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Maria Luiza Sena – Med XIV FASA CIRROSE HEPÁTICA Cirrose é o estágio terminal da doença hepática crônica, no qual grande parte dos tecidos hepáticos funcionantes foi substituída por tecido fibrótico. Embora a cirrose geralmente esteja associada ao alcoolismo, também pode ocorrer com outros distúrbios: ❖ Hepatites virais. ❖ Reações tóxicas aos fármacos. ❖ Compostos químicos. ❖ Obstrução biliar. A cirrose resulta de uma interrelação entre diversos fatores etiológicos, que atuam ao longo dos anos, tais como: morte e regeneração celular, degradação e formação anormal da matriz extracelular. Trata-se de um processo que se caracteriza por formações de fibrose difusa, além de micro e macronódulos, estabelecendo perversão da arquitetura normal do parênquima. EPIDEMIOLOGIA A cirrose hepática representa a principal causa de morte em muitas partes do mundo. Nos EUA, doenças hepáticas crônicas/cirroses foram responsáveis por 40.326 mortes em 2015. No Brasil, em 2015 houve 9,5 mortes/100.000 habitantes por cirrose de etiologia alcóolica. Tendo em vista que muitos pacientes com cirrose são assintomáticos até que ocorra descompensação, é difícil avaliar a verdadeira prevalência e incidência da cirrose na população geral. De acordo com a OMS, cerca de 800.000 pessoas morrem anualmente de cirrose. ETIOLOGIA INFECCIOSA A perpetuação de lesão celular imunomediada mostra-se responsável pela instalação de hepatite crônica e cirrose em portadores dos vírus das hepatites B, D e C. HEPATITE AUTOIMUNE É uma forma de doença que se traduz por inflamação do fígado de causa desconhecida, que se caracteriza por hepatite periporta (necrose periférica), proeminente infiltrado inflamatório e infiltração dos espaços portais por plasmócitos. ALCÓOLICA Os mecanismos patogênicos de agressão hepatocelular em pacientes com ingesta alcoólica excessiva (>80g etanol/dia) relacionam-se com predisposição genética, estado hipermetabólico de hepatócitos centrolobulares, em que se acumula mais acetaldeído, além de maior produção de colágeno pelas células de Ito. Fazem parte desse processo radicais livres de O2, peroxidação lipídica, reduzidas defesas antioxidantes e de formação de glutation, e agressão exercida por citocinas, com ação mediada pelas células de Kupffer. Na dependência desses fatores, os doentes evoluem com lesões necróticas focais dos hepatócitos, inflamação, acúmulo de proteínas celulares, esteatose, fibrose e regeneração micro e, menos frequentemente, macronodular, com instalação de cirrose e risco de evolução para carcinoma hepatocelular ao fim de 20 ou mais anos, com características evolutivas. OBSTRUÇÃO BILIAR Colangite crônica destrutiva não supurativa -> doença crônica do fígado resultante do insulto imunológico desenvolvido por linfócitos citotóxicos sobre o epitélio dos ductos biliares, causando lesão hepatocelular e colestase progressiva. ❖ Mais 90% desses pacientes são mulheres de meia-idade, portadoras do anticorpo sérico antimictocôndria, com características evolutivas para cirrose. Atresia de vias biliares -> doença idiopática, representada por obliteração completa, localizada ou difusa, dos ductos biliares a partir do hilo até o duodeno. Essa obstrução ao livre fluxo biliar leva aos aparecimentos de fibrose gradual, destruição de estruturas biliares intra- e extra-hepáticas. Fibrose cística -> desordem generalizada das glândulas exócrinas, herdada como padrão autossômico recessivo, com gene defeituoso localizado no meio do braço longo do cromossomo 7q31, produzindo um regulador anormal de condutância transmembrana. ❖ Nesses pacientes, ocorrem produção e acúmulo excessivo de muco, fibrose biliar focal e, eventualmente, cirrose, com hipertensão portal em todos os casos. Cursa com hipertensão portal. Hipoplasia biliar intra-hepática -> etiologia desconhecida. Os doentes cursam com sinais de colangite, colestase e cirrose de rápida instalação, sendo identificadas em portadores de