformação dos padrões educacionais vigentes 
até então, porque confirmaram a influência social e cultural no funcionamento 
intelectual e comportamental dos deficientes. 
Nesse contexto, a concepção behaviorista teve o mérito de afiançar à 
psicologia o status de cientificidade, distinguindo-se da psicologia anterior, 
chamada de psicologia filosófica ou racional. Essa perspectiva adapta os 
pressupostos da sujeição humana ao processo educacional, desenvolvendo o 
exercício fundamentado na repetição e no modelo estímulo-resposta. Por esse 
ponto de vista: 
O sujeito da aprendizagem apenas reage, e o profissional da educação 
transmite os conteúdos, organiza o ambiente da melhor maneira 
possível para que o condicionamento seja eficaz, isto é, para que se 
atinjam os objetivos esperados, anteriormente planejados. Nos casos de 
insucesso procura-se as causas nas contingências aplicadas ao sujeito 
e nas respostas dele (Padilha, 2004, p. 18). 
Assim sendo, no que concerne à educação especial, o trabalho educativo 
seguido se constitui em práticas escolares adaptativas, que formam uma recepção 
clínico-pedagógica na qual o processo pedagógico se aplica às ações 
terapêuticas e aos recursos pedagógicos manuais, de tal maneira que 
esquadrinhem a reparação dos déficits, por meio de processos de compensação, 
com o objetivo de aproximar os sujeitos com deficiência do padrão de 
“normalidade”. 
 
 
7 
O behaviorismo, embasado nos fundamentos filosóficos positivistas, se 
apresentou na história do ensino especial brasileiro por meio de instituições 
especializadas em educação especial, bem como pelo movimento de integração3 
organizado no Brasil na década de 1970, com o título de normalização e 
racionalização.4 
Kassar (2011) observa que no Brasil a fundação dos atos em proveito da 
integração dos sujeitos com deficiência teve sua entrada e expansão na 
concepção desenvolvimentista aceita pelo regime civil-militar. No final de 1970, 
atendia aproximadamente 97,8% dos alunos em situação de “integração”. 
1.1.2 O método montessoriano 
Outra fonte sobre educação especial está no trabalho produzido por Maria 
Montessori. Educadora que partilhava dos princípios escolanovistas5 para a 
elaboração de sua perspectiva educacional, ensinava, essencialmente, às 
crianças deficientes em um internato de Roma no início do século XX. Em seguida, 
expandiu-se para o método de escolarização. Por isso, “destacou-se pela 
proposição da autoeducação, por meio de materiais didáticos, tais como: blocos, 
encaixes, recortes, objetos coloridos, letras em relevo, etc. Fazia parte do seu 
programa de ‘treinamento’ a ênfase em regras essenciais para crianças em idade 
pré-escolar (Barroco, 2007, p. 149-151). 
Para Barroco (2007), ao ser proposto à educação especial, o método 
montessoriano tende ao aumento do desempenho básico sensório-motor, sendo 
que, conforme esse método, o elemento mais afetado nas crianças deficientes 
seria a percepção, causa pela qual os materiais didáticos propendiam, 
precisamente, fomentar a experiência sensorial por meio da ampliação do 
pensamento. 
A educadora, ao inferir a constituição da aprendizagem com base no 
psiquismo, demonstrou sua inquietação em expor as crianças ao desenvolvimento 
 
3 O movimento de integração difundido no Brasil, na década de 1970, surgiu em oposição à 
institucionalização dos sujeitos com deficiência. Todavia, está embasado na teoria produtivista de 
educação, que segue os princípios de racionalidade e produtividade e, com isso, a educação se 
transforma em mercadoria, um bem qualificado como capital humano. 
4 A normalização é o princípio que consiste na necessidade de assemelhar a pessoa deficiente 
aos demais cidadãos ditos “normais”, para ser integrada à sociedade. E a racionalização se 
caracteriza pela adequação dos fatores objetivos-recursos-limitações à plena utilização dos 
recursos disponíveis. 
5 O movimento escolanovista se baseia na teoria pragmática do conhecimento, em que este tem 
função quando usado na resolução de problemas da prática cotidiana. Assim, a validade das ideias 
é resultado de suas consequências práticas. 
 
