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A síndrome nefrótica (SN) caracteriza-se essencialmente pela presença de proteinúria maciça de caráter nefrótico e hipoalbu-minemia (≤ 2,5 g/dL), enquanto o quadro completo inclui edema, hiperlipidemia e lipidúria.A proteinúria nefrótica classicamente se caracteriza por valores ≥ 50 mg/kg/dia ou ≥ 40 mg/ m2 /hora. Na infância, 80 a 90% dos casos correspondem a SN pri-mária ou idiopática (SNI), e o restante, a causas secundárias, como associação com doenças sistêmicas, metabólicas, infecciosas, doenças autoimunes, drogas, entre outras A filtração glomerular proporciona, seletivamente, a eliminação de água e escórias e a retenção de proteínas, células sanguíneas e outros elementos da circulação. A excreção de gra-des quantidades de proteína através da barreira de ultrafiltração glomerular (BUFG) seria decorrente de agravos diversos sobre seus componentes, determinando aumento da permeabilida-de às proteínas plasmáticas. Vários autores defendem a existência de um fator circulante secretado pelos linfócitos T dos pacientes com LHM, o qual desencadearia proteinúria maciça e fusão dos processos podais. Recentemente, o papel do CD80 na LHM vem direcionando um marcador de diagnóstico Estudos sugerem que os níveis séricos do receptor ativador de plasminogênio tipo uroquinase na sua forma solúvel (suPAR) estão significativamente elevados em pacientes com GESF, quando comparados com pacientes portadores de outras glomerulopatias. A principal manifestação clínica da SN, embora sua presença não seja essencial para o diagnóstico, é o edema, que, em LHM, geralmente é intenso, mole, frio, depressível, sujeito à ação da gravidade, em geral insidioso, podendo evoluir para anasarca e apresentando diversos mecanismos em sua patogênese. Existem duas grandes teorias implicadas no mecanismo de formação do edema na SN. A primeira, conhecida como teoria do “hipofluxo”, considera que a proteinúria maciça e subsequente hipoalbuminemia promovam uma diminuição da pressão oncótica plasmática. Esse fato, por sua vez, acarreta aumento da ultrafiltração capilar e passagem de fluido do espaço intravascular para o interstício (edema), desencadeando hipovolemia, hipoperfusão renal, ativação do SRAA e retenção renal secundária de sódio. A segunda teoria, do “hiperfluxo”, propõe como fator inicial na formação do edema a retenção primária intrarrenal de sódio e água. A resistência ao peptídio natriurético atrial (ANP) associada à ativação dos canais epiteliais de sódio (ENaC) por proteases (como a plasmina) nos ductos coletores promove retenção hídrica e salina que contribui na formação do edema A criança não tratada ou que não responde bem à terapia apresenta-se adinâmica, evoluindo com ascite e hepatomegalia. Pode decorrer taquipneia pela compressão torácica. Há derrame pleural e aumento de volume dos genitais, principalmente no sexo masculino. Os cabelos são escassos, finos e quebradiços por causa da desnutrição. A pele é seca e friável com tendência de formação de estrias. A pressão arterial na LHM geralmente é normal, mas, em alguns casos, ocorre hipertensão transitória A presença de distúrbios eletrolíticos (hipocalcemia, hipopotassemia, hiponatremia, etc.) pode se manifestar por alterações clínicas como cãibras, parestesias, síndrome convulsiva, etc. É possível observar sinais de descalcificação óssea relacionada às alterações do metabolismo de vitamina D, cálcio e fósforo, particularmente naqueles casos de longa duração e/ou resistência à terapia imunossupressora. Os pacientes nefróticos apresentam risco elevado de deficiência de vitamina D. Essas crianças são propensas à aquisição de processos infecciosos, geralmente infecções de vias Síndrome nefrótica x nefrítica Quadro clínico aéreas superiores (rinofaringites, sinusites e broncopneumonias), infecções de pele (celulite), peritonites, gastroenterites, infecção do trato urinário e sepse. Os agentes virais frequentemente estão associados às descompensações, podendo favorecer infecções bacterianas secundárias. Os principais agentes