doenças hepáticas. Displasia artério-hepática ou síndrome de Alagille -> doença genética, herdada como autossômica dominante, de penetrância variável, com portadores cursando com rarefação de ductos biliares intra-hepáticos. Sarcoidose -> doença crônica, sistêmica, com envolvimento hepático em 60-90% dos pacientes, traduzindo-se histologicamente por granulomas não caseosos presentes ao nível do espaço portal. Há destruição progressiva de ductos biliares intra-hepáticos. APG 12 - cIRROSE HEPÁTICA E HIPERTENSÃO PORTAL Maria Luiza Sena – Med XIV FASA FÁRMACOS Diferentes fármacos e seus metabolitos podem produzir hepatite crônica ativa e cirrose, sobretudo α-metildopa, isoniazida, nitrofurantoína, dantrolone, diclofenaco e alguns outros. Cirrose pode ser identificada em pessoas que usam também por tempo prolongado coralgil e tamoxifeno, amiodarona, maleato de perexilina, BCC, cetoconazol, griseofulvina, nimesulida, fenilbutazona, ibuprofeno, guinidina e outros. Relaciona-se essa evolução com a continuada exposição, levando a que cursem nas fases mais avançadas com sinais de redução funcional da síntese parenquimatosa e hipertensão portal, sendo necessário conduzi-los ao transplante de fígado. METABÓLICA Doença de Wilson -> é um erro inato do metabolismo, caracterizado por defeito na excreção biliar do cobre, com consequente acúmulo do metal no fígado, cérebro e córnea. A doença hepática manifesta- se por insuficiência hepática fulminante, hepatite crônica ativa e/ou cirrose, compensada ou não. Hemocromatose hereditária (HH) -> doença herdada relacionada ao gene HFE. Todos cursam com níveis séricos elevados de ferritina (1000ng/ml) e transferrina (>40%) devendo ser tratados por flebotomias periódicas, até que índices de saturação de transferrina e de ferritina estejam, respectivamente, abaixo de 5% e 50ng/ml. ❖ Falência dessa resposta leva-os ao cursar histologicamente com excesso de ferro sendo depositado nos hepatócitos distribuídos na zona 1 posteriormente periporta, gerando fibrose e cirrose hepática. Deficiência de α1-antitripsina (α1-AT) -> um inibidor de protease sérica, bloqueadora de elastase neutrofílica, relaciona-se com a mutação que se instala no gene específico, disposto no cromossomo 14q3, com alelo M sendo normal e expressões mutantes ocorrendo nos alelos S e Z, gerando acentuada deficiência sérica da enzima, causando enfisema pulmonar e doença hepática. Galactosemia -> defeitos na atividade de enzimas, como a galactoquinase, decorrem do estabelecimento de mutações em aminoácidos, gerando distintas expressões clínicas, como doença hepática progressiva. ESTEATO-HEPATITE NÃO ALCOÓLICA (EHNA) Há redução da oxidação mitocondrial de triglicerídeos, baixa exportação hepática de ácidos graxos e lipídios, síntese hepática maior de fosfolipídios e ésteres de colesterol, acentuadas produções de radicais livres e hipersecreção de leptina e grelina, as quais hiperestimulam células estelares do fígado e da matriz extracelular. ❖ A cirrose é mais frequentemente observada na presença de infiltrado inflamatório. CLASSIFICAÇÃO A classificação tradicional das cirroses baseia-se no critério morfológico, que as divide em: ❖ Cirroses micronodulares -> seriam expressão de etiologia alcoólica. Pode ser devida a infecção pelo HBV. ❖ Cirroses macronodulares -> corresponderiam às formas pós- necróticas, mais bem designadas como pós-hepáticas. É a forma final de todos os tipos morfológicos da doença, independente de etiologia. O critério de classificação mais adequado é o etiológico, definido por marcadores químicos, virológicos e imunológicos. Alguns achados podem sugerir a causa da doença: ❖ Cirroses biliares -> antes da fase terminal em que se formam macro e micronódulos, o padrão é de um quebra-cabeça, em que porçõesdo parênquima hepático esboçando nódulos parcialmente circundados por tecido fibroso representam as peças do jogo, que se encaixam umas nas outras. ❖ Esteatose com infiltrado neutrofílico e hialino de Mallory-Denk sugere