 
8 
de aptidões inerentes e práticas, encorajadas pelo campo sensorial, com intensão 
de ativar (como uma espécie de gatilho) o pensamento inato pelos elementos 
externos. Essa concepção tinha o escopo de adequar aos sujeitos seus papéis 
sociais à edificação do conhecimento prático e experimental, de maneira a se 
tornarem benéficos à sociedade. O método montessoriano ainda tem ampla 
influência na educação especial. 
TEMA 2 – A PROPOSTA FILOSÓFICA DE INCLUSÃO SOCIAL DA DÉCADA DE 
1990 
A década de 1990 representou um marco na transição da concepção 
filosófica de educação especial, que passou a ser debatida em termos de inclusão 
social. Nesse momento histórico, houve um aumento no mapa dos registros legais 
e dos principais documentos internacionais provenientes de conferências e 
congressos organizados por agências internacionais.6 Esses documentos 
constituem o conjunto de diretrizes desenvolvidas por organizações internacionais 
em países em desenvolvimento, agrupando suas conclusões à elaboração das 
políticas educacionais desses países, que instauram medidas que cooperam para 
o caminhar de uma sociedade inclusiva.Nesse período, nos debates sobre educação especial, substituiu-se a 
narrativa da integração pela da inclusão, que objetivou a inclusão dos sujeitos 
com deficiência à rede regular de ensino como método de superação da exclusão 
social e do senso comum segregativo concernentes a elas. Nada obstante, é 
necessário analisar as concepções filosófico-educacionais que sustentam a 
proposta de uma educação especial inclusiva atualmente. 
2.1 A concepção interacionista de desenvolvimento humano 
Ao analisar os documentos que norteiam a proposta inclusiva, preparados 
pela Secretaria de Educação Especial (Seesp) do Ministério da Educação (MEC) 
(Brasil, 2006), notamos que a concepção interacionista é indicada como 
fundamento filosófico da política de inclusão educacional das pessoas com 
deficiência, uma vez que: 
[...] objetiva-se a substituição do paradigma reducionista organicista- 
centrado na deficiência do sujeito – para o paradigma interacionista – 
 
6 Trataremos desse tópico em uma aula exclusiva sobre o tema. 
 
 
9 
que exige uma leitura dialética e incessante das relações sujeito/mundo 
[...]. Recentemente houve mais uma revisão calcada no conceito 
ecológico da deficiência, isto é, relacionando a pessoa ao seu ambiente. 
Com esse enfoque, faz-se necessário avaliar os apoios que são 
oferecidos para as pessoas evoluírem nas suas habilidades adaptativas 
(Brasil, 2006, p. 34-35). 
A teoria interacionista de desenvolvimento humano se baseia na 
epistemologia genética de Jean Piaget e busca a superação do dualismo 
psicofísico na metodologia de conquista do conhecimento. Destarte, para Piaget, 
o conhecimento é erguido progressivamente por práticas sucessivas de 
desequilibração e equilibração decorrentes da relação do sujeito com o meio 
social. 
Duarte (2001) analisa que na constituição do conhecimento, na teoria de 
Piaget, o desenvolvimento cognitivo se compõe como elemento do processo de 
ajustamento do sujeito ao meio social, em que o processo de ajustamento tem 
papel adaptativo. 
De forma resumida, a epistemologia genética abarca fundamentalmente 
dois processos na adaptação do desenvolvimento cognitivo: 
1. assimilação: por meio dela, a realidade externa é explicada, e é possível 
agrupar novas experiências por meio de algum significado já constituído na 
estrutura cognitiva do indivíduo; 
2. acomodação: o indivíduo transforma os sentidos já existentes, modificando 
suas ações. 
Dolle (1974) demonstra que a adaptação incide em equilibrar 
sucessivamente assimilações e acomodações por meio de um processo que parte 
de uma etapa de menor equilíbrio até chegar a outra de maior equilíbrio, de 
maneira que a evolução do sujeito ocorre por uma construção ininterrupta. 
Assim, ao desenvolver a epistemologia genética, Piaget combateu a divisão 
entre empirismo e inatismo e sugeriu um conceito construtivista, em que a origem 
do conhecimento se instala paulatinamente em etapas contínuas sem pré-
formação. Consequentemente, houve qualificação da teoria construtivista, já que 
se passou a aceitar que a evolução cognitiva se erige como integrante do 
processo de adaptação do sujeito ao meio ambiente, em sua ação sobre o meio 
e pela troca adaptativa entre organismo e meio ambiente. 
Entretanto, Duarte (2001) infere que se para Piaget o desenvolvimento 
cognitivo não pode ser empírico nem estabelecido em um conhecimento inato, 
mas edificado pela preparação sucessiva de equilibração e adaptação derivando 
 