bacterianos são o Streptococcus pneumoniae e as bactérias Gram- negativas (Escherichia coli, Klebsiel-la sp, Proteus sp e Haemophilus influenzae). Os Staphylococcus aureus e coagulase negativos, assim como os fungos, também devem ser lembrados, em virtude da imunossupressão Complicações mais freqüentes: • Edema – anasarca • Hipovolemia • Infecções • Trombose • Dislipidemia Hipovolemia Pode levar a sérias complicações Geralmente está associado: sepse diarréia uso abusivo de diurético rápida drenagem líquido de ascite Sintomas: fraqueza dor abdominal vômitos Sinais: perfusão tecidual hipotensão hemoconcentração propensão a eventos tromboembólicos Diagnóstico precoce: Edema exame de urina Proteinúria • Amostra Urina • Indice Prot/Creat > 2,5 • Urina de 24h • >50mg/kg/dia • > 2g/ m2 Hipoalbuminemia Edema Dislipidemia Exames laboratoriais Sedimento urinário Além de proteinúria, em 25% dos pacientes com LHM, há hematúria, geralmente microscópica. Observa-se cilindrúria relacionada às perdas proteicas e lipidúria. Proteinúria Considera-se a proteinúria nefrótica acima de 50 mg/kg/dia ou 40 mg/m2/hora. Em amostra isolada de urina, valores > 2 são compatíveis com proteinúria nefrótica. Eletroforese de proteínas plasmáticas São observados hipoalbuminemia e aumento da fração alfa-2. A IgG, especialmente IgG-1 e IgG-2, apresenta- se muito baixa, e a IgA e a IgM, elevadas. A IgE também pode estar aumentada e observa-se hipogamaglobulinemia na SNI. A presença de hipergamaglobulinemia pode ser indicativa de patologia secundária Colesterol Os níveis séricos do colesterol total, triglicérides e lipoproteínas acham-se elevados. A hiperlipidemia é consequência do aumento da síntese hepática de colesterol, triglicérides e lipoproteínas; da redução no catabolismo das lipoproteínas decorrente do aumento da atividade das lipases lipoproteicas; da perda urinária de HDL; e da redução da atividade do receptor de LDL Ureia e creatinina Podem estar elevadas na instalação do edema ou em situações de hipovolemia. Em outras glomerulopatias (p.ex., GESF ou nefrotoxicidade), pode-se encontrar aumento persistente. Devem ser pesquisadas causas secundárias com solicitação de reações sorológicas para HIV, hepatite A, B e C, toxoplasmose, citomegalovírus, sífilis e mononucleose. Conforme a história e a epidemiologia, avaliações específicas devem ser realizadas (p.ex., esquistossomose, malária, etc.). Indicações de biópsia renal (BR) Atualmente, as crianças entre 1 e 10 anos com sintomatologia exuberante e complemento sérico normal devem ser consideradas e tratadas como portadoras de LHM. Nesse grupo, classicamente, aquelas que não obtiverem remissão clínica e Diagnóstico laboratorial após 8 semanas de corticoterapia seguidas ou não de 3 doses de pulsoterapia com metilprednisolona, desde que não estejam infectadas, devem ser biopsiadas Durante as fases de edema ou quando houver hipertensão, deve ser recomendada uma dieta hipossódica ou assódica. Na ausência de hipervolemia, a ingestão hídrica é livre. O repouso não deve ser imposto e não há evidência de que traga benefícios para o paciente. As atividades escolares e esportivas podem ser retomadas após os períodos de descompensação. Na presença de edema, a primeira medida a ser tomada é a restrição sódica. É importante avaliar a presença de evidências de hipovolemia como taquicardia, pulsos fracos, extremidades frias, hipotensão e outros fatores adicionais, como hemoconcentração, elevação desproporcional da ureia e baixa fração de excreção de sódio (< 0,5%). Nessa situação, realizar infusãode solução salina 15 a 20 mL/kg por 20 a 30 minutos e repetir conforme necessário. A infusão de albumina 20% (0,5 a 1 g/kg) é útil para aqueles pacientes que não respondem à expansão inicial. Os diuréticos devem ser evitados, de forma geral, pelo risco de precipitação de piora da função renal, pois muitos nefróticos apresentam redução do volume sanguíneo efetivo de base. Quando necessário, nos quadros de anasarca e sem evidências de hipovolemia, introduzir diuréticos tiazídicos como a hidroclorotiazida (2 a 5 