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Lyzandra Linhares Classificação da Dor Torácica: Desconforto ou dor torácica é uma manifestação clínica da isquemia miocárdica resultante de doença da artéria coronária (DAC) ou de qualquer outra condição que cause isquemia miocárdica através do desequilíbrio entre a demanda de oxigênio pelo miocárdio e a oferta desse gás. Dor de aparecimento recente, aguda e frequentemente persistente pode indicar infarto agudo do miocárdio (IAM), angina instável ou dissecção aórtica; uma causa pulmonar (embolia pulmonar aguda ou irritação pleural); uma condição musculoesquelética da parede torácica ou dos ombros; ou ainda uma anomalia do sistema digestório (refluxo ou espasmo esofágico, úlcera péptica ou colecistite). A dissecção aórtica se apresenta classicamente com início súbito e intenso de dor torácica intensa que irradia para o dorso; a localização da dor frequentemente fornece indícios sobre a localização da dissecção. A presença de sinais autonômicos (palidez cutânea e sudorese profusa) deve levantar a suspeita imediata de dissecção aguda de aorta. A dissecção aórtica pode gerar complicações como: a ruptura de vasos, insuficiência aórtica aguda, dissecção das coronárias, extensão para vasos cervicais, isquemia mesentérica ou de membros superiores e inferiores, dentre outras. Dissecções na aorta ascendente se apresentam comumente com desconforto torácico que irradia para o dorso, enquanto dissecções da aorta descendente frequentemente se apresentam com dor nas costas que irradia para o abdome. A dor da pericardite pode simular a dor de um IAM, pode ser primariamente pleurítica ou pode ser contínua; piora quando o paciente respira, deita ou deglute; e melhora com a posição sentada ou inclinada para a frente; um achado físico essencial é o atrito pericárdico. A dor de origem pulmonar pode ser por embolia pulmonar (comumente é de natureza pleurítica e é associada à dispneia, podendo ocorrer hemoptise – eliminação de sangue pelo sistema respiratório); por pneumotórax espontâneo (dor torácica localizada no dorso ou nos ombros e acompanhada de dispneia, taquipneia e ausência de ruídos no hemitórax afetado); por doenças do parênquima pulmonar (pneumonia, câncer e sarcoidose, e pode agravar com a respiração e ter sintomas associados como febre, tosse e fadiga); e hipertensão pulmonar (desconforto torácico aos esforços, dispneia intensa e cianose). Desconforto torácico episódico e recorrente pode ocorrer na angina pectoris e com muitas causas cardíacas e não cardíacas. Dores com causas esofágicas e gastroduodenal podem esta relacionada com: refluxo gastroesofágico (dor torácica geralmente com queimação – pirose – com melhora na posição ereta ou com repouso); ulcera péptica (dor na região epigástrica, mas às vezes pode ser referida em região subesternal ou retroesternal, e ocorre geralmente após uma refeição); ou com ruptura de esôfago/síndrome de Boerhaave (dor é excruciante, retroesternal ou no andar superior do abdome, geralmente acompanhada de um componente pleurítico à esquerda, e apresenta alta mortalidade). A dor torácica também pode ter origem osteomuscular, geralmente com características pleuríticas pois são desencadeadas ou exacerbadas pelos movimentos dos músculos e/ou articulações produzidos pela respiração, e a palpação no local desencadeia dor, podendo ainda ter histórico de atividade repetitiva ou não costumeira envolvendo os braços ou a parte superior do tronco; esse tipo de dor pode ser continua, com duração de dias ou semanas, e pode ser agravada com a inspiração profunda e movimentação dos bracos e tronco. A dor psicogênica costuma acometer pacientes com depressão e com transtornos da ansiedade. Costuma ser difusa, imprecisa, podendo estar associada com utilização abusiva de analgésicos. Frequentemente, o indivíduo tem dificuldade para definir a dor e se utiliza de comparações do cotidiano para descrevê-la. A dor ou desconforto torácico pode resultar em dois mecanismos: fibras somáticas (inervação da pele, estruturas superficiais e pleura parietal) e fibras viscerais (coração, esôfago e pleura visceral). A dor torácica pode ser definida ainda em: definidamente anginosa, provavelmente anginosa, possivelmente anginosa e definidamente não anginosa. Vale ressaltar que uma dor torácica mais intensa e com duração acima de 20 minutos, acompanhada de dispneia, sudorese, palidez cutânea e náuseas, frequentemente representa infarto agudo do miocárdio. A dor torácica pode ser classificada em típica, quando possui caráter de constrição, compressão e queimação; e atípica, quando possui características de