etiologia alcoólica. FISIOPATOLOGIA A cirrose caracteriza-se por fibrose difusa e conversão da arquitetura hepática normal em nódulos contendo hepatócitos proliferantes circundados por fibrose. A formação de nódulos, representa um equilíbrio entre atividade regenerativa e fibrose constritiva. O tecido fibroso que normalmente substitui o tecido hepático funcionante forma faixas constritivas, que bloqueiam o fluxo nos canais vasculares e nos ductos biliares do fígado. Maria Luiza Sena – Med XIV FASA ❖ O bloqueio dos canais vasculares predispõe à hipertensão porta e suas complicações; obstrução dos canais biliares e exposição aos efeitos destrutivos da bile e destruição dos hepatócitos com progressão para insuficiência hepática. A ingestão em curto prazo de até 80g de etanol por dia geralmente produz alterações hepáticas reversíveis discretas, como esteatose hepática. A ingestão de 40-80g/dia é considerada um fator de risco limítrofe para lesões graves. A característica patogênica essencial subjacente à fibrose hepática e cirrose é a ativação das células estreladas hepáticas (células de Ito) -> normalmente, essas células são quiescentes e atuam como principal local de armazenamento de retinoides (vit A). Em resposta a uma lesão, as células de Ito tornam-se ativadas e, em consequência, perdem seus depósitos de vit A, proliferam, desenvolvem um REG proeminente e secretam matriz extracelular (colágeno dos tipos I e III, proteoglicanos sulfatados e glicoproteínas). Além disso, transformam-se em miofibroblastos hepáticos contráteis. Ao contrário de outros capilares, os sinusoides hepáticos normais não têm membrana basal. As próprias células endoteliais sinusoidais apresentam grandes fenestrações, que possibilitam a passagem de grandes moléculas. O depósito de colágeno no espaço de Disse, como ocorre na cirrose, leva à perda das fenestrações das células sinusoidais (“capilarização” dos sinusoides), alterando a troca entre o plasma e os hepatócitos, com consequente diminuição do diâmetro dos sinusoides, o que é ainda mais exacerbado pela contração das células estreladas. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A magnitude das manifestações clínicas está na dependência do grau de comprometimento celular hepático e da intensidade da fibrose. CIRROSE HEPÁTICA COMPENSADA Muitas vezes, é pobre em sinais e sintomas, suspeitando-se da doença pela identificação de alterações físicas, como hepatoesplenomegalia e hipertransaminasemia, detectadas durante exame físico e laboratoriais de rotina. ❖ Nesses doentes, mostra-se comum a existência de história mórbida progressiva de hepatite sem etiologia definida, uso crônico de álcool ou sintomatologia vaga -> astenia, epistaxe, edema, lentidão de raciocínio e emagrecimento. Esses pacientes podem manter-se nessa fase por toda a vida, vindo a falecer por causas diversas, porém, alguns, em poucos meses/anos, geralmente evoluem para falência hepatocelular e hipertensão portal. CIRROSE HEPÁTICA DESCOMPENSADA Geralmente, a ida do paciente ao médico é por conta de complicações da cirrose hepática -> ascite, encefalopatia e hemorragia digestiva alta. Em geral, apresenta fraqueza progressiva, perda ponderal, com evidentes sinais de comprometimento de seu estado nutricional e diminuição de massa muscular. ❖ Pode haver episódios de bacteriemia, com febre causada por bactérias Gram-negativas, necrose celular ou instalação de carcinoma hepatocelular. Comumente, os doentes exibem hálito hepático e icterícia, do tipo hepatocelular ou causada por hiper-hemólise. Ao exame físico, identificam-se: ❖ Hiperpigmentação da pele. ❖ Dedo hipocrático com unhas esbranquiçadas. ❖ Telangiectasias aracniformes na face e no tronco. ❖ Eritema palmar. ❖ Alteração na distribuição dos pelos pubianos. ❖ Ginecomastia. ❖ Atrofia testicular. ❖ Petéquias e esquimoses. ❖ Tremor de extremidades. Abdome -> detectam-se ascite e sinais de circulação colateral, podendo ser do tipo porta ou do tipo cava inferior. O fígado