 
10 
em novas composições, sua teoria focaria a questão do conhecimento no 
indivíduo. 
Assim, a compreensão construtivista foi a síntese pedagógica hegemônica 
da década de 1990, cujo escopo foi garantir aos sujeitos a competência de 
adaptação às várias situações conferidas pelo sistema existente para obter o grau 
de empregabilidade. Dessa forma, “[...] a escola teria a função de ‘assegurar que 
ele aprenda a aprender’ para se tornar competitivo no mercado, nos moldes do 
que vem sendo chamado de globalização e, assim, sentir-se ‘incluído’ no sistema”. 
(Oliveira, 2010, p. 20) 
Ressaltamos que Piaget não propôs um método de ensino, mas elaborou 
uma teoria do conhecimento e desenvolveu diversas investigações cujos 
resultados são até hoje utilizados por psicólogos e pedagogos. Por isso suas 
pesquisas recebem distintas interpretações que se materializam em propostas 
didáticas também diferentes. 
Desse modo, no campo da educação especial, se de um lado procede-se 
à introdução do construtivismo, em contraponto aos métodos behavioristas, de 
outro há uma teoria diferente que dialoga no sentido contrário ao construtivismo, 
denominada de teoria histórico-cultural, desenvolvida por Vygotsky. 
TEMA 3 – TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL 
É conhecido o construto de Vygotsky para a educação, como também é 
conhecida a acessão e a adaptação de sua obra à realidade brasileira. Todavia, 
é desconhecido que o autor consagrou um quinhão de suas pesquisas à educação 
de crianças com necessidades especiais.7 
O pertinente é compreendermos que Vygotsky focou o nascimento de 
novos contornos de apreensão da psyché humana. Ao citarmos essa 
particularidade do trabalho do autor, dimensionamos que, em uma sociedade 
cristalizada em uma visão imutável e estática do sujeito e da sociedade, é muito 
impulsionadora a sua contribuição, que contradiz o legado que nos foi deixado por 
grande parte das ciências sociais e psicológicas. 
Com o objetivo de superar as filosofias fatalistas do desenvolvimento 
humano, de submissão e dependência do homem ao meio biológico, Vygotsky, 
com base nos fundamentos do materialismo histórico-dialético, cunhou uma teoria 
 
7 Nesta aula, apresentaremos uma discussão inicial para ter arcabouço categorial para que em 
um segundo momento possamos aprofundar essa temática. 
 
 
11 
que se distinguiu das demais correntes filosóficas por voltar-se à busca pela 
compreensão do homem em seu desenvolvimento. Com essa fundamentação, 
Vygotsky (1997, p. 372) afirma que: 
[...] cada pessoa é em maior ou menor grau o modelo de sociedade, ou 
melhor, da classe a que pertence, e que nele se refletem a totalidade 
das relações sociais. Podemos ver que nesta abordagem o 
conhecimento singular é a chave para toda a psicologia social; de modo 
que temos que conquistar para a psicologia o direito de considerar o 
singular, ou seja, o indivíduo como um microcosmo, como um tipo, como 
um exemplo ou modelo de sociedade. 
O teórico atenta para a forma de conceber o ser humano como elemento 
social que não está subordinado às leis biológicas, mas às leis sociais e históricas. 
Assim, para Vygotsky, a raiz das funções psicológicas superiores seria encontrada 
nas relações sociais dos sujeitos, sendo o desenvolvimento humano resultado do 
movimento dialético que se estabelece da função interpessoal para a intrapessoal. 
[...] as formas coletivas de colaboração precedem as formas individuais 
de conduta que se desenvolvem sobre a sua base e são seus 
progenitores diretos as fontes de seu surgimento. [...]. Desse modo, da 
conduta coletiva, de colaboração da criança com as pessoas que o 
rodeiam e de sua experiência social, surgem as funções superiores da 
atividade intelectual (Vygotsky, 1997, p. 179). 
Inferimos que, para o pensador russo, o ser humano se humaniza ao 
transformar a natureza de acordo com suas necessidades, e não se adaptando a 
ela, de tal modo que sua condição humana não antecede sua vivência, mas, sim, 
é produzida por ela, por meio da assimilação e transformação dos conhecimentos 
já existentes. 
Ao arraigar o tema do trabalho humano como ontologia do ser social, isto 
é, como produtor da condição humana, Vygotsky aceita os alicerces filogenéticos, 
mas considera como componente básico o desenvolvimento ontogenético. Com 
isso, somente as bases biológicas não dão contade ampliar a capacidade 
intelectual humana, pois a humanidade necessita se apropriar do patrimônio 
cultural, histórico e socialmente produzido, objetivando-o e o transformando por 
meio do trabalho. 
Isso posto, destacamos sua contribuição para a educação especial. Nesse 
campo do conhecimento, Vygotsky se sobressaiu pela quebra do modo 
determinista, filantrópico e religioso que a deficiência carregava como um legado 
europeu. 
3.1 Vygotsky e a educação especial 
 