pontadas, agulhadas e piora ao respirar. As dores típicas localizam-se nas regiões retroesternal, ombro esquerdo, pescoço, face, dentes e região epigástrica; além de serem desencadeadas por exercício físico e estresse. Já as dores atípicas encontram-se no ombro direito e hemitórax direito, sendo provocadas ao repouso. Angina Pectoris: A Angina Pectoris consiste na dor torácica subesternal ou precordial, causados por isquemia miocárdica transitória (15 segundos a 15 minutos), que é insuficiente para provocar a necrose de miócitos. A dor em si é provavelmente uma consequência da liberação, induzida pela isquemia, de adenosina, bradicinina, e de outras moléculas que estimulam os nervos aferentes vagais e simpáticos. Vale ressaltar que nem todos os eventos isquêmicos são percebidos pelos pacientes; a isquemia silenciosa é particularmente comum na população geriátrica e no cenário de neuropatia diabética. A angina estável (típica) é a forma mais comum de angina e é causada por um desequilíbrio na perfusão coronariana (devido à aterosclerose coronariana estenosante crônica) em relação à demanda miocárdica, tal como aquela produzida por atividade física, excitação emocional ou estresse psicológico. Além disso, esse tipo de angina é variavelmente descrito como uma sensação de pressão profunda mal localizada, de aperto, ou de queimação (como na indigestão), mas raramente é descrita como dor. Ela é geralmente aliviada pelo repouso (que diminui a demanda metabólica) ou pela administração de vasodilatadores, como nitroglicerina ou bloqueadores de canais de cálcio (que aumentam a perfusão). A angina variante de Prinzmetal é uma forma incomum de isquemia miocárdica episódica, e é causada pelo espasmo arterial coronariano. Embora os indivíduos com essa forma de angina possam ter aterosclerose coronariana significativa, os ataques anginosos não estão relacionados com a atividade física, frequência cardíaca ou pressão arterial. A angina de Prinzmetal geralmente responde de modo imediato a vasodilatadores. A angina instável ou crescente refere-se a um padrão de angina ou desconforto torácico grave, com frequência crescente ou duração prolongada, que é descrita como dor evidente. Ela é precipitada por níveis menores de atividade física ou ocorre mesmo em repouso. Aproximadamente metade dos pacientes com angina instável apresenta evidência de necrose do miocárdio; em outros, o infarto agudo do miocárdio pode ser iminente. Na maioria dos pacientes, a angina instável é causada pela ruptura de uma placa aterosclerótica, com trombose parcial superposta e, possivelmente, embolização ou vasospasmo (ou ambos). Além desse tipo de classificação, também há como analisar em classes o comprometimento cardiovascular, sendo: Em geral, a escala da Canadian Cardiovascular Society (CCS), categoriza os pacientes leves/estáveis sendo da classe 1 e 2, e graves/instáveis sendo da classe 3 e 4. Dois mecanismos patogenéticos principais podem resultar em isquemia miocárdica e angina no contexto crônico: a chamada angina de demanda, que é causada pelo aumento nas necessidades de oxigênio do miocárdio e na carga de trabalho; e a angina de suprimento, que é causada pela reduçãoda oferta de oxigênio ao tecido miocárdico. A angina de demanda é consequente às necessidades aumentadas de oxigênio do miocárdio que ocorrem com o aumento da atividade física, emoção ou estresse. Em um paciente com perfusão miocárdica diminuída devido ao estreitamento aterosclerótico crônico de uma artéria coronária, essa demanda aumentada pode causar angina. Outros fatores precipitantes extracardíacos da angina incluem as demandas metabólicas excessivas impostas por febre, tireotoxicose, anemia grave por perda de sangue, taquicardia de qualquer etiologia, hipoglicemia e dor. Por outro lado, a angina de suprimento pode ocorrer em pacientes com síndrome coronariana aguda ou cardiopatia isquêmica estável em resultado da constrição coronariana com estenose coronariana dinâmica. Assim, o estreitamento do lúmen coronariano (aterosclerose, trombos plaquetários e leucócitos sobrepostos) produzem substâncias vasoconstritoras, como serotonina e tromboxano A2, enquanto danos endoteliais em artérias coronárias afetadas diminuem a produção de substâncias vasodilatadoras, como óxido nítrico e adenosina. O resultado é uma resposta vasoconstritora fisiológica anormal ao exercício e outros estímulos. Alguns pacientes com cineangiocoronariografias (cateterismo cardíaco) normais ou estenoses que não limitem o fluxo podem apresentar obstrução dinâmica isolada, o que pode causar isquemia do miocárdio e resultar em angina em repouso (angina