pode estar aumentado de volume, endurecido ou diminuído e não palpável. Esplenomegalia pode ser evidenciada pela ocupação do espaço de Traube, ou palpação do órgão. COMPLICAÇÕES As duas principais complicações da cirrose são a hipertensão portal acompanhada de um estado circulatório hiperdinâmico, e a insuficiência hepática. Maria Luiza Sena – Med XIV FASA O desenvolvimento de ascite e varizes representa uma consequência direta da hipertensão portal e do estado circulatório hiperdinâmico, enquanto a icterícia ocorre como resultado da incapacidade do fígado de excretar a bilirrubina. A encefalopatia é causada tanto pela hipertensão portal quanto pela insuficiência hepática. Por sua vez, a ascite pode ser complicada por infecção, quando é denominada peritonite bacteriana espontânea, e pela insuficiência renal funcional, que é denominada síndrome hepatorrenal. Outras complicações incluem sangramentos secundários à redução dos níveis dos fatores de coagulação, trombocitopenia devido à esplenomegalia, ginecomastia e padrão feminino de distribuição dos pelos pubianos nos homens em consequência da atrofia testicular; angiomas aracneiformes e eritema palmar. DIAGNÓSTICO O diagnóstico se baseia nos sintomas e resultados de um exame físico, exames de imagem e, algumas vezes, de uma biópsia. EXAMES LABORATORIAIS Podem estar anormais na cirrose alcoólica inicial compensada. Biópsia do fígado -> é utilizada para confirmar o diagnóstico, mas só é feita com um período de abstinência de pelo menos 6 meses. Lesão hepatocelular -> é avaliada através das aminotransferase e da desidrogenase lática (DHL). Dentro da injúria hepatocelular, os testes que fazem essa detecção são realizados através da dosagem de enzimas distribuídas no plasma e no líquido intersticial. ❖ Essa detecção vai ser útil principalmente nas hepatites agudas e crônicas que cursam com dano ao hepatócito. Essas enzimas são liberadas no sangue após a injúria ao hepatócito ou morte e são representadas pelo aspartato aminotransferase (AST) e alanina aminotransferase (ALT). ❖ AST -> encontrada no fígado, músculo, rins, cérebro, pâncreas, pulmões, leucócitos e nos eritrócitos. ❖ ALT -> encontrada apenas no parênquima hepático, sendo, portanto, mais específica para a lesão hepatocelular. Fluxo biliar e lesão de vias biliares -> é avaliado através da fosfatase alcalina e da gama glutamiltransferase (GGT). A colestase é definida como redução/interrupção do fluxo biliar, podendo ser causada por obstrução das vias biliares. ❖ A fosfatase alcalina (FA) vai ser um marcador importante para o diagnóstico da colastase, essa enzima catalisa a hidrólise de ésteres de fosfato orgânicos e inorgânicos, sendo encontrada principalmente no fígado. Função de síntese do fígado -> é avaliada pelos fatores de coagulação e pela albumina, uma proteína sintetizada exclusivamente no fígado, e encontrada em valores normais na hepatite aguda e nas crônicas que não possuem dano à função hepática. EXAMES DE IMAGEM US -> é um método importante para a triagem e pode mostrar sinais de cirrose, como redução do tamanho do fígado. Além disso, mostra também alterações circulatórias, aumento do baço e líquido dentro do abdome. A imagem por US, TC ou RM de um fígado irregular e nodular, juntamente com função sintética hepática prejudicada, é suficiente para o diagnóstico da cirrose. Maria Luiza Sena – Med XIV FASA EDA -> é importante na definição da presença de varizes esofágicas, gástricas e gastropatia hipertensiva portal. Identifica-sea sede das lesões hemorrágicas. TRATAMENTO O tratamento deve ter por objetivo ideal a interrupção ou reversão da fibrose. Embora os antifibróticos não tenham demonstrado reverter consistentemente a fibrose ou melhorar os desfechos em pacientes com cirrose, a erradicação do vírus da hepatite C ou da hepatite B tem sido associada a uma regressão da fibrose. Atualmente, o tratamento da cirrose compensada é direcionado para a prevenção do desenvolvimento de descompensação por meio