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1 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 IATROGENIA E POLIFARMÁCIA Iatrogenia corresponde aos efeitos negativos decorrente das ações medicas, sejam essas não propositais ou passivas. Assim, atos de prescrição com suas consequências indesejadas caem nessa categoria e podem ser divididos em iatrogenia por polifarmacia, uso de medicamentos inapropriados, cascata de prescrição e subutilização de medicações apropriadas. Para a prevenção dessas iatrogenias, são possíveis a revisão da medicação atual e a descontinuação da medicação desnecessária. IATROGENIA X ERRO MÉDICO Iatrogenia é um dano previsível e necessário, que tem como pressuposto a vontade do médico dirigida a um determinado resultado, o qual só poderá ser alcançado através do procedimento técnico recomendado. Ex: amputação de um membro para evitar alastramento de uma infecção. Erro médico: é uma forma de conduta profissional inadequada que supõe uma inobservância técnica, capaz de produzir um dano a vida ou a saúde do paciente. É o dano que pode ser caracterizado como imperícia, negligencia ou imprudência do médico. Ex: esquecer material cirúrgico dentro do corpo do paciente ao final da cirurgia. IATROGENIA POR POLIFARMÁCIA A definição de polifarmacia não é consensual na literatura. Alguns consideram o número de medicações em uso e outros levam em conta a prescrição de fármacos sem indicação precisa ou inapropriada. No entanto, o conceito mais utilizado de polifarmacia é a utilização de 5 ou mais medicações. Existe ainda a polifarmácia excessiva para caracterizar a prescrição de 10 ou mais medicamentos. Os fatores que favorecem a polifarmácia são: Prevalência de automedicação Múltiplas comorbidades Acompanhamento por médicos diferentes simultaneamente. A polifarmacia é um preditor de desfechos negativos, havendo um risco aumentado para quedas, sarcopenia, lesão renal aguda, hipoglicemia, pneumonia, má nutrição, mortalidade e redução da cognição. IATROGENIA POR USO DE MEDICAMENTOS INAPROPRIADOS Medicamentos potencialmente inapropriados consiste na utilização de fármacos com alto potencial de danos à saúde, superando os benefícios do seu uso. Diversos desfechos negativos estão relacionados a MPI como quedas, fraturas, delirium, hospitalização e morte. Com o intuito de avaliar a prescrição em pacientes idosos de modo padronizado e propor critérios objetivos para estratificação de risco potencial da polifarmacia, foram desenvolvidas algumas ferramentas empregadas na pratica clínica: Critério de Beers: foram desenvolvidos em 2003 pela sociedade americana de geriatria e consiste em uma lista extensa de medicamentos considerados potencialmente inapropriados para uso em indivíduos idosos com base nos riscos de eventos adversos. A última versão foi publicada em 2019 e mantinha a divisão em 5 categorias: 1) Fármacos potencialmente inapropriados para a maioria dos idosos; 2) Fármacos que tipicamente devem ser evitados em idosos com certas condições; 3) Fármacos a serem utilizados com cautela; 4) Fármacos que necessitam de ajuste de dose pela função renal basal. 5) Interações medicamentosas 2 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 Critérios STOPP/START: essa ferramenta parece mais eficaz para identificar o risco de eventos adversos relacionados com a polifarmacia em pacientes hospitalizados. 3 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 INTERAÇÃO MEDICAMENTOSA Ao atender idosos devemos sempre nos questionar se alguma daquelas queixas pode ser por interações medicamentosas. Isso porque o risco de ocorrer interações medicamentosas é diretamente proporcional ao número de fármacos em uso. Muitos medicamentos apresentam potencial para os diversos tipos de interações medicamentosas como: • Fármaco-fármaco: AINE e dicumarínicos (aumenta risco de sangramento) • Fármaco-doença: Metoclopramida e doença de Parkinson (potencializa efeitos extrapiramidais) • Fármaco-alimentos: Levotiroxina e leite bovino (diminui a absorção) • Fármaco-álcool: Metformina e álcool etílico (aumenta o risco de acidose láctica) • Fármaco-fitoterápicos: salicilato e Ginkgo biloba (aumenta risco de sangramento) • Fármaco –estado nutricional: fenitoína e hipoalbuminemia (aumenta concentração sérica da fenitoina) A farmacodinâmica é pouco alterada. Já a farmacocinética engloba todos os processos que ocorrem quando usamos um medicamento, desde a sua absorção até excreção. Com o envelhecimento, podemos ter alterações em todos esses processos. As alterações que comprometem a absorção são: atrofia da mucosa intestinal, redução da motilidade do TGI e aumento do pH do estomago. Já a distribuição pode ser alterada pela redução da albumina sérica (hipoalbuminemia aumenta a fração livre de alguns medicamentos como fenitoina, diazepam..), redução da massa magra e quantidade de agua corporal (diminuem a distribuição dos medicamentos hidrossolúveis), aumento da gordura corporal (aumenta a distribuição e o tempo de ação de medicamentos lipossolúveis como os benzo); Além disso, podemos ter diminuição do volume do fígado, redução do fluxo sanguíneo hepático e menor atividade do citocromo p450 que pode alterar o metabolismo hepático de alguns medicamentos. A excreção renal pode ser comprometida pois teremos uma redução da taxa de filtração glomerular, redução do fluxo sanguíneo renal o que aumenta o tempo de meia vida dos medicamentos. IATROGENIA POR CASCATA DE PRESCRIÇÃO A cascata de prescrição ocorre quando se prescreve um fármaco e por conta dos efeitos colaterais é prescrito um segundo medicamento. Este por sua vez, pode resultar em novos efeitos colaterais, constituindo um ciclo de sintomas e prescrições inadvertidas. Um exemplo disso é: um paciente com dor pós-operatória que é muito sedado, evoluindo para insuficiência respiratória, necessidade de ventilação mecânica e, consequentemente, desenvolve uma pneumonia associada à ventilação mecânica. 