de Prinzmetal [variante]). Em pacientes com angina de demanda agentes terapêuticos que reduzem a frequência cardíaca e a tensão da parede, como betabloqueadores ou antagonistas de cálcio não di-hidropiridínicos, serão frequentemente a terapia com maior benefício clínico. Em comparação, nitratos e antagonistas de cálcio com propriedades vasodilatadoras mais potentes (particularmente os di-hidropiridínicos) serão mais benéficos para aliviar a angina e a isquemia mediada por constrição coronariana e reduções no fornecimento de oxigênio ao miocárdio (angina de suprimento). Embora a causa mais comum da cardiopatia isquêmica estável seja o estreitamento de uma artéria coronária aterosclerótica com obstrução ao fluxo sanguíneo epicárdico, a DAC obstrutiva também pode ter causas não ateroscleróticas, incluindo as anomalias congênitas das artérias coronárias, dissecção de artéria coronária, ponte miocárdica, arterite coronariana em associação com vasculites sistêmicas e DAC induzida por radiação. A isquemia miocárdica e a angina pectoris também podem ocorrer na ausência de DAC obstrutiva, como no caso de valvopatia aórtica, miocardiopatia hipertrófica e miocardiopatia dilatada. Além disso, a cardiopatia isquêmica estável pode coexistir com esses outros tipos de doença cardíaca. No que se refere a manifestação clínica, a angina pectoris tem quatro características clínicas principais: o desconforto, sua localização e distribuição, sua provocação e sua duração. O desconforto da angina é descrito como uma sensação de pressão que transmite uma sensação de estrangulamento e ansiedade, mas os pacientes também podem usar descritores como peso, aperto, compressão, sufocamento e esmagamento (em algumas mulheres e idosos, a sensação é mais vaga e atípica. Ademais, alguns pacientes descrevem o desconforto como uma sensação de queimação no meio do epigástrio ou como entorpecimento e desconforto. Outros sintomas, equivalentes anginosos, são: dispneia, fadiga, tontura ou vertigem e eructação gástrica. O local e a distribuição do desconforto anginoso são predominantemente esternais ou retroesternais, mas também podem ser precordiais. A irradiação é comum, geralmente para o lado esquerdo do pescoço e ombro e para baixo na superfície ulnar do braço esquerdo; a irradiação para o braço direito é menos comum. O desconforto que irradia para a mandíbula é comum e deve ser diferenciado da dor dentária. Pode ocorrer desconforto epigástrico isolado ou em associação com a pressão torácica. A angina é classicamente causada por esforço ou atividade física, estresse emocional, exposição ao frio, relação sexual ou ingestão de uma refeição farta. A angina que ocorre em repouso ou noturna frequentemente anuncia mudança no padrão de estável para instável e pode indicar que há uma ruptura de placa incipiente levando à SCA. A angina vasospástica (ou de Prinzmetal) pode ocorrer espontaneamente em repouso ou à noite, sem provocação. A duração típica de um episódio de angina pectoris é breve. Um episódio geralmente começa gradualmente e atinge a sua intensidade máxima durante um período de minutos antes de diminuir (é incomum que a angina pectoris atinja o pico e a depressão em menos de um minuto). Desconforto torácico que persiste por mais de 15 a 20 minutos, especialmente em repouso ou noturno, pode representar SCA ou IAM. A angina pectoris típica é geralmente aliviada em minutos com repouso ou uso de nitroglicerina sublingual, oral ou cutânea. A resposta à nitroglicerina sublingual é frequentemente uma ferramenta de diagnóstico útil, embora dor não cardíaca (p. ex., espasmo esofágico) também melhore com nitroglicerina. A inspeção dos olhos pode revelar um arco da córnea e o exame da pele pode mostrar xantomas(lesão na pele ocasionado pelo acumulo de lipídeo). Durante um episódio de desconforto torácico, a isquemia miocárdica pode produzir uma terceira bulha cardíaca (B3) ou uma quarta bulha cardíaca (B4). A isquemia miocárdica também pode causar um sopro apical holossistólico transitório ou mesodiastólico a telediastólico devido à disfunção reversível do músculo papilar que resulta em regurgitação mitral. Referências: GOLDMAN, Lee; SCHAFER, Andrew I. Goldman-Cecil Medicina. Rio de Janeiro: Grupo GEN, cap. 62, 2022. KUMAR, Vinay; ABBAS, Abul; ASTER, Jon. Robbins & Cotran Patologia - Bases Patológicas das Doenças. Rio de Janeiro: Grupo GEN, cap. 12, 2016. MARTINS, Herlon S.; NETO, Rodrigo Antonio B.; NETO, Augusto S.; VELASCO, Irineu T. Emergências Clínicas: Abordagem Prática. São Paulo: Editora Manole, cap. 17, 2015. Lyzandra Linhares
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