de: ❖ Tratamento da doença hepática subjacente, de modo a reduzir fibrose e evitar descompensação. ❖ Evitar fatores passíveis de agravar a doença hepática, como álcool, fármacos hepatotóxicos e infecções virais sobrepostas. ❖ Redução da pressão porta por meio de uso de BB não seletivos (ex.: propranolol), que evitam hemorragia varicosa e descompensação em pacientes com cirrose hepática compensada. ❖ Rastreamento de carcinoma hepatocelular. O tratamento da cirrose descompensada concentra-se em eventos descompensatórios específicos e na opção de transplante de fígado. O tratamento definitivo é o transplante de fígado. HIPERTENSÃO PORTAL A hipertensão porta é definida por elevação do gradiente de pressão venosa hepática >5mmHg. É causada por uma combinação de dois processos hemodinâmicos que ocorrem simultaneamente: ❖ Resistência intra-hepática aumentada à passagem do fluxo sanguíneo pelo fígado em função da cirrose e dos nódulos regenerativos. ❖ Fluxo sanguíneo esplâncnico aumentado secundário à vasodilatação dentro do leito vascular esplâncnico. A hipertensão portal é diretamente responsável pelas duas principais complicações da cirrose: hemorragia varicosa e ascite -> hemorragia varicosa é um problema imediato e ameaçador, com taxa de mortalidade associada a 20-30% a cada episódio de sangramento. ETIOLOGIA A hipertensão porta pode ser causada por vários distúrbios que aumentam a resistência do fluxo sanguíneo hepático, inclusive obstruções pré-hepáticas, pós-hepáticas e intra-hepáticas: Pré-hepáticas -> entre as causas estão trombose da veia porta e compressão extrínseca por câncer ou linfonodos aumentados, que causam obstrução da veia porta antes de sua entrada no fígado. Pós-hepáticas -> refere-se a qualquer obstrução do fluxo sanguíneo pelas veias hepáticas depois dos lóbulos do fígado, seja dentro do órgão ou nos segmentos circulatórios distais. ❖ Esse tipo de obstrução é causado por distúrbios como trombose das veias hepáticas, doença venoclusiva e ICD grave, que impede a drenagem do sangue venoso do fígado. ❖ Síndrome de Budd-Chari -> doença congestiva do fígado causada por obstrução de várias veias hepáticas ou do segmento hepático da VCI. ❖ Síndrome de obstrução sinusoidal ou doença venoclusiva hepática -> é uma variante da síndrome de Budd-Chari encontrada mais comumente nos pacientes tratados com quimioterápicos antineoplásicos, irradiação do fígado ou transplante de medula óssea. Intra-hepáticas -> são os distúrbios que causam obstrução do fluxo sanguíneo no fígado. Na cirrose alcoólica, principal causa de hipertensão porta, faixas de tecido fibroso e nódulos fibróticos distorcem a arquitetura do fígado e aumentam a resistência à circulação porta, resultando em hipertensão porta. Nos EUA, cirrose é a causa mais comum de hipertensão portal, e mais de 60% dos pacientes cirróticos têm hipertensão portal clinicamente significativa. A obstrução da veia porta pode ser idiopática, ou está associada à cirrose ou infecção, pancreatite ou traumatismo abdominal. FISIOPATOLOGIA A hipertensão portal resulta tanto do aumento da resistência ao fluxo porta quanto da elevação do influxo venoso porta. O mecanismo inicial consiste em aumento da resistência vascular sinusoidal secundária à deposição de tecido fibroso e compressão subsequente pelos nódulos regenerativos, e à vasoconstrição ativa, que é passível de resposta à agentes vasodilatadores e é causada pela deficiência de NO intra-hepático, bem como pela atividade aumentada dos vasoconstritores. Inicialmente, no processo hipertensivo portal, o baço aumenta de tamanho e sequestra plaquetas e outros elementos figurados do sangue, resultando em hiperesplenismo. Além disso, os vasos que normalmente drenam para o sistema porta, como a veia gástrica esquerda, revertem seu fluxo e causam desvio do sangue do sistema porta para a circulação sistêmica. Maria Luiza Sena – Med XIV FASA Esses colaterais portossistêmicas não são suficientes para descomprimir o sistema venoso porta e