mg/kg/dia em 2 tomadas). Evita-se a depleção de potássio usando reposição com cloreto de potássio (2 a 4 mEq/kg/dia) ou espironolactona (1 a 5 mg/kg/dia). Naqueles casos resistentes a essa terapia ou com anasarca e hipervolêmicos, podem ser associados diuréticos de alça, como a furosemida (1 a 5 mg/kg/dia). Nos edemas volumosos e persistentes, utiliza-se infusão endovenosa de albumina a 20% (0,5 a 1 g/kg/dia) associada à furosemida (infusão lenta parenteral para redução do potencial de ototoxicidade), que, proporcionando aumento transitório da pressão oncótica plasmática e do ritmo de filtração glomerular, facilita a liberação do diurético nos locais onde ocorre a reabsorção de sódio, melhorando a resposta natriurética. Em edemas refratários, associa-se albumina e furosemida parenteral em infusão contínua (0,1 a 0,2 mg/kg/hora ou 1 a 5 mg/ kg/dia). A coadministração de amilorida (associada a hidrocloro-tiazida ou clortalidona) pode ser estabelecida. Por causa das disfunções imunológicas citadas, da desnu-trição, do edema e do uso de medicações imunossupressoras, o nefrótico apresenta grande suscetibilidade às infecções: ce-lulites, peritonites, infecções de vias aéreas superiores, sinusi-tes e pneumonias, que podem evoluir para sepse. O tratamen-to antimicrobiano deve ser instituído rapidamente, levando em consideração o foco infeccioso, o estado clínico do pacien-te e o agente bacteriano. TRATAMENTO ESPECÍFICO Classicamente, para induzir remissão, utiliza-se prednisona diária (60 mg/m2 ou 2 mg/kg/dia; máximo de 60 mg/dia, 3 vezes/dia ou dose única) durante 4 a 6 semanas (o KDIGO sugere dose única). Caso tenha ocorrido remissão, introduz-se 40 mg/m2 ou 1,5 mg/kg em dias alternados em dose única pela manhã (máximo de 40 mg/dia) por 4 a 6 semanas Esse esquema é mantido por 6 meses, com diminuição lenta e progressiva da dose, caso a remissão se mantenha. Em casos com recidivas dentro dos 6 meses iniciais, volta-se para o esquema diário, mantido até 3 dias consecutivos após a remissão e, a seguir, reintroduz-se o corticosteroide em dias alternados. Se houver resistência ao tratamento inicial, pode-se utilizar pulsoterapia adicional com metilprednisolona (MP) 30 mg/kg/dose (máximo de 1 g) em dias alternados, 3 a 6 doses. Caso ocorra remissão completa, prosseguir a corticoterapia em esquema alternado por 1 ano, diminuindo a dose progressiva e lentamente. É importante a vigilância no controle da pressão arterial e o tratamento precoce das infecções. As infecções funcionam como gatilho para a descompensação da SN, dessa forma, durante os processos infecciosos, deve ser utilizado corticosteroide diário na mesma dose de manutenção por 5 a 7 dias para reduzir o risco de recaídas em crianças com recidivas frequentes ou corticodependente Tratamento Edema sem hipovolemia (alb>1,9mg/dl) furosemida 1 a 2mg/kg VO associação com espironolactona 1mg/kg 2x/dia Edema refratário furosemida 1 a 2mg/kg EV associada a espironolactona e hidroclorotiazida albumina (tentar evitar) Infusão de Albumina 1g/kg associada a furosemida reservar para casos com sinais de hipovolemia: dor abdominal, hipotensão oliguria evidência de insuficiência renal (hemoconcentração, baixo sódio urinário) Cuidado: risco de edema pulmonar em casos de hipervolemia Hipotensão: sugere hipovolemia Hipertensão: Avaliar cuidadosamente Pode refletir hipervolemia Pode ser secundário a vasoconstrição em resposta a hipovolemia (sódio urinário baixo) Tratamento: IECA: enalapril, captopril,.. OBS: EVITAR AINES DEVIDO AS COMPLICAÇÕES Complicações Outro fator de risco é o tromboembolismo, que deve ser sempre considerado, apesar de não ser tão frequente em crianças como nos adultos. O tromboembolismo venoso ocorre em cerca de 3% das crianças com SN A síndrome nefrítica é definida como um grupo de distúrbios que afetam os glomérulos renais, ou seja, as estruturas responsáveis pela filtração do sangue. Na maior parte dos casos, resulta dos diferentes tipos de glomerulonefrites, podendo se apresentar de forma aguda, crônica ou rapidamente progressiva O protótipo da síndrome