4 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 Inicialmente devem ser considerados todos os novos sintomas decorrentes do efeito adverso a droga, adotando medidas não farmacológicas na condução do caso, substituindo o medicamento por medicações alternativas menos toxicas. IATROGENIA POR SUBUTILIZAÇÃO DE MEDICAÇÕES APROPRIADAS NÃO ADERÊNCIA: O conceito de aderência compreende o ato de seguir orientações e recomendações sugeridas por um profissional de saúde. Para sua realização é fundamental a participação do paciente nas escolhas medicas e decisões terapêuticas (autonomia). Dentre os diversos fatores associados à não aderência, destacam-se os seguintes: I. Socioeconômicos: • Variáveis socioeconômicas: condições financeiras, escolaridade, apoio social. • Custo de tratamentos. II. Relacionados com a equipe e o sistema de saúde: • Interação médico-paciente. • Desenvolvimento e funcionamento do sistema de saúde. • Apoio comunitário. • Educação em saúde. III. Relacionados com a doença: • Intensidade dos sintomas. • Taxa de progressão. • Cronicidade. IV. Relacionados com o paciente: • Visão pessoal da doença e do tratamento (conhecimentos, crenças, percepções e expectativas). • Motivação para o autocuidado. • Suporte social. • Capacidade cognitiva. V. Relacionados com a terapia: • Complexidade do tratamento. • Duração do tratamento. • Reação adversa aos medicamentos. • Experiências prévias de tratamento (p. ex., falência de terapias). • Mudanças frequentes na estratégia de tratamento. Essas cinco dimensões devem ser consideradas quando os objetivos da terapêutica instituída não são alcançados. A baixa aderência costuma estar associada aos altos custos na saúde, baixa qualidade de vida e evoluções clinicas prejudiciais. SUBPRESCRIÇÃO: A omissão de terapia medicamentosa útil para determinada condição constitui parte do conceito de prescriçãoinapropriada. Essa é uma condição frequente entre os idosos, principalmente nos usuários de polifarmácia, sendo as principais hipóteses para isso o medo da interação medicamentosa, reação adversa e má aderência dos pacientes já usuários de prescrições múltiplas. Obviamente, há extensos argumentos em favor da cautela na prescrição e na dose de 5 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 fármacos para os idosos. Mas também existem situações, como os cuidados paliativos, as instituições de longa permanência e os idosos muito idosos (> 80 anos de idade), onde a sub utilização medicamentosa e/ou a omissão terapêutica ocorrem com frequência PREVENÇÃO DE ERROS DE PRESCRIÇÃO E EFEITOS ADVERSOS DAS MEDICAÇÕES • REVISÃO DA MEDICAÇÃO ATUAL: O habito de revisão continuada das medicações em uso é de suma importância para uma boa pratica clínica. Uma das estratégias utilizadas é solicitar ao paciente que leve todos os medicamentos em uso em uma sacola, isso permite que o médico saiba exatamente o que o paciente está usando e como ingere. • EFEITOS ADVERSOS DAS MEDICAÇÕES A reação adversa a medicamento é definida como qualquer efeito prejudicial ou indesejado que se manifeste após a administração do medicamento em doses normalmente utilizadas. A RAM em idosos são um grave problema de saúde pública, uma vez que os idosos são mais propensos por conta das mudanças fisiológicas do próprio envelhecimento, que alteram a farmacocinética e farmacodinâmica dos medicamentos. É importante salientar que no âmbito da geriatria, muitos medicamentos podem ser usados devido as suas reações adversas. • DESCONTINUAÇÃO DA MEDICAÇÃO DESNECESSÁRIA A descontinuação medicamentosa deve ser considerada em qualquer paciente idoso que apresente as seguintes situações clinicas: • Sintoma novo ou síndrome clínica sugestiva de efeitos adversos medicamentosos. • Manifestação de doença avançada ou de estado terminal. • Quadro demencial avançado. • Fragilidade extrema. • Completa dependência de cuidados de terceiros. • Pacientes que estejam recebendo medicações consideradas de alto risco (opioide, benzodiazepínico, agentes psicotrópicos, anti-inflamatórios não esteroides, anticoagulantes, 6 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 digoxina, agentes cardiovasculares, agentes hipoglicemiantes, fármacos com efeito anticolinérgico). • Medicamentos com risco de interação medicamentosa. • Pacientes que estejam recebendo agentes profiláticos para condições que não representem sérios riscos com sua suspensão. O objetivo da desprescrição é identificar e descontinuar medicações inapropriadas, levando em conta fatores como funcionalidade, expectativa de vida, risco potencial de efeitos adversos, polifarmacia. É uma ação da prevenção quaternária.
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