 
12 
Ao entender que o desenvolvimento humano não é inerente a uma possível 
essência humana, mas representa um produto social, Vygotsky proporcionou 
uma nova compreensão da prática pedagógica no domínio da educação especial. 
Ao teorizar que o desenvolvimento das composições psíquicas do ser humano 
está apto às ingerências históricas e sociais, a probabilidade de modificação do 
pensamento, da linguagem e da própria aprendizagem se tornaram mais 
realizáveis do que as mudanças pelas abordagens terapêuticas, amiúde 
utilizadas. 
Ao teorizar que “todo defeito cria estímulos para a compensação” 
(Vygotsky, 1997, p. 176), o autor aponta que a educação especial precisa analisar 
as limitações estruturais e funcionais das pessoas. No entanto, como essas são 
categorias elementares, é preciso escolher as categorias subsidiárias, conectadas 
às funções mentais superiores, para permitir o desenvolvimento de sujeitos com 
deficiência, permitir que se deparem com funções psicológicas superiores, e não 
inferiores. 
Dessarte, a educação especial não pode se ater a definir o nível e a 
circunspeção da deficiência e suas incapacidades, contudo, deve abarcar o 
processo de compensação com técnicas construtivas e estabilizadoras do 
desenvolvimento do indivíduo com deficiência. 
Vygotsky aposta na capacidade que o sujeito e seu organismo têm de se 
transformar, ou seja, na capacidade do indivíduo de criar processos adaptativos 
com a finalidade de sobrepujar os impedimentos que encontra. Entretanto, o autor 
analisa que apesar de o organismo ter, possivelmente, essa capacidade de 
superação, ela só se efetiva com a mediação de fatores socioambientais, pois o 
desenvolvimento ocorre na simbiose dos fatores externos e internos. 
A deficiência se transforma, de tal modo, no postulado e na energia 
propulsora do desenvolvimento psíquico e da personalidade. Qualquer defeito, de 
acordo com Vygotsky, causa estímulos para o desenvolvimento de sua própria 
superação ou compensação. O preceito geral da compensação, para esse autor, 
aplica-se do mesmo modo a qualquer outra categoria de desenvolvimento. Ao 
expor tal argumento, Vygotsky explica que sob essa perspectiva, “tudo o que não 
me destrói, me faz mais forte, pois na compensação da debilidade surge a força, 
e das deficiências, as capacidades” (Vygotsky, 1989 in Costa, 2006, p. 233). 
Sob essa perspectiva, um conceito que acompanha a teoria vygotskyana é 
o de que a inteligência não é imóvel, mas ativa, podendo, por conseguinte, se 
 
 
13 
transformar. Outro pressuposto é que um dos objetivos da educação é gerar o 
desenvolvimento da inteligência. Vygotsky nos provê os embasamentos dessa 
compreensão ao explicar que a inteligência não é inata, mas se estabelece nas 
interações ininterruptas com o meio ambiente. A educação se coloca nesse 
cenário, e a escola tem um papel elevado nesse processo. Por isso, torna-se 
imperativo lembrar o que Vigotsky nos fornece sobre as relações entre 
aprendizagem e desenvolvimento, o que é bem sintetizado em seu conceito de 
zona de desenvolvimento proximal, tema de nossa próxima aula. 
FINALIZANDO 
Prezados(as) cursistas, 
Nesta aula, vimos que os fatores formados historicamente na organização 
das teorias filosófico-educacionais no campo da educação especial elucubram o 
conjunto do movimento histórico-social de produção do próprio desenvolvimento 
humano. Dessa forma, o tratamento direcionado aos indivíduos com deficiência 
permanece conexo ao desenvolvimento social e científico, que a delimitada 
sociedade buscou superar durante um certo período. 
Com isso, percebemos que a compreensão do ser humano como imutável, 
por nós herdada, suscitou na sociedade, e também nos educadores, uma 
perspectiva contraproducente com relação às possibilidades de aprendizagem e 
desenvolvimento do sujeito com necessidades educativas especiais. 
Dentre as teorias que colocaram em xeque a imutabilidade cognitiva dos 
deficientes, destacamos os estudos da psicologia behaviorista, o método 
montessoriano, os estudos de Piaget e, principalmente, a perspectiva de 
Vygotsky, sobretudo pelo fato de que a filosofia apreendida pelo autor parte do 
princípio de que os indivíduos e o mundo real, que os insere, estão em constante 
movimento e transformação. Sob esse referencial, o que fizemos nesta aula foi 
oferecer ao cursista algum conhecimento a respeito da obra de Vygotsky dedicada 
às crianças com necessidades educativas especiais. 
Seus estudos ensinam-nos, do mesmo modo, que a formação do aluno com 
necessidades especiais mira os mesmos objetivos daquela do aluno dito não 
especial. As formas de se alcançar esses objetivos é que seriam diferentes. 
Produzir essas condições nos leva a pensar em uma educação enriquecida, 
criativa, que possa aproveitar de instrumentos diversos para que o educando 
desfrute de um ensino adequado e qualificado. 
 