nefrítica é a glomerulonefrite pós-estreptocócica (GNPE). A GNPE é a causa mais comum de nefrite aguda em crianças em todo o mundo, sendo a principal complicação não supurativa da infecção pelo estreptococo do grupo A A doença é hoje rara nas nações industrializadas e estima-se que a maioria dos casos ocorra em regiões do mundo com baixo nível socioeconômico. Síndrome nefrítica O risco de GNPE é aumentado em pacientes idosos e em crianças entre cinco e 12 anos de idade, sendo incomum em crianças com menos de três anos de idade e duas vezes mais frequente em homens que em mulheres. Pode ocorrer como um caso esporádico ou durante uma epidemia de infecção de pele ou garganta por estreptococos do grupo A. A patogênese da GNPE (Figura 1) não está elucidada, evidências sugerem associação com resposta imunológica com ativação do complemento, recrutamento de leucócitos, aumento do fator de crescimento e citocinas, inflamação e dano glomerular.3,4 Os depósitos imunes típicos são: IgG, C3, properdina e C5.5 O C3 volta aos valores de normalidade após 6-8 semanas.5 A gravidade e a duração da nefrite são variáveis, porém a maioria dos casos se resolve em 2-3 semanas e menos de 1% evolui para doença renal crônica Quadro clínico e exames laboratoriais O quadro clássico de GNPE corresponde ao aparecimento súbito de edema, hipertensão e hematúria. O edema ocorre em 65-90% dos pacientes e se mantém de 7-10 dias. Em geral, ele precede a hematúria, que é macroscópica em um terço dos casos e tem duração de 1-3 semanas, porém a hematúria microscópica pode persistir por meses até 2-4 anos A hipertensão arterial é observada em 60-80% dos pacientes e ocorre por retenção hidrossalina. Pode evoluir para emergência hipertensiva com encefalopatia, insuficiência cardíaca e/ou edema pulmonar, com resolução em cerca de 10 dias A redução da taxa de filtração glomerular pode ocorrer em cerca de 50% dos casos (raramente anúria), com normalização em 3-4 semanas após o início da doença. Além disso, podem ocorrer acidose metabólica e hipercalemia, particularmente nos pacientes oligúrico Alterações do sedimento urinário, destacam-se: hematúria com dismorfismo eritrocitário, cilindros hemáticos, cilindros granulosos e presença de proteinúria discreta (nefrótica em cerca de 5% dos casos) Tratamento O tratamento depende da apresentação e da causa da síndrome nefrítica. Em geral, é necessário fazer o controle da pressão arterial e do equilíbrio de sais e líquidos no corpo, o que se consegue respectivamente com medicamentos anti-hipertensivos e diuréticos, além de uma dieta com restrição de sódio e proteínas até recuperar a função renal. Havendo infecção bacteriana vigente, esse processo deve ser combatido com antibióticos adequados e no caso de doenças auto-imunes, utilizam-se corticosteróides e imunossupressores. Em alguns casos, pode ser necessário realizar uma biópsia do rim para identificar a causa ou mesmo fazer o planejamento terapêutico Pacientes com hipertensão arterial sistêmica moderada ou grave, oligúria e/ou complicações,como insuficiência cardíaca congestiva, encefalopatia hipertensiva e lesão renal aguda, devem ser hospitalizados. A avaliação diária de peso, pressão arterial, sintomas cardiovasculares, débito urinário e acompanhamento do edema e estado geral são fundamentais. Prognóstico O prognóstico é muito bom, com recuperação completa para a grande maioria dos pacientes. Em geral, a diurese retorna ao habitual em uma semana a partir do início do quadro e os níveis de creatinina costumam retornar aos basais em 3-4 semanas.5 Anormalidades mínimas (microalbuminúria e/ou hematúria microscópica) podem ser observadas na vida adulta em menos de 10-20% dos pacientes com glomerulonefrite pós- -estreptocócica. Assim, ressalta-se a importância de acompanhamento com nefrologista pediátrico. A presença de complemento normal no início do quadro, proteinúria nefrótica e crescentes epiteliais em biópsias na fase aguda, conferem pior prognóstico, com potencial de evolução para doença renal crônica
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