oferecem resistência adicional ao fluxo porta. À medida que ocorre desenvolvimento de colaterais, um aumento do fluxo sanguíneo porta, que resulta da vasodilatação esplâncnica, mantém o estado hipertensivo portal. Por sua vez, a dilatação arteriolar esplâncnica é secundária ao aumento da produção de NO. Por conseguinte, o paradoxo na hipertensão portal é o fato de que a deficiência de NO na vascularização intra-hepática leva à vasoconstrição e resistência aumentada, enquanto a superprodução de NO na circulação extra- hepática leva à vasodilatação e fluxo porta aumentado. Além da vasodilatação esplâncnica, ocorre vasodilatação sistêmica que, ao provocar uma redução efetiva do volume sanguíneo arterial, leva à ativação do SRAA, retenção de sódio, expansão do volume plasmático e desenvolvimento de um estado circulatório hiperdinâmico. ❖ Esse estado mantém a hipertensão portal, levando à formação e ao crescimento de varizes e desempenha um importante papel no desenvolvimento de todas as complicações da cirrose. MANIFESTAÇÕES CLÍNICA S O quadro clínico da hipertensão portal consiste em: ❖ Esplenomegalia. ❖ Colaterais portossistêmicas: circulação colateral, varizes de esôfago e varizes ectópicas. ❖ Sangramento digestivo. ❖ Manifestações sistêmicas: taquicardia, ictus impulsivo e redução da PA. ❖ Ascite. ❖ Encefalopatia hepática. ❖ Baqueteamento de dedos/unhas em vidro de relógio. ❖ Taquipneia e dispneia aos esforços. ASCITE Ocorre quando o volume de líquido da cavidade peritoneal aumenta e é uma manifestação clínica tardia da cirrose e hipertensão porta. É comum encontrar pacientes com cirrose avançada e acúmulo de 15L de líquido ascítico. ❖ Os pacientes referem dor abdominal, dispneia e insônia. Embora os mecanismos responsáveis pelo desenvolvimento da ascite não estejam bem esclarecidos, vários fatores parecem contribuir para a acumulação de líquidos, inclusive elevação da pressão capilar em consequência da hipertensão porta e obstrução do fluxo venoso através do fígado; retenção de sal e água pelos rins; e diminuição da pressão coloidosmótica por causa da síntese reduzida de albumina pelo fígado. Redução do volume sanguíneo e aumento excessivo do volume sanguíneo são mecanismos citados para explicar a retenção aumentada de água e sal pelos rins. Teoria do enchimento insuficiente -> a contração do volume sanguíneo efetivo é um sinal aferente, que leva os rins a reterem sal e água. ❖ O volume sanguíneo efetivo pode estar reduzido em consequência das perdas de líquido para a cavidade peritoneal, ou da vasodilatação causada pela presença de substâncias vasodilatadoras na circulação. Teoria do enchimento excessivo -> propõe que o evento inicial da patogênese da ascite seja retenção renal de sal e água em consequência dos distúrbios do próprio fígado. Um desses distúrbios seria incapacidade de o fígado metabolizar aldosterona, aumentando a retenção de sal e água pelos rins. Outro fator contribuinte provável para a patogênese da ascite é a redução da pressão coloidosmótica, reduzindo a reabsorção de líquidos da cavidade peritoneal. ESPLENOMEGALIA Na hipertensão porta, o baço cresce progressivamente em consequência do desvio (shunting) do sangue para a veia esplênica. O baço aumentado frequentementecausa sequestro de quantidades significativas de elementos sanguíneos e leva ao desenvolvimento do hiperesplenismo. Caracteriza-se por redução da sobrevida de todos os elementos celulares do sangue, com redução subsequente de suas contagens e anemia, trombocitopenia e leucopenia. ❖ A sobrevida reduzida dos elementos celulares do sangue parece ser causada pela taxa acelerada de remoção em consequência do tempo de trânsito prolongado pelo baço aumentado. SHUNTS PORTOSSITÊMICOS Com a obstrução gradativa do fluxo sanguíneo venoso do fígado, a pressão na veia porta aumenta e formam-se vasos colaterais calibrosos entre a veia porta e as veias sistêmicas (que drenam o segmento inferior do reto e o esôfago) e as veias umbilicais do ligamento