 
14 
LEITURA OBRIGATÓRIA 
Texto de abordagem teórica 
COSTA, D. A. F. Superando limites: a contribuição de Vygotsky para a educação 
especial. Revista Psicopedagogia, v. 23, n. 72, p. 232-240, 2006. 
Essa obra nos oferece um panorama geral dos principais conceitos e categorias 
desenvolvidos por Vygotsky no âmbito da educação especial. 
Texto de abordagem prática 
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Saberes e 
práticas da inclusão: recomendações para a construção de escolas inclusivas. 
2. ed. Brasília: MEC/Seesp, 2006. 
Esse documento norteador estabelece recomendações para a construção de 
metodologias direcionadas à educação especial. 
Saiba mais 
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Educação 
inclusiva: a fundamentação filosófica. Brasília: MEC/Seesp, 2004. v. 1. 
Disponível em: 
<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/fundamentacaofilosofica.pdf>. 
Acesso em: 29 jun. 2018. 
Esse documento sobre educação inclusiva apresenta novos conceitos, 
informações e metodologias no âmbito da gestão e também da relação 
pedagógica em todos os estados brasileiros. 
 
 
 
15 
REFERÊNCIAS 
BARROCO, S. M. S. A educação especial do novo homem soviético e a 
psicologia de L. S. Vygotsky: implicações e contribuições para a psicologia e a 
educação. 414 f. Tese (Doutorado em Educação Escolar) – Universidade Estadual 
Paulista Júlio de Mesquita Filho – Faculdade de Ciências e Letras, Araraquara, 
2007. 
BRASIL. Ministério da Educação. Saberes e práticas da inclusão: 
recomendações para a construção de escolas inclusivas. 2. ed. Brasília: 
MEC/Seesp, 2006. 
COSTA, D. A. F. Superando limites: a contribuição de Vygotsky para a educação 
especial. Revista Psicopedagogia, v. 23, n. 72, p. 232-240, 2006. 
DOLLE, J. M. Para compreender Jean Piaget: uma iniciação à psicologia 
genética piagetiana. 4. ed. Tradução de Maria José J. G. de Almeida. Rio de 
Janeiro: Guanabara Koogan, 1974. 
DUARTE, N. Vigotski e o “aprender a aprender”: crítica às apropriações 
neoliberais e pós-modernas da teoria vigotskiana. 2. ed. Campinas: Autores 
Associados, 2001. 
KASSAR, M. C. M. Percursos da constituição de uma política brasileira de 
educação especial inclusiva. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, 
v. 17, n. esp. 1, p. 41-58, ago. 2011. 
LOCKE, J. Ensaio acerca do entendimento humano. São Paulo: Abril Cultural, 
1978. (Coleção Os Pensadores). 
MAZZOTTA, M. J. S. Educação especial no Brasil: história e políticas públicas. 
São Paulo: Cortez, 1996. 
OLIVEIRA,B. A. Fundamentos filosóficos marxistas da obra vigotskiana: a 
questão da categoria de atividade e algumas implicações para o trabalho 
educativo. In: MENDOÇA, S. G. L.; MILLER, S. Vigotski e a escola atual: 
fundamentos teóricos e implicações pedagógicas. 2. ed. Araraquara: Junqueira e 
Marin; Marília: Cultura Acadêmica, 2010. p. 11-29. 
PADILHA, A. M. L. Possibilidades de histórias ao contrário ou como 
desencaminhar o aluno da classe especial. São Paulo: Plexus, 2004. 
 
 
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1984. 
ZANOTTO, M. L. B.; MOROZ, M.; GIOIA, P. S. Behaviorismo radical e educação. 
Revista da APG, São Paulo, v. 9, n. 23, p. 217-237, 2000. Disponível em: 
<http://www.redepsi.com.br/2008/08/22/behaviorismo-radical-e-educa-o/>. 
Acesso em: 29 jun. 2018.

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