falciforme. Os vasos colaterais formados entre as veias ilíacas inferior e interna podem causar hemorroidas. Maria Luiza Sena – Med XIV FASA Em alguns pacientes, a veia umbilical fetal não está totalmente fechada e forma um canal na parede anterior do abdome. As veias dilatadas ao redor do umbigo são conhecidas como cabeça de Medusa. Shunts portossistêmicos também podem desenvolver-se e causar desvio do sangue dos capilares pulmonares, interferindo na oxigenação sanguínea e ocasionando cianose. Clinicamente, os vasos colaterais mais importantes são os que interligam as veias porta e coronária, resultando na inversão do fluxo e na formação de dilatações varicosas de paredes finas na submucosa do esôfago. Essas varizes esofágicas de paredes finas podem romper e causar hemorragias profusas e fatais em alguns casos. A síntese hepática reduzida dos fatores de coagulação e a diminuição das contagens de plaquetas secundária à esplenomegalia pode dificultar ainda mais o controle do sangramento esofágico. Varizes esofágicas são encontradas em quase 30 a 40% das pessoas com cirrose hepática compensada e em 60% das pessoas com cirrose hepática descompensada. A hemorragia varicosa é, talvez, a complicação relacionada com hipertensão porta mais devastadora em pessoas com cirrose hepática, ocorrendo em até 30% delas durante o curso da doença. DIAGNÓSTICO Nos pacientes com cirrose que estão sendo acompanhados cronicamente, o desenvolvimento de hipertensão portal geralmente é revelado pela presença de: ❖ Trombocitopenia. ❖ Crescimento do baço. ❖ Desenvolvimento de ascite, encefalopatia e/ou varizes esofágicas com ou sem sangramento. Nos pacientes ainda não diagnosticados, qualquer uma dessas características deve justificar a avaliação adicional destinada a determinar a presença de hipertensão portal e hepatopatia. As varizes devem ser identificadas por endoscopia (padrão-ouro no diagnóstico da hipertensão portal). O estudo por imagem do abdome, seja por TC ou RM, pode ser útil para demonstrar um fígado nodular e evidenciar alterações decorrentes da hipertensão portal com circulação colateral intra-abdominal. ❖ Os achados endoscópicos podem ser classificados em varizes esofágicas, sinais de cor avermelhada, varizes gastroesofágicas, varizes gástricas isoladas e gastropatia de hipertensão portal. Se necessário, procedimentos radiológicos intervencionistas podem ser realizados para determinar as pressões na veia hepática ocluída e livre, que permitem fazer o cálculo do gradiente das pressões ocluída-livre (equivalente à pressão portal). ❖ O gradiente médio normal entre as pressões ocluída-livre é de 5 mmHg e os pacientes com gradiente >12 mmHg correm risco de sofrer hemorragia varicosa. IMPACTOS DO ABUSO DO ÁLCOOL NAS RELAÇÕES FAMILIARES O uso de bebidas alcoólicas está atrelado à cultura em que, desde os primórdios, se fazia uso da mesma como gesto de comemoração em diversas festividades, atos religiosos, comerciais ou complementos culinários. Contudo, o uso inapropriado/excessivo destas acarreta complicações para a vida do indivíduo. O alcoolismo tem aumentado progressivamente em toda sociedade, tornando-se um grande problema de saúde pública, e seu uso constante está ligado aos fatores de fácil acesso e baixo custo. Considerada uma droga lícita, o álcool é um dos principais responsáveis pelas causas de óbitos por abuso de drogas no Brasil. De 8 mil mortes por ano, o álcool é responsável por 85% delas. O número de dependentes cresce substancialmente, afetando tanto jovens quanto adultos. Ainda que seja ingerido em poucas quantidades, acarreta consequências graves para todos ao redor do alcoolista. Os malefícios provocados pelo alcoolismo vão além, pois pessoas que possuem essa dependência têm maiores chances de sofrer algum tipo interferência no ambiente de trabalho, ou seja, é prejudicial tanto para as relações familiares quanto para as relações do meio social e profissional.
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